Jurisprudência STF 7532 de 29 de Abril de 2025
Publicado por Supremo Tribunal Federal
Título
ADI 7532
Classe processual
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE
Relator
ANDRÉ MENDONÇA
Data de julgamento
24/02/2025
Data de publicação
29/04/2025
Orgão julgador
Tribunal Pleno
Publicação
PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 28-04-2025 PUBLIC 29-04-2025
Partes
REQTE.(S) : PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA INTDO.(A/S) : ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE MINAS GERAIS PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DA ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE MINAS GERAIS INTDO.(A/S) : GOVERNADOR DO ESTADO DE MINAS GERAIS PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO-GERAL DO ESTADO DE MINAS GERAIS
Ementa
Ementa: Direito administrativo e outras matérias de direito público. Ação direta de inconstitucionalidade. Licença-maternidade e paternidade. Filhos biológicos e adotivos. Compartilhamento das licenças parentais. Servidores públicos estaduais. Estado de Minas Gerais. Parcial procedência. i. caso em exame 1. Ação direta de inconstitucionalidade proposta pela Procuradoria-Geral da República contra os atos normativos do Estado de Minas Gerais que estabelecem o regramento da licença-maternidade, da licença paternidade e da licença aos adotantes nos regimes dos servidores públicos civis e militares estaduais, além dos membros da Assembleia Legislativa. 2. Os atos normativos estaduais impugnados são os seguintes: (i) o art. 59-A, da Constituição do Estado de Minas Gerais; (ii) os artigos 7º, inciso II, 8º, inciso I, II e III, e parágrafo único, da Lei Complementar estadual nº 121/2011; (iii) os artigos 1º e 2º, §§ 1º, 2º e 3º, da Lei estadual nº 18.879/2010; (iv) os artigos 1º, capute parágrafo único, 2º, 3º e 4º da Lei Complementar estadual nº 165/2021; e (v)o art. 2º da Lei Complementar estadual nº 109/2009, que inseriu o inciso IX ao art. 26 da Lei nº 5.301/1969. ii. questão em discussão 3. As questões constitucionais em discussão são as seguintes: (i) saber se é inconstitucional a diferenciação do regime de licença-maternidade concedido às servidoras públicas “efetivas” e “não efetivas”, civis e militares, estatutárias e com vínculo celetista; (ii)saber se é inconstitucional a divergência entre os prazos de licença maternidade concedidos às servidoras públicas gestantes e adotantes, considerando que a licença prevista às adotantes se daria por “uma única vez” e proporcional à idade da criança adotada; (iii) saber se é inconstitucional o estabelecimento de licença-paternidade do pai solo (biológico ou adotante) em prazo inferior a 180 (cento e oitenta) dias;(iv) saber se é inconstitucional a previsão do prazo de licença-paternidade em tempo inferior a 20 (vinte dias), nos casos de adoção ou obtenção de guarda judicial para fins de adoção; (v) saber se é inconstitucional a fruição partilhada, pelo casal, dos períodos de licença parental. III. Razões de decidir 5. Preliminarmente. Perda parcial do objeto. Alterações legislativas promovidas no art. 8º da Lei Complementar estadual nº 121/2021, pela Lei Complementar estadual nº 176/2024, bem como no art. 2º da Lei estadual nº 18.879/2010, pela Lei estadual nº 24.826/2024. 6. Preliminarmente. Inadequação da via eleita. Pedido de atuação do STF como legislador positivo. A função jurisdicional desempenhada pelo Supremo Tribunal Federal evoluiu ao longo dos anos - sobretudo, após a promulgação da Constituição de 1988. Além do aumento do seu escopo subjetivo (legitimados ativos) e objetivo (atos normativos passíveis de apreciação), a atual formatação das técnicas decisórias utilizadas pelo Supremo Tribunal Federal na declaração da inconstitucionalidade das leis, permite que a Corte não somente desempenhe uma função de legislador negativo, como também atue para fazer valer a força normativa da Constituição, por meio da jurisdição constitucional. Os pedidos formulados nesta ação não buscam que o Supremo crie uma regulação jurídica totalmente nova, sem aderência seja à legislação, seja à Constituição. Na verdade, os pedidos pretendem que o STF conforme a legislação estadual ao sistema normativo constitucional. Ademais, a questão sobre a possibilidade de, no presente caso, haver essa conformação da legislação estadual à Constituição é matéria típica de mérito (procedência ou improcedência dos pedidos) e não de conhecimento. Preliminar rejeitada. 7. Mérito. O Supremo Tribunal Federal assegurou à servidora contratada temporariamente sob regime jurídico-administrativo ou à servidora comissionada, ainda quando não ocupe cargo efetivo, o direito ao gozo da licença-maternidade nos termos legais estabelecidos nos respectivos regimes jurídicos (Tema 542, RE 842.844/SC, Rel. Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno, j. 5.10.2023, DJe 6.12.2023). Contudo, o prazo da licença deverá ser concedido de acordo com a respectiva lei estadual que regule a contratação comissionada ou temporária, ou, eventualmente, a legislação trabalhista que incida sobre o caso, na hipótese de vínculo não-administrativo. Logo, ainda que se garanta a todas as servidoras (independente da natureza do vínculo com a Administração) o direito à licença-maternidade, não é possível a extensão do prazo conferido à servidora pública efetiva a todos os casos. Pedido parcialmente procedente. 8. Mérito. Quanto à fixação de prazo mínimo de 20 (vinte) dias de licença-paternidade aos servidores públicos do Estado de Minas Gerais, considerando que o Supremo Tribunal Federal, na ADO nº 20 já reconheceu a omissão legislativa quanto à regulamentação do regime jurídico da licença-paternidade previsto no art. 7º, inciso XIX, da Constituição), bem como fixou o prazo de 18 (meses) para que a matéria seja editada pelo Congresso Nacional, compete ao Poder Legislativo fixar as balizas gerais sobre a questão (art. 22, inciso I, Constituição). Ademais, como ressaltado pelo eminente Ministro Nunes Marques, na ADI nº 7.522 e na ADI nº 7.531, “não há como se adotar a legislação federal como paradigma. No que se refere ao regime jurídico dos servidores públicos, as leis federais não têm natureza de norma geral”. Por outro lado, deve ser aplicado, na hipótese, a tese fixada no Tema 782(RE 778.889/PE, Rel. Min. Roberto Barroso, j. 10/03/2016, DJe 01/08/2016), que impede a diferenciação da concessão da licença-paternidade em função da natureza da filiação (biológica ou adotiva), ou em função da idade do adotado (se criança ou adolescente). Pedido parcialmente procedente. 9. Mérito. Não cabe ao Poder Judiciário fixar a possibilidade de compartilhamento do período de licença parental entre os cônjuges ou companheiros, considerando a ausência de obrigação constitucional nesse sentido e a liberdade de conformação do legislador. Precedentes (ADI nº 7.518, Rel. Min. Gilmar Mendes,j. 16/09/2024, DJe 02/10/2024). Pedido improcedente. IV. Dispositivo e tese 10. ADI parcialmente conhecida e, nesta parte, parcialmente procedente para: 10.1 Declarar a nulidade parcial, sem redução de texto, dos artigos 7º, caput e inciso II, e 8º da Lei Complementar estadual nº 121/2011, bem como do artigo 2º da Lei nº 18.879/2010, fixando que: (i) as servidoras do Estado de Minas Gerais, independentemente da natureza do vínculo com a Administração Pública (estatuário, comissionado ou temporário; civil ou militar), possuem o direito à licença-maternidade; e que (ii)o prazo para fruição da licença deve ser concedido de acordo com a respectiva lei estadual que regule a contratação comissionada ou temporária, ou, eventualmente, a legislação trabalhista que incida sobre o caso, na hipótese de vínculo não-administrativo. 10.2. Dar interpretação conforme à Constituição ao art. 59-A da Constituição do Estado de Minas Gerais e aos artigos 2º e 3º da Lei Complementar nº 165/2021, a fim de: (i) declarar inconstitucional qualquer interpretação ao art. 59-A da Constituição do Estado de Minas Gerais que diferencie a concessão da licença-paternidade ao Deputado estadual em caso de paternidade biológica ou de adoção (ou, ainda, de guarda judicial para fins de adoção); e (ii) declarar que a palavra “criança” que consta dos artigos 2º e 3º da Lei Complementar nº 165/2021, deve ser interpretada como “criança ou adolescente”, a fim de evitar a fixação de prazos diversos em função da idade do adotado Tese de julgamento:1. A servidora pública gestante tem direito ao gozo de licença-maternidade, independentemente do regime jurídico aplicável, se contratual ou administrativo, ainda que ocupe cargo em comissão ou seja contratada por tempo determinado. 2. O prazo para fruição da licença-maternidade pelas servidoras públicas em cargo comissionado ou contratadas temporariamente deve ser concedido de acordo com a respectiva lei estadual que regule a contratação comissionada ou temporária, ou, eventualmente, a legislação trabalhista que incida sobre o caso, na hipótese de vínculo não-administrativo. 3. Não há como se adotar a legislação federal como paradigma para fixação do prazo da licença-paternidade no âmbito estadual, distrital ou municipal, pois, no que se refere ao regime jurídico dos servidores públicos, as leis federais não têm natureza de norma geral. 4. É inconstitucional qualquer interpretação ou ato normativo que diferencie a concessão de licença-paternidade em caso de paternidade biológica ou em caso de adoção (ou, ainda, de guarda judicial para fins de adoção), bem como que fixe prazo diferenciado em função da idade do adotado. 5. Não cabe ao Poder Judiciário fixar a possibilidade de compartilhamento do período de licença parental entre os cônjuges ou companheiros, considerando a ausência de obrigação constitucional nesse sentido e a liberdade de conformação do legislador. _________ Dispositivos relevantes citados: art. 7º, XIX, da CF; art. 10, § 1º, do ADCT; art. 22, I, da CF; art. 208 da Lei nº 8.112/1990; Decreto nº 8.737/2016; art. 227 da CF; art. 5º, I, da CF; art. 6º e 203 da CF; art. 226 da CF; Leis Complementares estaduais nº 121/2011 e 18.879/2010 e Constituição do Estado de Minas Gerais. Jurisprudência relevante citada: RE 842.844/SC; RE 778.889/PE; RE 1.211.446/SP; RE 1.348.854/SP; ADI 7.518; ADI 7.520; ADI 7.528; ADI 7.543; ADI 6.579; ADI 7.522; ADI 7.531; ADO 20.
Decisão
O Tribunal, por unanimidade, conheceu parcialmente da presente ação direta de inconstitucionalidade e, na parte conhecida, julgou parcialmente procedentes os pedidos, para: a) Declarar a nulidade parcial, sem redução de texto, dos artigos 7º, caput e inciso II, e 8º da Lei Complementar estadual nº 121/2011, bem como do artigo 2º da Lei nº 18.879/2010, fixando que: (i) as servidoras do Estado de Minas Gerais, independentemente da natureza do vínculo com a Administração Pública (estatuário, comissionado ou temporário; civil ou militar), possuem o direito à licença-maternidade; e que (ii) o prazo para fruição da licença deve ser concedido de acordo com a respectiva lei estadual que regule a contratação comissionada ou temporária, ou, eventualmente, a legislação trabalhista que incida sobre o caso, na hipótese de vínculo não-administrativo; e b) Dar interpretação conforme à Constituição ao art. 59-A da Constituição do Estado de Minas Gerais e aos artigos 2º e 3º da Lei Complementar nº 165/2021, a fim de: (i) declarar inconstitucional qualquer interpretação ao art. 59-A da Constituição do Estado de Minas Gerais que diferencie a concessão da licença-paternidade ao Deputado estadual em caso de paternidade biológica ou de adoção (ou, ainda, de guarda judicial para fins de adoção); e (ii) declarar que a palavra “criança”, que consta dos artigos 2º e 3º da Lei Complementar nº 165/2021, deve ser interpretada como “criança ou adolescente”, a fim de evitar a fixação de prazos diversos em função da idade do adotado. Por fim, fixou as seguintes teses de julgamento: a) A servidora pública gestante tem direito ao gozo de licença-maternidade, independentemente do regime jurídico aplicável, se contratual ou administrativo, ainda que ocupe cargo em comissão ou seja contratada por tempo determinado; b) É inconstitucional qualquer interpretação ou ato normativo que diferencie a concessão de licença-paternidade em caso de paternidade biológica ou em caso de adoção (ou, ainda, de guarda judicial para fins de adoção), bem como que fixe prazo diferenciado em função da idade do adotado; c) Não cabe ao Poder Judiciário fixar a possibilidade de compartilhamento do período de licença parental entre os cônjuges ou companheiros, considerando a ausência de obrigação constitucional nesse sentido e a liberdade de conformação do legislador. Tudo nos termos do voto do Relator. Os Ministros Flávio Dino e Edson Fachin acompanharam o Relator com ressalvas. Plenário, Sessão Virtual de 14.2.2025 a 21.2.2025.
Tese
a) A servidora pública gestante tem direito ao gozo de licença-maternidade, independentemente do regime jurídico aplicável, se contratual ou administrativo, ainda que ocupe cargo em comissão ou seja contratada por tempo determinado; b) É inconstitucional qualquer interpretação ou ato normativo que diferencie a concessão de licença-paternidade em caso de paternidade biológica ou em caso de adoção (ou, ainda, de guarda judicial para fins de adoção), bem como que fixe prazo diferenciado em função da idade do adotado; c) Não cabe ao Poder Judiciário fixar a possibilidade de compartilhamento do período de licença parental entre os cônjuges ou companheiros, considerando a ausência de obrigação constitucional nesse sentido e a liberdade de conformação do legislador.