Jurisprudência STM 7000295-56.2022.7.00.0000 de 03 de maio de 2023
Publicado por Superior Tribunal Militar
Relator(a)
LEONARDO PUNTEL
Revisor(a)
MARIA ELIZABETH GUIMARÃES TEIXEIRA ROCHA
Classe Processual
APELAÇÃO CRIMINAL
Data de Autuação
28/04/2022
Data de Julgamento
23/03/2023
Assuntos
1) DIREITO PENAL MILITAR,CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO MILITAR,CORRUPÇÃO,CORRUPÇÃO PASSIVA. 2) DIREITO PENAL MILITAR,CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO MILITAR,CORRUPÇÃO,CORRUPÇÃO ATIVA. 3) DIREITO PENAL,FATO ATÍPICO.
Ementa
APELAÇÃO. MPM. ARTS. 308, 309 E 310 DO CPM. CORRUPÇÃO PASSIVA. CORRUPÇÃO ATIVA. PARTICIPAÇÃO ILÍCITA. CONTINUIDADE DELITIVA. OPERAÇÃO CARRO PIPA (OCP). PRELIMINAR EX-OFFÍCIO. NULIDADE. ART. 433 DO CPPM. NÃO OBSERVÂNCIA. REJEIÇÃO. MAIORIA. MÉRITO. CORRUPÇÃO PASSIVA. NÃO CONFIGURAÇÃO. CARÊNCIA DE ELEMENTOS CONCRETOS. COMPROVAÇÃO DA ORIGEM LÍCITA DOS RECURSOS. AUSÊNCIA DE VANTAGEM INDEVIDA. CORRUPÇÃO ATIVA. NÃO CONSTATAÇÃO. NÃO OFERECIMENTO OU PROMESSA DE VANTAGEM INDEVIDA, PRÁTICA OU RETARDAMENTO DE ATO FUNCIONAL. NÃO COMPROVAÇÃO. PARTICIPAÇÃO ILÍCITA. EXIGÊNCIA DE DOLO. COMPROVAÇÃO. MILITAR RÉU CONFESSO. PROVAS CONCRETAS. AUFERIMENTO DE LUCROS. PROIBIÇÃO DE TOMAR PARTE EM CONTRATO COM A ADMINISTRAÇÃO CASTRENSE. PARTICIPAÇÃO EM CONTRATO POR INTERPOSTAS PESSOAS. CADASTRAMENTO DE TERCEIROS NA OCP. CONDENAÇÃO. MAJORAÇÃO DA PENA. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS NEGATIVAS. CONTINUIDADE DELITIVA. ART. 71 DO CP. DUAS INFRAÇÕES. TERCEIRA FASE. AUMENTO DE UM SEXTO NA PENA. EXCLUSÃO DAS FORÇAS ARMADAS. PENA ACESSÓRIA. ART. 98, IV, C/C ART. 108. CPM. VEDAÇÃO AO SURSIS. PENA SUPERIOR A DOIS ANOS. ART. 84 DO CPM. REGIME ABERTO. ART. 33 § 2º, ALÍNEA "C" DO CP. 1 – Consoante entendimento majoritário do STM, a sustentação oral, em princípio, não é ato essencial à Defesa e deve ser analisado sob a perspectiva do caso concreto, a fim de se verificar a eventual ocorrência de prejuízo, em respeito ao princípio do pas de nullité sans grief, de modo que a ausência desse rito não eiva de vícios a Ação Penal Militar caso as partes não tenham manifestado interesse pela sua realização, tratando-se de matéria preclusa, quando não aventada no momento processual oportuno. Preliminar de nulidade por inobservância do art. 433 do CPPM, suscitada de ofício, rejeitada por maioria. 2 - A doutrina leciona que o crime de corrupção passiva exige relação da conduta com a função pública e que, para a sua consumação, exige-se o cumprimento das elementares "receber" vantagem indevida ou "aceitar sua promessa" no exercício da função que exerce na Administração Militar, tendo como elemento subjetivo o dolo, de modo que a vantagem exigida pelo tipo penal é destinada ao próprio agente ou a terceiro. Nesse conspecto, não havendo demonstração cabal de que os valores recebidos tenham sido oriundos de atividades ilícitas, de modo a ter o Acusado se utilizado da função pública para a prática delitiva, faz-se imperiosa a absolvição. Comprovada a licitude dos valores recebidos, por mais que eventualmente possam não ter sido declarados ao fisco em data oportuna, essa situação não transmuta a origem (lícita) dos recursos, o que torna a conduta atípica, não havendo que falar em crimes de corrupção e de lavagem de dinheiro. 3 – Caracterizada a contratação, por militar integrante do Escritório da Operação Carro Pipa, no âmbito do programa de distribuição emergencial de água, por intermédio de terceiros, está configurado o crime de participação ilícita. 4 - Por não haver dilação probatória no sentido da busca por elementos que pudessem ao menos por em cheque a comprovação acerca da efetiva entrega da água ou da lisura no procedimento de prestação de contas dos pipeiros cadastrados, capaz de gerar pagamento indevido e prejuízo à Administração Militar, afasta-se a tipificação pelo crime do art. 251 do CPM. 5 – In casu, o Parquet não logrou êxito em demonstrar a ocorrência dos núcleos do tipo penal, consistentes em "dar", "oferecer" ou "prometer" dinheiro ou vantagem indevida com fim específico de ter em seu benefício a prática, omissão ou retardamento de ato funcional, acarretando a absolvição pelo crime de corrupção ativa, previsto no art. 309 do CPM. 6 – Não havendo qualquer poder de ingerência do Acusado, nos procedimentos da OM, que pudesse favorecer aos agentes tidos como corruptores, resta afastada a tese de recebimento de vantagens em troca de favorecimentos. 7 - O delito do art. 310 do CPM visa resguardar a idoneidade dos atos administrativos militares. Configura indubitável risco à lisura dos serviços da Operação Carro-Pipa o fato de um militar atuar dissimuladamente como contratado pela OM, ainda mais quando trabalhava paralelamente na equipe de fiscalização destes serviços, no escritório da OCP. Sem falar na patente violação à Disciplina, base angular que rege a vida na caserna. 8 - Consoante a doutrina, o tipo penal do crime de participação ilícita possui como sujeito aquele que está incumbido de informar ou fiscalizar as atividades, zelando pela guarda da moralidade e pela manutenção da ordem administrativa militar, objeto jurídico do delito. De sorte que aquele que, às claras ou de forma oculta, dissimulada, participa do contrato, do fornecimento ou do serviço prestado à Administração Militar, incorre no referido tipo penal, haja vista que deveria zelar pela regularidade. 9 - De acordo com os autos, restou devidamente comprovado que, no decorrer dos anos de 2013 a 2016, um dos Acusados militar, de forma livre e consciente, participou, de forma simulada, por interpostas pessoas, em contratos firmados com a administração militar, de modo a prestar serviços no âmbito da Operação Carro-Pipa, por meio de, pelo menos, dois caminhões, exercendo fiscalização sobre estes mesmos serviços. 10 – Adequada a emendatio libeli com a consequente reclassificação da conduta que importar benefício ao Acusado. Nesse sentido é a inteligência do art. 437, "a", do CPPM, bem como da Súmula nº 5 do STM. 11 – Tratando-se de recurso da Acusação, e verificada a existência de circunstâncias judiciais negativas, bem como constatada a continuidade delitiva, não consideradas pelo Juízo a quo, deve a pena ser revista e majorada, em observância ao primado da vedação à proteção deficiente. 12 - É cediço que, embora não haja um critério puramente matemático para a realização da dosimetria da pena, na qual ao julgador é conferido o poder de, dentro da discricionariedade juridicamente vinculada para atender às singularidades do caso concreto, a jurisprudência tem admitido para aumento da pena base a adoção da fração correspondente a 1/8 (um oitavo) entre o mínimo e o máximo da pena abstratamente cominada ao delito para cada circunstância judicial desfavorável. 13 - Consoante entendimento pacífico na doutrina e na jurisprudência pátrias, por motivo de política criminal, é adotado critério meramente quantitativo para a exasperação da pena em virtude da continuidade delitiva, sendo consideradas adequadas as frações de 1/6 (um sexto) pela prática de 2 infrações; 1/5 (um quinto), para 3 infrações; 1/4 (um quarto), para 4 infrações; 1/3 (um terço), para 5 infrações; 1/2 (metade), para 6 infrações e 2/3 (dois terços), para 7 ou mais infrações. 14 - Face ao quantum da reprimenda estabelecida superar o limite de 2 (dois) anos previsto no art. 84 do CPM para a concessão do sursis, deve ser negado ao Sentenciado o direito à suspensão condicional da pena e, em sendo Praça, deve ser imposta a pena acessória de exclusão das Forças Armadas, consoante disposto no art. 98, IV c/c o art. 102, ambos do CPM. 15 – Apelo conhecido e parcialmente provido. Sentença condenatória mantida. Pena majorada. Decisão por maioria.