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Jurisprudência STF 948634 de 18 de Novembro de 2020

Publicado por Supremo Tribunal Federal


Título

RE 948634

Classe processual

RECURSO EXTRAORDINÁRIO

Relator

RICARDO LEWANDOWSKI

Data de julgamento

20/10/2020

Data de publicação

18/11/2020

Orgão julgador

Tribunal Pleno

Publicação

PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-274 DIVULG 17-11-2020 PUBLIC 18-11-2020

Partes

RECTE.(S) : UNIMED PORTO ALEGRE - SOCIEDADE COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO LTDA ADV.(A/S) : CARLOS SPINDLER DOS SANTOS ADV.(A/S) : JOSE EDUARDO MARTINS CARDOZO RECDO.(A/S) : IARA MARIA CARDOSO DOS SANTOS ADV.(A/S) : PAULO CELSO SAMPAIO MENEZES AM. CURIAE. : FEDERAÇÃO NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR - FENASAÚDE ADV.(A/S) : SERGIO BERMUDES E OUTRO(A/S)

Ementa

Ementa: RECURSO EXTRAORDINÁRIO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TEMA 123 DA SISTEMÁTICA DA REPERCUSSÃO GERAL. DIREITO CIVIL. APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO. PLANOS DE SAÚDE. LEI 9.656/1998. DISCUSSÃO SOBRE A SUA APLICAÇÃO EM RELAÇÃO A CONTRATOS FIRMADOS ANTERIORMENTE À RESPECTIVA VIGÊNCIA. I - A blindagem constitucional ao ato jurídico perfeito, ao direito adquirido e à coisa julgada configura cláusula pétrea, bem assim um dos pilares de sustentação do Estado Democrático de Direito, consubstanciando garantias individuais de todos os cidadãos. II - Os efeitos decorrentes da entrada em vigor da Lei 9.656/1998 em relação a fatos passados, presentes, futuros e pendentes pode variar, de acordo com os diferentes graus da retroatividade das leis, admitida pela doutrina e jurisprudência em casos particulares. III - Dentro do campo da aplicação da lei civil no tempo é que surge a regulamentação do setor de prestação de assistência suplementar à saúde, como forma de intervenção estatal no domínio econômico, implementada pela Lei 9.656/1998, a gerar reflexos no campo da aplicação da lei civil no tempo. IV - A expansão da assistência privada à saúde, paralelamente à sua universalização, para além de estar calcada no direito constitucional de acesso à saúde, também atende aos ditames da livre iniciativa e da proteção ao consumidor, ambos princípios norteadores da ordem econômica nacional. V - Como em qualquer contrato de adesão com o viés de aleatoriedade tão acentuado, a contraprestação paga pelo segurado é atrelada aos riscos assumidos pela prestadora, sendo um dos critérios para o seu dimensionamento o exame das normas aplicáveis à época de sua celebração. VI - Sob a perspectiva das partes, é preciso determinar, previamente, quais as regras legais que as vinculam e que servirão para a interpretação das cláusulas contratuais, observado, ainda, o vetusto princípio pacta sunt servanda. VII - A dimensão temporal é inerente à natureza dos contratos de planos de saúde, pois as operadoras e os segurados levaram em conta em seus cálculos, à época de sua celebração, a probabilidade da ocorrência de riscos futuros e as coberturas correspondentes. VIII - As relações jurídicas decorrentes de tais contratos, livremente pactuadas, observada a autonomia da vontade das partes, devem ser compreendidas à luz da segurança jurídica, de maneira a conferir estabilidade aos direitos de todos os envolvidos, presumindo-se o conhecimento que as partes tinham das regras às quais se vincularam. IX - A vedação à retroatividade plena dos dispositivos inaugurados pela Lei 9.656/1998, como aqueles que dizem respeito à cobertura de determinadas moléstias, além de obedecer ao preceito pétreo estampado no art. 5°, XXXVI, da CF, também guarda submissão àqueles relativos à ordem econômica e à livre iniciativa, sem que se descuide da defesa do consumidor, pois todos encontram-se expressamente previstos no art. 170 da CF. X – Os contratos de planos de saúde firmados antes do advento da Lei 9.656/1998 constituem atos jurídicos perfeitos, e, como regra geral, estão blindados contra mudanças supervenientes, ressalvada a proteção de outros direitos fundamentais ou de indivíduos em situação de vulnerabilidade. XI - Nos termos do art. 35 da Lei 9.656/1998, assegurou-se aos beneficiários dos contratos celebrados anteriormente a 10 de janeiro de 1999 a possibilidade de opção pelas novas regras, tendo o § 4° do mencionado dispositivo proibido que a migração fosse feita unilateralmente pela operadora. XII – Em suma: As disposições da Lei 9.656/1998, à luz do art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal, somente incidem sobre os contratos celebrados a partir de sua vigência, bem como nos contratos que, firmados anteriormente, foram adaptados ao seu regime, sendo as respectivas disposições inaplicáveis aos beneficiários que, exercendo sua autonomia de vontade, optaram por manter os planos antigos inalterados. XIII - Recurso extraordinário a que se dá provimento.

Decisão

Após os votos dos Ministros Ricardo Lewandowski (Relator), Marco Aurélio, Cármen Lúcia e Rosa Weber, que davam provimento ao recurso extraordinário, para julgar improcedente o pedido inicial, e fixavam a seguinte tese (tema 123 da repercussão geral): “As disposições da Lei 9.656/1998, à luz do art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal, somente incidem sobre os contratos celebrados a partir de sua vigência, bem como nos contratos que, firmados anteriormente, foram adaptados ao seu regime, sendo as respectivas disposições inaplicáveis aos beneficiários que, exercendo sua autonomia de vontade, optaram por manter os planos antigos inalterados”; e dos votos dos Ministros Edson Fachin, Dias Toffoli (Presidente) e Roberto Barroso, que negavam provimento ao recurso, pediu vista dos autos o Ministro Alexandre de Moraes. Falaram: pela recorrente, o Dr. José Eduardo Martins Cardozo; e, pelo amicus curiae, o Dr. Guilherme Valdetaro Mathias. Afirmou suspeição o Ministro Luiz Fux. Plenário, Sessão Virtual de 28.8.2020 a 4.9.2020. Decisão: O Tribunal, por maioria, apreciando o tema 123 da repercussão geral, deu provimento ao recurso extraordinário para julgar improcedente o pedido inicial, nos termos do voto Relator, vencidos os Ministros Edson Fachin, Dias Toffoli e Roberto Barroso. O Ministro Gilmar Mendes acompanhou o Relator com ressalvas. Foi fixada a seguinte tese: "As disposições da Lei 9.656/1998, à luz do art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal, somente incidem sobre os contratos celebrados a partir de sua vigência, bem como nos contratos que, firmados anteriormente, foram adaptados ao seu regime, sendo as respectivas disposições inaplicáveis aos beneficiários que, exercendo sua autonomia de vontade, optaram por manter os planos antigos inalterados". Não participou deste julgamento o Ministro Celso de Mello. Afirmou suspeição o Ministro Luiz Fux (Presidente). Plenário, Sessão Virtual de 9.10.2020 a 19.10.2020.

Indexação

- CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, APLICABILIDADE, PLANO DE SAÚDE. NORMA CONSTITUCIONAL, RETROATIVIDADE MÁXIMA, RETROATIVIDADE MÉDIA, OFENSA, PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL, PRESERVAÇÃO, DIREITO FUNDAMENTAL, PESSOA NATURAL, SITUAÇÃO, VULNERABILIDADE, LEI NOVA, ALCANCE, ATO JURÍDICO, MOMENTO ANTERIOR, INTERFERÊNCIA, PLANO DA VALIDADE DO NEGÓCIO JURÍDICO. LEI DA FICHA LIMPA, LIMITAÇÃO, EFEITO PRO FUTURO, DIREITO DE SER VOTADO, CARGO ELETIVO. APLICAÇÃO RETROATIVA, LEI, TAXA REFERENCIAL (TR), ÍNDICE DE REAJUSTE, CONTRATO ANTERIOR. - FUNDAMENTAÇÃO COMPLEMENTAR, MIN. ALEXANDRE DE MORAES: FUNDAMENTAÇÃO SUCINTA, DECISÃO JUDICIAL. AUSÊNCIA, REPERCUSSÃO GERAL, ALEGAÇÃO, OFENSA, DIREITO ADQUIRIDO, ATO JURÍDICO PERFEITO, COISA JULGADA, PRINCÍPIO DA LEGALIDADE, CONTRADITÓRIO, AMPLA DEFESA, DEVIDO PROCESSO LEGAL, INDISPENSABILIDADE, APRECIAÇÃO, NORMA INFRACONSTITUCIONAL. EXPLORAÇÃO, SERVIÇO DE SAÚDE, REGULAÇÃO, IRRELEVÂNCIA, CARÁTER SUPLEMENTAR. CONTRATO, ATO JURÍDICO PERFEITO, RETROATIVIDADE MÍNIMA. - RESSALVA DE ENTENDIMENTO, MIN. GILMAR MENDES: AÇÃO DE CONTROLE CONCENTRADO DE CONSTITUCIONALIDADE, AUSÊNCIA, IMPEDIMENTO, SUSPEIÇÃO, EXCEÇÃO, MINISTRO, INDICAÇÃO, RAZÕES, FORO ÍNTIMO. - VOTO VENCIDO, MIN. EDSON FACHIN: CONTRATO, PRESTAÇÃO SUCESSIVA, APERFEIÇOAMENTO, DIREITO, MOMENTO, ACORDO, VONTADE, PARTE PROCESSUAL. DESPROVIMENTO, RECURSO EXTRAORDINÁRIO, ACÓRDÃO RECORRIDO, ANULAÇÃO, CONTRATO, PLANO DE SAÚDE, OFENSA, ESTATUTO DO IDOSO, CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.

Legislação

LEG-IMP CIB ANO-1824 ART-00179 INC-00001 INC-00002 INC-00003 CIB-1824 CONSTITUIÇÃO POLITICA DO IMPERIO DO BRAZIL LEG-FED CF ANO-1891 ART-00011 PAR-00001 PAR-00002 PAR-00003 CF-1891 CONSTITUIÇÃO FEDERAL LEG-FED CF ANO-1934 CF-1934 CONSTITUIÇÃO FEDERAL LEG-FED CF ANO-1946 CF-1946 CONSTITUIÇÃO FEDERAL LEG-FED CF ANO-1988 ART-00005 INC-00036 INC-00054 INC-00055 ART-00093 INC-00020 ART-00102 INC-00003 LET-A ART-00170 ART-00199 CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL LEG-FED LEI-008078 ANO-1990 CDC-1990 CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR LEG-FED LEI-008177 ANO-1991 LEI ORDINÁRIA LEG-FED LEI-009656 ANO-1998 ART-00010 PAR-00002 ART-00035 PAR-00004 LEI ORDINÁRIA LEG-FED LEI-009961 ANO-2000 LEI ORDINÁRIA LEG-FED LEI-010406 ANO-2002 ART-00757 CC-2002 CÓDIGO CIVIL LEG-FED DEL-004657 ANO-1942 ART-00006 LINDB-1942 LEI DE INTRODUÇÃO ÀS NORMAS DO DIREITO BRASILEIRO (LICC-1942 LEI DE INTRODUÇÃO AO CÓDIGO CIVIL) LEG-FED MPR-001908 ANO-1999 MEDIDA PROVISÓRIA - REEDIÇÃO Nº 18 LEG-FED MPR-002177 ANO-2001 ART-00002 MEDIDA PROVISÓRIA - REEDIÇÃO Nº44

Tese

As disposições da Lei 9.656/1998, à luz do art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal, somente incidem sobre os contratos celebrados a partir de sua vigência, bem como nos contratos que, firmados anteriormente, foram adaptados ao seu regime, sendo as respectivas disposições inaplicáveis aos beneficiários que, exercendo sua autonomia de vontade, optaram por manter os planos antigos inalterados.

Tema

123 - Aplicação de lei nova sobre plano de saúde aos contratos anteriormente firmados.

Observação

- Acórdão(s) citado(s): (LEI DA FICHA LIMPA, LIMITAÇÃO, EFEITO PRO FUTURO, DIREITO DE SER VOTADO, CARGO ELETIVO) RE 929670 (TP). (OPERADORA DE PLANO DE SAÚDE, LEI NOVA, APLICAÇÃO RETROATIVA) ADI 1931 (TP), ADI 1931 MC (TP). (FUNDAMENTAÇÃO SUCINTA, DECISÃO JUDICIAL) AI 791292 QO-RG. (AUSÊNCIA, REPERCUSSÃO GERAL, INDISPENSABILIDADE, APRECIAÇÃO, NORMA INFRACONSTITUCIONAL) ARE 748371 RG (TP). (EXPLORAÇÃO, SERVIÇO DE SAÚDE, REGULAÇÃO, IRRELEVÂNCIA, CARÁTER SUPLEMENTAR) RE 597064 (TP). (AÇÃO DE CONTROLE CONCENTRADO DE CONSTITUCIONALIDADE, AUSÊNCIA, IMPEDIMENTO, SUSPEIÇÃO, EXCEÇÃO, MINISTRO, INDICAÇÃO, RAZÕES, FORO ÍNTIMO) ADI 6362 (TP). (APLICAÇÃO RETROATIVA, LEI, TAXA REFERENCIAL (TR), ÍNDICE DE REAJUSTE, CONTRATO ANTERIOR) ADI 493 (TP). (CONTRATO, PRESTAÇÃO SUCESSIVA, APERFEIÇOAMENTO, DIREITO, MOMENTO, ACORDO, VONTADE, PARTE PROCESSUAL) AI 99655 AgR (2ªT). (CONTRATO, ATO JURÍDICO PERFEITO, RETROATIVIDADE MÍNIMA) AI 363159 AgR (2ªT). - Legislação estrangeira citada: Art. 2º, do Código Napoleônico, de 1804. - Veja RE 578801 RG e RE 652492 do STF. Número de páginas: 43. Análise: 16/08/2021, JRS.

Doutrina

FRANÇA, Rubens Limongi. A Irretroatividade das Leis e o Direito Adquirido. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 29-30. GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Manual de Direito Civil. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2019. v. único. GREGORI, Maria Stella. Planos de Saúde: a ótica da proteção do consumidor. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. p. 130-132. MARQUES, Cláudia Lima. Conflito de Leis no tempo e direito adquirido dos consumidores de planos e seguros de saúde, v. 13, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1999. p. 131. MAXIMILIANO, Carlos. Direito Intertemporal. 2. ed. São Paulo: Freitas Bastos, 1955. p. 8. OLIVEIRA, Carlos E. Elias de. Retroatividade das leis: a situação das leis emergenciais em tempos de pandemia. Disponível em: http://www.flaviotartuce.adv.br/artigos_convidados. Acesso em: 15 jul. 2020. RÁO, Vicente. O Direito e a Vida dos Direitos, 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 428. RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. 16. ed. São Paulo: Forense, 2016. p. 894. ROUBIER. Paul. Apud PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. 33. ed. Atualização: Maria Celina Bodin de Moraes. Rio de Janeiro: Forense, 2020. v. 1. p. 154. STOLZE, Pablo; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil: Parte Geral. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2014. v. 1. p. 345. TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2014. v. único. p. 581-582. ZAVASCKI, Teori. Planos econômicos, direito adquirido e FGTS. Revista de Informação Legislativa, v. 34, n. 134, abr./jun. 1997. p. 252.