Jurisprudência STF 7537 de 17 de Marco de 2025
Publicado por Supremo Tribunal Federal
Título
ADI 7537
Classe processual
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE
Relator
ANDRÉ MENDONÇA
Data de julgamento
24/02/2025
Data de publicação
17/03/2025
Orgão julgador
Tribunal Pleno
Publicação
PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 14-03-2025 PUBLIC 17-03-2025
Partes
REQTE.(S) : PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA INTDO.(A/S) : ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO ADV.(A/S) : PROCURADOR-GERAL DA ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO INTDO.(A/S) : GOVERNADOR DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
Ementa
Ementa: Direito administrativo e outras matérias de direito público. Ação direta de inconstitucionalidade. Licença-maternidade e paternidade. Filhos biológicos e adotivos. Servidores públicos civis e militares. Extensão do prazo de licença-paternidade ao pai em família monoparental. Compartilhamento das licenças parentais. Servidores públicos estaduais. Estado do Rio de Janeiro. Parcial procedência. I. Caso em exame 1. Ação direta de inconstitucionalidade proposta pela Procuradoria-Geral da República contra os artigos 83, incisos XII, e XIV, e 92, incisos V e VI, da Constituição do Estado do Rio de Janeiro (com a redação dada pelas Emendas Constitucionais nº 63/2015 e 65/2016), que estabelecem o regramento da licença-maternidade, da licença paternidade e da licença aos adotantes nos regimes dos servidores públicos e dos militares estaduais. II. Questão em discussão 2. As questões constitucionais em discussão são as seguintes: (i) saber se é inconstitucional a divergência entre os prazos de licença-maternidade e licença-paternidade concedidas às servidoras e aos servidores civis adotantes dos prazos estabelecidos às servidoras e aos servidores militares adotantes; (ii) saber se é inconstitucional o estabelecimento de licença-paternidade do pai solo (biológico ou adotante) em prazo inferior a 180 (cento e oitenta) dias; (iii) saber se é inconstitucional a impossibilidade de fruição partilhada, pelo casal, dos períodos de licença parental. III. Razões de decidir 3. Preliminarmente. Ausência de impugnação de todo o complexo normativo estadual. Das normas citadas pelo Governador do Estado do Rio de Janeiro que poderiam influenciar o desfecho da causa e não foram impugnadas, somente a primeira (art. 92, inciso VII, da Constituição estadual) possui a mesma hierarquia normativa (norma constitucional estadual) que os dispositivos constitucionais. Ademais, as outras normas infraconstitucionais estaduais foram editadas anteriormente às Emendas Constitucionais nº 63/2015, e 65/2016, que alteraram os artigos 83, incisos XII e XIV, e 92, incisos V e VI, da Constituição do Estado do Rio de Janeiro. Preliminar rejeitada. 4. Preliminarmente. Falta de interesse de agir. Analisando a integralidade dos artigos 83 e 92 da Constituição do Rio de Janeiro, em sua atual redação, estão previstas: (i) a concessão de licença-maternidade às gestantes e adotantes (mesmo em caso de guarda judicial para fins de adoção), pelo prazo de 180 (cento e oitenta) dias, sejam elas servidoras públicas efetivas (art. 83, inciso XII e XIV) ou submetidas a outro regime jurídico (art. 83, §2º), independentemente da idade do adotado; e (ii) concessão de licença-paternidade aos pais biológicos ou adotantes (mesmo em caso de guarda judicial para fins de adoção), pelo prazo de 30 (trinta) dias, sejam eles servidores públicos efetivos (art. 83, inciso XIII e XIV) ou submetidos a outro regime jurídico (art. 83, §2º), independentemente da idade do adotado. Rejeição da questão preliminar suscitada pelo Governador do Estado do Rio de Janeiro e acolhimento da questão preliminar invocada pelo Advogado-Geral da União. 5. Preliminarmente. Impossibilidade jurídica do pedido. Competência da União para legislar sobre Direito do Trabalho (art. 22, inciso I, da Constituição). Questão preliminar esvaziada, considerando que a norma estadual impugnada estende as licenças parentais a todos os servidores do Estado do Rio de Janeiro (independentemente da natureza do vínculo). Preliminar rejeitada. 6. Preliminarmente. Preliminar de inadequação da via eleita. Pedido de atuação do STF como legislador positivo. Os pedidos formulados nesta ação não buscam que o Supremo crie uma regulação jurídica totalmente nova, sem aderência seja à legislação, seja à Constituição. Na verdade, os pedidos pretendem que o STF conforme a legislação estadual ao sistema normativo constitucional. Ademais, a questão sobre a possibilidade de, no presente caso, haver essa conformação da legislação estadual à Constituição é matéria típica de mérito (procedência ou improcedência dos pedidos) e não de conhecimento. Preliminar rejeitada. 7. Mérito. Atos normativos do Estado do Rio de Janeiro que estabelecem a diferenciação entre servidoras públicos civis e militares, no que se refere aos prazos de fruição de licença-maternidade e licença-paternidade nos casos de adoção. Incidência do Tema 782 (RE 778.889/PE, Rel. Min. Roberto Barroso, j. 10/03/2016, p. 01/08/2016), em que o Supremo Tribunal Federal fixou a tese de que “[o]s prazos da licença adotante não podem ser inferiores aos prazos da licença gestante, o mesmo valendo para as respectivas prorrogações. Em relação à licença adotante, não é possível fixar prazos diversos em função da idade da criança adotada”. Aplicação do Tema 782 à licença-maternidade e à licença-paternidade. Inconstitucionalidade da diferenciação dos prazos de licença-maternidade e licença-paternidade em razão da natureza da filiação (biológica ou adotiva), considerando a vulneração às normas constitucionais que protegem a isonomia (art. 5º, caput, da Constituição) e a instituição familiar (art. 201, inciso II, 203, inciso I, 226, caput e §§ 5º e 7º, e 227, caput e § 6º, da Constituição). Precedentes. Pedido julgado parcialmente procedente. 8. Mérito. Alegação de inconstitucionalidade dos atos normativos do Estado do Rio de Janeiro que regulam a licença-paternidade no âmbito da Administração Pública estatal, que não estabelecem aos pais solo (adotantes ou biológicos) a licença-paternidade no mesmo prazo de 180 (cento e oitenta) dias concedido às mães gestantes e adotantes. Incidência do Tema 1.182 (RE 1.348.854, Rel. Min. Alexandre de Moraes, j. 12/05/2022, p. 24/10/2022), em que o Supremo Tribunal Federal fixou a tese de que “[à] luz do art. 227 da CF, que confere proteção integral da criança com absoluta prioridade e do princípio da paternidade responsável, a licença maternidade, prevista no art. 7º, XVIII, da CF/88 e regulamentada pelo art. 207 da Lei 8.112/1990, estende-se ao pai genitor monoparental”. Precedentes. Pedido julgado parcialmente procedente. 9. Mérito. Não cabe ao Poder Judiciário fixar a possibilidade de compartilhamento do período de licença parental entre os cônjuges ou companheiros, considerando a ausência de obrigação constitucional nesse sentido e a liberdade de conformação do legislador. Precedentes (ADI nº 7.518, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 16/09/2024, p. 02/10/2024). Pedido improcedente. IV. Dispositivo e tese 10. Ação direta de inconstitucionalidade parcialmente conhecida e, nesta parte, parcialmente procedente. 10.1. Declaração de nulidade, sem redução de texto, do art. 92, inciso VII, da Constituição do Estado do Rio de Janeiro, a fim de estabelecer: (i) que não haja diferenciação na concessão da licença-maternidade e da licença-paternidade aos servidores militares estaduais em caso de filiação biológica, de adoção ou de guarda judicial para fins de adoção; e (ii) que não haja diferença entre os prazos e as condições para fruição dessas licenças entre os servidores civis e os servidores militares, seja em caso de adoção, seja em caso de filiação biológica. 10.2. Atribuição de interpretação conforme à Constituição aos artigos 83, incisos XII e XIV, e 92 incisos V e VII, da Constituição do Estado do Rio de Janeiro, a fim de garantir aos servidores que sejam pai solo (biológicos ou adotivos) a fruição de licença-paternidade pelo mesmo período de afastamento concedido às servidoras a título de licença-maternidade. Tese de julgamento: 1. É inconstitucional qualquer interpretação ou ato normativo que fixe prazos distintos para a concessão de licença-maternidade ou de licença-paternidade em razão da natureza do vínculo com a administração (civil ou militar) ou da natureza da filiação (biológica ou adotiva). 2. Conforme decidido pelo Supremo Tribunal Federal no Tema 1.182, garante-se aos servidores que sejam pai solo (biológicos ou adotivos) a fruição de licença-paternidade pelo mesmo período de afastamento concedido às servidoras a título de licença-maternidade. 3. Não cabe ao Poder Judiciário fixar a possibilidade de compartilhamento do período de licença parental entre os cônjuges ou companheiros, considerando a ausência de obrigação constitucional nesse sentido e a liberdade de conformação do legislador. _________ Dispositivos relevantes citados: art. 5º, caput, da CF; art. 7º, XVIII, da CF; art. 227 da CF; art. 83, incisos XII, XIII, XIV e §2º, e art. 92, incisos V, VI e VII, da Constituição do Estado do Rio de Janeiro; art. 1º, §4º, da Lei 11.770/2008; art. 195, §5º, da CF. Jurisprudência relevante citada: ADI 6.579, ADI 7.518, ADI 7.519, ADI 7.520, ADI 7.526, ADI 7.528, ADI 7.535, ADI 7.541, ADI 7.543; RE 778.889/PE (Tema 782); RE 1.348.854 (Tema 1.182).
Decisão
O Tribunal, por unanimidade, conheceu parcialmente da ação direta de inconstitucionalidade e, na parte conhecida, julgou parcialmente procedentes os pedidos, para: a) Declarar a nulidade, sem redução de texto, do art. 92, inciso VII, da Constituição do Estado do Rio de Janeiro, a fim de estabelecer: (i) que não haja diferenciação na concessão da licença-maternidade e da licença-paternidade aos servidores militares estaduais em caso de filiação biológica, de adoção ou de guarda judicial para fins de adoção; e (ii) que não haja diferença entre os prazos e as condições para fruição dessas licenças entre os servidores civis e os servidores militares, seja em caso de adoção, seja em caso de filiação biológica; e b) Dar interpretação conforme à Constituição aos artigos 83, incisos XII e XIV, e 92, incisos V e VII, da Constituição do Estado do Rio de Janeiro, a fim de garantir aos servidores que sejam pai solo (biológicos ou adotivos) a fruição de licença-paternidade pelo mesmo período de afastamento concedido às servidoras a título de licença-maternidade. Por fim, fixou as seguintes teses de julgamento: a) É inconstitucional qualquer interpretação ou ato normativo que fixe prazos distintos para a concessão de licença-maternidade ou de licença-paternidade em razão da natureza do vínculo com a administração (civil ou militar) ou da natureza da filiação (biológica ou adotiva); b) Conforme decidido pelo Supremo Tribunal Federal no Tema 1.182, garante-se aos servidores que sejam pai solo (biológicos ou adotivos) a fruição de licença-paternidade pelo mesmo período de afastamento concedido às servidoras a título de licença-maternidade; c) Não cabe ao Poder Judiciário fixar a possibilidade de compartilhamento do período de licença parental entre os cônjuges ou companheiros, considerando a ausência de obrigação constitucional nesse sentido e a liberdade de conformação do legislador. Tudo nos termos do voto do Relator. Falou, pelo interessado Governador do Estado do Rio de Janeiro, a Dra. Isabela Leão Monteiro, Procuradora do Estado. Plenário, Sessão Virtual de 14.2.2025 a 21.2.2025.
Indexação
- AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE, IMPUGNAÇÃO, TOTALIDADE, COMPLEXO NORMATIVO. STF, DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE, ATUAÇÃO, GARANTIA, FORÇA NORMATIVA DA CONSTITUIÇÃO. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE, CONFORMIDADE, LEGISLAÇÃO ESTADUAL, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, MATÉRIA DE MÉRITO. - FUNDAMENTAÇÃO COMPLEMENTAR, MIN. LUÍS ROBERTO BARROSO: OMISSÃO LEGISLATIVA, REGULAMENTAÇÃO, LICENÇA-PATERNIDADE.
Legislação
LEG-FED CF ANO-1988 ART-00005 "CAPUT" ART-00007 INC-00018 INC-00019 ART-00022 INC-00001 ART-00195 PAR-00005 ART-00201 INC-00002 ART-00203 INC-00001 ART-00226 "CAPUT" PAR-00005 PAR-00007 ART-00227 "CAPUT" PAR-00006 CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL LEG-FED EMC-000063 ANO-2015 EMENDA CONSTITUCIONAL LEG-FED EMC-000065 ANO-2016 EMENDA CONSTITUCIONAL LEG-FED LEI-011770 ANO-2008 ART-00001 PAR-00004 LEI ORDINÁRIA LEG-EST CES ART-00083 INC-00012 INC-00013 INC-00014 PAR-00002 ART-00092 INC-00005 INC-00006 INC-00007 CONSTITUIÇÃO ESTADUAL, RJ
Tese
a) É inconstitucional qualquer interpretação ou ato normativo que fixe prazos distintos para a concessão de licença-maternidade ou de licença-paternidade em razão da natureza do vínculo com a administração (civil ou militar) ou da natureza da filiação (biológica ou adotiva); b) Conforme decidido pelo Supremo Tribunal Federal no Tema 1.182, garante-se aos servidores que sejam pai solo (biológicos ou adotivos) a fruição de licença-paternidade pelo mesmo período de afastamento concedido às servidoras a título de licença-maternidade; c) Não cabe ao Poder Judiciário fixar a possibilidade de compartilhamento do período de licença parental entre os cônjuges ou companheiros, considerando a ausência de obrigação constitucional nesse sentido e a liberdade de conformação do legislador.
Observação
- Acórdão(s) citado(s): (LICENÇA, ADOTANTE, PRAZO, LICENÇA MATERNIDADE) RE 778889 (TP). (LICENÇA-MATERNIDADE, SERVIDOR PÚBLICO, PAI, FAMÍLIA MONOPARENTAL) RE 1348854 (TP). (COMPARTILHAMENTO, PERÍODO, LICENÇA-MATERNIDADE, LICENÇA-PATERNIDADE) ADI 7518 (TP). (ADI, IMPUGNAÇÃO, TOTALIDADE, COMPLEXO NORMATIVO) ADI 4878 ED (TP). (STF, DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE, ATUAÇÃO, GARANTIA, FORÇA NORMATIVA DA CONSTITUIÇÃO) ADI 6579 (TP). (INCONSTITUCIONALIDADE, DIFERENÇA, PRAZO, LICENÇA-MATERNIDADE, LICENÇA-PATERNIDADE, FILIAÇÃO) ADI 7519 (TP), ADI 7520 (TP), ADI 7526 (TP), ADI 7528 (TP), ADI 7535 (TP), ADI 7541 (TP), ADI 7543 (TP). (OMISSÃO LEGISLATIVA, REGULAMENTAÇÃO, LICENÇA-PATERNIDADE) ADO 20 (TP). (ADI, CONFORMIDADE, LEGISLAÇÃO ESTADUAL, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, MATÉRIA DE MÉRITO) ADI 7518 (TP). Número de páginas: 50. Análise: 15/04/2025, JRS.