Jurisprudência STF 1075412 de 27 de Junho de 2025
Publicado por Supremo Tribunal Federal
Título
RE 1075412 ED
Classe processual
EMB.DECL. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO
Relator
EDSON FACHIN
Data de julgamento
20/03/2025
Data de publicação
27/06/2025
Orgão julgador
Tribunal Pleno
Publicação
PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 26-06-2025 PUBLIC 27-06-2025
Partes
EMBTE.(S) : DIARIO DE PERNAMBUCO SA ADV.(A/S) : CARLOS MARIO DA SILVA VELLOSO FILHO ADV.(A/S) : JOAO CARLOS BANHOS VELLOSO EMBDO.(A/S) : RICARDO ZARATTINI FILHO ADV.(A/S) : RAFAEL DE ALENCAR ARARIPE CARNEIRO INTDO.(A/S) : ASSOCIACAO NACIONAL DE JORNAIS ADV.(A/S) : RODRIGO BRANDAO VIVEIROS PESSANHA AM. CURIAE. : ASSOCIACAO BRASILEIRA DE JORNALISMO INVESTIGATIVO - ABRAJI ADV.(A/S) : IGOR SANT ANNA TAMASAUSKAS ADV.(A/S) : PIERPAOLO CRUZ BOTTINI ADV.(A/S) : BEATRIZ CANOTILHO LOGAREZZI AM. CURIAE. : ASSOCIACAO BRASILEIRA DE RADIO E TELEVISAO - ABRATEL ADV.(A/S) : MARCIO SILVA NOVAES ADV.(A/S) : SAMIR AMANDO GRANJA NOBRE MAIA ADV.(A/S) : EDUARDO RODRIGUES LOPES AM. CURIAE. : ASSOCIACAO BRASILEIRA DE EMISSORAS DE RADIO E TV ADV.(A/S) : GUSTAVO BINENBOJM ADV.(A/S) : ALICE BERNARDO VORONOFF ADV.(A/S) : ANDRÉ RODRIGUES CYRINO ADV.(A/S) : RAFAEL LORENZO FERNANDEZ KOATZ AM. CURIAE. : ASSOCIACAO INSTITUTO TORNAVOZ ADV.(A/S) : TAIS BORJA GASPARIAN
Ementa
EMENTA: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL. LIBERDADE DE EXPRESSÃO. DIREITO-DEVER DE INFORMAR. REPRODUÇÃO DE ENTREVISTA. ERRO MATERIAL, OMISSÃO E OBSCURIDADE. NÃO CONFIGURADOS. APERFEIÇOAMENTO DE TESE. EMBARGOS DECLARATÓRIOS PARCIALMENTE ACOLHIDOS. I. CASO EM EXAME 1. Embargos de declaração opostos em face de acórdão proferido pelo Plenário desta Corte, que, apreciando o Tema 995 da sistemática da repercussão geral, negou provimento ao recurso extraordinário e fixou a seguinte tese: “1. A plena proteção constitucional à liberdade de imprensa é consagrada pelo binômio liberdade com responsabilidade, vedada qualquer espécie de censura prévia. Admite-se a possibilidade posterior de análise e responsabilização, inclusive com remoção de conteúdo, por informações comprovadamente injuriosas, difamantes, caluniosas, mentirosas, e em relação a eventuais danos materiais e morais. Isso porque os direitos à honra, intimidade, vida privada e à própria imagem formam a proteção constitucional à dignidade da pessoa humana, salvaguardando um espaço íntimo intransponível por intromissões ilícitas externas. 2. Na hipótese de publicação de entrevista em que o entrevistado imputa falsamente prática de crime a terceiro, a empresa jornalística somente poderá ser responsabilizada civilmente se: (i) à época da divulgação, havia indícios concretos da falsidade da imputação; e (ii) o veículo deixou de observar o dever de cuidado na verificação da veracidade dos fatos e na divulgação da existência de tais indícios". II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Alega-se equívoco nas premissas no acórdão embargado, argumentando-se que a decisão se baseou erroneamente na ideia de que o jornal negligenciou o dever de cuidado, além de afirmar que o jornal não concedeu espaço para a defesa do ofendido e de ter considerado documentos prévios como suficientes para comprovar a inocência do mesmo, ignorando confirmação posterior. Contesta-se, também, a falta de contextualização da opinião do entrevistado, argumentando que o preâmbulo da matéria já continha observações a esse respeito. Afirma-se, por fim, omissão e obscuridade, especialmente quanto à possibilidade de eliminação de subjetividades, presentes na redação da tese do Tema 995 da sistemática da repercussão geral firmada no julgado embargado, postula-se o aperfeiçoamento da redação da referida tese fixada por esta Corte. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. Para haver a responsabilização são obrigatoriamente necessárias evidências claras e convincentes da falsidade das declarações e actual malice – o que pressupõe saber-se falsa a informação ou agir com desleixo em relação à apuração da verdade ou à busca por fontes confiáveis. 4. A liberdade de imprensa goza de um regime de prevalência, sendo exigidas condições excepcionais para seu afastamento quando em conflito com outros princípios constitucionais, de modo que, para além da configuração de dolo ou culpa grave do agente, é necessário também que as circunstâncias fáticas indiquem uma incomum necessidade de salvaguarda dos direitos da personalidade, pois somente será possível a responsabilização quando o veículo de comunicação, sem aplicar protocolos de busca pela verdade objetiva e sem propiciar oportunidade ao direito de resposta ao ofendido, reproduz unilateralmente, entrevista que imputa fatos inverídicos a terceiros. 5. A construção dessa compreensão, acerca da questão constitucional posta à análise desta Suprema Corte, deu-se após laboriosas sessões de discussões entre os Ministros que compõem o colegiado plenário da Suprema Corte brasileira. A composição da compreensão, que ficou expressa na tese, emergiu de audiências, discussões e diálogos aparteados nas sessões plenárias sobre a tese originalmente fixada no julgamento do presente feito, compondo-se em atenção ao método de julgamento conhecido como modelo per curiam. 6. A utilização do modelo per curiam denota método deliberativo em que a Corte, de forma colegiada, expressa uma opinião única, fruto de entendimentos discutidos pelos seus integrantes, num grupo que não identifica a origem individual de cada ideia ou argumento. A decisão per curiam publiciza não o voto e o entendimento isolado de um membro da Corte, mas a síntese da fundamentação colhida de todos os membros que compõem o respectivo colegiado. IV. DISPOSITIVO 7. Embargos de declaração parcialmente acolhidos para, mantida a condenação no caso concreto, declarar, com exclusivo efeito de aprimoramento da tese de repercussão geral, que a Tese do ARE 1075412, Tema 995 da sistemática da repercussão geral, passa a ter a seguinte redação: “1. Na hipótese de publicação de entrevista, por quaisquer meios, em que o entrevistado imputa falsamente prática de crime a terceiro, a empresa jornalística somente poderá ser responsabilizada civilmente se comprovada sua má-fé caracterizada: (i) pelo dolo demonstrado em razão do conhecimento prévio da falsidade da declaração, ou (ii) culpa grave decorrente da evidente negligência na apuração da veracidade do fato e na sua divulgação ao público sem resposta do terceiro ofendido ou, ao menos, de busca do contraditório pelo veículo; 2. Na hipótese de entrevistas realizadas e transmitidas ao vivo, fica excluída a responsabilidade do veículo por ato exclusivamente de terceiro quando este falsamente imputa a outrem a prática de um crime, devendo ser assegurado pelo veículo o exercício do direito de resposta em iguais condições, espaço e destaque, sob pena de responsabilidade nos termos dos incisos V e X do artigo 5º da Constituição Federal; 3. Constatada a falsidade referida nos itens acima, deve haver remoção, de ofício ou por notificação da vítima, quando a imputação permanecer disponível em plataformas digitais, sob pena de responsabilidade."
Decisão
Após o voto do Ministro Edson Fachin (Relator), que, mantendo a condenação no caso concreto, acolhia parcialmente os embargos de declaração, com exclusivo efeito de aprimoramento da tese de repercussão geral, para esclarecer que a Tese do ARE 1.075.412, Tema 995 da sistemática da repercussão geral, passa a ter a seguinte redação: “1. A plena proteção constitucional à liberdade de imprensa é consagrada pelo binômio liberdade com responsabilidade, vedada qualquer espécie de censura prévia. Admite-se a possibilidade posterior de análise e responsabilização em relação a eventuais danos materiais e morais. Isso porque os direitos à honra, intimidade, vida privada e à própria imagem formam a proteção constitucional à dignidade da pessoa humana, salvaguardando um espaço íntimo intransponível por intromissões ilícitas externas. 2. Na hipótese de publicação de entrevista, por quaisquer meios, em que o entrevistado imputa falsamente prática de crime a terceiro, a empresa jornalística somente poderá ser responsabilizada civilmente se comprovada a sua má-fé caracterizada pelo dolo direto, demonstrado pelo conhecimento prévio da falsidade da declaração, ou ainda por dolo eventual, evidenciado pela negligência na apuração da veracidade de fato duvidoso e na sua divulgação ao público sem resposta do terceiro ofendido ou, ao menos, de busca do contraditório pelo veículo. 3. Na hipótese de entrevistas realizadas e transmitidas ao vivo, fica excluída a responsabilidade do veículo por ato exclusivamente de terceiro quando este falsamente imputa a outrem a prática de um crime, devendo ser assegurado pelo veículo o exercício do direito de resposta em iguais condições, espaços e destaque, sob pena de responsabilidade nos termos dos incisos V e X do artigo 5º da Constituição Federal”, pediu vista dos autos o Ministro Flávio Dino. Aguardam os demais Ministros. Presidência do Ministro Luís Roberto Barroso. Plenário, 7.8.2024. Decisão: O Tribunal, por unanimidade, conheceu dos embargos de declaração e deu-lhes parcial provimento, para fixação da seguinte tese de repercussão geral (tema 995): “1. Na hipótese de publicação de entrevista, por quaisquer meios, em que o entrevistado imputa falsamente prática de crime a terceiro, a empresa jornalística somente poderá ser responsabilizada civilmente se comprovada sua má-fé caracterizada: (i) pelo dolo demonstrado em razão do conhecimento prévio da falsidade da declaração, ou (ii) culpa grave decorrente da evidente negligência na apuração da veracidade do fato e na sua divulgação ao público sem resposta do terceiro ofendido ou, ao menos, de busca do contraditório pelo veículo; 2. Na hipótese de entrevistas realizadas e transmitidas ao vivo, fica excluída a responsabilidade do veículo por ato exclusivamente de terceiro quando este falsamente imputa a outrem a prática de um crime, devendo ser assegurado pelo veículo o exercício do direito de resposta em iguais condições, espaço e destaque, sob pena de responsabilidade nos termos dos incisos V e X do artigo 5º da Constituição Federal; 3. Constatada a falsidade referida nos itens acima, deve haver remoção, de ofício ou por notificação da vítima, quando a imputação permanecer disponível em plataformas digitais, sob pena de responsabilidade”, nos termos do voto do Relator. Presidência do Ministro Luís Roberto Barroso. Plenário, 20.3.2025.