Resolução CNJ 622 de 30 de Maio de 2025
Estabelece diretrizes e procedimentos para a transferência interestadual de adolescentes e jovens em cumprimento de medida socioeducativa de internação ou semiliberdade, no âmbito do Poder Judiciário.
Publicado por Conselho Nacional de Justiça
Identificação
Resolução Nº 622 de 30/05/2025
Apelido
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Temas
Execução Penal e Sistema Carcerário; Infância/Juventude;
Ementa
Estabelece diretrizes e procedimentos para a transferência interestadual de adolescentes e jovens em cumprimento de medida socioeducativa de internação ou semiliberdade, no âmbito do Poder Judiciário.
Situação
Vigente
Situação STF
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Origem
Presidência
Fonte
DJE/CNJ n. 118/2025, de 3 de junho de 2025, p. 2-5.
Alteração
Legislação Correlata
Decreto n. 99.710, de 21 de novembro de 1990 - Convenção sobre os Direitos das Crianças Regras da Organização das Nações Unidas para a Administração da Justiça Juvenil Princípios de Riade Regras de Havana Lei n. 12.594, de 18 de janeiro de 2012 HC n. 143.988 - STF Resolução n. 165, de 16 de novembro de 2012 Resolução n. 214, de 15 de dezembro de 2015 Resolução Conanda n. 119, de 11 de dezembro de 2006 Resolução Conanda n. 249, de 10 de julho de 2024 Resolução CONAD n. 10, de 19 de julho de 2024 Resolução CONAD n. 3, de 24 de julho de 2020 Resolução n. 367, de 19 de janeiro de 2021 Resolução n. 350, de 27 de outubro de 2020 Súmula Vinculante n. 11 - STF Lei n. 12.847, de 2 de agosto de 2013 Decreto n. 40, de 15 de fevereiro de 1991 - Convenção Contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes de 1989
Observação / CUMPRDEC / CONSULTA
SEI n. 00139/2025
Texto
O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ), no uso de suas atribuições legais e regimentais; CONSIDERANDO que a Constituição Federal estabelece a prioridade absoluta da garantia dos direitos da criança e do adolescente e o princípio da convivência familiar e comunitária (art. 227), bem como a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III) e a não submissão à tortura ou tratamento desumano e degradante (art. 5º, III); CONSIDERANDO a Convenção Internacional sobre os Direitos das Crianças, de 20 de novembro de 1989, que dispõe que todas as crianças privadas de sua liberdade sejam tratadas com a humanidade e com o respeito que merece a dignidade inerente à pessoa humana, e levando em consideração as necessidades de uma pessoa de sua idade (art. 37); CONSIDERANDO as Regras da Organização das Nações Unidas para Administração da Justiça Juvenil (Regras de Beijing), de 29 de novembro de 1985; CONSIDERANDO os princípios Orientadores da Organização das Nações Unidas para Prevenção da Delinquência Juvenil (Princípios de Riad), de 1990; CONSIDERANDO as Regras Mínimas da Organização das Nações Unidas para Proteção de Jovens Privados de Liberdade (Regras de Havana), de 14 de dezembro de 1990; CONSIDERANDO o disposto no Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), Lei nº 12.594/2012, segundo o qual a execução das medidas socioeducativas reger-se-á, dentre outros, pelos princípios da brevidade e do fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários (art. 35, V e IX); CONSIDERANDO a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal no Habeas Corpus nº 143.988, em 25 de agosto de 2020, que determinou que as unidades de execução de medida socioeducativa não ultrapassem a capacidade projetada e estabeleceu a adoção do princípio numerus clausus como estratégia de gestão para estas unidades, com a liberação de nova vaga na hipótese de ingresso de adolescente; CONSIDERANDO os procedimentos para melhoria do atendimento socioeducativo dispostos na Resolução CNJ nº 165/2012, que dispõe que nenhum adolescente poderá ingressar ou permanecer em unidade de internação ou semiliberdade sem ordem escrita da autoridade judiciária competente (art. 4º); CONSIDERANDO as disposições da Resolução CNJ nº 214/2015, que dispõe sobre a organização e o funcionamento os Grupos de Monitoramento e Fiscalização (GMF), incumbindo-os de fiscalizar e monitorar as condições de cumprimento de medidas de internação por adolescentes em conflito com a lei; CONSIDERANDO a Resolução Conanda nº 119/2006, que dispõe sobre o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo e dá outras providências; CONSIDERANDO a Resolução Conanda nº 249/2024, que proíbe, em todo território nacional, “o acolhimento, atendimento, tratamento e acompanhamento de crianças e adolescentes em comunidades terapêuticas ou em instituições que prestam serviços de atenção a pessoas com transtornos decorrentes do uso, abuso, ou dependência de substâncias psicoativas (SPA), em regime de residência, e que utilizam como principal instrumento terapêutico a convivência entre os pares.(comunidades terapêuticas)”, bem como a Resolução CONAD nº 10/2024, que suspende a eficácia da Resolução CONAD nº 3/2020, que regulamentava o acolhimento de adolescentes em comunidades terapêuticas; e dá outras providências; CONSIDERANDO a deliberação do Plenário do CNJ no Ato Normativo nº 0001691-05.2025.2.00.0000, na 6ª Sessão Virtual, finalizada em 16 de maio de 2025; RESOLVE Art. 1º Estabelecer diretrizes e procedimentos a serem observados pelo Poder Judiciário e seus serviços auxiliares para a transferência interestadual de adolescentes e jovens em cumprimento de medida socioeducativa de internação ou de semiliberdade. Parágrafo único. A transferência de adolescentes e jovens entre unidades socioeducativas situadas no mesmo estado da federação é regulada pela Resolução CNJ nº 367/2021, aplicando-se, no que couber, os dispositivos da presente Resolução. Art. 2º São princípios aplicáveis às transferências de que trata a presente Resolução: I –a prioridade absoluta e a proteção integral; II – o respeito à dignidade humana, à singularidade e à autonomia progressiva de cada adolescente e jovem; III – o respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento; IV – a vedação de que seja conferido a adolescente e jovem tratamento mais gravoso do que o conferido à pessoa adulta; V – a convivência familiar e comunitária; VI – a garantia a assistência jurídica, a ampla defesa, ao contraditório e ao devido processo legal; VII – a excepcionalidade e a brevidade das medidas socioeducativas privativas de liberdade; e VIII – a atualidade e temporalidade da medida socioeducativa. Art. 3º São diretrizes aplicáveis à transferência interestadual de que trata a presente Resolução: I – a garantia da convivência familiar e comunitária, em ambiente que assegure o desenvolvimento integral de adolescentes e jovens; II – a competência do juízo natural para a execução da medida socioeducativa; III – o respeito ao Plano Individual de Atendimento (PIA), enquanto instrumento de previsão, registro e gestão das atividades a serem desenvolvidas com a pessoa adolescente ou jovem; IV – a articulação interinstitucional e a cooperação entre os órgãos do Poder Judiciário, nos termos da Resolução CNJ nº 350/2020; V – as normas gerais da Central de Vagas no Sistema Estadual de Atendimento Socioeducativo, em consonância com a Resolução CNJ nº 367/2021; VI – o transporte de adolescentes e jovens de forma a respeitar sua integridade física e moral; VII – o deslocamento em condições dignas e não degradantes, nos termos das Regras de Havana; VIII – a proibição do uso de algemas, salvo em condições excepcionais, nos termos da Súmula Vinculante 11, do Supremo Tribunal Federal; IX – a primazia do tratamento de saúde em liberdade; X – a vedação à internação de adolescentes em comunidades terapêuticas; e XI – a prevenção a tortura ou tratamento cruel, desumano e degradante, nos termos do Sistema Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, instituído pela Lei nº 12.847/2013, e da Convenção Contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes de 1989. Art. 4º A transferência interestadual, desde que fundamentada no Plano Individual de Atendimento (PIA), será autorizada para garantir o direito à convivência familiar e comunitária. § 1º Excepcionalmente, a transferência interestadual poderá ser autorizada para a garantia do exercício de outros direitos, desde que devidamente fundamentada e quando não for possível a extinção, substituição por medida menos gravosa ou suspensão da medida socioeducativa privativa de liberdade. § 2º A decisão judicial considerará que a transferência interestadual não pode ser utilizada como sanção administrativa por falta disciplinar. Art. 5º A transferência interestadual, de competência exclusiva do juízo competente para a execução da medida socioeducativa, poderá ser determinada após requerimento formulado: I – por adolescente, jovem ou seus familiares; II – pela defesa constituída; III – pelo Ministério Público; e IV – pela equipe de acompanhamento da execução da medida socioeducativa. Parágrafo único. O direito de petição da pessoa adolescente ou jovem será assegurado de maneira efetiva, cabendo aos tribunais receber e processar os requerimentos de transferência, observados os direitos de acesso à justiça e à assistência judiciária gratuita, bem como a instrumentalidade das formas. Art. 6º Recebido o pedido de transferência interestadual, o juízo designará audiência com a presença da pessoa adolescente ou jovem, da família ou responsável, da defesa constituída e de membro do Ministério Público. § 1º Antes de decidir sobre o pedido, o juízo avaliará a possibilidade de extinção, substituição da medida de internação ou semiliberdade por medida em meio aberto ou suspensão da medida socioeducativa. § 2º Deferido o pedido de transferência, a decisão será comunicada ao juízo da execução do estado de destino, que solicitará vaga à respectiva Central de Vagas no Sistema Estadual de Atendimento Socioeducativo; §3º A transferência somente poderá ser negada pelo juízo da execução do estado de destino por ausência de vaga na unidade mais próxima a residência do socioeducando, caso em que a pessoa adolescente ou jovem será colocada em fila de espera. Art. 7º As transferências serão realizadas de forma a respeitar a dignidade e integridade física e moral das pessoas adolescentes e jovens, observando, especialmente: I – a garantia do acompanhamento por familiares ou responsáveis no deslocamento; II – a adequabilidade das condições de iluminação, ventilação, conforto térmico e segurança no transporte, conforme as normas do Código de Trânsito Brasileiro e as Regras de Havana, incluídos a adequação dos assentos e cintos de segurança; III – a vedação do transporte em compartimento fechado; IV – a disponibilidade de alimentação e água potável e a realização de parada para refeição e uso de banheiro, considerada a necessidade da pessoa transportada; V – a garantia de cuidados especiais a adolescente ou jovem gestante, com deficiência, em enfermidade ou que necessite de tratamento médico; VI – a preservação do anonimato e do sigilo das pessoas transportadas, vedada a exposição pública e a utilização de veículo que indique a condição de adolescente ou jovem em cumprimento de medida socioeducativa; e VII – a proibição do uso de algemas, salvo em condições excepcionais e devidamente justificado, nos termos da Súmula Vinculante 11, do Supremo Tribunal Federal. § 1º Será efetuado o registro da data, da hora de saída da unidade de origem e da hora de chegada na unidade de destino. § 2º Haverá a realização de exame de corpo de delito na saída da pessoa adolescente ou jovem da unidade socioeducativa de origem e antes do ingresso na unidade de destino, como forma de prevenir a tortura ou tratamento cruel, desumano e degradante. § 3º Compete aos GMFs o monitoramento das transferências, devendo ser comunicados sobre as movimentações para o devido acompanhamento. § 4º O transporte de adolescentes ou jovens em condições que lhes causem sofrimentos físicos ou morais poderá ensejar responsabilização administrativa, civil e criminal. Art. 8º Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação. Ministro Luís Roberto Barroso