Jurisprudência STF 1309642 de 02 de Abril de 2024

Publicado por Supremo Tribunal Federal


Título

ARE 1309642

Classe processual

RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO

Relator

LUÍS ROBERTO BARROSO

Data de julgamento

01/02/2024

Data de publicação

02/04/2024

Orgão julgador

Tribunal Pleno

Publicação

PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-s/n DIVULG 01-04-2024 PUBLIC 02-04-2024

Partes

RECTE.(S) : MARIA CECILIA NISPECHE DA SILVA ADV.(A/S) : AGEU LIBONATI JUNIOR ADV.(A/S) : ALEX LIBONATI RECDO.(A/S) : SONIA MARIA RAYES PEREIRA E OUTRO(A/S) ADV.(A/S) : MARCELO AUGUSTO DE SOUZA GARMS ADV.(A/S) : RODRIGO LOPES GARMS ADV.(A/S) : HERALDO GARCIA VITTA AM. CURIAE. : INSTITUTO BRASILEIRO DE DIREITO DE FAMÍLIA (IBDFAM) ADV.(A/S) : MARIA BERENICE DIAS ADV.(A/S) : RONNER BOTELHO SOARES ADV.(A/S) : MARIA LUIZA POVOA CRUZ AM. CURIAE. : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO AM. CURIAE. : ASSOCIAÇÃO DE DIREITO DE FAMÍLIA E DAS SUCESSÕES (ADFAS) ADV.(A/S) : REGINA BEATRIZ TAVARES DA SILVA ADV.(A/S) : MONICA DEL ROSSO SCRASSULO ADV.(A/S) : CARLOS ALBERTO GARBI ADV.(A/S) : CAIO CHAVES MORAU ADV.(A/S) : VENCESLAU TAVARES COSTA FILHO ADV.(A/S) : DANILO PORFIRIO DE CASTRO VIEIRA ADV.(A/S) : MARCO ANTONIO DA COSTA SABINO AM. CURIAE. : INSTITUTO DOS ADVOGADOS BRASILEIROS (IAB) ADV.(A/S) : LUIZ PAULO VIEIRA DE CARVALHO ADV.(A/S) : PEDRO TEIXEIRA PINOS GRECO AM. CURIAE. : DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO PROC.(A/S)(ES) : DEFENSOR PÚBLICO-GERAL FEDERAL

Ementa

Ementa: Direito Constitucional e Civil. Recurso extraordinário com agravo. Repercussão geral. Separação obrigatória de bens nos casamentos e uniões estáveis com pessoa maior de setenta anos. Interpretação conforme a Constituição. I. O caso em exame 1. O recurso. Recurso extraordinário com agravo e repercussão geral reconhecida contra decisão que considerou constitucional o art. 1.641, II, do Código Civil e estendeu sua aplicação às uniões estáveis. O referido dispositivo prevê a obrigatoriedade do regime de separação de bens no casamento de pessoa maior de setenta anos. 2. O fato relevante. Companheira em união estável postula participação na sucessão de seu falecido companheiro em igualdade de condições com os herdeiros necessários. 3. As decisões anteriores. O juiz de primeiro grau considerou inconstitucional o dispositivo do Código Civil e reconheceu o direito da companheira em concorrência com os herdeiros. O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo reformou a decisão, considerando a norma que impõe a separação obrigatória de bens válida. II. A questão jurídica em discussão 4. O presente recurso discute duas questões: (i) a constitucionalidade do dispositivo que impõe o regime da separação de bens aos casamentos com pessoa maior de setenta anos; e (ii) a aplicação dessa regra às uniões estáveis. III. A solução do problema 5. O dispositivo aqui questionado, se interpretado de maneira absoluta, como norma cogente, viola o princípio da dignidade da pessoa humana e o da igualdade. 6. O princípio da dignidade humana é violado em duas de suas vertentes: (i) da autonomia individual, porque impede que pessoas capazes para praticar atos da vida civil façam suas escolhas existenciais livremente; e (ii) do valor intrínseco de toda pessoa, por tratar idosos como instrumentos para a satisfação do interesse patrimonial dos herdeiros. 7. O princípio da igualdade, por sua vez, é violado por utilizar a idade como elemento de desequiparação entre as pessoas, o que é vedado pelo art. 3º, IV, da Constituição, salvo se demonstrado que se trata de fundamento razoável para realização de um fim legítimo. Não é isso o que ocorre na hipótese, pois as pessoas idosas, enquanto conservarem sua capacidade mental, têm o direito de fazer escolhas acerca da sua vida e da disposição de seus bens. 8. É possível, todavia, dar interpretação conforme a Constituição ao art. 1.641, II, do Código Civil, atribuindo-lhe o sentido de norma dispositiva, que deve prevalecer à falta de convenção das partes em sentido diverso, mas que pode ser afastada por vontade dos nubentes, dos cônjuges ou dos companheiros. Ou seja: trata-se de regime legal facultativo e não cogente. 9. A possibilidade de escolha do regime de bens deve ser estendida às uniões estáveis. Isso porque o Supremo Tribunal Federal entende que “[n]ão é legítimo desequiparar, para fins sucessórios, os cônjuges e os companheiros, isto é, a família formada pelo casamento e a formada por união estável” (RE 878.694, sob minha relatoria, j. em 10.05.2017). 10. A presente decisão tem efeitos prospectivos, não afetando as situações jurídicas já definitivamente constituídas. É possível, todavia, a mudança consensual de regime, nos casos em que validamente admitida (e.g., art. 1.639, § 2º, do Código Civil). 11. No caso concreto, como não houve manifestação do falecido, que vivia em união estável, no sentido de derrogação do art. 1.641, II, do Código Civil, a norma é aplicável. IV. Dispositivo e tese 12. Recurso extraordinário a que se nega provimento. Tese de julgamento: “Nos casamentos e uniões estáveis envolvendo pessoa maior de 70 anos, o regime de separação de bens previsto no art. 1.641, II, do Código Civil pode ser afastado por expressa manifestação de vontade das partes, mediante escritura pública”. __________ Atos normativos citados: Constituição Federal, arts. 1º, III; 3º, IV; 5º, I, X; 226, § 3º; 230, e Código Civil, arts. 1.641, II; e 1.639, § 2º. Jurisprudência citada: RE 878.694 (2017), Rel. Min. Luís Roberto Barroso.

Decisão

Após a leitura do relatório e a realização das sustentações orais, o julgamento foi suspenso. Falaram: pelos recorridos, o Dr. Heraldo Garcia Vitta; pelo amicus curiae Instituto Brasileiro de Direito de Família-IBDFAM, a Dra. Maria Luiza Póvoa Cruz; pelo amicus curiae Ministério Público do Estado de São Paulo, o Dr. Mário Luiz Sarrubbo, Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo; pelo amicus curiae Associação de Direito de Família e das Sucessões - ADFAS, a Dra. Regina Beatriz Tavares da Silva; e, pelo amicus curiae Defensoria Pública da União, o Dr. Gustavo Zortéa da Silva, Defensor Público Federal. Presidência do Ministro Luís Roberto Barroso. Plenário, 18.10.2023. Decisão: O Tribunal, por unanimidade, apreciando o tema 1.236 da repercussão geral, negou provimento ao recurso extraordinário, nos termos do voto do Relator, Ministro Luís Roberto Barroso (Presidente). Em seguida, foi fixada a seguinte tese: “Nos casamentos e uniões estáveis envolvendo pessoa maior de 70 anos, o regime de separação de bens previsto no art. 1.641, II, do Código Civil, pode ser afastado por expressa manifestação de vontade das partes, mediante escritura pública". Plenário, 1º.2.2024.

Tese

Nos casamentos e uniões estáveis envolvendo pessoa maior de 70 anos, o regime de separação de bens previsto no art. 1.641, II, do Código Civil, pode ser afastado por expressa manifestação de vontade das partes, mediante escritura pública.

Tema

1236 - Regime de bens aplicável no casamento e na união estável de maiores de setenta anos.