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Informativo do STF 992 de 25/09/2020

Publicado por Supremo Tribunal Federal


PLENÁRIO

DIREITO CONSTITUCIONAL – CONFLITO FEDERATIVO

Uso da Força Nacional de Segurança Pública por requerimento de Ministro de Estado e autonomia estadual -

É plausível a alegação de que a norma inscrita no art. 4º do Decreto 5.289/2004 (1), naquilo em que dispensa a anuência do governador de estado no emprego da Força Nacional de Segurança Pública, viole o princípio da autonomia estadual. Trata-se de referendo de decisão que concedeu medida cautelar em ação cível originária para ordenar à União que retire dos municípios de Prado e Mucuri o contingente da Força Nacional de Segurança Pública mobilizado pela Portaria 493/2020. A citada Portaria, expedida pelo Ministro de Estado da Justiça e Segurança Pública, autorizou o emprego da Força Nacional naquelas localidades, em apoio ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, sem que houvesse formal e expressa solicitação do governador do estado da Bahia. Há plausibilidade jurídica do direito evocado, porque pesam legítimas dúvidas sobre a constitucionalidade do art. 4º do Decreto 5.289/2004, que, alterado pelo Decreto 7.957/2013, estendeu o conteúdo semântico da norma e criou uma regra adicional ampliadora do rol dos legitimados a requerer o emprego da Força Nacional. A autorização unilateral do emprego da Força Nacional, parece, em juízo de delibação, contrariar as normas de escalão superior das quais deveria retirar sua validade. Nesse sentido, o art. 241 da Constituição Federal (CF) se refere expressamente à celebração de convênios de cooperação ou consórcios públicos entre os entes federados para assegurar a continuidade de serviços públicos. Além disso, com exceção das hipóteses de intervenção federal, previstas no art. 34 da CF, não se identificam dispositivos hábeis a contornar a autonomia dos estados, em sua integridade administrativa e territorial, sem que se obedeça à exigência de exteriorização de vontade apta a ser elemento de suporte de fato jurídico. Em análise típica de controle de legalidade, a validade do art. 4º do Decreto 5.289/2004 deve ser contrastada com a Lei 11.473/2007, que dispõe sobre cooperação federativa no âmbito da segurança pública. Presente, também, o requisito do perigo da demora. Em primeiro lugar, em razão da gravidade do objeto em litígio, uma vez que o pacto federativo é essencial para o correto funcionamento das instituições republicanas. A jurisprudência da Corte confere significativo peso argumentativo à autonomia dos Estados-membros. Dessa forma, a mobilização de força de segurança pública em território estadual, ressalvado ulterior juízo de mérito, implica grave ameaça ao equilíbrio da Federação. Em segundo lugar, a citada gravidade é exacerbada por se tratar, justamente, de tópico referente à segurança pública. O horizonte possível de emprego do uso da força apresenta risco que é da essência da própria atividade. Existe fundado temor de que, ao final do curso natural do processo, o uso da violência monopolística do Estado se revele, a um só tempo, ilegítimo e irreversível. Havendo vidas envolvidas, tanto da população local quanto dos membros das forças de segurança, é razoável assumir que existe um risco elevado na demora do julgado. Por fim, o objeto da demanda não ocorre em um vácuo histórico, mas durante a mais severa crise sanitária dos últimos cem anos (decorrente da pandemia do Covid-19). Em razão disso, a mobilização do contingente exógeno de forças de segurança inegavelmente apresenta riscos de contaminação para a população local. O Plenário, por maioria, referendou a decisão concessiva da cautelar. Vencido o ministro Roberto Barroso. (1) Decreto 5.289/2004: “Art. 4º A Força Nacional de Segurança Pública poderá ser empregada em qualquer parte do território nacional, mediante solicitação expressa do respectivo Governador de Estado, do Distrito Federal ou de Ministro de Estado.”

ACO 3427 Ref-MC/BA, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 24.9.2020. (ACO-3427)

REPERCUSSÃO GERAL

DIREITO TRIBUTÁRIO – CONTRIBUIÇÕES

EC 33/2001: contribuição destinada ao Sebrae, à Apex e à ABDI e folha de salários – 2 -

As contribuições devidas ao Sebrae, à Apex e à ABDI com fundamento na Lei 8.029/1990 foram recepcionadas pela Emenda Constitucional (EC) 33/2001. No recurso extraordinário (Tema 325 da repercussão geral) discutia-se, em suma, sobre a constitucionalidade das contribuições destinadas ao Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), à Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimento (Apex) e à Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), incidentes sobre a folha de salários, após a EC 33/2001 ( Informativo 991 ). Entendeu-se que a alteração promovida pela EC 33/2001, no art. 149, § 2º, III (1) da Constituição Federal (CF) não estabeleceu delimitação exaustiva das bases econômicas passíveis de tributação por toda e qualquer contribuição social e de intervenção do domínio econômico (CIDE). A taxatividade pretendida por uma interpretação meramente literal aplica-se tão somente, nos termos da EC 33/2001 e em conjunto com o art. 177, § 4º, da CF, em relação às contribuições incidentes sobre a indústria do petróleo e seus derivados. Porém, para as CIDEs e as contribuições em geral, entre as quais as contribuições ao Sebrae, Apex e ABDI, a EC 33/2001 manteve a mera exemplificação, não esgotando todas as possibilidades legislativas. Portanto, a materialidade econômica para a incidência dessas contribuições não se esgota na previsão de faturamento, receita bruta, valor da operação e valor aduaneiro (no caso de importação), podendo comportar, também, a incidência sobre folha de salários. Por essa razão, o art. 149, § 2º, III, da CF utiliza a expressão “poderão ter alíquotas”. Assim, garante a ideia de facultatividade a abranger tanto as alíquotas quanto as bases de cálculo das contribuições sociais e das CIDEs. Ademais, a exposição de motivos da EC 33/2001 demonstra que as alterações implementadas pretenderam apenas possibilitar a cobrança da CIDE-combustíveis quando da importação de derivados do petróleo e do gás natural, retirando obstáculos à tributação de insumos vindos do exterior. Com base nesse entendimento, o Tribunal, por maioria, negou provimento ao recurso extraordinário. (1) CF: “Art. 149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo. (...) § 2º As contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico de que trata o caput deste artigo: (...) III – poderão ter alíquotas: a) ad valorem, tendo por base o faturamento, a receita bruta ou o valor da operação e, no caso de importação, o valor aduaneiro; b) específica, tendo por base a unidade de medida adotada.”

RE 603624/SC, rel. orig. Min. Rosa Weber, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 23.09.2020. (RE-603324)

SEGUNDA TURMA

DIREITO TRIBUTÁRIO – TRIBUTOS

Substituição tributária e requerimento administrativo -

Inviabiliza o recurso extraordinário a necessidade de análise de normas infraconstitucionais para chegar-se à conclusão contrária à adotada pelo tribunal de origem, segundo a qual o contribuinte substituído deve apresentar requerimento administrativo ao Fisco, nos termos da legislação estadual, e observar o procedimento por ele adotado para obter o aproveitamento do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) recolhido a mais, em razão da venda de mercadoria por preço inferior ao presumido, ou seja, no regime de substituição tributária para frente. Trata-se, na espécie, de recurso extraordinário interposto por pessoa jurídica — atuante na revenda de combustíveis —, no qual alegava, em suma, ofensa ao art. 150, § 7º, da Constituição Federal (CF) (1). Antes da remessa dos autos ao Supremo Tribunal Federal (STF), a presidência da corte de origem devolveu o processo ao órgão prolator do acórdão impugnado para juízo de adequação, tendo em conta o julgamento do RE 593.849 (Tema 201 da Repercussão Geral). O referido órgão manteve o posicionamento, afirmando que a inobservância da norma infralegal impede a concessão da tutela jurisdicional ( Informativo 975 ). Para dissentir do acórdão recorrido e verificar a procedência dos argumentos consignados no recurso extraordinário, necessária a reanálise da interpretação dada pelo Juízo a quo às normas infraconstitucionais locais aplicáveis ao caso. Portanto, há o óbice do Enunciado 280 do STF (2). A Segunda Turma, por maioria, negou provimento ao agravo regimental e manteve a decisão que negou seguimento ao recurso extraordinário com agravo. (1) CF: “Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: (...) § 7º A lei poderá atribuir a sujeito passivo de obrigação tributária a condição de responsável pelo pagamento de imposto ou contribuição, cujo fato gerador deva ocorrer posteriormente, assegurada a imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido.” (2) Enunciado 280/STF: “Por ofensa a direito local não cabe recurso extraordinário.”

ARE 1184956 AgR/SP, rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgamento em 22.9.2020. (ARE-1184956)