Jurisprudência STM 7000854-76.2023.7.00.0000 de 09 de setembro de 2024
Publicado por Superior Tribunal Militar
Relator(a)
ARTUR VIDIGAL DE OLIVEIRA
Revisor(a)
LOURIVAL CARVALHO SILVA
Classe Processual
APELAÇÃO CRIMINAL
Data de Autuação
23/10/2023
Data de Julgamento
15/08/2024
Assuntos
1) DIREITO PENAL MILITAR,CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO,ESTELIONATO E OUTRAS FRAUDES,ART. 251, CPM - ESTELIONATO. 2) DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO TRABALHO,PROCESSO E PROCEDIMENTO,PROVAS,DEPOIMENTO.
Ementa
APELAÇÃO. ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO. RECURSO MINISTERIAL. CASAMENTO NULO DE NORA COM SOGRO. SIMULAÇÃO. FRAUDE COMPROVADA. AUSÊNCIA DE CONVIVÊNCIA CONJUGAL. INDUZIMENTO DA ADMINISTRAÇÃO MILITAR EM ERRO. COMPROVAÇÃO DO DOLO. PROVIMENTO DO APELO. COMUNICAÇÃO E ENVIO DE CÓPIA DOS AUTOS AO PROCURADOR-GERAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. NOTIFICAÇÃO DA ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO. DECISÃO POR MAIORIA. I - Os autos evidenciam, de forma incontestável, os elementos essenciais reveladores do intento criminoso da Apelada, em razão da nulidade do casamento entre nora e sogro, instituidor da pensão, que, em comunhão de desígnios, decidiram simular um matrimônio com o inequívoco intuito de fraudar a Administração Militar. II - Cumpre destacar que os impedimentos matrimoniais do art. 1.521 do Código Civil são hipóteses previstas em lei, quando configuradas, impossibilitam que determinadas pessoas contraiam matrimônio entre si. Trata-se de regras de ordem pública, ou seja, possuem natureza de proibição absoluta, não negocial. IV - A vedação de matrimônio entre afins em linha reta decorre do parentesco firmado por casamento anterior. Assim, não é possível se casar com “ex-sogro” ou “ex-sogra”. A regra se assemelha à de proibição de casamento entre pais e filhos, sendo os sogros considerados pais por afinidade. V – Permanece a afinidade entre sogro e nora. Assim, inexiste “ex-sogro” ou “ex-sogra”, expressões comuns em conversas informais, consoante art. 1.595, § 2º, do Código Civil. VI - A proibição do casamento entre nora e sogro, assim como outras relações de afinidade em linha reta, é fundamentada em uma combinação de razões jurídicas, socioculturais, éticas e psicossociais. VII - Ao se tratar de casamento simulado entre parentes afins, no caso concreto, observa-se que o ato jurídico se operou exclusivamente para a fraude previdenciária. As núpcias foram contraídas apenas como aparência, sem que jamais fosse estabelecida a real comunhão matrimonial entre os envolvidos. VIII - Existe uma simulação dolosa, realizada por meio de fraude delitiva, o que acarreta a nulidade e a ineficácia do ato jurídico civil, no caso, o casamento. Embora reconhecido em cartório, em desobediência ao art. 1.521, inciso II, do Código Civil, não há qualquer prejudicialidade em relação à validade ou não da união civil da Apelada, para que lhe seja imputada a prática do delito de estelionato, em homenagem a independência de instâncias jurídicas, seja civil, administrativa ou penal. IX - Entre os deveres na relação conjugal, encontra-se a distribuição equitativa de responsabilidades no cuidado dos filhos. Contudo, no caso, como poderia existir uma relação equilibrada no cuidado com a prole, diante da possibilidade de confusão entre o papel de avô e de suposto padrasto. Outro dever conjugal descumprido pela Apelada e o militar foi a vida em comum no mesmo domicílio. Constata-se que ambos possuíam residências distintas. X – As provas documentais, como a Certidão de Óbito e os registros médicos, são precisas e concordantes com os testemunhos acusatórios, o que permite a formação de um juízo seguro de elementos probantes, de modo a comprovar a ocorrência de fraude no negócio jurídico do casamento. Todo o quadro probatório evidencia que houve simulação no matrimônio em análise, pois o único efeito almejado pelos nubentes foi o da percepção de pensão por morte. XI - Por ser uma questão de interesse público, faz-se necessária a atuação do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul (MPRS), o qual apresentará, na justiça comum, caso entenda pela possibilidade, uma Ação Declaratória de Nulidade Absoluta de Casamento. XII - Provimento do Apelo ministerial para reformar a sentença absolutória e condenar a Apelada como incursa no tipo descrito no art. 251, caput, do CPM. Decisão por maioria.