Informativo do STJ 568 de 16 de Setembro de 2015
Publicado por Superior Tribunal de Justiça
RECURSOS REPETITIVOS
DIREITO EMPRESARIAL E PROCESSUAL CIVIL. RESPONSABILIDADE POR AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO DE INSCRIÇÃO DE CORRENTISTA NO CCF. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ). TEMA 874. O Banco do Brasil, na condição de gestor do Cadastro de Emitentes de Cheques sem Fundos (CCF), não tem a responsabilidade de notificar previamente o devedor acerca da sua inscrição no aludido cadastro, tampouco legitimidade passiva para as ações de reparação de danos diante da ausência de prévia comunicação. Inicialmente, destaca-se que a Segunda Seção do STJ, no julgamento do REsp 1.061.134-RS, fixou, para os efeitos do art. 543-C do CPC, a tese de que "os órgãos mantenedores de cadastros possuem legitimidade passiva para as ações que buscam a reparação dos danos morais e materiais decorrentes da inscrição, sem prévia notificação, do nome de devedor em seus cadastros restritivos, inclusive quando os dados utilizados para a negativação são oriundos do CCF do Banco Central ou de outros cadastros mantidos por entidades diversas". No entanto, o CCF tem natureza, finalidade e características específicas, que não se confundem com as de outros cadastros a que se refere imediatamente a lógica daquele julgado. Com efeito, o CCF tem natureza pública, visa à proteção do crédito em geral e à preservação da higidez do sistema financeiro nacional, servindo aos interesses da coletividade (art. 192 do CF), envolvendo relevante interesse de ordem pública, submetido a normas de cunho estatutário obrigatório, estabelecidas pelas autoridades monetárias, operando sob controle do Banco Central do Brasil (Bacen), sem prevalente intuito de obtenção de ganhos. Já os demais cadastros são de natureza privada, instituídos e mantidos no interesse de particulares, sociedades empresárias atuantes, sem vínculo sistêmico, no ramo comercial, submetidos a normas de índole meramente contratual, operados por entidades privadas, que os exploram com nítido intuito da obtenção de lucro. Segundo a Resolução 1.682/1990 do Bacen, a inclusão no CCF ocorre automaticamente quando o cheque é devolvido por: a) falta de provisão de fundos (motivo 12), na segunda apresentação; b) conta encerrada (motivo 13); e c) prática espúria (motivo 14). Conforme o art. 10 da referida Resolução e o item 14 da Circular 2.989/2000 do Bacen: "Nas devoluções pelos motivos 12 a 14, o banco sacado é responsável pela inclusão do emitente no Cadastro de Emitentes de Cheques sem Fundos (CCF)". A mesma Resolução dispõe que a instituição financeira, ao recusar o pagamento de cheque por motivo que enseje a inclusão de ocorrência no CCF, deve providenciar a referida inclusão no prazo de quinze dias, contados da data de devolução do cheque. Por sua vez, o correntista não fica prejudicado pela inscrição de seu nome no CCF, senão após previamente notificado, pois as ocorrências do CCF devem ser obrigatoriamente comunicadas pela instituição financeira sacada, por escrito, ao respectivo correntista emitente do cheque e, somente após, serão consolidadas pelo executante dos serviços de compensação de cheques e outros papéis e distribuídas, em meios magnéticos, às instituições bancárias, conforme o art. 16 e o art. 27, "a", da Resolução 1.682/1990 do Bacen, alterado pelo art. 1º da Circular 2.250 do Bacen. Assim, tratando-se de sistema financeiro, não pode o Banco do Brasil encarregar-se de desempenhar função estranha, notificação prévia de emitente de cheque sem provisão de fundos, dever que as normas de regência do sistema atribuem corretamente a outro componente do sistema, o próprio banco sacado, instituição financeira mais próxima do correntista, detentor do cadastro desse cliente e do próprio saldo da conta do correntista, como depositário. É, pois, de reconhecer-se a ilegitimidade do Banco do Brasil, na condição de gestor do CCF, para responder pela ausência de prévia notificação aos correntistas inscritos no CCF, pelo que descabe cogitar-se de sua responsabilização por danos materiais ou morais, exceto nas hipóteses em que também figure como banco sacado. Precedentes citados: REsp 1.425.756-RS, Terceira Turma, DJe de 16/6/2014; e AgRg no AREsp 230.981-RS, Quarta Turma, DJe de 17/9/2014. REsp 1.354.590-RS, Rel. Min. Raul Araújo, Segunda Seção, julgado em 9/9/2015, DJe 15/9/2015.
RECURSOS REPETITIVOS
DIREITO PENAL. CONFIGURAÇÃO DO CRIME DE ESTUPRO DE VULNERÁVEL. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ). TEMA 918. Para a caracterização do crime de estupro de vulnerável previsto no art. 217-A, caput, do Código Penal, basta que o agente tenha conjunção carnal ou pratique qualquer ato libidinoso com pessoa menor de 14 anos; o consentimento da vítima, sua eventual experiência sexual anterior ou a existência de relacionamento amoroso entre o agente e a vítima não afastam a ocorrência do crime. Inicialmente, registre-se que a interpretação jurisprudencial acerca do art. 224, "a", do CP (antes da entrada em vigor da Lei 12.015/2009) já vinha se consolidando no sentido de que respondia por estupro ou por atentado violento ao pudor o agente que mantinha relações sexuais (ou qualquer ato libidinoso) com menor de 14 anos, mesmo sem violência real, e ainda que mediante anuência da vítima (EREsp 1.152.864-SC, Terceira Seção, DJe 1º/4/2014). Com efeito, o fato de alterações legislativas terem sido incorporadas pela Lei 12.015/2009 ao "Título IV - Dos Crimes contra a Dignidade Sexual", especialmente ao "Capítulo II - Dos Crimes Sexuais contra Vulnerável", do CP, estanca, de uma vez por todas, qualquer dúvida quanto à irrelevância, para fins de aperfeiçoamento do tipo penal inscrito no caput do art. 217-A, de eventual consentimento da vítima ao ato libidinoso, de anterior experiência sexual ou da existência de relacionamento amoroso entre ela e o agente. Isso porque, a despeito de parte da doutrina sustentar o entendimento de que ainda se mantém a discussão sobre vulnerabilidade absoluta e vulnerabilidade relativa, o tipo penal do art. 217-A do CP não traz como elementar a expressão "vulnerável". É certo que o nomem iuris que a Lei 12.015/2009 atribui ao citado preceito legal estipula o termo "estupro de vulnerável". Entretanto, como salientado, a "vulnerabilidade" não integra o preceito primário do tipo. Na verdade, o legislador estabelece três situações distintas em que a vítima poderá se enquadrar em posição de vulnerabilidade, dentre elas: "Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos". Não cabe, destarte, ao aplicador do direito relativizar esse dado objetivo, com o fim de excluir a tipicidade da conduta. A propósito, há entendimento doutrinário no viés de que: "Hoje, com louvor, visando acabar, de uma vez por todas, com essa discussão, surge em nosso ordenamento jurídico penal, fruto da Lei nº 12.015, de 7 de agosto de 2009, o delito que se convencionou denominar de estupro de vulnerável, justamente para identificar a situação de vulnerabilidade que se encontra a vítima. Agora, não poderão os Tribunais entender de outra forma quando a vítima do ato sexual for alguém menor de 14 (quatorze) anos. [...]. O tipo não está presumindo nada, ou seja, está tão somente proibindo que alguém tenha conjunção carnal ou pratique outro ato libidinoso com menor de 14 anos, bem como com aqueles mencionados no § 1º do art. 217-A do Código Penal. Como dissemos anteriormente, existe um critério objetivo para análise da figura típica, vale dizer, a idade da vítima". Dessa forma, não se pode qualificar ou etiquetar comportamento de crianças, de modo a desviar a análise da conduta criminosa ou justificá-la. Expressões como "amadurecimento sexual da adolescente", "experiência sexual pretérita da vítima" ou mesmo a utilização das expressões "criança prostituta" ou "criança sedutora" ainda frequentam o discurso jurisprudencial, como se o reconhecimento de tais circunstâncias, em alguma medida, justificasse os crimes sexuais perpetrados. Esse posicionamento, todavia, implica a impropriedade de se julgar a vítima da ação delitiva para, a partir daí, julgar-se o agente. Refuta-se, ademais, o frágil argumento de que o desenvolvimento da sociedade e dos costumes possa configurar fator que não permita a subsistência de uma presunção que toma como base a innocentia consilli da vítima. Basta um rápido exame da história das ideias penais - e, em particular, das opções de política criminal que deram ensejo às sucessivas normatizações do Direito Penal brasileiro - para se constatar que o caminho da "modernidade" é antípoda a essa espécie de proposição. Deveras, de um Estado ausente e de um Direito Penal indiferente à proteção da dignidade sexual de crianças e adolescentes, evoluiu-se, paulatinamente, para uma Política Social e Criminal de redobrada preocupação com o saudável crescimento físico, mental e afetivo do componente infanto-juvenil de nossa população, preocupação que passou a ser compartilhada entre o Estado, a sociedade e a família, com reflexos na dogmática penal. Assim é que novas tipificações vieram reforçar a opção do Estado brasileiro - na linha de similar esforço mundial - de combater todo tipo de violência, sobretudo a sexual, contra crianças e adolescentes. É anacrônico, portanto, qualquer discurso que procure considerar a modernidade, a evolução moral dos costumes sociais e o acesso à informação como fatores que se contrapõem à natural tendência civilizatória de proteger certos grupos de pessoas física, biológica, social ou psiquicamente fragilizadas. Além disso, não há que se falar em aplicação do princípio da adequação social, porquanto no julgamento de caso de estupro de vulnerável deve-se evitar carga de subjetivismo, sob pena de ocorrência de possíveis danos relevantes ao bem jurídico tutelado - o saudável crescimento físico, psíquico e emocional de crianças e adolescentes - que, recorde-se, conta com proteção constitucional e infraconstitucional, não sujeito a relativizações. Ora, a tentativa de não conferir o necessário relevo à prática de relações sexuais entre casais em que uma das partes (em regra, a mulher) é menor de 14 anos, com respaldo nos costumes sociais ou na tradição local, tem raízes em uma cultura sexista - ainda muito impregnada no âmago da sociedade ocidental, sobretudo em comunidades provincianas, segundo a qual meninas de tenra idade, já informadas dos assuntos da sexualidade, estão aptas a manter relacionamentos duradouros e estáveis (envolvendo, obviamente, a prática sexual), com pessoas adultas. Ressalta-se, por fim, que praticamente todos os países do mundo repudiam o sexo entre um adulto e um adolescente - e, mais ainda, com uma criança - e tipificam como crime a conduta de praticar atos libidinosos com pessoa ainda incapaz de ter o seu consentimento reconhecido como válido. Precedentes citados: AgRg nos EDcl no AREsp 191.197-MS, Quinta Turma, DJe 19/12/2014; e AgRg no REsp 1.435.416-SC, Sexta Turma, DJe 3/11/2014. REsp 1.480.881-PI, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Terceira Seção, julgado em 26/8/2015, DJe 10/9/2015.
DIREITO PENAL. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE INDEPENDENTEMENTE DO ADIMPLEMENTO DA PENA DE MULTA. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ). TEMA 931. Nos casos em que haja condenação a pena privativa de liberdade e multa, cumprida a primeira (ou a restritiva de direitos que eventualmente a tenha substituído), o inadimplemento da sanção pecuniária não obsta o reconhecimento da extinção da punibilidade. A Lei 9.268/1996 deu nova redação ao art. 51 do CP e extirpou do diploma jurídico a possibilidade de conversão da pena de multa em detenção, no caso de inadimplemento da sanção pecuniária. Após a alteração legislativa, o mencionado artigo passou a vigorar com a seguinte redação: "Transitada em julgado a sentença condenatória, a multa será considerada dívida de valor, aplicando-se-lhes as normas da legislação relativa à dívida ativa da Fazenda Pública, inclusive no que concerne às causas interruptivas e suspensivas da prescrição". Portanto, diante da nova redação dada ao CP, a pena de multa não mais possui o condão de constranger o direito à locomoção do sentenciado (STF: AgRg no HC 81.480-SP, Primeira Turma, DJ 5/4/2002; e HC 73.758-SP, Segunda Turma, DJ 24/9/1999). É imperioso frisar que a nova redação do art. 51 do CP trata da pena de multa como dívida de valor já a partir do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, ou seja, em momento, inclusive, anterior ao próprio cumprimento da pena privativa de liberdade ou da restritiva de direitos. Isso implica afirmar que o jus puniendi do Estado exaure-se ao fim da execução da pena privativa de liberdade ou da restritiva de direitos, porquanto, em nenhum momento, engloba a pena de multa, considerada dívida de valor a partir do trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Entendimento oposto, ou seja, a possibilidade de constrição da liberdade daquele que é apenado somente em razão de sanção pecuniária, consistiria em legitimação da prisão por dívida, em afronta, portanto, ao disposto no art. 5º, LXVII, da CF e, ainda, no art. 7º, 7, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica), cujo texto estabelece que "ninguém deve ser detido por dívida". Dessa forma, o reconhecimento da pena de multa como dívida de valor atribui à sanção pecuniária caráter extrapenal. Se a natureza da multa, após o trânsito em julgado da condenação, fosse compreendida como de caráter penal, mesmo diante da extinção da pena privativa de liberdade ou da restritiva de direitos pelo cumprimento, os efeitos da sentença se conservariam até o adimplemento da pena pecuniária, porquanto não reconhecida a extinção da punibilidade do apenado. Após a alteração legislativa que considerou a pena de multa como dívida de valor, deve-se assinalar também a alteração da competência para a execução da sanção, exclusiva, então, da Fazenda Pública, conforme disposto no enunciado da Súmula 521 do STJ: "A legitimidade para a execução fiscal de multa pendente de pagamento imposta em sentença condenatória é exclusiva da Fazenda Pública". Portanto, extinta a pena privativa de liberdade (ou restritiva de direitos) pelo seu cumprimento, o inadimplemento da pena de multa não obsta a extinção da punibilidade do apenado, porquanto, após a nova redação do art. 51 do CP, dada pela Lei 9.268/1996, a pena pecuniária é considerada dívida de valor e, desse modo, possui caráter extrapenal, de forma que sua execução é de competência exclusiva da Procuradoria da Fazenda Pública. REsp 1.519.777-SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Terceira Seção, julgado em 26/8/2015, DJe 10/9/2015.
SEGUNDA SEÇÃO
DIREITO EMPRESARIAL. PRAZO DE PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO DE COBRANÇA DE DEMURRAGE. Prescreve em cinco anos a pretensão de cobrança de valores estabelecidos em contrato de transporte marítimo de cargas (unimodal) para as despesas de sobre-estadia de contêiner (demurrage). A distinção entre o que se denominou ser transporte multimodal e o transporte dito unimodal, pelo menos para fins de definição do prazo prescricional aplicável à eventual pretensão de cobrança de despesas de sobre-estadia de contêineres, não se fazia relevante até a entrada em vigor do novo Código Civil, já que, ainda que se admitisse a existência de demurrage no transporte multimodal, para ambos os casos o prazo previsto necessariamente seria ânuo. No caso do transporte unimodal, por força do estabelecido pelo Código Comercial, e, no do transporte multimodal, em virtude da específica regra do art. 22 da Lei 9.611/1998. Ocorre que o artigo do Código Comercial que estabelecia o prazo de prescrição de um ano para a hipótese (art. 449, 3) foi expressamente revogado pelo Código Civil de 2002 (art. 2.045). Já quanto ao não cumprimento das responsabilidades decorrentes do transporte multimodal, o prazo prescricional permanece sendo de um ano por expressa previsão no art. 22 da Lei 9.611/1998. Ademais, nenhuma relação com a hipótese guarda o art. 8º do Decreto-Lei 116/1967, haja vista dispor no sentido de que prescrevem "ao fim de um ano, contado da data do término da descarga do navio transportador", as ações decorrentes do eventual extravio da carga transportada, bem como da falta de conteúdo, diminuição, perdas e avarias ou danos a esta. Quanto à aplicação analógica do art. 22 da Lei 9.611/1998, esta é absolutamente incabível, pois não se coaduna com os princípios gerais que regem o Direito Civil brasileiro, além de constituir verdadeiro atentado à segurança jurídica. É justamente a diferença existente entre as atividades desempenhadas pelo transportador marítimo e aquelas legalmente exigidas do Operador de Transporte Multimodal que revela, por si só, a manifesta impossibilidade de se estender à pretensão de cobrança de despesas decorrentes da sobre-estadia de contêineres (pretensão do transportador unimodal contra o contratante do serviço) a regra que estabelece o prazo prescricional ânuo para as ações fundadas no não cumprimento das responsabilidades decorrentes do transporte multimodal (pretensões dos contratantes do serviço contra o Operador de Transporte Multimodal). Vale destacar que, no caso do transporte unimodal (marítimo), a responsabilidade do transportador é restrita ao percurso marítimo, que se inicia após o recebimento da carga a bordo do navio no porto de origem, cessando imediatamente após o içamento das cargas e o consequente desembarque no porto de destino. Ou seja, os demais serviços e atos correlatos, tais como desembaraço aduaneiro, transporte, desunitização dos contêineres etc., são de exclusiva responsabilidade do afretador, e, por tal motivo, a demora na conclusão desse procedimento pode resultar em demasiado atraso na devolução dos contêineres utilizados no transporte da carga ao transportador. Essa situação que não se verifica no transporte multimodal de cargas, visto que este compreende, consoante expressamente disposto no art. 3º da Lei 9.611/1998, "além do transporte em si, os serviços de coleta, unitização, desunitização, movimentação, armazenagem e entrega da carga ao destinatário, bem como a realização dos serviços correlatos que forem contratados entre a origem e o destino, inclusive os de consolidação e desconsolidação documental de cargas". Em outras palavras, em nenhum momento a unidade de carga deixa de estar sob a posse e o controle do operador de transporte multimodal, sendo descabido, portanto, falar, em tal caso, na existência de responsabilidade do contratante por suposta sobre-estadia de contêineres. Além da dessemelhança das situações em apreço, certo é que, em se tratando de regras jurídicas sobre prazos prescricionais, a interpretação analógica ou extensiva sequer é admitida pelo ordenamento jurídico. A própria inteligência do caput do art. 205 do Código Civil evidencia a impossibilidade de interpretação analógica ou extensiva de norma sobre prescrição, visto que estabelece o prazo prescricional decenal como regra geral a ser aplicada nas hipóteses em que prazo inferior não seja expressamente fixado por lei. Desse modo, diante da certeza de que o art. 22 da Lei 9.611/1998 não alcança as ações de cobrança de despesas de sobre-estadia decorrentes da execução de contrato de transporte de cargas unimodal e de que inexiste lei especial vigente que defina prazo prescricional específico para a referida pretensão, a matéria deve ser regida pelas disposições insertas no Código Civil. Não por outro motivo é que ambas as Turmas julgadoras integrantes da Segunda Seção do STJ já haviam reconhecido que, em se tratando de transporte unimodal de cargas, quando a taxa de sobre-estadia objeto da cobrança for oriunda de disposição contratual que estabeleça os dados e os critérios necessários ao cálculo dos valores devidos a título de ressarcimento pelos prejuízos causados em virtude do retorno tardio do contêiner, será quinquenal o prazo prescricional (art. 206, § 5º, I, do CC); caso contrário, ou seja, nas hipóteses em que inexistente prévia estipulação contratual, aplica-se a regra geral do art. 205 do CC, ocorrendo a prescrição em dez anos. Precedentes citados: REsp 1.192.847-SP, Terceira Turma, DJe 1º/8/2014; e REsp 1.355.173-SP, Quarta Turma, DJe 17/2/2014. REsp 1.340.041-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 24/6/2015, DJe 4/9/2015.
TERCEIRA SEÇÃO
DIREITO PROCESSUAL PENAL. UTILIZAÇÃO DE FORMULÁRIOS FALSOS DA RECEITA FEDERAL E COMPETÊNCIA. O fato de os agentes, utilizando-se de formulários falsos da Receita Federal, terem se passado por Auditores desse órgão com intuito de obter vantagem financeira ilícita de particulares não atrai, por si só, a competência da Justiça Federal. Isso porque, em que pese tratar-se de uso de documento público, observa-se que a falsidade foi empregada, tão somente, em detrimento de particular. Assim sendo, se se pudesse cogitar de eventual prejuízo sofrido pela União, ele seria apenas reflexo, na medida em que o prejuízo direto está nitidamente limitado à esfera individual da vítima, uma vez que as condutas em análise não trazem prejuízo direto e efetivo a bens, serviços ou interesses da União, de suas entidades autárquicas ou empresas públicas (art. 109, IV, da CF). CC 141.593-RJ, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 26/8/2015, DJe 4/9/2015.
SEGUNDA TURMA
DIREITO ADMINISTRATIVO. ALTERAÇÃO NO CNPJ POR TRANSFORMAÇÃO DE SOCIEDADE COOPERATIVA. A alteração no CNPJ da razão social de sociedade cooperativa que modificou sua forma jurídica não exige o prévio cancelamento de sua autorização para funcionar e de seu registro. O art. 4º da Lei 5.764/1971 estabelece que "as cooperativas são sociedades de pessoas, com forma e natureza jurídica próprias, de natureza civil, não sujeitas a falência, constituídas para prestar serviços aos associados [...]". Consoante a doutrina e a jurisprudência do STJ, as cooperativas são sociedades simples (art. 982, parágrafo único, do CC) que não exercem atividade empresarial (art. 1.093 do CC). Nesse contexto, a melhor interpretação ao art. 63, IV, da Lei 5.764/1971 - segundo o qual, em caso de transformação da forma jurídica, ocorrerá, de pleno direito, a dissolução da sociedade cooperativa - é aquela que implica reconhecer tão somente a resolução da função social para a qual foi criada a cooperativa, promovendo sua conversão na entidade societária pretendida. O art. 1.113 do CC autoriza o ato de transformação societária independentemente "de dissolução ou liquidação da sociedade", resguardando, apenas, a observância dos "preceitos reguladores da constituição e inscrição do tipo em que vai converter-se", de modo que a transformação do tipo societário simples (classificação das cooperativas) não impõe a necessidade de liquidá-la, porque a pessoa jurídica é uma só, tanto antes quanto depois da operação, mudando apenas o tipo. REsp 1.528.304-RS, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 20/8/2015, DJe 1º/9/2015.
DIREITO ADMINISTRATIVO. POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DA LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA A ESTAGIÁRIO. O estagiário que atua no serviço público, ainda que transitoriamente, remunerado ou não, está sujeito a responsabilização por ato de improbidade administrativa (Lei 8.429/1992). De fato, o conceito de agente público, constante dos artigos 2º e 3º da Lei 8.429/1992 (Lei de Improbidade Administrativa), abrange não apenas os servidores públicos, mas todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função na Administração Pública. Assim, na hipótese em análise, o estagiário, que atua no serviço público, enquadra-se no conceito legal de agente público preconizado pela Lei 8.429/1992. Ademais, as disposições desse diploma legal são aplicáveis também àquele que, mesmo não sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma, direta ou indireta. Isso porque o objetivo da Lei de Improbidade não é apenas punir, mas também afastar do serviço público os que praticam atos incompatíveis com o exercício da função pública. REsp 1.352.035-RS, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 18/8/2015, DJe 8/9/2015.
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. PRAZO DECADENCIAL DO DIREITO DE PLEITEAR REVISÃO DE PENSÃO PREVIDENCIÁRIA DECORRENTE DE MORTE. O prazo decadencial do direito de revisar o valor do salário de benefício da pensão previdenciária por morte mediante o recálculo da renda mensal inicial do benefício originário de aposentadoria conta-se após o deferimento do ato de pensionamento. Isso porque, em decorrência do princípio da actio nata, a legitimidade do pensionista para propositura de ação de revisão advém apenas com o óbito do segurado, já que, por óbvio, aquele não era titular do benefício originário, direito personalíssimo. REsp 1.529.562-CE, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 20/8/2015, DJe 11/9/2015.
DIREITO TRIBUTÁRIO. INCIDÊNCIA DE PIS/PASEP-IMPORTAÇÃO E COFINS-IMPORTAÇÃO SOBRE A IMPORTAÇÃO DE ANIMAL SILVESTRE. Há incidência de contribuição para o PIS/PASEP-Importação e de COFINS-Importação sobre a importação de animal silvestre, ainda que sua internalização no território nacional tenha ocorrido via contrato de permuta de animais. O art. 1º, caput, da Lei 10.865/2004 instituiu a Contribuição para os Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público incidente na Importação de Produtos Estrangeiros ou Serviços (PIS/PASEP-Importação) e a Contribuição Social para o Financiamento da Seguridade Social devida pelo Importador de Bens Estrangeiros ou Serviços do Exterior (COFINS-Importação), com base nos arts. 149, § 2º, II, e 195, IV, da CF, observado o disposto no seu art. 195, § 6º. Da análise da referida Lei, verifica-se que o fato gerador de ambas as contribuições, nos termos do art. 3º, I, faz referência a "bens" e não a "produtos" ou "mercadorias". Logo, discutir se os animais objeto do contrato se enquadram nos conceitos de produto e mercadoria é irrelevante no plano infraconstitucional. Ademais, os artigos seguintes da mencionada Lei deixam clara a intenção do legislador em tributar os bens importados, não havendo restrição aos que estariam enquadrados nos conceitos de "produto" ou "mercadoria". Registre-se, ad argumentandum tantum, que até mesmo no plano constitucional é despicienda, na hipótese, a análise dos conceitos de "produto" e "mercadoria", tendo em vista que o art. 195, IV, quando trata do financiamento da seguridade social, determina que ela também ocorrerá mediante recursos provenientes de contribuições do importador de bens, não havendo referência, nesse dispositivo constitucional, aos referidos termos. Dessa forma, os animais silvestres objeto de contrato de permuta enquadram-se no conceito de bem definido no art. 82 do CC para fins de incidência do PIS/PASEP-Importação e da COFINS-Importação, pelo que a sua internalização no território nacional está sujeita às referidas contribuições. Ressalte-se que, ainda que no contrato de permuta o pagamento não se realize com moeda, mas sim com a entrega do bem que se pretende trocar, tal fato não retira a possibilidade de se atribuir valor financeiro, ou preço, à operação realizada, sobretudo porque o art. 533 do CC determina a aplicação à permuta das disposições referentes à compra e venda. REsp 1.254.117-SC, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 18/8/2015, DJe 27/8/2015.
DIREITO TRIBUTÁRIO. INCIDÊNCIA DE IR SOBRE LUCROS CESSANTES. Os valores percebidos, em cumprimento de decisão judicial, a título de pensionamento por redução da capacidade laborativa decorrente de dano físico causado por terceiro são tributáveis pelo Imposto de Renda (IR). Para a materialização da hipótese de incidência do IR, requer-se, simplesmente, a existência de acréscimo patrimonial, consistente na aquisição de riqueza nova, independentemente da fonte ou procedência do ganho, exceto em situações de imunidade ou isenção. Tal afirmação encontra-se em sintonia com o princípio tributário intitulado pecunia non olet, que, de acordo com a doutrina, "significa que o 'dinheiro não tem cheiro'", razão pela qual "o tributo será cobrado de todos aqueles que apresentam capacidade contributiva (capacidade econômica)". Feitas essas considerações, sob a ótica do Código Civil, notadamente dos arts. 402 e 403, tem-se que indenização corresponde a perdas e danos, devendo englobar não apenas o que o indivíduo perdeu, como também o que deixou de lucrar, este último denominado "lucros cessantes". Nesse contexto, a natureza indenizatória dos lucros cessantes não os retira do âmbito de incidência do IR, pois o que interessa para a tributação por intermédio do referido tributo, como visto acima, é a obtenção de riqueza nova, ou seja, a ocorrência de acréscimo patrimonial. Assim, para fins de incidência do IR, o nomen iuris atribuído à verba é irrelevante. No caso dos valores percebidos a título de pensionamento por redução da capacidade laborativa decorrente de dano físico causado por terceiro, não obstante a verba ostente a natureza de lucros cessantes - o que a qualifica como verba indenizatória -, há acréscimo patrimonial apto a autorizar a incidência do IR com base no art. 43, II, do CTN. REsp 1.464.786-RS, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 25/8/2015, DJe 9/9/2015.
DIREITO TRIBUTÁRIO E PREVIDENCIÁRIO. GRATIFICAÇÕES E PRÊMIOS E CONTRIBUIÇÃO PREVIDÊNCIÁRIA. Não incide contribuição previdenciária sobre prêmios e gratificações de caráter eventual. A fim de verificar a sua inclusão ou não no salário-de-contribuição, uma das principais características a ser aferida sobre as gratificações e os prêmios é a habitualidade ou não de seu pagamento. Havendo pagamento com habitualidade, manifesto o caráter salarial, implicando ajuste tácito entre as partes, razão pela qual incide contribuição previdenciária. A propósito, o STF possui entendimento firmado pela Súmula 207 ("As gratificações habituais, inclusive a de natal, consideram-se tacitamente convencionadas, integrando o salário"). Tratando-se de prêmio ou gratificação eventual, fica afastada a incidência da contribuição, conforme o art. 28, § 9º, "e", 7, da Lei 8.212/1991. REsp 1.275.695-ES, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 20/8/2015, DJe 31/8/2015.
DIREITO TRIBUTÁRIO E PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-FAMÍLIA E CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. Não incide contribuição previdenciária sobre salário-família. A doutrina aponta que a natureza jurídica do salário-família não é de salário, em que pese o nome, na medida em que não é pago como contraprestação de serviços prestados pelo empregado. Realizando-se uma interpretação sistemática da legislação de regência (art. 70 da Lei 8.213/1991 e art. 28, § 9º, "a", da Lei 8.212/1991), verifica-se que se trata de benefício de natureza previdenciária não incorporável ao cômputo dos rendimentos que integrarão a aposentadoria do trabalhador. REsp 1.275.695-ES, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 20/8/2015, DJe 31/8/2015.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. LEGITIMIDADE DO MP PARA PROPOR ACP OBJETIVANDO A LIBERAÇÃO DE SALDO DE CONTAS PIS/PASEP DE PESSOAS COM INVALIDEZ. O Ministério Público tem legitimidade para propor ação civil pública objetivando a liberação do saldo de contas PIS/PASEP, na hipótese em que o titular da conta - independentemente da obtenção de aposentadoria por invalidez ou de benefício assistencial - seja incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, bem como na hipótese em que o próprio titular da conta ou quaisquer de seus dependentes for acometido das doenças ou afecções listadas na Portaria Interministerial MPAS/MS 2.998/2001. Embora a LC 75/1993, em seu art. 6º, VII, "d", preceitue que "Compete ao Ministério Público da União (...) VII - promover o inquérito civil e a ação civil pública para: (...) d) outros interesses individuais indisponíveis, homogêneos, sociais, difusos e coletivos", o Ministério Público somente terá sua representatividade adequada para propor ação civil pública quando a ação tiver relação com as atribuições institucionais previstas no art. 127, caput, da Constituição da República ("O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis"). Deve-se destacar, nesse passo, que a jurisprudência do STF e do STJ assinala que, quando se trata de interesses individuais homogêneos - até mesmo quando disponíveis - a legitimidade do Ministério Público para propor ação coletiva é reconhecida se evidenciado relevante interesse social do bem jurídico tutelado, atrelado à finalidade da instituição (RE 631.111-GO, Tribunal Pleno, DJe 30/10/2014; REsp 1.209.633-RS, Quarta Turma, DJe 4/5/2015). Ademais, ao se fazer uma interpretação sistemática dos diplomas que formam o microssistema do processo coletivo, seguramente pode-se afirmar que, por força do art. 21 da Lei 7.347/1985, aplica-se o Capítulo II do Título III do Código de Defesa do Consumidor (CDC) à hipótese em análise. Com efeito, a tutela coletiva será exercida quando se tratar de interesses/direitos difusos, coletivos e individuais coletivos, nos termos do art. 81, parágrafo único, do CDC. Assim, necessário observar que, no caso, o interesse tutelado referente à liberação do saldo do PIS/PASEP, mesmo se configurando como individual homogêneo (Lei 8.078/1990), mostra-se de relevante interesse à coletividade, tornando legítima a propositura de ação civil pública pelo Parquet, visto que se subsume aos seus fins institucionais. REsp 1.480.250-RS, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 18/8/2015, DJe 8/9/2015.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. NATUREZA JURÍDICA DO TERMO DE ACORDO DE PARCELAMENTO PARA FINS DE EXECUÇÃO. O Termo de Acordo de Parcelamento que tenha sido subscrito pelo devedor e pela Fazenda Pública deve ser considerado documento público para fins de caracterização de título executivo extrajudicial, apto à promoção de ação executiva, na forma do art. 585, II, do CPC. De fato, o art. 585, II, do CPC elenca o "documento público assinado pelo devedor" dentre os títulos executivos extrajudiciais, mas não traz o seu conceito, sendo que o art. 364 do CPC revela tão somente a força probante do referido documento, ao referir que "faz prova não só da sua formação, mas também dos fatos que o escrivão, o tabelião, ou o funcionário declarar que ocorreram na sua presença". Nesse contexto, o STJ, ao analisar situação similar, assentou que "a melhor interpretação para a expressão documento público é no sentido de que tal documento é aquele produzido por autoridade, ou em sua presença, com a respectiva chancela, desde que tenha competência para tanto" (REsp 487.913-MG, Primeira Turma, DJ 9/6/2003). Ademais, essa mesma linha de raciocínio é seguida pela doutrina, que define documento público como "todo aquele cuja elaboração se deu perante qualquer órgão público, como, por exemplo um termo de confissão de dívida em repartição administrativa". Dessa forma, na hipótese em análise, não há como extirpar da declaração de vontades exarada pelas partes no âmbito administrativo a natureza de documento público, na medida em que lavrada sob a chancela de órgão público e firmado pelo devedor, externando a vontade da Administração Pública e do particular. REsp 1.521.531-SE, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 25/8/2015, DJe 3/9/2015.
TERCEIRA TURMA
DIREITO CIVIL. ALTERAÇÃO DE FACHADA SEM AUTORIZAÇÃO DA TOTALIDADE DOS CONDÔMINOS. O condômino não pode, sem a anuência de todos os condôminos, alterar a cor das esquadrias externas de seu apartamento para padrão distinto do empregado no restante da fachada do edifício, ainda que a modificação esteja posicionada em recuo, não acarrete prejuízo direto ao valor dos demais imóveis e não possa ser vista do térreo, mas apenas de andares correspondentes de prédios vizinhos. Destaca-se que o legislador, tanto no Código Civil como na Lei 4.591/1964, faz referência expressa à proibição de se alterar a cor das esquadrias externas ao dispor, respectivamente, que "São deveres do condômino: [...] não alterar a forma e a cor da fachada, das partes e esquadrias externas" (inciso III do art. 1.336) e que "É defeso a qualquer condômino: [...] decorar as partes e esquadriais externas com tonalidades ou côres diversas das empregadas no conjunto da edificação" (inciso II do art. 10), ressalvando-se a possibilidade de sua modificação quando autorizada pela unanimidade dos condôminos (art. 10, § 2º, da Lei 4.591/1946). A consideração de que a alteração seria possível porque pouco visível a partir da vista da rua e por não acarretar prejuízo direto no valor dos demais imóveis do condomínio fere a literalidade da norma, pois é indiscutível que houve alteração na fachada do prédio. Admitir que apenas as alterações visíveis do térreo possam caracterizar alteração da fachada, passível de desfazimento, poderia levar ao entendimento de que, em arranha-céus, os moradores dos andares superiores, quase invisíveis da rua, não estariam sujeitos ao regramento em análise. De igual modo, poderia ensejar a descaracterização do padrão arquitetônico da obra, ainda que a alteração da fachada seja avistável apenas dos prédios vizinhos em andares correspondentes, visto posicionar-se em área recuada. Há de se considerar que recuos são recursos arquitetônicos comuns e que, se localizados na face externa da edificação, não deixam de compor a fachada. De fato, fachada não é somente aquilo que pode ser visualizado do térreo. Assim, isoladamente, a alteração pode não afetar diretamente o preço dos demais imóveis do edifício, mas deve-se ponderar que, se cada proprietário de unidade superior promover sua personalização, empregando cores de esquadrias que entender mais adequadas ao seu gosto pessoal, a quebra da unidade arquitetônica seria drástica, com a inevitável desvalorização do condomínio. Registre-se, por fim, que não se ignoram as discussões doutrinárias e jurisprudenciais a respeito da alteração de fachada, mais especificamente acerca de fechamento de varandas com vidros incolores, instalação de redes de segurança e até substituição de esquadrias com material diverso do original quando este não se encontra mais disponível no mercado. Entretanto, na hipótese em apreço, foi utilizada esquadria de cor diversa do conjunto arquitetônico, alteração jamais admitida e em flagrante violação do texto legal. REsp 1.483.733-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 25/8/2015, DJe 1º/9/2015.
DIREITO CIVIL. PENSÃO CIVIL POR INCAPACIDADE PARCIAL PARA O TRABALHO. Pode ser incluída pensão civil em indenização por debilidade permanente de membro inferior causada a soldado por acidente de trânsito, ainda que se possa presumir capacidade para atividades administrativas no próprio Exército Brasileiro ou para outras ocupações. O STJ já decidiu que a circunstância de se presumir a capacidade laborativa da vítima para outras atividades, diversas daquela exercida no momento do acidente, não exclui o pensionamento civil, observado o princípio da reparação integral do dano. Precedentes citados: REsp 1.269.274-RS, Segunda Turma, DJe 10/12/2012; e REsp 899.869-MG, Terceira Turma, DJe 26/3/2007. REsp 1.344.962-DF, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 25/8/2015, DJe 2/9/2015.
DIREITO CIVIL. VALOR DA PENSÃO CIVIL POR INCAPACIDADE PARCIAL PARA O TRABALHO. A pensão civil incluída em indenização por debilidade permanente de membro inferior causada a soldado do Exército Brasileiro por acidente de trânsito pode ser fixada em 100% do soldo que recebia quando em atividade. A pensão correspondente ao soldo integral que o soldado recebia na ativa bem repara o dano gravíssimo sofrido, com amparo no princípio da reparação integral do dano. REsp 1.344.962-DF, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 25/8/2015, DJe 2/9/2015.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. FORO COMPETENTE PARA APRECIAR AÇÃO DE DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL CUMULADA COM ALIMENTOS. A autora pode optar entre o foro de seu domicílio e o foro de domicílio do réu para propor ação de reconhecimento e dissolução de união estável cumulada com pedido de alimentos, quando o litígio não envolver interesse de incapaz. Deve-se ponderar, para a solução da controvérsia em análise, acerca de qual regra de competência deve sobressair: se a geral do art. 94, ou a especial do art. 100, II, ambos do CPC. A resposta se orienta à luz do princípio da especificidade, prevalecendo, dessa forma, a segunda regra de competência. Deve-se ressaltar, contudo, que a competência prevista no art. 100, II, do CPC é relativa quando se tratar de pedido de alimentos feito por qualquer um dos cônjuges, ao qual se presume a condição de hipossuficiente. O que significa dizer que é lícito à autora optar tanto pelo foro do domicílio do réu quanto pelo de seu próprio domicílio. A propósito do tema, cabe invocar a seguinte lição doutrinária: "A regra especial de competência dos incisos I e II do CPC 100 não fere o princípio constitucional da isonomia (art. 5º, I), nem é incompatível com a igualdade dos cônjuges na condução da sociedade conjugal (CF 226) (RJTJSP 134/283, 132/279). A hipótese é de tratar desigualmente partes desiguais, vale dizer, de discriminação justa, permitida pela CF 5º, I. Como, em tese, o alimentando necessita dos alimentos para sobreviver e o alimentante pode pagá-los, a ação de alimentos deve ser proposta no foro do domicílio do alimentando". Conclui-se, portanto, que a aplicação da regra especial de competência resguarda o alimentando em sua presumida condição de hipossuficiente e ameniza o custo financeiro de se demandar em foro distinto de seu domicílio, promovendo seu acesso à justiça. REsp 1.290.950-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 25/8/2015, DJe 31/8/2015.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. DESNECESSIDADE DE EXAURIMENTO DAS VIAS EXTRAJUDICIAIS PARA A UTILIZAÇÃO DO SISTEMA RENAJUD. A utilização do sistema RENAJUD com o propósito de identificar a existência de veículos penhoráveis em nome do executado não pressupõe a comprovação do insucesso do exequente na obtenção dessas informações mediante consulta ao DETRAN. O RENAJUD é um sistema on line de restrição judicial de veículos criado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que interliga o Judiciário ao Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) e permite consultas e o envio, em tempo real, à base de dados do Registro Nacional de Veículos Automotores (Renavam), de ordens judiciais de restrições de veículos, inclusive registro de penhora. Para a utilização desse sistema, assim como ocorre com a penhora on line pelo sistema BACENJUD, é dispensável o exaurimento das vias administrativas tendentes à localização de bens do devedor. Essa conclusão pode ser extraída das seguintes considerações: a) a execução é movida no interesse do credor, a teor do disposto no artigo 612 do CPC; b) o sistema RENAJUD é ferramenta idônea para simplificar e agilizar a busca de bens aptos a satisfazer os créditos executados; e c) a utilização do sistema informatizado permite a maior celeridade do processo (prática de atos com menor dispêndio de tempo e de recursos) e contribui para a efetividade da tutela jurisdicional. Observe-se que, nos termos do art. 655, I e II, do CPC, a penhora observará, preferencialmente, dinheiro e, em seguida, veículos de vias terrestres. Logo, em cumprimento à referida ordem de preferência, no insucesso da utilização da ferramenta BACENJUD para a localização de ativos financeiros, é lícito ao exequente requerer ao juízo que promova a consulta via RENAJUD a respeito da possível existência de veículos automotores em nome do executado, revelando-se injustificável a recusa com esteio no singelo fundamento da ausência de comprovação do esgotamento de diligências na busca de bens penhoráveis. Sob outra perspectiva, é notório que os órgãos públicos, em sua grande maioria, como garantia de privacidade, não fornecem os dados cadastrais de particulares, o que torna difícil a obtenção da informação pretendida. Além disso, a busca realizada no DETRAN local não é capaz de verificar a existência de veículos em outros Estados da Federação, ao contrário da pesquisa pelo sistema RENAJUD, que atinge todo o país. Dessa forma, atualmente, com o aparato tecnológico posto a favor do Estado, a exigência de exaurimento das vias administrativas de busca bens do devedor se afigura verdadeiro mecanismo de procrastinação do andamento do feito, o que vai de encontro à efetiva prestação jurisdicional. Ademais, o CNJ, atento às repercussões dos sistemas BACENJUD, RENAJUD e INFOJUD como importantes ferramentas que asseguram a razoável duração do processo judicial, editou a Recomendação 51/2015, cujo teor corrobora o entendimento exposto acima. REsp 1.347.222-RS, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 25/8/2015, DJe 2/9/2015.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. PRAZO DECADENCIAL PARA AJUIZAMENTO DE AÇÃO ANULATÓRIA NO PROCEDIMENTO ARBITRAL. No procedimento arbitral, o prazo decadencial de noventa dias para o ajuizamento de ação anulatória (art. 33, § 1º, da Lei 9.307/1996) em face de sentença arbitral parcial conta-se a partir do trânsito em julgado desta, e não do trânsito em julgado da sentença arbitral final. De plano, afigura-se de suma relevância consignar que, no âmbito do procedimento arbitral, nos termos da Lei 9.307/1996 (antes mesmo das alterações promovidas pela Lei 13.129/2015), inexiste qualquer óbice à prolação de sentença arbitral parcial. Efetivamente, a possibilidade de prolação de sentença arbitral parcial, há muito admitida no Direito Comparado e expressamente prevista nos principais regulamentos de arbitragem internacionais (dentre eles, citam-se: da UNCITRAL - United Nations Commission on International Trade Law, art. 32.1; da ICC - International Court of Arbitration, art. 2 (iii); da AAA - International Centre for Dispute Resolution, art. 27.7; e da LCIA - London Court of International Arbitration, art. 26.7), encontrava, no país, antes da Lei 11.232/2005, alguma resistência de alguns autores, em virtude, não raro, da inevitável comparação com o processo judicial então em vigor. Todavia, após a Reforma instituída pela Lei 11.232/2005, pela qual se afastou da definição de sentença o critério "exclusivamente" topográfico (extinção do processo), reportando-se ao conteúdo das matérias vertidas nos arts. 267 e 269 do CPC, tornou-se insubsistente o argumento de parte da doutrina nacional, que não admitia a prolação de sentença parcial no âmbito do procedimento arbitral em virtude da literalidade do art. 29 da Lei 9.307/1996 ("Proferida a sentença arbitral, dá-se por finda a arbitragem..."). Não se olvidam, tampouco se afastam, as vantagens de se traçar um paralelo entre o processo judicial e a arbitragem, notadamente por se tratar efetivamente de ramos do Direito Processual. E, desse modo, natural que do processo judicial se extraiam as principais noções e, muitas vezes, elementos seguros para solver relevantes indagações surgidas no âmbito da arbitragem, de modo a conceder às partes tratamento isonômico e a propiciar-lhes o pleno contraditório e a ampla defesa. Por consectário, vislumbra-se, em certa medida, a salutar harmonia dos institutos processuais incidentes no processo judicial com aqueles aplicáveis à arbitragem. Isso, todavia, não autoriza o intérprete a compreender que a arbitragem - regida por princípios próprios (notadamente o da autonomia da vontade e o da celeridade da prestação jurisdicional) - deva observar necessária e detidamente os regramentos disciplinadores do processo judicial, sob pena de desnaturar-se esse importante modo de heterocomposição. Há que se preservar, portanto, as particularidades de cada qual. É justamente com este enfoque que se deve examinar a admissão da prolação de sentença parcial no âmbito do procedimento arbitral, assim como sua adequação com o sistema processual vigente. E, o fazendo, pode-se afirmar com segurança que o julgamento fatiado da causa afigura-se adequado, viável e condizente com o sistema processual posto (inclusive pela Lei 11.232/2005). Portanto, em consonância com o sistema processual vigente, absolutamente admissível que, no âmbito do procedimento arbitral, os árbitros profiram decisão (sentença) que resolva a causa parcialmente, compreendida esta como o decisum que reconhece ou não o direito alegado pela parte (sentença de mérito), ou que repute ausente pressupostos ou condições de admissibilidade da tutela jurisdicional pretendida (sentença terminativa). Naturalmente, levando-se em conta as peculiaridades do processo arbitral, a decisão (sentença) que decide a causa, total ou parcialmente, não pode ser impugnada por meio de recursos (com exceção, é certo, dos embargos aclaratórios), mas apenas pela estreita via da ação anulatória, justamente em função da celeridade e da segurança jurídica da prestação jurisdicional perseguida pelas partes signatárias. Não obstante, a simples disparidade de forma pela qual a decisão (sentença) parcial é impugnada nos processos judicial e arbitral não consubstancia justificativa idônea para inadmiti-la neste último. Com base em tais premissas, e em se transportando a definição de sentença ofertada pela Lei 11.232/2005 à Lei 9.307/1996, é de se reconhecer a absoluta admissão, no âmbito do procedimento arbitral, de se prolatar sentença parcial, compreendida esta como o ato dos árbitros que, em definitivo (ou seja, finalizando a arbitragem na extensão do que restou decidido), resolve parte da causa, com fundamento na existência ou não do direito material alegado pelas partes ou na ausência dos pressupostos de admissibilidade da tutela jurisdicional pleiteada. Nesse passo, a sentença parcial arbitral resolve parte da causa em definitivo, ou seja, finaliza a arbitragem na extensão do que restou decidido, sendo, portanto, apta, no ponto, à formação da coisa julgada. Nessa medida, a ação anulatória destinada a infirmá-la - único meio admitido de impugnação do decisum - deve ser intentada de imediato, sob pena de a questão decidida tornar-se imutável, porquanto não mais passível de anulação pelo Poder Judiciário, a obstar, por conseguinte, que o Juízo arbitral profira nova decisão sobre a matéria. Não há, dessa maneira, qualquer argumento idôneo a autorizar a compreensão de que a impugnação ao comando da sentença parcial arbitral, por meio da competente ação anulatória, poderia ser engendrada somente por ocasião da prolação da sentença arbitral final. Sob o enfoque da celeridade, da efetividade e da segurança jurídica especialmente perseguidas pelas partes signatárias de um compromisso arbitral, absolutamente contraproducente a adoção de tal postura. De fato, encontrando-se determinado capítulo da causa maduro para ser julgado, não haveria razão para que a correlata matéria não fosse desde logo decidida. E, uma vez resolvida a questão em sentença parcial, caso esta venha a ser anulada, salutar que o referido provimento judicial seja exarado o quanto antes a fim de não comprometer ainda mais o procedimento arbitral. A justificar, ainda, a imediata impugnação, é de suma relevância reconhecer que a questão decidida pela sentença arbitral parcial encontrar-se-á definitivamente julgada, não podendo ser objeto de ratificação e muito menos de modificação pela sentença arbitral final, exigindo-se de ambas, por questão de lógica, naturalmente, coerência, tão-somente. Não bastassem tais considerações, suficientes em si, para lastrear a compreensão de que a impugnação da sentença parcial, por meio de ação anulatória, deve ser exercida pela parte sucumbente imediatamente à sua prolação, é de se reconhecer, também e principalmente, que tal incumbência decorre da própria lei de regência (Lei 9.307/1996, inclusive antes das alterações promovidas pela Lei 13.129/2015), que, no § 1º do art. 33, estabelece o prazo decadencial de 90 (noventa dias) para anular a sentença arbitral. Nesse contexto, compreendendo-se sentença arbitral como gênero, do qual a parcial e a definitiva são espécies, o prazo previsto no aludido dispositivo legal aplica-se a estas, indistintamente. REsp 1.519.041-RJ, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 1º/9/2015, DJe 11/9/2015.
QUINTA TURMA
DIREITO PENAL. TERMO INICIAL DO PRAZO PRESCRICIONAL DO CRIME PREVISTO NO ART. 2º, I, DA LEI 8.137/1990. O termo inicial do prazo prescricional da pretensão punitiva do crime previsto no art. 2º, I, da Lei 8.137/1990 ("fazer declaração falsa ou omitir declaração sobre rendas, bens ou fatos, ou empregar outra fraude, para eximir-se, total ou parcialmente, de pagamento de tributo") é a data em que a fraude é perpetrada, e não a data em que ela é descoberta. Isso porque o referido tipo tem natureza de crime formal, instantâneo, sendo suficiente a conduta instrumental, haja vista não ser necessária a efetiva supressão ou redução do tributo para a sua consumação, bastando o emprego da fraude. Assim, o fato de a fraude ter sido empregada em momento determinado, ainda que irradie efeitos até ser descoberta, não revela conduta permanente, mas sim, crime instantâneo de efeitos permanentes - os quais perduraram até a descoberta do engodo. Precedente citado do STJ: RHC 9.625-CE, Sexta Turma, DJ 27/8/2001. Precedente citado do STF: RHC 90.532 ED, Tribunal Pleno, DJe 5/11/2009. RHC 36.024-ES, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 25/8/2015, DJe 1º/9/2015.
DIREITO PENAL. INTERRUPÇÃO DE PRESCRIÇÃO DE PRETENSÃO PUNITIVA EM CRIMES CONEXOS. No caso de crimes conexos que sejam objeto do mesmo processo, havendo sentença condenatória para um dos crimes e acórdão condenatório para o outro delito, tem-se que a prescrição da pretensão punitiva de ambos é interrompida a cada provimento jurisdicional (art. 117, § 1º, do CP). De antemão, salienta-se que o art. 117, IV, do CP enuncia que: "O curso da prescrição interrompe-se: IV - pela publicação da sentença ou acórdão condenatórios recorríveis". Nesse contexto, é importante ressaltar que, se a sentença é condenatória, o acórdão só poderá ser confirmatório ou absolutório, assim como só haverá acórdão condenatório no caso de prévia sentença absolutória. Na hipótese, contudo, os crimes são conexos, o que viabilizou a ocorrência, no mesmo processo, tanto de uma sentença condenatória quanto de um acórdão condenatório. Isso porque a sentença condenou por um crime e absolveu por outro, e o acórdão reformou a absolvição. Ressaltado isso, enfatiza-se que a prescrição não é contada separadamente nos casos de crimes conexos que sejam objeto do mesmo processo. Ademais, para efeito de prescrição, o art. 117, § 1º, do CP dispõe que: "[...] Nos crimes conexos, que sejam objeto do mesmo processo, estende-se aos demais a interrupção relativa a qualquer deles". Portanto, observa-se que, a despeito de a sentença ter sido em parte condenatória e em parte absolutória, ela interrompeu o prazo prescricional de ambos os crimes julgados. Outrossim, o acórdão, em que pese ter confirmado a condenação perpetrada pelo Juiz singular, também condenou o agente - que, até então, tinha sido absolvido - pelo outro crime, de sorte que interrompeu, novamente, a prescrição de ambos os delitos conexos. Precedente citado do STF: HC 71.983-SP, Segunda Turma, DJ 31/5/1996. RHC 40.177-PR, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 25/8/2015, DJe 1º/9/2015.
DIREITO PENAL. LIVRAMENTO CONDICIONAL NO CRIME DE ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. O condenado por associação para o tráfico (art. 35 da Lei 11.343/2006), caso não seja reincidente específico, deve cumprir 2/3 da pena para fazer jus ao livramento condicional. Isso porque a própria Lei 11.343/2006, no parágrafo único do art. 44, prevê requisito objetivo específico para a concessão do livramento condicional ao delito de associação para o tráfico: "Os crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1º, e 34 a 37 desta Lei são inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória, vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos. Parágrafo único. Nos crimes previstos no caput deste artigo, dar-se-á o livramento condicional após o cumprimento de dois terços da pena, vedada sua concessão ao reincidente específico". Assim, em observância ao Princípio da Especialidade, aplica-se o disposto no art. 44, parágrafo único, da Lei 11.343/2006 em detrimento dos incisos I e II do art. 83 do CP. Ressalte-se que o lapso temporal de cumprimento de pena para obtenção do livramento condicional quanto ao delito do art. 35 da Lei 11.343/2006 independe da análise do caráter hediondo do crime. Precedentes citados: AgRg no REsp 1.484.138-MS, Sexta Turma, DJe de 15/6/2015; e HC 292.882-RJ, Sexta Turma, DJe de 18/8/2014. HC 311.656-RJ, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 25/8/2015, DJe 2/9/2015.
SEXTA TURMA
DIREITO PENAL. IMPORTAÇÃO E TRANSPORTE ILEGAIS DE AGROTÓXICO. A conduta consistente em transportar, no território nacional, em desacordo com as exigências estabelecidas na legislação pertinente, agrotóxicos importados por terceiro de forma clandestina não se adequa ao tipo de importação ilegal de substância tóxica (art. 56 da Lei 9.605/1998) caso o agente não tenha ajustado ou posteriormente aderido à importação ilegal antes da entrada do produto no país, ainda que o autor saiba da procedência estrangeira e ilegal do produto, subsumindo-se ao tipo de transporte ilegal de agrotóxicos (art. 15 da Lei 7.802/1989). De fato, o art. 56 da Lei 9.605/1998 dispõe: "Produzir, processar, embalar, importar, exportar, comercializar, fornecer, transportar, armazenar, guardar, ter em depósito ou usar produto ou substância tóxica, perigosa ou nociva à saúde humana ou ao meio ambiente, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou nos seus regulamentos: Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa". Por sua vez, o art. 15 da Lei 7.802/1989 (Lei dos Agrotóxicos) prescreve: "Aquele que produzir, comercializar, transportar, aplicar, prestar serviço, der destinação a resíduos e embalagens vazias de agrotóxicos, seus componentes e afins, em descumprimento as exigências estabelecidas na legislação pertinente estará sujeito à pena de reclusão, de dois a quatro anos, além de multa". Ocorre que, não havendo elementos no sentido de que o agente, tendo recebido os produtos dentro do Brasil, sabendo da procedência estrangeira, tenha previamente ajustado ou posteriormente aderido à importação ilegal antes da consumação do crime, que, sendo formal instantâneo, ocorre com a simples entrada do produto no país, não se pode falar em participação na importação de substância tóxica (art. 56 da Lei 9.605/1998), mas tão somente em delito autônomo de transporte de agrotóxico (art. 15 da Lei 7.802/1989). Isso porque a participação na modalidade de coautoria sucessiva, em que o partícipe resolve aderir à conduta delituosa após o início da sua execução, exige, além do liame subjetivo comum a todo concurso de agentes, que a adesão do partícipe ocorra antes da consumação do delito, caso contrário restará configurado delito autônomo. Vale lembrar ilustrativamente que, assim como o receptador não responde por participação em contrabando pelo simples fato de conhecer a procedência estrangeira da mercadoria que recebe, o réu, no presente caso, também não responde pela importação do produto tóxico que transporta ilegalmente dentro do território nacional apenas por "achar que estaria levando mercadoria estrangeira". REsp 1.449.266-PR, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 6/8/2015, DJe 26/8/2015.
DIREITO PENAL. COMPENSAÇÃO ENTRE A ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA E A AGRAVANTE DE VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER. Compensa-se a atenuante da confissão espontânea (art. 65, III, "d", do CP) com a agravante de ter sido o crime praticado com violência contra a mulher (art. 61, II, "f", do CP). O STJ tem firme entendimento de que a atenuante da confissão espontânea, por envolver a personalidade do agente, deve ser utilizada como circunstância preponderante quando do concurso entre agravantes e atenuantes, nos termos consignados pelo art. 67 do CP. Nessa linha intelectiva, o STJ, por ocasião do julgamento do REsp 1.341.370-MT, Terceira Seção, DJe 17/4/2013, submetido ao rito do art. 543-C do CPC, pacificou a compreensão de que a agravante da reincidência e a atenuante da confissão espontânea, por serem igualmente preponderantes, devem ser compensadas entre si. Nessa senda, o referido entendimento deve ser estendido, por interpretação analógica, à hipótese em análise, dada sua similitude, por também versar sobre a possibilidade de compensação entre circunstâncias preponderantes. AgRg no AREsp 689.064-RJ, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 6/8/2015, DJe 26/8/2015.
DIREITO PENAL. CRIME DE COAÇÃO NO CURSO DE PROCEDIMENTO INVESTIGATÓRIO CRIMINAL (PIC). O crime de coação no curso do processo (art. 344 do CP) pode ser praticado no decorrer de Procedimento Investigatório Criminal instaurado no âmbito do Ministério Público. Isso porque, além de o PIC servir para os mesmos fins e efeitos do inquérito policial, o STJ já reconheceu que, mesmo as ameaças proferidas antes da formalização do inquérito caracterizam o crime de coação no curso do processo, desde que realizadas com o intuito de influenciar o resultado de eventual investigação criminal (HC 152.526-MG, Quinta Turma, DJe 19/12/2011). HC 315.743-ES, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 6/8/2015, DJe 26/8/2015.
RECURSOS REPETITIVOS - AFETAÇÃO
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. TEMA 904. Recurso Especial afetado à Primeira Seção como representativo da seguinte controvérsia: "possibilidade de inclusão do décimo-terceiro salário na base de cálculo do valor do benefício previdenciário até a vigência da Lei n. 8.870/94". REsp 1.546.680-RS, Rel. Min. Og Fernandes, DJe 3/9/2015.
RECURSOS REPETITIVOS - AFETAÇÃO
DIREITO DO CONSUMIDOR. TEMA 937. Recurso Especial afetado à Segunda Seção como representativo da seguinte controvérsia: "critérios para arbitramento de indenização por danos morais na hipótese de inclusão indevida em cadastro de inadimplentes". REsp 1.446.213-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, DJe 3/9/2015.
DIREITO CONSUMIDOR. TEMA 938. Recurso Especial afetado à Segunda Seção como representativo das seguintes controvérsias: - "prescrição da pretensão de restituição das parcelas pagas a título de comissão de corretagem e de assessoria imobiliária, sob o fundamento da abusividade da transferência desses encargos ao consumidor"; - "validade da cláusula contratual que transfere ao consumidor a obrigação de pagar comissão de corretagem e taxa de assessoria técnico-imobiliária (SATI)". REsp 1.551.956-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, DJe 8/9/2015.
DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. TEMA 939. Recurso Especial afetado à Segunda Seção como representativo da seguinte controvérsia: "legitimidade passiva da incorporadora (promitente vendedora) para responder pela restituição da comissão de corretagem e da taxa de serviço de assessoria técnico-imobiliária (SATI), sob o fundamento da abusividade da transferência desses encargos ao consumidor". REsp 1.551.956-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, DJe 8/9/2015.
DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. TEMA 940. Recurso Especial afetado à Segunda Seção como representativo da seguinte controvérsia: "possibilidade de o juiz ou o Tribunal reconhecer de ofício a abusividade de cláusulas contratuais". REsp 1.465.832-RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, DJe 15/9/2015.