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Jurisprudência STF 5818 de 05 de Agosto de 2022

Publicado por Supremo Tribunal Federal


Título

ADI 5818

Classe processual

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE

Relator

RICARDO LEWANDOWSKI

Data de julgamento

16/05/2022

Data de publicação

05/08/2022

Orgão julgador

Tribunal Pleno

Publicação

PROCESSO ELETRÔNICO DJe-155 DIVULG 04-08-2022 PUBLIC 05-08-2022

Partes

REQTE.(S) : PROCURADORA-GERAL DA REPÚBLICA INTDO.(A/S) : GOVERNADOR DO ESTADO DO CEARÁ PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DO ESTADO DO CEARÁ INTDO.(A/S) : ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO CEARÁ ADV.(A/S) : SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS

Ementa

EMENTA Ação direta de inconstitucionalidade. Artigo 4º, parágrafo único, da Lei nº 11.449, de 2 de junho de 1988, do Estado do Ceará, inserido pela Lei nº 11.551 do referido Estado, de 18 de maio de 1989. Isenção da taxa de inscrição em concursos públicos concedida aos servidores públicos estaduais. Violação do princípio da isonomia ou igualdade. Procedência do pedido. 1. O princípio da igualdade situa-se no âmbito dos direitos e garantias fundamentais, traduzindo-se em valor regente, informativo e irradiante da ordem constitucional e, por conseguinte, de todo o ordenamento jurídico. Nessa esteira, no caput do art. 5º da Constituição Federal consta o preceito de que todos são iguais perante a lei, o que reverbera ao longo do texto constitucional, importando não só a proibição de todas as formas de discriminação, como também a submissão de todos os indivíduos ao amparo e à força da lei de forma isonômica. 2. A noção de igualdade não se encerra em sua dimensão meramente formal, de igualdade perante a lei. Ela contempla ainda um caráter material, pelo qual se busca concretizar a justiça social e os outros objetivos fundamentais da República (art. 3º da CRFB/88). É com base nesse viés material que a lei eventualmente estabelece distinções a fim de compensar os indivíduos que se encontram em situação desprivilegiada para elevá-los ao patamar dos demais. 3. No caso em apreço, o critério utilizado pela norma para a isenção da taxa de inscrição nos concursos públicos estaduais é a existência da qualidade de servidor público estadual. Além de não haver correlação lógica entre o fator de discriminação escolhido pelo Estado do Ceará e o tratamento desigual estipulado pela norma, esse tratamento desigual também não se justifica à luz do ordenamento constitucional. 4. Ao conceder a isenção a uma categoria que teria condições de arcar com os custos da inscrição no certame, o Estado amplia a desvantagem daqueles que, por insuficiência de recursos, não conseguem pagar tal quantia – e, portanto, sequer têm a chance de concorrer por um cargo na Administração estadual –, restringindo, consequentemente, o acesso à via do concurso público. A porta de entrada para o concurso público deve ser igualmente acessível a todos os cidadãos, sendo válidas as medidas que fomentem essa igualdade de acesso, e não as que ampliem a desigualdade entre os possíveis candidatos. 5. A categoria beneficiada pela norma ora impugnada não vê sua participação em concursos públicos obstada pela exigência do pagamento da taxa de inscrição. Consequentemente, a medida ora analisada não tem a finalidade de promover a igualdade substancial, ou seja, não está voltada à mitigação de uma discriminação ou de uma desigualdade constatada na sociedade. 6. Não se constata a cogitada correlação entre a facilitação da inscrição para servidores públicos e o princípio da eficiência. É que, de um lado, esse benefício não se presta para motivar tais servidores a continuar estudando, a participar de ações de formação continuada e/ou a se preparar para outros certames no âmbito do Estado; de outro, há outras formas de fomentar o bom desempenho no mister público e de valorizar a categoria, o que, porém, não pode se dar pela quebra de isonomia no acesso ao certame. 7. O fato de a taxa de concurso público não ostentar feição tributária não quer dizer que a concessão da sua isenção estaria inserida em um espaço de completa discricionariedade. Nada obriga o Estado a conceder uma isenção dessa natureza, porém, ao fazê-lo, não está autorizado a privilegiar determinados grupos de forma anti-isonômica. Isso porque todo e qualquer ato da Administração Pública se encontra submetido à tábua axiológica da Constituição. Inexistindo justificação razoável para a concessão da isenção, como no caso da lei cearense, a medida importa em privilégio incompatível com a ordem constitucional. 8. O Supremo Tribunal Federal tem o concurso público como mecanismo que, por excelência, proporciona a realização concreta dos princípios constitucionais da isonomia e da impessoalidade, motivo pelo qual, em várias ocasiões, declarou a inconstitucionalidade de normas que veiculavam quebra da igualdade entre os candidatos (v.g., ADI nº 1.350/RO, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 1º/12/06; ADI nº 2.949/MG, Tribunal Pleno, Rel. Min. Joaquim Barbosa, red. do ac. Min. Marco Aurélio, DJe de 28/5/15; ADI nº 2.364/AL, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, DJe 7/3/19; ADI nº 3.522/RS, Tribunal Pleno, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ de 12/5/06; e ADI nº 5.776/BA, Tribunal Pleno, Rel. Min. Alexandre de Moraes, DJe de 3/4/19). De outro lado, a Suprema Corte também tem proclamado a constitucionalidade de normas que, com fulcro na ideia de igualdade material, instituem benefício em favor de grupo social desfavorecido (v.g., ADI nº 2.177, Tribunal Pleno, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 17/10/19; ADPF nº 186, Tribunal Pleno, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe de 20/10/14; ADI nº 2.672, Tribunal Pleno, Rel. Min. Ellen Gracie, red. do ac. Min. Ayres Britto, DJ de 10/11/06). 9. A norma estadual questionada não se amolda às hipóteses excepcionais mencionadas, pois promove o agrupamento de candidatos em dois grupos bem distintos – os que já são servidores públicos e os que não o são – e concede preferência apenas ao primeiro grupo, resultando em um desarrazoado discrímen, desprovido de fundamento jurídico. 10. Pedido julgado procedente para declarar a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 4º da Lei estadual nº 11.449, de 2 de junho de 1988, inserido pela Lei nº 11.551, de 18 de maio de 1989, do Estado do Ceará.

Decisão

Após o voto do Ministro Ricardo Lewandowski (Relator), que julgava improcedente a ação direta, no que foi acompanhado pelos Ministros Alexandre de Moraes e Marco Aurélio, pediu vista dos autos o Ministro Dias Toffoli. Plenário, Sessão Virtual de 11.6.2021 a 18.6.2021. Decisão: O Tribunal, por maioria, julgou procedente o pedido formulado na ação direta, para declarar a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 4º da Lei nº 11.449, de 2 de junho de 1988, inserido pela Lei nº 11.551, de 18 de maio de 1989, do Estado do Ceará, nos termos do voto do Ministro Dias Toffoli, Redator para o acórdão, vencidos os Ministros Ricardo Lewandowski (Relator), Alexandre de Moraes, Marco Aurélio, que votara em assentada anterior, e o Ministro Nunes Marques. Não votou o Ministro André Mendonça, sucessor do Ministro Marco Aurélio. Plenário, Sessão Virtual de 6.5.2022 a 13.5.2022.

Indexação

- VOTO VENCIDO, MIN. RICARDO LEWANDOWSKI: INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL, INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL, INOCORRÊNCIA. CONSTITUIÇÃO FEDERAL, PRINCÍPIO DO CONCURSO PÚBLICO, PRINCÍPIO DA ISONOMIA. AUSÊNCIA, OFENSA, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, CONCESSÃO, LEI ESTADUAL, ISENÇÃO, PAGAMENTO, TAXA, INSCRIÇÃO, CONCURSO PÚBLICO, SERVIDOR PÚBLICO.

Legislação

LEG-FED CF ANO-1988 ART-00003 ART-00005 "CAPUT" INC-00013 ART-00006 "CAPUT" ART-00019 INC-00003 ART-00037 "CAPUT" INC-00001 INC-00002 ART-00061 PAR-00001 ART-00170 INC-00008 CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL LEG-EST LEI-011449 ANO-1988 ART-00004 PAR-ÚNICO LEI ORDINÁRIA, CE LEG-EST LEI-011551 ANO-1989 LEI ORDINÁRIA, CE LEG-EST LEI-006663 ANO-2001 LEI ORDINÁRIA, ES

Observação

- Acórdão(s) citado(s): (CONCURSO PÚBLICO, PRINCÍPIO DA ISONOMIA, PRINCÍPIO DA IMPESSOALIDADE, CANDIDATO) ADI 1350 (TP), ADI 2177 (TP), ADI 2364 (TP), ADI 2672 (TP), ADI 2949 (TP), ADI 3522 (TP), ADI 5776 (TP). (NORMA, IGUALDADE, CARÁTER MATERIAL) ADI 2177 (TP), ADI 2672 (TP), ADPF 186 (TP). (CONSTITUCIONALIDADE, LEI ESTADUAL, ISENÇÃO, TAXA, INSCRIÇÃO, CONCURSO PÚBLICO, CANDIDATO, DESEMPREGADO) ADI 2672 (TP). (LEI ESTADUAL, CONCESSÃO, BENEFÍCIO, MEIA-ENTRADA, DOADOR, SANGUE) ADI 3512 (TP). (LEI ESTADUAL, CONCESSÃO, ISENÇÃO, TAXA, INSCRIÇÃO, CONCURSO PÚBLICO) RE 396468 AgR (1ªT). (LEI ESTADUAL, CONCESSÃO, ISENÇÃO, TAXA, INSCRIÇÃO, CONCURSO PÚBLICO, SERVIDOR PÚBLICO) RE 456722 AgR (1ªT), RE 467722 AgR (2ªT). (CONSTITUCIONALIDADE, COTA RACIAL, SELEÇÃO, INSTITUIÇÃO FEDERAL DE ENSINO SUPERIOR) ADPF 186 (TP). - Legislação estrangeira citada: Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão francesa, promulgada em 26/8/1789. Número de páginas: 36. Análise: 23/02/2023, MAV.

Doutrina

BARBOSA, Ruy. Oração dos Moços apud MENEZES, Paulo Lucena de. A ação afirmativa (affirmative action) no direito norteamericano. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 153-154. MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 10. MOTTA. Fabrício. Direito público moderno. Belo Horizonte: Del Rey, 2003.


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