Jurisprudência STF 292 de 27 de Julho de 2020
Publicado por Supremo Tribunal Federal
Título
ADPF 292
Classe processual
ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL
Relator
LUIZ FUX
Data de julgamento
01/08/2018
Data de publicação
27/07/2020
Orgão julgador
Tribunal Pleno
Publicação
PROCESSO ELETRÔNICO DJe-185 DIVULG 24-07-2020 PUBLIC 27-07-2020
Partes
REQTE.(S) : PROCURADORA-GERAL DA REPÚBLICA INTDO.(A/S) : MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO ADV.(A/S) : ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO
Ementa
Ementa: ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. ARTS. 2º E 3º DA RESOLUÇÃO 1, DE 14 DE JANEIRO DE 2010, E ARTS. 2º A 4º DA RESOLUÇÃO 6, DE 20 DE OUTUBRO DE 2010, DA CÂMARA DE EDUCAÇÃO BÁSICA (CEB) DO CONSELHO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (CNE). ALEGAÇÃO DE OFENSA REFLEXA À CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. NÃO CONFIGURAÇÃO. MÉRITO. CORTE ETÁRIO PARA MATRÍCULA NO ENSINO INFANTIL E NO ENSINO FUNDAMENTAL. CONSTITUCIONALIDADE. AFRONTA AO PRINCÍPIO DA ISONOMIA. NÃO OCORRÊNCIA. VIOLAÇÃO AO PRECEITO DA ACESSIBILIDADE À EDUCAÇÃO INFANTIL. NÃO OCORRÊNCIA. DISCRICIONARIEDADE DO ADMINISTRADOR PÚBLICO. CRITÉRIO DEFINIDO COM AMPLA PARTICIPAÇÃO TÉCNICA E SOCIAL. GESTÃO DEMOCRÁTICA DO ENSINO PÚBLICO. PEDIDO IMPROCEDENTE. 1. As Resoluções CNE/CEB nº 1/2010 e 6/2010, ao estabelecerem um critério único e objetivo para o ingresso às séries iniciais da Educação Infantil e do Ensino Fundamental da criança que tenha, respectivamente, quatro e seis anos de idade, completos até o dia 31 de março do ano em que ocorrer a matrícula, não violam os princípios da isonomia, da proporcionalidade e do acesso à educação. 2. A efetividade das normas consagradoras do direito à educação encontrou suporte nas alterações promovidas pelo constituinte derivado, por meio das Emendas Constitucionais nº 53/2006 e 59/2009, que ampliaram a educação obrigatória a partir dos quatro anos de idade e substituiram o critério da etapa de ensino pelo critério da idade do aluno. 3. A democratização do acesso à leitura, à escrita e ao conhecimento, na primeira infância, acarreta diversos benefícios individuais e sociais, como melhores resultados no desempenho acadêmico, produtividade econômica, cidadania responsável e combate à miséria intelectual intergeracional. 4. A faixa etária não é estabelecida entre as etapas do sistema de ensino porque o que importa é que à criança entre quatro e dezessete anos seja assegurado o acesso à educação, de acordo com sua capacidade, o que não gera inconstitucionalidade na regulamentação da transição entre as etapas de ensino (art. 208, I e IV, da CRFB). 5. Cabe ao poder público desenhar as políticas educacionais conforme sua expertise, estabelecidas as balizas pretendidas pelo constituinte. 5.1 A uniformização da política instituída visa a permitir um percurso escolar contínuo entre os diversos sistemas de ensino e, consoante refletem diversos estudos pedagógicos específicos, permite à criança vivenciar cada etapa de acordo com sua faixa etária. 5.2 Os critérios universalizáveis para o ingresso no ensino fundamental, de cunho impessoal e genérico, são imperiosos em sede de política pública. 5.3 É que a tomada de decisão baseada em regras considera a possibilidade de erros de subinclusão e sobreinclusão e prestigia a teoria da segunda melhor opção (second best), que preserva as virtudes de certeza, segurança, previsibilidade, eficiência, separação de poderes e prevenção de erros de decisão. 6. O corte etário, mercê de não ser a única solução constitucionalmente possível, insere-se no espaço de conformação do administrador, sobretudo em razão da expertise do Conselho Nacional de Educação e de as resoluções terem sido expedidas com ampla participação técnica e social, em respeito à gestão democrática do ensino público (art. 206, VI, da CRFB). 7. As regras objetivas encerram notável segurança jurídica, por isso que a expressão “completos” é inerente a qualquer referência etária, sem que o esforço exegético de se complementar o que já está semanticamente definido possa desvirtuar a objetivação decorrente do emprego de número. 8. O acesso aos níveis mais elevados do ensino, segundo a capacidade de cada um, pode justificar o afastamento da regra em casos bastante excepcionais, a critério exclusivo da equipe pedagógica diretamente responsável pelo aluno, o que se mostra consentâneo com a “valorização dos profissionais da educação escolar” (art. 208, V, da CRFB e art. 206, V, da CRFB) e o apreço à pluralidade de níveis cognitivo-comportamentais em sala de aula. 9. In casu, não se faz necessário verificar a compatibilidade das resoluções expedidas pela Câmara de Educação Básica (CEB) do Conselho Nacional da Educação (CNE) com nenhuma outra norma infraconstitucional, senão diretamente com os parâmetros constitucionais de controle, sendo certo que os dispositivos legais a que fazem remissão apenas atribuem ao Poder Executivo poderes normativos para disciplinar o tema. 10. Pedido improcedente.
Decisão
Após o relatório e a sustentação oral, o julgamento foi suspenso. Falou, pela arguente, a Procuradora-Geral da República, Dra. Raquel Elias Ferreira Dodge. Ausentes, justificadamente, o Ministro Dias Toffoli, em face de participação, na qualidade de conferencista inaugural, no XXIII Congresso Brasileiro de Magistrados, em Maceió/AL, e, neste julgamento, o Ministro Gilmar Mendes. Presidência da Ministra Cármen Lúcia. Plenário, 24.5.2018. Decisão: Após o voto do Ministro Luiz Fux (Relator), julgando improcedente o pedido da arguição de descumprimento de preceito fundamental, no que foi acompanhado pelos Ministros Roberto Barroso, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes, e o voto do Ministro Edson Fachin, julgando parcialmente procedente o pedido, para declarar a inconstitucionalidade parcial das normas impugnadas, excluindo-se as expressões “completos até 31 de março”, constantes dos artigos 2º e 3º das Resoluções do Conselho Nacional de Educação, no que foi acompanhado pelos Ministros Alexandre de Moraes, Rosa Weber e Dias Toffoli, pediu vista dos autos o Ministro Marco Aurélio. Presidência da Ministra Cármen Lúcia. Plenário, 30.5.2018. Decisão: O Tribunal, por maioria e nos termos do voto do Ministro Luiz Fux (Relator), julgou improcedente o pedido. Vencidos os Ministros Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Rosa Weber, Dias Toffoli e Celso de Mello. Presidiu o julgamento a Ministra Cármen Lúcia. Plenário, 1º.8.2018.
Indexação
- VOTO VENCIDO, MIN. EDSON FACHIN: DIREITO FUNDAMENTAL, ACESSO À EDUCAÇÃO, PRINCÍPIO DO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. NORMA REGULAMENTADORA, RESTRIÇÃO, DIREITO SUBJETIVO, CRIANÇA, EDUCAÇÃO, INOBSERVÂNCIA, DIRETRIZ, CONSTITUIÇÃO FEDERAL. - VOTO VENCIDO, MIN. ALEXANDRE DE MORAES: CONSTITUIÇÃO FEDERAL, IMPLEMENTAÇÃO, IDADE, ANO LETIVO.
Legislação
LEG-FED CF ANO-1988 ART-00005 "CAPUT" ART-00006 "CAPUT" ART-00022 INC-00024 ART-00024 INC-00002 ART-00031 ART-00032 "CAPUT" ART-00060 PAR-00004 INC-00004 ART-00205 ART-00206 INC-00001 INC-00005 INC-00006 ART-00208 INC-00001 INC-00002 INC-00003 INC-00004 INC-00005 INC-00006 INC-00007 PAR-00001 PAR-00005 ART-00227 "CAPUT" PAR-00002 PAR-00003 CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL LEG-FED EMC-000007 ANO-2005 EMENDA CONSTITUCIONAL LEG-FED EMC-000053 ANO-2006 EMENDA CONSTITUCIONAL LEG-FED EMC-000059 ANO-2009 EMENDA CONSTITUCIONAL LEG-FED LEI-004024 ANO-1961 ART-00009 PAR-00001 LET-C LDBEN-1961 LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL LEG-FED LEI-009131 ANO-1995 ART-00007 LEI ORDINÁRIA LEG-FED LEI-009394 ANO-1996 ART-00008 PAR-00001 ART-00009 PAR-00001 ART-00024 INC-00002 LET-A LET-B LET-C ART-00029 ART-00030 ART-00031 INC-00001 INC-00002 INC-00003 INC-00004 INC-00005 ART-00032 "CAPUT" ART-00090 LDBEN-1996 LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL LEG-FED LEI-009882 ANO-1999 ART-00003 LEI ORDINÁRIA LEG-FED LEI-011274 ANO-2006 LEI ORDINÁRIA LEG-FED LEI-012796 ANO-2013 LEI ORDINÁRIA LEG-FED DEL-003689 ANO-1941 ART-00068 CPP-1941 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL LEG-FED RES-000001 ANO-2010 ART-00002 ART-00003 RESOLUÇÃO DA CÂMARA DE EDUCAÇÃO BÁSICA DO CONSELHO NACIONAL DA EDUCAÇÃO - CEB/CNE LEG-FED RES-000006 ANO-2010 ART-00002 ART-00003 ART-00004 RESOLUÇÃO DA CÂMARA DE EDUCAÇÃO BÁSICA DO CONSELHO NACIONAL DA EDUCAÇÃO - CEB/CNE LEG-FED RES-000033 ANO-2017 RESOLUÇÃO DA SECRETARIA DE EDUCAÇÃO - SE LEG-FED PEC-000536 ANO-1997 PROPOSTA DE EMENDA CONSTITUCIONAL LEG-FED PEC-000538 ANO-2006 PROPOSTA DE EMENDA CONSTITUCIONAL DA CÂMARA DOS DEPUTADOS - CD LEG-FED PEC-000267 ANO-2008 PROPOSTA DE EMENDA CONSTITUCIONAL DA CÂMARA DOS DEPUTADOS - CD LEG-FED PEC-00277A ANO-2008 PROPOSTA DE EMENDA CONSTITUCIONAL DA CÂMARA DOS DEPUTADOS - CD LEG-FED PRC-000039 ANO-2006 PARECER DO CONSELHO NACIONAL DA EDUCAÇÃO LEG-FED PRC-000020 ANO-2009 PARECER DA CÂMARA DE EDUCAÇÃO BÁSICA DO CONSELHO NACIONAL DA EDUCAÇÃO - CEB/CNE
Observação
- Veja ADC 17 do STF. Número de páginas: 117. Análise: 26/05/2021, JRS.
Doutrina
ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 586. ALMEIDA, Lciana Barros. Todos pela educação. Aprendendo em cada etapa, 31 de julho de 2015. BARCELLOS, Ana Paula de. “Constitucionalização das políticas públicas em matéria de direitos fundamentais: o controle político-social e o controle jurídico no espaço democrático. Revista de Direito do Estado, v. 3, n. 17, p. 34, 2006. BLOCH, Ernst. Prinzip Hoffnung. CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 1999. p. 1224. ______.______. Coimbra: Almedina, 2003. p. 519. CARVALHO, Rosita. Diversidade como paradigma de ação pedagógica na Educação. Revista da Educação Especial, MEC/SEESP, out. 2005. DIDONET, Vital. Desafios legislativos na revisão da LDB: aspectos gerais e a educação infantil. Insumos para o debate 2 Emenda Constitucional n.º 59/2009 e a educação infantil: impactos e perspectivas. São Paulo: Campanha Nacional pelo Direito à Educação, 2010. p. 28. HÄBERLE, Peter. El Estado Constitucional. Tradução: Héctor Fix-Fierro. México D.F: Universidad Autónoma de México, 2001. p. 7. HECKMAN, James J.; MOSSO, Stefano. The economics of human development and social mobility. Annu Rev Econom., v. 6, n. 1, p. 689-733, 2014. JONAS, Hans. Das Prinzip Verantwortung. p. 63-64 e 271-272. JORDÃO, Eduardo. Controle Judicial de uma Administração Pública Complexa. São Paulo: Malheiros, 2016. p. 165. MALTA, Maria A educação infantil como Direito. Insumos para o debate 2 Emenda Constitucional n.º 59/2009 e a educação infantil: impactos e perspectivas. São Paulo: Campanha Nacional pelo Direito à Educação, 2010. p. 13. OSSENBÜHL, Fritz. Kontrolle von Tatsachenfeststellungen und Prognosenentscheidungen durch das Bundesverfassungsgericht. In: STARCK, Christian (Org.). Bundesverfassungsgericht und Grundgesetz, v. I. p. 461. PHILIPPI, Klaus Jürgen, Tatsachenfeststellungen des Bundesverfassungsgerichts. Colônia, 1971. p. 2, 27 et seq. ROCHA, Eloisa. A pesquisa em educação infantil: trajetória recente de consolidação de uma pedagogia da educação infantil. Florianópolis: Centro de Ciências da Educação, 1999. ROSE-ACKERMAN, Susan. Análise Econômica Progressista do Direito e o Novo Direito Administrativo. In: MATTOS, Paulo (Coord.). Regulação Econômica e Democracia: o Debate Norte-Americano. São Paulo: Ed. 34, 2004. p. 250. SARLET, Ingo Wolfgang. Linhas mestras da interpretação constitucional. In: SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel (Coord.). Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2017. p. 229. SCHAUER, Frederick. Playing by the rules: A philosophical examination of rule-based decision-making in law and in life. Clarendon Press, 1991. SUNSTEIN, Cass. Constitutional Personae: Heroes, Soldiers, Minimalists, and Mutes. Oxford: Oxford University Press, 2015. p. xv-xvi.