Jurisprudência STM 7000460-69.2023.7.00.0000 de 11 de outubro de 2024
Publicado por Superior Tribunal Militar
Relator(a)
LEONARDO PUNTEL
Revisor(a)
JOSÉ BARROSO FILHO
Classe Processual
APELAÇÃO CRIMINAL
Data de Autuação
07/06/2023
Data de Julgamento
08/08/2024
Assuntos
1) DIREITO PENAL MILITAR,CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO MILITAR,CONCUSSÃO, EXCESSO DE EXAÇÃO E DESVIO,ART. 305, CPM - CONCUSSÃO. 2) DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO TRABALHO,PROCESSO E PROCEDIMENTO,PROVAS,DEPOIMENTO.
Ementa
RECURSO DE APELAÇÃO. MPM. ART. 305 DO CPM. CONCUSSÃO. EXIGÊNCIA DE VANTAGEM INDEVIDA EM RAZÃO DA FUNÇÃO MILITAR. TROCA DE ESCALAS DE SERVIÇO. MARCAÇÃO DE FÉRIAS. INFLUÊNCIA EM PROMOÇÕES. ABUSO. NECESSIDADE PREMENTE DE CABOS E SOLDADOS. ADEQUAÇÃO TÍPICA. CONSUMAÇÃO. RECEBIMENTO DE VANTAGEM. DISPENSABILIDADE. SUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. PROVA TESTEMUNHAL ROBUSTA. PROVIMENTO DO APELO. REFORMA DA SENTENÇA. DECISÃO UNÂNIME. 1. Considerando que o recurso ministerial é direcionado tão somente contra a absolvição da imputação do crime de concussão (art. 305 do CPM), deve-se considerar operado o trânsito em julgado quanto à absolvição pelas demais imputações, por ausência de insurgência. 2. De acordo com a doutrina, o tipo penal previsto no art. 305 do CPM retrata crime militar impróprio, cuja essência reside no abuso da função exercida, sendo o sujeito passivo a própria Administração Militar, e consiste em exigir vantagem indevida, direta ou indiretamente, em razão da função pública exercida (na atualidade) ou que virá a exercer (futuro próximo), e consuma-se com a simples exigência da vantagem descabida, pouco importando se essa vantagem seja recebida ou mesmo devolvida posteriormente. 3. Depreende-se dos elementos constantes dos autos que o Acusado fez exigências a militares para que, em contrapartida, fossem atendidos em seus pedidos relacionados a troca de escalas de serviços, bem como engajamento. Do contrário, caso não atendido em suas exigências, perseguia as vítimas com imposição de escalas de serviços tidas como mais intensas. 4. As provas constantes dos autos incluem depoimentos testemunhais, alguns favoráveis e outros desfavoráveis ao Acusado. Contudo, a partir dos depoimentos das testemunhas arroladas pelo Ministério Público, é possível concluir com clareza que não se trata apenas de rumores ou de boatos. Os fatos apurados foram comprovados, evidenciando a prática de concussão. 5. Embora as testemunhas arroladas pela Defesa tenham declarado que o Acusado nunca lhes fez exigências, os depoimentos não tiveram o condão de por em dúvida, anular ou lançar por terra as declarações das demais testemunhas, vitimadas pela conduta do Acusado, que, de forma categórica, confirmaram que o Acusado lhes fez cobrança de maços de cigarros e/ou dinheiro. 6. Os depoimentos dos superiores hierárquicos e dos demais militares que trabalharam diretamente com o Acusado, no sentido de ser ele militar de confiança e cumpridor de suas funções, também não enfraquecem os depoimentos das vítimas, uma vez que a conduta era praticada distante da presença dos seus superiores hierárquicos, que, obviamente, desconheciam o comportamento e, ao tomarem conhecimento das irregularidades, procederam, de pronto, a sua substituição da função. 7. A insatisfação de uma parte dos militares vítimas se manifestou de forma muito mais intensa em relação às exigências e barganhas do Acusado para realizar trocas na escala, em vez de se concentrar nas escalas em si. Assim, compreenderam que a intensidade dos serviços impostos por essas escalas, bem como a imposição de tarefas mais árduas, resultaram de retaliação do Acusado por não ter suas demandas atendidas em algumas ocasiões. 8. Independentemente de o Acusado possuir ou não competência para alteração de escala, impor qualquer tipo de sanção disciplinar ou mesmo influir na decisão do Comando de engajamento de militares, o simples fato de exigir qualquer tipo de vantagem em razão de sua função perfaz a elementar do crime do art. 305 do CPM, que é formal e dispensa resultado naturalístico, pois se consuma com a mera exigência de vantagem indevida ligada à função pública. 9. Ao exigir valores pecuniários ou mesmo maços de cigarros para atender aos pedidos de alteração de escalas dos militares, o Acusado incorreu no tipo penal do art. 305 do CPM e sua conduta atentou contra a Administração Militar, especialmente em detrimento do dever militar, da moralidade administrativa, da probidade e da honra. 10. É cediço que não existem regras objetivas ou mesmo critérios matemáticos para a fixação da pena, de modo que o acréscimo à pena mínima decorre da avaliação negativa das circunstâncias judiciais previstas no art. 69 do CPM, segundo o livre convencimento do Juiz, após analisar todo arcabouço fático probatório dos autos, mas sempre em obediência aos critérios de proporcionalidade e da ponderação das circunstâncias do crime. 11. Apelo conhecido e provido. Sentença reformada. Decisão unânime.