Jurisprudência STM 7000241-95.2019.7.00.0000 de 14 de abril de 2020
Publicado por Superior Tribunal Militar
Relator(a)
LÚCIO MÁRIO DE BARROS GÓES
Revisor(a)
MARIA ELIZABETH GUIMARÃES TEIXEIRA ROCHA
Classe Processual
APELAÇÃO
Data de Autuação
13/03/2019
Data de Julgamento
17/12/2019
Assuntos
1) DIREITO PENAL MILITAR,CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO MILITAR,CORRUPÇÃO,CORRUPÇÃO ATIVA. 2) DIREITO PENAL MILITAR,CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO MILITAR,CORRUPÇÃO,CORRUPÇÃO PASSIVA. 3) DIREITO PENAL MILITAR,CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO MILITAR,DESACATO E DA DESOBEDIÊNCIA,INGRESSO CLANDESTINO. 4) DIREITO PENAL,PARTE GERAL,APLICAÇÃO DA PENA,SUBSTITUIÇÃO DA PENA. 5) DIREITO PROCESSUAL PENAL MILITAR,JURISDIÇÃO E COMPETÊNCIA,COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA MILITAR DA UNIÃO. 6) DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO TRABALHO,PROCESSO E PROCEDIMENTO,PROVAS,DEPOIMENTO.
Ementa
APELAÇÕES. DPU. PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA. CIVIL. REJEIÇÃO. PRELIMINAR SUSCITADA DE OFÍCIO. INGRESSO CLANDESTINO. PRESCRIÇÃO. ACOLHIMENTO. MÉRITO DO APELO DO PRIMEIRO CORRÉU. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO POR FALTA DE PROVAS. SITUAÇÃO NÃO CONFIGURADA. CONCESSÃO DO SURSIS. MÉRITO DO APELO DO SEGUNDO CORRÉU. COLABORAÇÃO PREMIADA. POSSIBILIDADE DE INCIDÊNCIA NA JUSTIÇA MILITAR. ATO JURÍDICO BILATERAL. AUSÊNCIA DE ACORDO MINISTERIAL. INEXISTÊNCIA DE DELITO ASSOCIATIVO DE AGENTES. CONTINUIDADE DELITIVA. IMPRESCINDIBILIDADE DE CRIMES DA MESMA ESPÉCIE. NÃO OCORRÊNCIA. A competência penal da Justiça Especial Federal não se limita aos integrantes das Forças Armadas, mas também aos civis, mesmo em tempos de paz, desde que estes atuem nas circunstâncias expressamente elencadas pelo art. 9° da Lei Material Castrense. Preliminar rejeitada. Decisão unânime. Nos termos do § 3º do art. 125 do CPM, "No caso de concurso de crimes ou de crime continuado, a prescrição é referida, não à pena unificada, mas à de cada crime considerado isoladamente". Daí, tendo em vista que entre o recebimento da Denúncia (16/4/2015) e a data da publicação da Sentença (21/8/2018) decorreram mais de 2 (dois) anos, há de ser reconhecida a prescrição do crime do art. 302 do CPM, nos termos do art. 123, inciso IV, c/c o art. 125, inciso VII, ambos do CPM. Preliminar acolhida. Decisão unânime. No mérito, quanto ao apelo de CARLOS ALBERTO SOUZA REZENDE DE CARVALHO, não há como acolher a tese defensiva de insuficiência probatória, pois certo é que não somente a oitiva do corréu confirmou a prática delitiva por parte do apelante, mas também a prova testemunhal deu conta de que um civil alimentou o esquema de facilitação de acesso de embarcação pesqueira em área sob a Administração Militar. Por derradeiro, devido à declaração de ofício, com relação ao delito do art. 302 do CPM, da extinção da punibilidade, o Recurso deve ser parcialmente provido para deferir ao apelante a suspensão condicional da pena, porquanto o civil somente resta condenado, como incurso no art. 309, parágrafo único, do CPM, à pena de 1 (um) ano, 6 (seis) meses e 20 (vinte) dias de reclusão. Concernente ao apelo de FRANCISCO RONALDO FREITAS LINO, é incabível o instituto da delação premiada. A colaboração premiada é meio especial de obtenção de prova, na qual um sujeito ativo coopera, voluntaria e efetivamente, com a investigação ou com o processo criminal, fornecendo a identificação dos demais coautores e partícipes, revelando a estrutura hierárquica e a divisão de tarefas da organização criminosa, auxiliando na prevenção de infrações penais decorrentes das atividades da organização criminosa, na recuperação total ou parcial do produto ou do proveito das infrações penais praticadas pela organização criminosa e na localização de eventual vítima com a sua integridade física preservada, almejando a concessão dos benefícios do perdão judicial, da redução da pena em até 2/3 (dois terços) ou da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. Nesta Justiça Especializada, havendo a prática de crimes própria ou impropriamente militares, mediante a associação de 4 (quatro) ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional, aplicam- se as disposições normativas da Lei nº 12.850/2013 (art. 1º, § 1º), em nítido diálogo das fontes. A despeito disso, na dicção estabelecida pela Lei nº 12.850/2013, a colaboração não traduz ato jurídico unilateral, e sim bilateral. Trata-se de negócio jurídico processual formalizado entre o delegado de polícia ou o membro do Ministério Público e o investigado/denunciado, para fins de obtenção de provas. Ainda que se adotasse o entendimento de que o juiz, na sentença, pudesse conceder benefícios ao colaborador sem prévia homologação de acordo reduzido a termo, cabe ressaltar que, conquanto a ação delitiva tenha sido operada por meio de concurso de pessoas, inexistiu, in casu, delito de associação de agentes. Daí ter sido reconhecida a atenuante da confissão espontânea, mas não a minorante no patamar de 2/3 (dois terços) relativamente à colaboração premiada, porquanto aquela concerne aos fatos descritos na exordial, enquanto esta se refere aos esclarecimentos sobre a própria organização criminosa. A continuidade delitiva é um benefício legal (uma ficção jurídica) que somente se aplica quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subsequentes ser considerados como continuação do primeiro (art. 80 do CPM). No caso, os delitos foram de espécies diferentes e são previstos em tipos distintos (corrupção passiva e corrupção ativa) e as maneiras de execução foram diversas, até porque se tratou de condutas bem distintas uma das outras (na corrupção passiva, o apelante aceitou receber do civil vantagem ilícita; enquanto na corrupção ativa, ele ofereceu dinheiro aos colegas da caserna para permitirem o acesso à embarcação). No âmbito penal especializado, crimes da mesma espécie não se confundem com crimes da mesma natureza, uma vez que aqueles têm que constar do mesmo dispositivo legal, enquanto estes podem ser previstos em dispositivos diversos, desde que apresentem caracteres fundamentais comuns, conforme o § 5º do art. 78 do CPM. Recurso do primeiro apelante parcialmente provido. Decisão unânime. Recurso do segundo apelante não provido. Decisão por maioria.