Jurisprudência STM 7000700-24.2024.7.00.0000 de 13 de junho de 2025
Publicado por Superior Tribunal Militar
Relator(a)
PÉRICLES AURÉLIO LIMA DE QUEIROZ
Classe Processual
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO
Data de Autuação
12/11/2024
Data de Julgamento
27/05/2025
Assuntos
1) DIREITO PENAL MILITAR,CRIMES CONTRA A PESSOA,CRIMES SEXUAIS,ART. 232, CPM - ESTUPRO. 2) DIREITO PROCESSUAL PENAL MILITAR,JURISDIÇÃO E COMPETÊNCIA,COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA MILITAR DA UNIÃO.
Ementa
DIREITO PROCESSUAL PENAL MILITAR. DIREITO PENAL MILITAR. RECURSO INOMINADO. ART. 145 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL MILITAR (CPPM). COMPETÊNCIA. CRIME DE ESTUPRO. OCORRÊNCIA EM PRÓPRIO NACIONAL RESIDENCIAL (PNR). LOCAL CONSIDERADO CASA. GARANTIA DA INVIOLABILIDADE DOMICILIAR. ART. 5º, INCISO XI, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DE 1988 (CR/88). PRÁTICA POR MILITAR DA ATIVA CONTRA CIVIL. ART. 9º, INCISO II, DO CÓDIGO PENAL MILITAR (CPM). HIPÓTESE CONCRETA. DESCONFIGURAÇÃO DO CARÁTER RESIDENCIAL. USO PARA FINS SEXUAIS ILÍCITOS. MOMENTO DO FATO. EQUIPARAÇÃO A PROSTÍBULO. FINALIDADE PROSCRITA. RETOMADA MOMENTÂNEA DO LOCAL À ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA PROPRIETÁRIA. SUBMISSÃO À ADMINISTRAÇÃO MILITAR. DELITO PRATICADO, PORTANTO, EM LOCAL SUJEITO À ADMINISTRAÇÃO MILITAR (ART. 9º, INCISO II, ALÍNEA “B”, DO CPM). ENQUADRAMENTO NO ART. 232, CAPUT, DO CPM. REDAÇÃO ANTERIOR À LEI 14.688/2023. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. UNANIMIDADE. 1. Cuida-se de Recurso Inominado interposto contra Decisão que reconheceu a competência da Justiça Militar da União para conhecer e julgar caso envolvendo crime de estupro dentro de imóvel PNR, praticado por militar da ativa contra civil. 2. Recorrente alegou não haver enquadramento do caso nas hipóteses do art. 9º, inciso II, do CPM, em especial porque o local (área interna da residência considerada PNR) estaria abarcado pela proteção constitucional da inviolabilidade domiciliar (art. 5º, inciso XI, da CR/88) e, por isso, não poderia ser considerado “área sujeita à administração militar” (art. 9º, inciso II, alínea “b”, do CPM). 3. Esta Corte já manifestou que os PNRs, em suas áreas internas, “são destinados à moradia dos militares e [...] merecem a garantia da inviolabilidade domiciliar consubstanciada no art. 5º, inciso XI, da Constituição Federal” (STM, RSE 7000816-06.2019.7.00.0000. Rel. Min. Péricles Aurélio Lima de Queiroz. Julgado em 16.12.2019. Publicado em 10.2.2020), razão pela qual não se enquadram como local sujeito à Administração Militar quando ocupados legalmente. 4. Hipótese dos autos que aponta a perda da licitude da ocupação, uma vez que, antes da prática do delito, o imóvel recebeu destinação diversa daquela prevista no conceito de residência. 5. Demonstrada a prática de atos sexuais desviantes (ménage à trois e à quatre, dentre outros) pela Vítima e o Investigado em conjunto com outros dois indivíduos, o que acarreta a perda da qualidade do local como casa e o aproxima mais de um prostíbulo, o que fere o ideal de bons costumes e tem finalidade proscrita, conforme art. 229 do Código Penal. 6. Confirma essa leitura a Portaria Normativa 43, do Gabinete do Ministro da Defesa (GM-MD), de 29.4.2020, enquanto normativa regulamentadora da permissão de uso de PNR gerido pelo MD, ao passo que nela se prevê a possibilidade de extinção da permissão quando houver uso do local que seja contrário “aos bons costumes” (art. 21, inciso XI, da Portaria). 7. Configurada a destinação indevida do imóvel, a qual retira a sua qualidade de residência e a proteção constitucional apontada, ainda que de forma transitória, o recinto interno do PNR volta ao seu status jurídico original de bem pertencente e sob gestão da Administração Pública, mais especificamente do órgão público militar ao qual está atrelado. 8. Nesse cenário, a parte interna do PNR, antes e durante a prática do delito, reenquadrou-se como área sujeita à Administração Militar, em razão da perda momentânea da condição de espaço fechado equivalente à casa e, portanto, protegido pela inviolabilidade. 9. Suposto delito de estupro que se torna crime militar na forma do art. 9º, inciso II, alínea “b”, do CPM, a se enquadrar na hipótese do art. 232, caput, do CPM, na redação original do Códex, anterior à alteração trazida pela Lei 14.688/2023, uma vez que os fatos ocorreram antes dessa norma e a modificação legal tornou a punição mais severa, razão pela qual não pode retroagir. 10. Recurso conhecido e desprovido. Decisão unânime.