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Jurisprudência STF 7192 de 13 de Junho de 2024

Publicado por Supremo Tribunal Federal


Título

ADI 7192

Classe processual

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE

Relator

LUIZ FUX

Data de julgamento

20/05/2024

Data de publicação

13/06/2024

Orgão julgador

Tribunal Pleno

Publicação

PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 12-06-2024 PUBLIC 13-06-2024

Partes

REQTE.(S) : ASSOCIACAO NACIONAL DOS MEMBROS DO MINISTERIO PUBLICO - CONAMP ADV.(A/S) : ARISTIDES JUNQUEIRA ALVARENGA ADV.(A/S) : JULIANA MOURA ALVARENGA DILASCIO INTDO.(A/S) : PRESIDENTE DA REPÚBLICA PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO INTDO.(A/S) : CONGRESSO NACIONAL PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO AM. CURIAE. : ASSOCIACAO DOS DELEGADOS DE POLICIA DO BRASIL ADV.(A/S) : OPHIR FILGUEIRAS CAVALCANTE JUNIOR E OUTRO(A/S)

Ementa

EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTIGO 21, § 1º, DA LEI 14.344, DE 24 DE MAIO DE 2022. REQUISIÇÃO POR AUTORIDADE POLICIAL DE PROPOSITURA DE AÇÃO CAUTELAR DE ANTECIPAÇÃO DE PROVAS PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. AUTONOMIA INSTITUCIONAL E INDEPENDÊNCIA FUNCIONAL. NATUREZA DE SOLICITAÇÃO, SEM CARÁTER COGENTE. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE CONHECIDA E JULGADO PARCIALMENTE PROCEDENTE O PEDIDO. INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO. 1. O artigo 21, § 1º, da Lei n. 14.344/2022, prevê que a autoridade policial poderá requisitar ao Ministério Público a propositura de ação cautelar de antecipação de produção de prova nas causas que envolvam violência contra a criança e o adolescente. 2. A tutela penal de crianças e adolescentes deve levar em consideração o aspecto informacional, isto é, a origem da notícia de atos lesivos às autoridades competentes. A controvérsia reside no emprego do termo “requisitar”, usualmente interpretado como “determinar”. Questiona-se, assim, a possibilidade de a lei prever que a autoridade policial pode determinar ao Ministério Público a propositura de ação cautelar de antecipação de provas em caso de notícia de violência contra vítimas menores de idade. 3. A intervenção criminal envolve a busca de informações, por agentes públicos, sobre a ocorrência de atos ilícitos, sem prejuízo de notícias fornecidas por particulares e pelas próprias vítimas. O modelo de órgãos públicos incumbidos de reportar atos lesivos tem especial relevância ao se tratar de violência contra crianças e adolescentes, pois, além do medo de represália e a necessidade de identificação dos infratores, há as dificuldades inerentes a essa fase do desenvolvimento até mesmo para identificação de situações configuradoras de violência e para expressar a condição de vítima. Por isso, deve-se maximizar a amplitude de fontes de informações sobre essa prática nefasta. 4. O Ministério Público é instituição essencial à Justiça, dotada pela Constituição da República de autonomia para defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. Incumbe-lhe promover, privativamente, a ação penal pública, com independência funcional de cada um de seus membros para o desempenho de seu mister, conforme os artigos 127, caput e §§ 1º e 2º, e 129, I, da Constituição. Com a conformação constitucional dessa instituição, não é possível a subordinação de sua atuação a outros órgãos ou autoridades públicas. 5. A Polícia Judiciária, que exerce relevante função vinculada à segurança pública, pode e deve provocar o Ministério Público quando entender necessária a sua atuação. Conforme a arquitetura constitucional do sistema de persecução penal, o Ministério Público exerce a função de controle externo dos órgãos policiais, não sendo possível que a legislação subordine a atuação daquela instituição ao entendimento da Polícia Judiciária. 6. A palavra “requisitar”, utilizada no artigo 21, § 1º, da Lei n. 14.344/2022, para se referir à provocação de atuação do Ministério Público pela autoridade policial tem o sentido comumente interpretado no âmbito processual penal como o de “dar ordem”, “determinar”. É possível, contudo, que seja compreendido como “solicitar”, “requerer”, dada a polissemia do vocábulo. 7. A natureza não cogente da provocação, proveniente da autoridade policial, deriva da autonomia concedida por norma constitucional ao Ministério Público. Além disso, a Constituição prevê que o controle externo da atividade policial é atribuição do Ministério Público, de modo que não pode haver subordinação deste órgão em relação à Polícia Judiciária. 8. A autonomia institucional e a independência funcional do Ministério Público não retiram o caráter obrigatório de sua atuação em casos de violência contra a criança ou adolescente, o que se infere inclusive do sistema de responsabilização dos membros do Ministério Público em caso de descumprimento dos deveres funcionais. 9. Ação direta de inconstitucionalidade julgada parcialmente procedente para conferir interpretação conforme ao artigo 21, § 1º, da Lei n. 14.344, de 24 de maio de 2022, de modo a assentar que o Delegado pode solicitar ao Ministério Público a propositura de ação cautelar de antecipação de produção de prova nas causas que envolvam violência contra a criança e o adolescente, cabendo ao membro desta última instituição avaliar se entende ser o caso de atuação, nos limites de sua independência funcional e observados os deveres que lhe são inerentes.

Decisão

O Tribunal, por unanimidade, julgou parcialmente procedente a ação direta de inconstitucionalidade, para conferir interpretação conforme ao artigo 21, § 1º, da Lei n. 14.344, de 24 de maio de 2022, e assentar que o Delegado pode solicitar ao Ministério Público a propositura de ação cautelar de antecipação de produção de prova nas causas que envolvam violência contra a criança e o adolescente, cabendo ao membro desta última instituição avaliar se entende ser o caso de atuação, nos limites de sua independência funcional e observados os deveres que lhe são inerentes, tudo nos termos do voto do Relator. O Ministro Gilmar Mendes acompanhou o Relator com ressalvas. Plenário, Sessão Virtual de 10.5.2024 a 17.5.2024.

Indexação

- FINALIDADE, PERSECUÇÃO PENAL, PROTEÇÃO, VÍTIMA, REPRESSÃO DO CRIME, OBSERVÂNCIA, DEVIDO PROCESSO LEGAL. DADO, CRIANÇA, ADOLESCENTE, VÍTIMA, VIOLÊNCIA. PRECEDENTE, STF, NATUREZA JURÍDICA, REQUISIÇÃO, MINISTRO DA JUSTIÇA, ATUAÇÃO, MINISTÉRIO PÚBLICO, AÇÃO PENAL PÚBLICA. INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO, DOUTRINA. ENTENDIMENTO, STF, HIPÓTESE, DESNECESSIDADE, INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO. - RESSALVA DE ENTENDIMENTO, MIN. GILMAR MENDES: VIOLÊNCIA, VÍTIMA, CRIANÇA, ADOLESCENTE, AUTORIDADE POLICIAL, REQUISIÇÃO, PROPOSITURA, AÇÃO CAUTELAR, ANTECIPAÇÃO, PRODUÇÃO DE PROVA, AUSÊNCIA, PROPOSITURA, AÇÃO CAUTELAR, DEVER, FUNDAMENTAÇÃO, MINISTÉRIO PÚBLICO.

Legislação

LEG-FED CF ANO-1988 ART-00005 INC-00059 ART-00127 "CAPUT" PAR-00001 PAR-00002 ART-00129 INC-00001 INC-00007 ART-0130A PAR-00002 ART-00142 ART-00144 "CAPUT" INC-00001 INC-00004 PAR-00001 INC-00001 INC-00004 PAR-00004 CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL LEG-FED LEI-014344 ANO-2022 ART-00021 PAR-00001 LEI ORDINÁRIA LEG-FED DEL-002848 ANO-1940 ART-00100 PAR-00001 CP-1940 CÓDIGO PENAL

Observação

- Acórdão(s) citado(s): (NATUREZA JURÍDICA, REQUISIÇÃO, MINISTRO DA JUSTIÇA, ATUAÇÃO, MINISTÉRIO PÚBLICO, AÇÃO PENAL PÚBLICA) HC 68242 (1ªT). (HIPÓTESE, DESNECESSIDADE, INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO) ADI 6855 (TP). - Veja Relatório Violência contra Crianças e Adolescentes (2019-2021) do FBSP. - Veja ADI 2943, ADI 3309 e ADI 3318 do STF. Número de páginas: 28. Análise: 04/07/2024, JAS.

Doutrina

FILOCRE, Lincoln D’Aquino. Direito Policial Moderno: Polícia de Segurança Pública no Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Almedina, 2017. p. 39. GUASTINI, Riccardo. Interpretar e argumentar. 2. reimp. Belo Horizonte: Editora D’Plácido, 2021. p. 34. MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime Jurídico do Ministério Público. 8. ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Saraiva, 2014. p. 136-137. MIRANDA, Jorge. Fiscalização de constitucionalidade. 2. ed. Coimbra: Almedina, 2022. p. 85. PEYROU-PISTOULEY, Sylvie. La cour constitutionnelle et le contrôle de la constitutionnalité de lois en Autriche. Paris: Economica, 1993. p. 337. TORNAGHI, Hélio. Instituições de processo penal. 1. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1959. v. 2 p. 143. SHAVELL, Steven. The Optimal structure of law enforcement. Journal of Law & Economics, vol. XXXVI, April 1993. p. 260 e 278.


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