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Jurisprudência STM 7000481-16.2021.7.00.0000 de 27 de setembro de 2022

Publicado por Superior Tribunal Militar


Relator(a)

ARTUR VIDIGAL DE OLIVEIRA

Revisor(a)

CARLOS VUYK DE AQUINO

Classe Processual

APELAÇÃO CRIMINAL

Data de Autuação

07/07/2021

Data de Julgamento

01/09/2022

Assuntos

1) DIREITO PENAL MILITAR,CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO MILITAR,CRIMES CONTRA O DEVER FUNCIONAL,VIOLAÇÃO DO DEVER FUNCIONAL COM O FIM DE LUCRO. 2) DIREITO PENAL MILITAR,CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO MILITAR,FALSIDADE,FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO. 3) DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO TRABALHO,PROCESSO E PROCEDIMENTO,PROVAS,DEPOIMENTO. 4) DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO TRABALHO,ATOS PROCESSUAIS,NULIDADE. 5) DIREITO PROCESSUAL PENAL,DENÚNCIA/QUEIXA,DESCLASSIFICAÇÃO. 6) DIREITO PROCESSUAL PENAL,EXECUÇÃO PENAL,PENAS DO CÓDIGO PENAL MILITAR.

Ementa

APELAÇÃO. DEFESA CONSTITUÍDA. FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO E VIOLAÇÃO DO DEVER FUNCIONAL COM O FIM DE LUCRO. ARTS. 311 E 320 DO CÓDIGO PENAL MILITAR. CONDENAÇÃO EM PRIMEIRA INSTÂNCIA. PRELIMINAR DE NULIDADE PELA EXISTÊNCIA DE INDÍCIOS DE PROVA ILÍCITA PRODUZIDA NA FASE INQUISITORIAL. REJEIÇÃO. UNANIMIDADE. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA POR INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. REJEIÇÃO. UNANIMIDADE. MÉRITO. FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO. ART. 311 DO CÓDIGO PENAL MILITAR. INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. DÚVIDAS QUANTO À AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVAS. PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO REO. NÃO ACOLHIMENTO. DESCLASSIFICAÇÃO PARA O DELITO DE FALSIDADE IDEOLÓGICA. ART. 312 DO CÓDIGO PENAL MILITAR. IMPOSSIBILIDADE. VIOLAÇÃO DO DEVER FUNCIONAL COM O FIM DE LUCRO. ART. 320 DO CÓDIGO PENAL MILITAR. ATIPICIDADE DA CONDUTA. NÃO ACOLHIMENTO. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. BENS JURÍDICOS DIVERSOS. NÃO INCIDÊNCIA. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE PELAS RESTRITIVAS DE DIREITO. PEDIDO PREJUDICADO. CONVERSÃO DA PENA EM PRISÃO. INCOMPATIBILIDADE. PENA SUPERIOR A 2 (DOIS) ANOS. ART. 59 DO CÓDIGO PENAL MILITAR. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO. UNANIMIDADE. PENA ACESSÓRIA DE EXCLUSÃO DAS FORÇAS ARMADAS. ART. 102 DO CÓDIGO PENAL MILITAR. APLICABILIDADE. REFORMATIO IN PEJUS. NÃO OCORRÊNCIA. MAIORIA. O Comandante da Unidade é a Autoridade competente para o exercício da Polícia Judiciária Militar, nos termos do art. 7º do Código de Processo Penal Militar. Portanto, o fato de a referida Autoridade ter sido ouvida na fase inquisitorial como testemunha, frise-se, não de acusação como insinua a Defesa, em absoluto configura a hipótese de impedimento, cujo escopo está delineado no art. 37 do referido Códex processual e que diz respeito, exclusivamente, ao Julgador, por motivos óbvios, na forma das alíneas “a” e “b” do referido dispositivo. Vale dizer que o impedimento caberia se e somente se o Comandante da Unidade fosse testemunha em Juízo e convocado para exercer a função de Juiz Militar no Conselho de Justiça. A propósito de a Encarregada das diligências complementares ter sido ouvida como testemunha na fase inquisitorial, esse fato, por si só, em absoluto contamina as diligências por ela procedidas e, ainda que assim fosse considerado, de igual modo, não teriam o condão de macular a ação penal militar, conforme a reiterada jurisprudência dos Pretórios. Preliminar de nulidade rejeitada. Decisão por unanimidade. Segundo a doutrina recorrente, o ônus da prova é sempre da acusação; eventualmente, se o réu alegar um fato relevante, como um álibi, cabe a ele demonstrar. Mas isto não significa, em hipótese alguma, inversão do ônus da prova. A Sentença de primeiro grau fundamentou a condenação nas provas produzidas no processo, de sorte que, para se contrapor a essas evidências, caberia sim à Parte Ré a demonstração de que tais elementos não seriam aptos à imposição de um Decreto condenatório. Preliminar de nulidade rejeitada. Decisão por unanimidade. Mérito 1. Falsificação de documento – na figura típica descrita no art. 311 do Código Penal Militar, falsificar significa criar, fabricar um documento que se passe por verdadeiro, ou então “alterar”, ou seja, modificar um documento verdadeiro, transformando relevantemente, assim, a informação nele constante. Esse delito tem por objeto jurídico a Administração Militar. Trata-se de crime formal que independe de demonstração de lesividade, sendo admitida a falsificação parcial, na qual se altera um documento verdadeiro, introduzindo-lhe partes não autênticas. A autoria e a materialidade do delito foram suficientemente comprovadas pelos Laudos de Perícia Grafotécnica, elaborados por peritos oficiais da Polícia Federal, a partir dos documentos de referência fornecidos pela Marinha do Brasil, os quais atestaram a falsificação da assinatura em 21 (vinte e um) Títulos de Inscrição de Embarcação Miúda. A despeito de a Defesa ter sustentado em seu arrazoado que a prova pericial produzida na fase inquisitorial seria ineficaz, sob o argumento segundo o qual não foi ratificada no âmbito processual, em sendo elaborados os Laudos Periciais por peritos devidamente habilitados da Polícia Federal, ainda que produzidas na fase pré-processual, se consubstanciadas na conformidade do art. 315 do Código de Processo Penal Militar dispensam a renovação em juízo, constituindo meio de prova suficiente para fundamentar eventual decreto condenatório. A melhor adequação típica para a conduta narrada e comprovada nos autos não é outra que não a do falso material, na medida em que, para a configuração do delito de falsidade ideológica, seria necessária a alteração de verdade juridicamente relevante e não somente a assinatura aposta no documento emitido pela Marinha do Brasil, não cabendo, portanto, a pretendida desclassificação para o delito do art. 312 do Código Penal Militar. 2. Violação do dever funcional com o fim de lucro – na figura típica descrita no art. 320 do Código Penal Militar, violar significa transgredir, sendo que o objeto da transgressão é o dever funcional (obrigação inerente ao cargo ou função pública). O objetivo do agente é a obtenção de qualquer espécie de vantagem, para si ou para outrem. O cenário da execução do delito é o negócio da administração militar. Os autos demonstram que o Acusado ofertou serviços de despachante e facilidades a civis proprietários de embarcações, bem como recebeu valores indevidos para agilizar os procedimentos de cadastramento e de transferências desses meios de transporte no âmbito da Capitania Fluvial do Araguaia-Tocantins. O delito em testilha, consoante a reiterada jurisprudência desta Corte Castrense, é de natureza formal, de sorte que, para haver consumação, basta a violação com o fim de obter especulativamente vantagem pessoal, ou seja, não há necessidade de que o agente obtenha o ganho desejado, de modo que a simples atitude de agilizar o andamento dos processos administrativos com vistas à sua indicação para possíveis clientes no âmbito do CFAT é suficiente para a sua consumação. Consoante a doutrina recorrente, o critério da consunção pode ser adotado em 2 (duas) situações, quais sejam, quando um crime é meio necessário ou normal fase de preparação ou de execução de outro crime e nos casos de antefato e pós-fato impuníveis. Vale dizer que, na prática de 2 (dois) crimes, para que um deles seja absorvido pelo outro, condenando-se o agente somente pela pena cominada ao delito principal, faz-se necessária a existência de conexão entre ambos, ou seja, que um deles tenha sido praticado apenas como meio ou preparatório para a prática de outro, o que não se evidencia no caso em exame, bastando, para tanto, verificar que as falsificações documentais foram efetuadas pelo Réu em momentos absolutamente distintos e completamente dissociados dos da violação de seu dever funcional, não integrando, portanto, o mesmo iter criminis. Afinal, embora os crimes cometidos pelo Réu tutelem a Administração Militar, o delito de falsificação de documento encontra-se topograficamente inserido no Capítulo V (Da Falsidade), enquanto o crime de violação do dever funcional pertence ao Capítulo VI (Dos Crimes contra o Dever Funcional). Além disso, há diversidade de momentos consumativos e de sujeitos passivos, conforme demonstrado nos autos, circunstâncias que confluem pela inaplicabilidade do Princípio da Consunção. Considerando que o pedido de desclassificação da conduta perpetrada pelo Réu para o delito de falso ideal não foi acolhido, em tese, restaria prejudicado o pleito subjacente de conversão da pena em restritiva de direitos. Nada obstante, ainda que verificado não ter havido pedido expresso em relação ao delito de falso material, melhor sorte não assiste à Defesa constituída, pois, a toda evidência, segundo a reiterada jurisprudência desta Corte Castrense, não estando prevista na legislação substantiva a obrigação de prestar serviços comunitários, incabível é a sua aplicação. O Conselho Julgador de primeiro grau aplicou a previsão legal contida no art. 59 do Código Penal Militar e converteu a pena aplicada em prisão. Todavia, o texto legal do referido Diploma é claro ao descrever que “(...) A pena de reclusão ou de detenção até 2 (dois) anos, aplicada a militar, é convertida em pena de prisão e cumprida, quando não cabível a suspensão condicional (...)”. Portanto, considerando a condenação operada em primeiro grau, de 5 (cinco) anos, 3 (três) meses e 10 (dez) dias de reclusão, não cabe a citada conversão. Negado provimento ao Apelo defensivo. Decisão por unanimidade. A incidência da previsão legal de exclusão das forças armadas contida no art. 102 do Estatuto Repressivo Castrense, além de não configurar a reformatio in pejus, porquanto não se verificou mudança para pior do quantum da reprimenda principal, em sua essência, constitui pena acessória e, sendo assim, tem aplicação imediata, bastando para tanto que se identifique a condenação da praça a pena privativa de liberdade superior a 2 (dois) anos. Afinal, consoante a jurisprudência da Excelsa Corte, a exclusão do serviço ativo da praça condenada a pena superior a 2 (dois) anos é pena acessória e não efeito da condenação, tornando desnecessária a justificação específica quando a decisão condenatória encontrar-se devidamente fundamentada. Pena acessória de exclusão das forças armadas aplicada ao Apelante. Decisão por maioria.