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Jurisprudência STM 7000131-46.2023.7.03.0203 de 04 de agosto de 2025

Publicado por Superior Tribunal Militar


Relator(a)

CARLOS VUYK DE AQUINO

Revisor(a)

PÉRICLES AURÉLIO LIMA DE QUEIROZ

Classe Processual

APELAÇÃO CRIMINAL

Data de Autuação

18/03/2025

Data de Julgamento

12/06/2025

Assuntos

1) DIREITO PENAL MILITAR,CRIMES CONTRA INCOLUMIDADE PÚBLICA,CONTRA A SAÚDE,ART. 290, CPM - TRÁFICO, POSSE OU USO DE ENTORPECENTE OU SUBSTÂNCIA DE EFEITO SIMILAR. 2) DIREITO PROCESSUAL PENAL,ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL. 3) DIREITO PENAL MILITAR,PARTE GERAL ,SUSPENSÃO CONDICIONAL DA PENA. 4) DIREITO PENAL,CRIMES PREVISTOS NA LEGISLAÇÃO EXTRAVAGANTE,CRIMES DE TRÁFICO ILÍCITO E USO INDEVIDO DE DROGAS,POSSE DE DROGAS PARA CONSUMO PESSOAL,DESPENALIZAÇÃO / DESCRIMINALIZAÇÃO. 5) DIREITO PROCESSUAL PENAL,DENÚNCIA/QUEIXA,DESCLASSIFICAÇÃO. 6) DIREITO PENAL MILITAR,PARTE GERAL ,APLICAÇÃO DA PENA,SUBSTITUIÇÃO DA PENA.

Ementa

DIREITO PENAL MILITAR. DIREITO PROCESSUAL PENAL MILITAR. APELAÇÃO. DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO. TRÁFICO, POSSE OU USO DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE EM LOCAL SUJEITO À ADMINISTRAÇÃO MILITAR. ART. 290 DO CÓDIGO PENAL MILITAR. CONDENAÇÃO EM PRIMEIRO GRAU. PRELIMINAR DE SOBRESTAMENTO DO FEITO EM VIRTUDE DA NÃO PROPOSITURA DO ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL. REJEIÇÃO. UNANIMIDADE. MÉRITO. TEMA 506 DE REPERCUSSÃO GERAL. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. NÃO CABIMENTO. EXCLUSÃO DO SERVIÇO ATIVO. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DO NE BIS IN IDEM. NÃO ACOLHIMENTO. CRIME IMPOSSÍVEL. ABSOLUTA INEFICÁCIA DO MEIO. PEQUENA QUANTIDADE DE ENTORPECENTE. NÃO ACOLHIMENTO. AUSÊNCIA DE PERIGO DE LESÃO AO BEM JURÍDICO TUTELADO. CRIME DE PERIGO ABSTRATO. NÃO ACOLHIMENTO. ART. 28 DA LEI Nº 11.343/2006. DESCLASSIFICAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. LEI Nº 9.099/95. NÃO APLICAÇÃO. DESCLASSIFICAÇÃO DA CONDUTA PARA O ART. 202 DO CÓDIGO PENAL MILITAR. EMBRIAGUEZ. NÃO ACOLHIMENTO. DESCLASSIFICAÇÃO DA CONDUTA PARA O ARTIGO 291, PARÁGRAFO ÚNICO, INCISO I, DO CÓDIGO PENAL MILITAR. RECEITA ILEGAL. NÃO ACOLHIMENTO. DESPROPORCIONALIDADE DO PRECEITO SECUNDÁRIO DO ART. 290 DO CÓDIGO PENAL MILITAR. NÃO ACOLHIMENTO. ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA. ALÍNEA “D” DO ARTIGO 72 DO ESTATUTO REPRESSIVO CASTRENSE. NÃO INCIDÊNCIA. ART. 44 DO CÓDIGO PENAL COMUM. NÃO APLICAÇÃO. CONCESSÃO DO SURSIS. RÉU TECNICAMENTE PRIMÁRIO. CABIMENTO. AUTORIA, MATERIALIDADE E CULPABILIDADE COMPROVADAS. MANUTENÇÃO DA CONDENAÇÃO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. MAIORIA. A partir da conclusão do julgamento do Habeas Corpus nº 185.913/DF, em 18 de setembro de 2024, cuja Ata foi publicada em 20 de setembro de 2024, o Supremo Tribunal Federal pronunciou-se acerca da aplicação do Acordo de Não Persecução Penal fixando tese no sentido de que: “1. Compete ao membro do Ministério Público oficiante, motivadamente e no exercício do seu poder-dever, avaliar o preenchimento dos requisitos para negociação e celebração do ANPP, sem prejuízo do regular exercício dos controles jurisdicional e interno; 2. É cabível a celebração de Acordo de Não Persecução Penal em casos de processos em andamento quando da entrada em vigência da Lei nº 13.964, de 2019, mesmo se ausente confissão do réu até aquele momento, desde que o pedido tenha sido feito antes do trânsito em julgado; 3. Nos processos penais em andamento na data da proclamação do resultado deste julgamento, nos quais em tese seja cabível a negociação de ANPP, se este ainda não foi oferecido ou não houve motivação para o seu não oferecimento, o MP agindo de ofício, a pedido da defesa ou mediante provocação do magistrado da causa, deverá, na primeira oportunidade em que falar nos autos, após a publicação da ata deste julgamento, manifestar-se motivadamente acerca do cabimento, ou não, do acordo; 4. Nas investigações ou ações penais iniciadas a partir da proclamação do resultado deste julgamento, a proposição de ANPP pelo Ministério Público, ou a motivação para o seu não oferecimento, devem ser apresentadas antes do recebimento da denúncia, ressalvada a possibilidade de propositura, pelo órgão ministerial, no curso da ação penal, se for o caso.”. Por fim, o Tribunal definiu que este julgamento não afeta, em nenhuma medida, as decisões já proferidas e, ainda, que a deliberação sobre o cabimento, ou não, do ANPP deverá ocorrer na instância em que o processo se encontrar. Relativamente à abrangência do citado julgado, não há dúvidas de que os processos penais militares estão abarcados pelo decisum acima pronunciado. Nada obstante a possibilidade de aplicação do referido Instituto aos “(...) processos penais em andamento na data da proclamação do resultado (...)” do julgamento do Habeas Corpus nº 185.913, aí incluídas as ações penais militares em curso no âmbito desta Justiça Especializada, tal circunstância somente poderia ser levada a efeito se e somente se não houvesse “(...) motivação para o seu não oferecimento (...)”. Partindo dessa premissa, o caso vertente evidencia a impossibilidade de atendimento do pleito defensivo, uma vez que, em Sessão de Julgamento realizada em 13 de dezembro de 2024, o Ministério Público Militar manifestou-se, em sustentação oral, pelo não cabimento do Acordo de Não Persecução Penal ao Acusado. Preliminar de sobrestamento rejeitada. Decisão por unanimidade. Para a configuração do delito de tráfico, posse ou uso de substância entorpecente em local sujeito à Administração Militar, basta que se evidencie qualquer das figuras nucleares do tipo penal. Ao analisar os fundamentos da Decisão colacionada pela Defesa referente ao Tema 506 de Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 635.659/SP, é de completa percepção que a análise dos eminentes Ministros da Corte Suprema circunscreveu-se à inconstitucionalidade do art. 28 da Lei nº 11.343/2006, circunstância que, por si só, afastaria qualquer juízo de valor nos autos vertentes, simplesmente porque a conduta pela qual o Réu foi denunciado está tipificada no art. 290 do Código Penal Militar. O licenciamento de militar do serviço ativo é matéria que, por motivos óbvios, refoge à esfera de apreciação desta Justiça Castrense, por demandar a aferição de ato administrativo, não se vislumbrando qualquer violação ao Princípio do ne bis in idem. Embora o art. 32 do Código Penal Militar considere impossível a consumação de crime cujo meio empregado seja absolutamente ineficaz ou se verifique a impropriedade do objeto, determinando a não aplicação de reprimenda, na espécie, independentemente da quantidade, o agente foi encontrado portando substância entorpecente em local sujeito à Administração Militar, em circunstâncias tais que configuram o crime previsto no citado preceito penal incriminador do Estatuto Repressivo Castrense, na figura nuclear “trazer consigo”. A tipificação dos delitos de perigo abstrato tem por objetivo reprimir preventivamente eventual lesão ao bem jurídico tutelado pela norma, razão pela qual não se contrapõe à ordem constitucional. Precedentes do Supremo Tribunal Federal e do Plenário do Superior Tribunal Militar. Na espécie, por se tratar de crime de perigo abstrato, para a configuração do tipo descrito no art. 290 do Código Penal Militar não se faz necessária a comprovação de resultado lesivo, pois em ambiente militar a potencial lesividade da substância entorpecente é suficiente para incriminar o seu possuidor, bastando, para tanto, que o agente pratique qualquer das figuras nucleares do tipo penal em apreço, sem a necessidade de efetiva comprovação da existência de qualquer lesão ou ameaça de lesão ao bem juridicamente tutelado pela norma penal, in casu, a saúde pública. Quanto à pretensão de incidência da Lei nº 11.343/2006 ao vertente caso, a aplicação da referida norma extravagante é inviável no âmbito da Justiça Militar da União, em razão do Princípio da Especialidade, pois não houve revogação nem alteração na redação do art. 290 do CPM, bastando, para tanto, o exame do art. 75 do citado Diploma legal. Precedentes do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal Militar. Além disso, a expressão em “local sujeito à administração militar” contida na norma penal castrense descrita pelo art. 290 do Código Penal Militar delimita a especialidade desse delito em relação à Lei Antidrogas (Lei nº 11.343/2006), devendo a conduta perpetrada pelo Acusado ser apreciada sob esse prisma. A Lei nº 9.099/95 não é aplicável no âmbito desta Justiça Especializada, por força da vedação legal contida no seu art. 90-A e na esteira da jurisprudência desta Corte Militar. O delito descrito no art. 202 do Estatuto Repressivo Castrense exige para a sua configuração a demonstração de que o agente se encontra no denominado “estado de embriaguez”, ou seja, revela-se imprescindível a comprovação de que o autor do fato ingeriu a substância inebriante. Ainda que se pudesse admitir que a conduta acima tipificada se configurasse pela ingestão de substância entorpecente, no caso dos autos o Acusado foi flagrado trazendo consigo maconha em local sujeito à Administração Militar, circunstância que, por si só, afasta a pretensão defensiva de desclassificação da conduta delituosa. Para os casos assimilados, o inciso I do parágrafo único do artigo 291 do Código Penal Militar reclama para a sua incidência que o agente tenha a substância entorpecente em sua guarda ou cuidado, em farmácia, laboratório, consultório, gabinete ou depósito militar. Ou seja, deve o agente ser o responsável lícito pela droga, hipótese esta que não encontra adequação aos fatos apurados nos presentes autos, haja vista que o Acusado trazia consigo substância entorpecente no interior da organização militar, portanto, ilicitamente. A norma penal incriminadora descrita no art. 290 do Código Penal Militar é compatível com a ordem constitucional vigente, e com as garantias previstas na Convenção Americana sobre Direitos Humanos (CADH), pois a penalidade aplicada foi razoável à conduta perpetrada, estando dentro dos parâmetros legais, sendo inclusive aplicada a pena mínima prevista no tipo legal, qual seja, 1 ano de reclusão, não incidindo qualquer violação aos Princípios da Proporcionalidade ou da Razoabilidade. A atenuante da confissão espontânea é reconhecida somente quando a autoria do delito é ignorada ou imputada a terceiro, o que não se verifica nos presentes autos, até mesmo porque, conforme se extrai da Denúncia, o Réu foi preso em flagrante no interior do aquartelamento. Conforme a jurisprudência desta Corte Castrense, não é possível a aplicação de penas alternativas previstas no art. 44 e §§ do Código Penal comum nesta Justiça Especializada, tendo em vista a impossibilidade de se mesclar os regimes penal comum e o penal castrense, mediante a seleção das partes mais benéficas de cada um deles. Com base na doutrina e interpretando-se sistematicamente o inciso I do artigo 84 e o § 1º do artigo 71, ambos do Código Penal Militar, conclui-se que o legislador castrense vedou, via de regra, a concessão da suspensão condicional da pena aos reincidentes, à semelhança do disposto no inciso I do artigo 77 do Código Penal comum. Na espécie, o Réu não é reincidente, porém ele é considerado “tecnicamente primário”, termo jurisprudencial que foi inclusive reconhecido pela Sentença de primeiro grau. Assim, considerando que o Réu não é reincidente, nada impede a concessão do sursis, na esteira da jurisprudência desta Corte Castrense segundo a qual a natureza do inciso I do art. 84 do Código Penal Militar é de evitar a suspensão condicional da pena em caso de reincidência. Comprovadas a autoria, a materialidade e a culpabilidade delitivas, não merece reparo a condenação imposta ao Acusado. Recurso parcialmente provido. Decisão por unanimidade.


Jurisprudência STM 7000131-46.2023.7.03.0203 de 04 de agosto de 2025