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Informativo do STF 922 de 09/11/2018

Publicado por Supremo Tribunal Federal


PLENÁRIO

DIREITO CONSTITUCIONAL – CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE

ADPF: manifestações em universidades e normas eleitorais -

O Plenário referendou, com efeito vinculante e eficácia contra todos, decisão monocrática que, em arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF), suspendeu os efeitos de atos judiciais ou administrativos emanados de autoridade pública que possibilitem, determinem ou promovam o ingresso de agentes públicos em universidades públicas e privadas, o recolhimento de documentos, a interrupção de aulas, debates ou manifestações de docentes e discentes universitários, a atividade disciplinar docente e discente e a coleta irregular de depoimentos desses cidadãos pela prática de manifestação livre de ideias e divulgação do pensamento em ambientes universitários ou em equipamentos sob a administração de universidades públicas e privadas e serventes a seus fins e desempenhos. A arguição impugnava decisões proferidas por juízes eleitorais que determinaram a busca e apreensão do que seriam “panfletos” e materiais de campanha eleitoral em universidades e nas dependências das sedes de associações de docentes e que proibiram aulas com temática eleitoral e reuniões e assembleias de natureza política, impondo a interrupção de manifestações públicas de apreço ou reprovação a candidatos nas eleições gerais de 2018, em ambiente virtual ou físico de universidades federais e estaduais. Em alguns casos, policiais executaram essas ações sem comprovação de ato judicial que o respaldasse. As medidas tiveram como fundamento jurídico o art. 37 da Lei 9.504/1997 (1), que estabelece normas para as eleições. Preliminarmente, o Colegiado reconheceu adequada a utilização da ADPF, haja vista o respeito ao princípio da subsidiariedade e a viabilidade da impugnação, por meio desse instrumento processual, de decisões judiciais ou de interpretações judiciais de textos normativos. Citou, no ponto, a orientação jurisprudencial fixada no julgamento da ADPF 405 e da ADPF 147 no sentido de que um conjunto de reiteradas decisões sobre determinada matéria deve ser considerado ato do poder público passível de controle pela ADPF e de que esta é a via correta para questionar interpretação judicial de normas constitucionais e legais. Registrou, também, o posicionamento firmado na ADPF 33 , quanto à plausibilidade do conhecimento da ADPF quando o princípio da segurança jurídica seja seriamente ameaçado, sobretudo em razão de conflitos de interpretação ou de incongruências hermenêuticas causadas pelo modelo pluralista de jurisdição constitucional, desde que presentes os demais pressupostos de admissibilidade. No mérito, o Plenário entendeu que os atos questionados violam os princípios constitucionais assecuratórios da liberdade de manifestação do pensamento e desobedecem às garantias inerentes à autonomia universitária (CF, artigos 5º, IV, IX e XVI; 206, II e III; e 207 (2)). Observou que, às vésperas do pleito eleitoral de 2018, denso e tenso, as providências judiciais e os comportamentos administrativos interrompem atos pelos quais se expressam ideias e ideologias, preferências, propostas e percepções do que se quer no processo político. Asseverou, ainda, que as normas jurídicas impeditivas de práticas durante o processo eleitoral devem ser interpretadas de acordo com sua finalidade e nos limites por elas contemplados, sem transgredir princípios constitucionais. Caso se extrapole o limite necessário ao resguardo de todas as formas de manifestação livre de pensar e do espaço livre de cada um agir segundo seu pensamento político, ocorre abuso não por parte de quem se expressa, mas de quem limita a expressão. A finalidade do art. 37 da Lei 9.504/1997, que regulamenta a propaganda eleitoral e impõe proibição de alguns comportamentos em períodos que especifica, é a de impedir o abuso do poder econômico e político e de preservar a igualdade entre os candidatos no processo. A norma visa resguardar a liberdade do cidadão, o amplo acesso às informações, para que ele decida conforme sua livre convicção, sem cerceamento direto ou indireto a seu direito de escolha. A vedação por ela estabelecida possui a finalidade específica de lisura do processo eleitoral. O que não estiver dentro dos limites dessa finalidade e, diversamente, atingir a livre manifestação do cidadão não se afina com a teleologia da norma eleitoral nem com os princípios constitucionais garantidores da liberdade de pensamento, manifestação, informação, ensino e aprendizagem. Portanto, as providências judiciais e administrativas impugnadas na ADPF, além de ferir o princípio garantidor de todas as formas de manifestação da liberdade, desrespeitam a autonomia das universidades e a liberdade dos docentes e discentes. As condutas limitadas pelos atos questionados restringem não os direitos dos candidatos, mas o livre pensar dos cidadãos. O Colegiado esclareceu que os dispositivos da Lei 9.504/1997 somente têm interpretação válida em sua adequação e compatibilidade com os princípios previstos no art. 5º, IV, IX e XVI, da CF, por meio dos quais são asseguradas todas as formas de manifestação da liberdade de pensamento, de divulgação de ideias e de reunião dos cidadãos. As autoridades judiciais e policiais, ao impor comportamentos restritivos ou impeditivos do exercício desses direitos, proferiram decisões com eles incompatíveis e em afronta, ainda, ao princípio democrático e ao modelo de Estado de Direito erigido e vigente no Brasil. Por sua vez, as normas previstas nos artigos 206, II e III, e 207 da CF se harmonizam com os direitos às liberdades de expressão do pensamento, de informar e de ser informado. Esses direitos são constitucionalmente assegurados, para o que o ensino e a aprendizagem se conjugam, de modo a garantir espaços de libertação da pessoa, a partir de ideias e compreensões do mundo convindas ou não e expostas para convencer ou simplesmente expressar o entendimento de cada qual. A autonomia é o espaço de discricionariedade conferido constitucionalmente à atuação normativa infralegal de cada universidade para o excelente desempenho de suas funções. As universidades são espaços de liberdade e de libertação pessoal e política. Seu título indica a pluralidade e o respeito às diferenças, às divergências para se formarem consensos, legítimos apenas quando decorrentes de manifestações livres. Por isso, a Constituição ali garante, de modo expresso, a liberdade de aprender e ensinar e, ainda, de divulgar livremente o pensamento. Também o pluralismo de ideias está na base da autonomia universitária como extensão do princípio fundante da democracia brasileira, previsto no art. 1º, V, da CF (3). Dessa forma, os atos impugnados, ao se contrapor a esses direitos fundamentais e determinar providências incompatíveis com seu pleno exercício e eficaz garantia, interpretam a referida norma eleitoral de forma incompatível com sua dicção e traidora dos fins a que se destina, que são os de acesso igual e justo a todos os cidadãos, garantindo-lhes o direito de informar-se e projetar suas ideias, ideologias e entendimentos, sobretudo em espaços afetos diretamente à atividade do livre pensar e divulgar pensamentos plurais. O ministro Gilmar Mendes, que também referendou a decisão, propôs, sem adesão dos demais ministros, outras medidas, no sentido de que seja preservada a liberdade de cátedra e as liberdades universitárias também no âmbito das relações privadas, tanto individuais quanto institucionais. (1) Lei 9.504/1997: “Art. 37. Nos bens cujo uso dependa de cessão ou permissão do poder público, ou que a ele pertençam, e nos bens de uso comum, inclusive postes de iluminação pública, sinalização de tráfego, viadutos, passarelas, pontes, paradas de ônibus e outros equipamentos urbanos, é vedada a veiculação de propaganda de qualquer natureza, inclusive pichação, inscrição a tinta e exposição de placas, estandartes, faixas, cavaletes, bonecos e assemelhados. ” (2) CF: “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) IV – é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato; (...) IX – é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença; (...) XVI – todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente;” (3) CF: “Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: (...) II – liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber; III – pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino; ” (4) CF: “Art. 207. As universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão. ” (5) CF: “Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (...) V – o pluralismo político. ”

ADPF 548 MC-Ref/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 31.10.2018. (ADPF-548)

DIREITO TRIBUTÁRIO – ICMS

ICMS: fornecedor optante do Simples Nacional e diferencial de alíquota (DIFAL) em operações interestaduais -

O Plenário iniciou julgamento de referendo em medida cautelar em ação direta de inconstitucionalidade na qual se discute a validade da Cláusula nona do Convênio ICMS 93/2015 (1) do Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ), que dispõe sobre a aplicação de diferencial de alíquota (DIFAL) às empresas fornecedoras optantes pelo Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições (Simples Nacional) nas operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final não contribuinte do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços de Comunicação e de Transporte Intermunicipal e Interestadual (ICMS) localizado em outra unidade federada. O ministro Dias Toffoli (relator), em decisão monocrática, deferiu a medida cautelar para, ad referendum do Plenário, suspender a eficácia da cláusula impugnada até o julgamento final da ação. Entendeu que o dispositivo questionado invadiu o campo próprio de lei complementar, bem como produziu efeitos funestos no mercado nacional. A parte requerente afirma que o Confaz criou obrigação de recolhimento de tributo sem previsão em lei complementar. O ato editado pelo Conselho carece de qualquer interpretação autorizada da Carta Maior, ao dispor que as empresas optantes pelo Simples Nacional devem aplicar o disposto nas diretrizes celebradas no convênio. Preliminarmente, o relator votou pela rejeição dos embargos declaratórios opostos em face da decisão monocrática que deferiu a medida cautelar. As questões postas pelos embargantes foram enfrentadas adequadamente. No mérito, propôs o referendo da cautelar e a sua conversão em julgamento definitivo de mérito, julgando procedente o pedido formulado e a consequente declaração de inconstitucionalidade formal da norma impugnada. A Constituição Federal (CF) dispõe caber a lei complementar – e não a convênio interestadual – estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre definição de tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de pequeno porte, o que inclui regimes especiais ou simplificados de certos tributos, como o ICMS, nos termos do art. 146, III, d, da CF (2), incluído pela Emenda Constitucional (EC) 42/2003. A Carta Federal também possibilita a essa lei complementar “instituir um regime único de arrecadação dos impostos e contribuições da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios”, observando-se certas determinações, conforme previsto no art. 146, parágrafo único, da CF (3), também incluído pela EC 42/2003. Dentro desse quadro jurídico especial, o microempreendedor, no tocante ao ICMS, nem sempre se submeterá a todas as regras gerais do imposto previstas no texto constitucional. No caso, a LC 123/2006 trata de maneira distinta as empresas optantes desse regime em relação ao tratamento constitucional geral atinente ao denominado diferencial de alíquotas de ICMS relativo às operações de saída interestadual de bens ou de serviços a consumidor final não contribuinte. A norma questionada invadiu campo reservado à lei complementar, ao determinar a aplicação das disposições do convênio aos contribuintes optantes pelo Simples Nacional quando remetentes de bens ou prestadores de serviços. Essa norma infralegal criou obrigação de recolhimento do Difal em favor da unidade federada de destino em relação às operações e prestações que destinem bens ou serviços a consumidor final não contribuinte do ICMS localizado em outra unidade federada. O fato de a EC 87/2015 não ter feito qualquer referência ou exceção à situação dos optantes do Simples Nacional não autoriza o entendimento externado pelos estados e pelo Distrito Federal por meio do convênio. Ao lado da regência constitucional dos tributos, a Carta Magna consagra o tratamento jurídico diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de pequeno porte, conforme os artigos 179 (4) e 170, IX (5). Prevê, no âmbito tributário, que lei complementar defina esse tratamento, o que inclui regimes especiais ou simplificados, no caso do ICMS. Não houve qualquer modificação dessa previsão constitucional com o advento da referida alteração constitucional. Em seguida, o julgamento foi suspenso ante o pedido de vista do ministro Gilmar Mendes. (1) Convênio ICMS 93/2015 do Confaz: “Cláusula nona Aplicam-se as disposições deste convênio aos contribuintes optantes pelo Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte – Simples Nacional, instituído pela Lei Complementar n. 123, de 14 de dezembro de 2006, em relação ao imposto devido à unidade federada de destino.” (2) CF: “Art. 146. Cabe à lei complementar: (...) III – estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre: (...) d) definição de tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de pequeno porte, inclusive regimes especiais ou simplificados no caso do imposto previsto no art. 155, II, das contribuições previstas no art. 195, I e §§ 12 e 13, e da contribuição a que se refere o art. 239. ” (3) CF: “Art. 146. Cabe à lei complementar: (...) Parágrafo único. A lei complementar de que trata o inciso III, d, também poderá instituir um regime único de arrecadação dos impostos e contribuições da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, observado que: I – será opcional para o contribuinte; II – poderão ser estabelecidas condições de enquadramento diferenciadas por Estado; III – o recolhimento será unificado e centralizado e a distribuição da parcela de recursos pertencentes aos respectivos entes federados será imediata, vedada qualquer retenção ou condicionamento; IV – a arrecadação, a fiscalização e a cobrança poderão ser compartilhadas pelos entes federados, adotado cadastro nacional único de contribuintes.” (4) CF: “Art. 179. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios dispensarão às microempresas e às empresas de pequeno porte, assim definidas em lei, tratamento jurídico diferenciado, visando a incentivá-las pela simplificação de suas obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e creditícias, ou pela eliminação ou redução destas por meio de lei. ” (5) CF: “Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (...) IX – tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País.”

ADI 5464 MC-Ref/DF, rel. Min. Dias Toffoli, julgamento em 07.11.2018. (ADI-5464)

DIREITO CONSTITUCIONAL – CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE

ADI e uso de armas de menor potencial ofensivo -

O Plenário iniciou julgamento de ação direta de inconstitucionalidade ajuizada contra a Lei federal 13.060/2014 (1), que disciplina o uso dos instrumentos de menor potencial ofensivo pelos agentes de segurança pública em todo o território nacional. O ministro Alexandre de Moraes (relator) julgou o pedido procedente por entender que a lei impugnada possui vícios de inconstitucionalidade formal e material. Para o relator, trata-se de lei federal de iniciativa parlamentar que dispõe sobre questão de segurança pública e cria obrigações e despesas aos estados-membros, inclusive com a imposição de compra de instrumentos não letais, de prestação de socorro e assistência, e de cursos de formação e capacitação. Além disso, a norma questionada pretende padronizar todos os agentes de segurança pública e ignora que, conforme a Constituição Federal (CF), o comandante das forças da Polícia Militar e Civil é o governador de estado. Segundo o ministro Alexandre de Moraes, a determinação de procedimentos policiais a todos os agentes de segurança não é de competência federal, muito menos de iniciativa parlamentar. Dessa forma, a lei federal viola o princípio da separação de poderes, competências dos estados-membros e a competência privativa do chefe do Poder Executivo para tratar sobre a matéria (CF, arts. 2º (2); 61, § 1º, II, c (3); 84, III, IV, VI (4); e 144 (5)). Em seguida, o ministro Edson Fachin pediu vista dos autos. (1) Lei 13.060/2014: “Art. 2º Os órgãos de segurança pública deverão priorizar a utilização dos instrumentos de menor potencial ofensivo, desde que o seu uso não coloque em risco a integridade física ou psíquica dos policiais, e deverão obedecer aos seguintes princípios: I – legalidade; II – necessidade; III – razoabilidade e proporcionalidade. Parágrafo único. Não é legítimo o uso de arma de fogo: I – contra pessoa em fuga que esteja desarmada ou que não represente risco imediato de morte ou de lesão aos agentes de segurança pública ou a terceiros; e II – contra veículo que desrespeite bloqueio policial em via pública, exceto quando o ato represente risco de morte ou lesão aos agentes de segurança pública ou a terceiros. Art. 3º Os cursos de formação e capacitação dos agentes de segurança pública deverão incluir conteúdo programático que os habilite ao uso dos instrumentos não letais. Art. 4º Para os efeitos desta Lei, consideram-se instrumentos de menor potencial ofensivo aqueles projetados especificamente para, com baixa probabilidade de causar mortes ou lesões permanentes, conter, debilitar ou incapacitar temporariamente pessoas. Art. 5º O poder público tem o dever de fornecer a todo agente de segurança pública instrumentos de menor potencial ofensivo para o uso racional da força. Art. 6º Sempre que do uso da força praticada pelos agentes de segurança pública decorrerem ferimentos em pessoas, deverá ser assegurada a imediata prestação de assistência e socorro médico aos feridos, bem como a comunicação do ocorrido à família ou à pessoa por eles indicada. Art. 7º O Poder Executivo editará regulamento classificando e disciplinando a utilização dos instrumentos não letais. ” (2) CF: “Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. ” (3) CF: “Art. 61. (...) § 1º São de iniciativa privativa do Presidente da República as leis que: (...) II – disponham sobre: (...) c) servidores públicos da União e Territórios, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria; ” (4) CF: “Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: (...) III – iniciar o processo legislativo, na forma e nos casos previstos nesta Constituição; IV – sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, bem como expedir decretos e regulamentos para sua fiel execução; (...) VI – dispor, mediante decreto, sobre: a) organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos; ” (5) CF: “Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos: (...)”

ADI 5243/DF, rel. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 7.11.2018. (ADI-5243)

DIREITO CONSTITUCIONAL – CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE

ADI e revista íntima em trabalhadores do sexo masculino -

O Plenário iniciou julgamento conjunto de duas ações diretas de inconstitucionalidade ajuizadas contra a Lei 12.258/2005 do estado do Rio Grande do Sul, que proíbe, no âmbito estadual, a prática de revista íntima em funcionários em todos os estabelecimentos industriais, comerciais e de serviços. A lei ainda define que revista íntima engloba, além do despimento coercitivo, todo e qualquer ato de molestamento físico que exponha o corpo dos funcionários. O ministro Edson Fachin (relator) julgou improcedente o pedido formulado, no que foi acompanhado pelos ministros Luiz Fux, Ricardo Lewandowski e Celso de Mello. Inicialmente, afirmou que a lei estadual impugnada estende aos empregados do sexo masculino o arco de proteção previsto na Lei Federal 9.799/1999, que inseriu, no inciso VI do art. 373-A da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) (1), a vedação da revista íntima em empregadas ou funcionárias. Esse arco de proteção, do ponto de vista material, não recebeu impugnação por nenhum dos requerentes das ações diretas, não havendo dúvidas quanto a sua constitucionalidade nesse aspecto. Da mesma forma, considerou que a norma questionada, ao proteger a inviolabilidade da intimidade, da vida privada e das pessoas de um modo geral, superando toda e qualquer discriminação de gênero e levando em conta o fundamento da dignidade da pessoa humana, também não incorre em inconstitucionalidade formal. Segundo o relator, o vício formal ocorreria se a legislação estadual adentrasse específica e exclusivamente nas relações de trabalho, em afronta ao art. 22, I, da Constituição Federal (CF) (2), e, no caso, a norma protege a intimidade de empregadas e empregados. A regra federal, no âmbito do chamado federalismo de cooperação, estabelece o campo de sua incidência de tal modo claro que o estado não teria latitude legislativa sobre o tema (clear statement rule). Em síntese, o ministro Edson Fachin assentou algumas premissas. Para ele, em leis que envolvam mais de um tema, os conflitos formais de competência federativa devem ser solucionados reconhecendo deferência à competência legislativa concorrente e comum dos estados e municípios. Além disso, não se deve confundir a maior proximidade do governo, que ocorre naturalmente nos municípios, com mais democracia, pois a Constituição é também um contraponto à captura do governo local pelas oligarquias regionais. Por isso, o federalismo é um instrumento de descentralização política não apenas para distribuir poder político, mas sobretudo para realizar direitos fundamentais, que é compromisso da Constituição da República. A proibição de revistas íntimas dentro do local de trabalho dimana da própria Constituição, razão pela qual a competência para proibi-la é comum à União, aos estados e aos municípios. A fim de garantir a inserção legítima da mulher no mercado de trabalho, a Lei Federal 13.271/2016 (3) proibiu a revista íntima de funcionárias nos locais de trabalho, mas não impediu que estados e municípios, de forma protetiva, também disciplinassem o tema. Por isso, o ministro concluiu ser possível ao legislador estadual, com fundamento no inciso I do art. 23 da CF (4), complementar ou repetir a legislação federal, para fins de explicitar essa proibição inquestionável de conduta vexatória e atentatória de direitos fundamentais. O ministro Alexandre de Moraes, em divergência, julgou o pedido da ação procedente, por entender que a lei impugnada invade a competência privativa da União para legislar sobre direito do trabalho. Os ministros Roberto Barroso, Rosa Weber e Marco Aurélio o acompanharam. Para ele, trata-se de uma norma eminentemente ligada ao direito do trabalho, tanto é que repete e complementa o próprio art. 373-A da CLT. Registrou, no ponto, que o Tribunal Superior do Trabalho (TST), ao interpretar esse dispositivo, estendeu a vedação aos funcionários de sexo masculino e editou enunciado que define o que é a revista íntima, com base na relação de trabalho. Explicou que a norma dispõe sobre matéria que nasceu com uma grande preocupação no âmbito do direito do trabalho e que nele se desenvolveu, com inserção de norma na CLT, e definições necessárias, principalmente em relação ao que seria a revista íntima. Nesse sentido, admitir que o estado tem competência inclusive para definir o que é revista íntima, como faz a lei estadual, viabiliza que ele legisle sobre o direito do trabalho. Por esse motivo, seria inviável extirpar a questão do art. 22, I, da CF, não obstante se reconheça, do ponto de vista material, a importância da honra e da intimidade da pessoa humana. Também não seria possível encaixar a matéria em um dos incisos do art. 24 da CF, que dispõe sobre a competência legislativa concorrente dos entes da Federação. O ministro Alexandre de Moraes citou, por fim, a jurisprudência predominante da Corte no sentido de reconhecer a inconstitucionalidade formal de normas estaduais que, a despeito do louvável conteúdo material de combate à discriminação contra empregados, invadiram a competência da União para legislar sobre direito do trabalho ( ADI 2.487 ; ADI 5.307 ). A ministra Rosa Weber asseverou que a lei estadual protege um direito que não decorre nem da condição de trabalhador, nem da condição de empregado, mas da condição de pessoa humana que presta serviços, sendo hígida materialmente. Entretanto, reconheceu sua inconstitucionalidade formal, tendo em conta que ela impõe uma obrigação ao empregador ou ao tomador do serviço. Em seguida, o ministro Dias Toffoli pediu vista dos autos. (1) CLT: “Art. 373-A. Ressalvadas as disposições legais destinadas a corrigir as distorções que afetam o acesso da mulher ao mercado de trabalho e certas especificidades estabelecidas nos acordos trabalhistas, é vedado: (...) VI – proceder o empregador ou preposto a revistas íntimas nas empregadas ou funcionárias. ” (2) CF: “Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: I – direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho; ” (3) Lei 13.271/2016: “Art. 1º As empresas privadas, os órgãos e entidades da administração pública, direta e indireta, ficam proibidos de adotar qualquer prática de revista íntima de suas funcionárias e de clientes do sexo feminino. Art. 2º Pelo não cumprimento do art. 1º, ficam os infratores sujeitos a: I – multa de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) ao empregador, revertidos aos órgãos de proteção dos direitos da mulher; II – multa em dobro do valor estipulado no inciso I, em caso de reincidência, independentemente da indenização por danos morais e materiais e sanções de ordem penal. ” (4) CF: “Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: I – zelar pela guarda da Constituição, das leis e das instituições democráticas e conservar o patrimônio público; ”

ADI 3559/RS, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 8.11.2018. (ADI-3559) ADI 6036/RS, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 8.11.2018. (ADI-6036)

REPERCUSSÃO GERAL

TRIBUTÁRIO – ICMS

ICMS: aquisição interestadual por contribuinte optante pelo Simples Nacional e antecipação de diferencial de alíquota (DIFAL) - O Plenário iniciou julgamento de recurso extraordinário – Tema 517 da repercussão geral – em que se discute a constitucionalidade da aplicação de diferencial de alíquota (DIFAL) de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços de Comunicação e de Transporte Intermunicipal e Interestadual (ICMS) a contribuinte do imposto optante pelo Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições (Simples Nacional) nas operações interestaduais de aquisição de mercadorias para revenda. O recurso extraordinário em julgamento é anterior à Emenda Constitucional (EC) 87/2015, que alterou a sistemática de cobrança do ICMS incidente sobre as operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final, contribuinte ou não do imposto, localizado em outro estado. O recorrente postula a reforma da decisão do Tribunal de Justiça local para se considerar a impossibilidade constitucional de pagamento ou recolhimento antecipado do imposto quando o adquirente for contribuinte optante do regime simplificado. Alega ser indevida a cobrança do diferencial de alíquota, de maneira antecipada, sobre as operações em que a mercadoria for destinada à revenda, diante da impossibilidade de posterior creditamento no regime do Simples. A exigência de diferencial somente seria válida na hipótese de aquisição interestadual de mercadoria por contribuinte na qualidade de consumidor final. De início, o Plenário rejeitou a preliminar de prejudicialidade por perda de objeto, apontada pela Procuradoria-Geral da República. Considerou que remanesce interesse recursal na hipótese transcendente, por força do instituto da repercussão geral. Quanto ao objeto da demanda, o ministro Edson Fachin (relator) ressaltou que o recurso diz respeito às operações interestaduais de aquisição de mercadorias por contribuinte aderente ao Simples Nacional, cobrando-se o diferencial de alíquota de ICMS na fronteira do estado-membro. A outra questão suscitada pela parte recorrente, relativa à antecipação do recolhimento do tributo, é objeto do Tema 456 ( RE 598.677 ), com julgamento de mérito já iniciado, no qual se discute a constitucionalidade da cobrança antecipada de ICMS no ingresso de mercadorias adquiridas por consumidor final em outro ente da Federação. Em relação ao mérito, o relator votou pelo não provimento do extraordinário e pela consequente manutenção do acórdão recorrido. Em seu entendimento, quando da entrada de mercadoria no estado de destino, é constitucional a imposição tributária por esse estado de diferencial de alíquota do ICMS devido por sociedade empresária aderente ao Simples Nacional, independentemente da posição desta na cadeia produtiva ou da possibilidade de compensação dos créditos. Para o ministro Edson Fachin, não há como reputar existente vício formal ou material na legislação questionada. Como regra geral, o art. 13 da Lei Complementar (LC) 123/2006 prevê o recolhimento mensal unificado de diversos impostos e contribuições, incluindo o ICMS. No entanto, essa mesma lei expressamente autoriza a cobrança de diferencial de alíquota mediante antecipação do tributo, nas aquisições em outros estados e no Distrito Federal, nos termos da legislação estadual ou distrital, conforme previsto no art. 13, § 1º, XIII, g, 2, e h (1). O diferencial de alíquota é um mecanismo que objetiva equilibrar a partilha do ICMS em operações interestaduais entre os estados de origem e destino. Em um primeiro momento, o estado de origem exige do fornecedor o recolhimento do imposto calculado pela alíquota interestadual aplicável. Posteriormente, o estado de destino cobra o diferencial de alíquota entre a sua alíquota interna e a interestadual, o qual pode ser exigido sob o regime de antecipação. Há, portanto, a cobrança de um único imposto efetuada por dois entes distintos, distribuindo-se o montante devido caso a aquisição tenha sido realizada no próprio estado. Nesse contexto, a parte recorrida, no exercício de sua competência tributária, exigiu validamente do contribuinte o recolhimento do diferencial de alíquota de ICMS nas aquisições interestaduais na entrada da mercadoria em seu território. Também é válida a legislação local que veda a compensação desse pagamento com tributos posteriormente devidos por empresa optante do Simples Nacional. O ministro enfatizou que o Superior Tribunal de Justiça ( REsp 1.193.911 ), na qualidade de órgão judicial competente para uniformizar a interpretação da legislação federal, firmou entendimento no sentido de que o diferencial de alíquota não viola a sistemática do Simples Nacional. A LC 123/2006, por um lado, autoriza expressamente a cobrança do DIFAL (art. 13, § 1º, XIII, g); por outro, veda o creditamento e compensação com as operações subsequentes, não apenas no caso do diferencial, mas em qualquer hipótese. Com base nessas premissas, o relator entendeu que não merece acolhida a alegação de ofensa ao princípio da não cumulatividade, haja vista que o art. 23 da supracitada lei complementar também veda explicitamente a apropriação ou compensação de créditos relativos a impostos ou contribuições abrangidas pelo Simples Nacional. Por conseguinte, e com base na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal ( RE 723.651/ ; ARE 658.571 AgR ; RE 595.450 AgR ; e ARE 938.209 AgR ), é dado ao legislador ordinário excepcionar a não cumulatividade mesmo em situação de plurifasia, impedindo o aproveitamento ou a transferência de créditos, desde que em prol da racionalidade do regime diferenciado e mais favorável ao micro e pequeno empreendedor, bem como lastreado em finalidades com assento constitucional, como é o caso da promoção do federalismo fiscal cooperativo de equilíbrio e da continuidade dos pilares do Estado Fiscal. No tocante à possível ofensa ao postulado do tratamento favorecido às microempresas e empresas de pequeno porte, a jurisprudência assente do Supremo ( ADI 4.033 ) compreende o Simples Nacional como realização desse ideal regulatório, em total consonância ao princípio da isonomia tributária. Contudo, a realização desse objetivo republicano deve ser contemporizada com os demais postulados do Estado Democrático de Direito, como assentou este Tribunal no julgamento do Tema 363 da sistemática da repercussão geral ( RE 627.543 ), cuja tese de julgamento é a seguinte: “É constitucional o art. 17, V, da LC 123/2006, que veda a adesão ao Simples Nacional à microempresa ou à empresa de pequeno porte que possua débito com o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS ou com as Fazendas Públicas Federal, Estadual ou Municipal, cuja exigibilidade não esteja suspensa.” A lei estadual impugnada, inclusive, cristalizou tratamento mais benéfico a sociedades empresárias aderentes ao Simples Nacional, permitindo maior prazo de recolhimento do diferencial de alíquota a essas pessoas jurídicas em comparação aos contribuintes submetidos à sistemática geral, sob as luzes da praticabilidade fiscal e da realização do princípio da capacidade contributiva. Em conclusão, o ministro Edson Fachin considerou não haver como prosperar uma adesão parcial ao regime simplificado, adimplindo-se a obrigação tributária de forma centralizada e com carga menor, simultaneamente ao não recolhimento de diferencial de alíquota nas operações interestaduais. A opção pelo Simples Nacional é facultativa no âmbito da livre conformação do planejamento tributário, arcando-se com bônus e ônus decorrentes dessa escolha empresarial, que, em sua generalidade, representa um tratamento tributário sensivelmente mais favorável à maioria das sociedades empresárias de pequeno e médio porte. À luz da separação dos poderes, é inviável ao Poder Judiciário mesclar as parcelas mais favoráveis dos regimes tributários culminando em um modelo híbrido, sem qualquer amparo legal, conforme jurisprudência deste Tribunal ( RE 1.009.816 AgR ; e RE 936.642 AgR ). A divergência foi inaugurada pelo ministro Alexandre de Moraes, que deu provimento ao recurso para considerar inconstitucional a legislação impugnada, por ofensa aos arts. 146, III, d (2); 170, IX (3); e 179 (4) da CF, bem como à LC 123/2006. Para ele, houve a criação de um tratamento desigual às pequenas e microempresas optantes pelo Simples Nacional, que foram obrigadas a recolher o ICMS tanto na sistemática unificada quanto na modalidade geral, o que representou uma dupla tributação, além da exigência de antecipação do momento de seu recolhimento. Não haverá tratamento diferenciado, revogando a própria LC 123/2006, se for autorizada a cobrança de ICMS tanto no regime do Simples – no momento em que vende ao consumidor final não contribuinte – quanto na sistemática geral, exigindo-se a diferença de alíquota na entrada da mercadoria de origem interestadual. O ministro considerou ainda que o tratamento privilegiado e favorecido afasta a antecipação do pagamento da diferença do ICMS nas operações interestaduais para revenda; pois, ao implementar a segunda operação de venda, o contribuinte faz o pagamento no regime do Simples. Isso é vital para as pequenas empresas, porque uma coisa é antecipar, outra é só pagar depois que recebeu. O regime do Simples é um dos únicos incentivos legais ao empreendedorismo. A par da situação concreta tratada nos autos, o ministro Alexandre de Moraes teceu considerações sobre a hipótese em julgamento na ADI 5.464 , que tem como parâmetro a EC 87/2015 e o Convênio ICMS 93/2015. Para ele, a ratio dessa emenda foi reequilibrar a tributação entre estados de origem e destino. Não se pretendeu alterar o tratamento dado, desde 1988, às micros e pequenas empresas, nem mesmo aumentar a tributação sobre a cadeia produtiva. A referida modificação constitucional tratou apenas do regime geral aplicável às empresas, não se aplicando aos contribuintes optantes pelo Simples. Antes da EC 87/2015, se o destinatário da operação interestadual fosse contribuinte do ICMS, o fornecedor recolhia no estado de origem a alíquota interestadual, enquanto o adquirente pagava a diferença entre a alíquota interna e a interestadual no estado de destino, tanto se a mercadoria fosse para revenda quanto para consumo final. Em seguida, o adquirente poderia fazer a compensação do imposto cobrado. Por sua vez, nas operações interestaduais destinadas a consumidor final não contribuinte, o fornecedor deveria recolher integralmente o ICMS no estado de origem com base na alíquota interna. O estado de destino, nessa situação, nada recebia. Após a citada emenda, a tributação sobre essa situação passou também a ser repartida entre os estados de origem e destino. O primeiro exige o ICMS com base na alíquota interestadual, enquanto o outro cobra a diferença entre a alíquota interestadual e a interna. Há, pois, a distribuição dos recursos entre o estado de origem e o de destino. O ministro Alexandre de Moraes ressaltou que, mesmo após a alteração constitucional, não houve alteração do regime jurídico do Simples, cuja sistemática determina o recolhimento do ICMS juntamente com diversos outros tributos, mediante documento único mensal, nos termos do art. 13 da LC 123/2006. O tratamento diferenciado em relação ao ICMS nem de longe foi tocado pela alteração constitucional; a emenda não modificou o regime do Simples, não tendo havido sua revogação. No entanto, a partir da mudança constitucional, o Convênio ICMS 93/2015 autorizou os estados de destino a cobrarem do fornecedor localizado em outra unidade federada a diferença da alíquota interestadual e da alíquota interna. Impor o recolhimento do Difal aos optantes do Simples representa aumento de tributo, que somente poderia ocorrer por meio de lei. Com efeito, o convênio do Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ) não possui competência para tratar dessa matéria. A divergência foi acompanhada pelos ministros Roberto Barroso, Cármen Lúcia e Ricardo Lewandowski, para quem também não incide o diferencial de alíquota do ICMS no caso de remessa interestadual de mercadoria para revenda. Para eles, as micros e pequenas empresas submetidas ao regime da LC 123/2006, ao contrário das empresas regidas pelo regime geral, recolhem o ICMS em contribuição única e não se creditam do imposto recolhido. O pagamento antecipado do diferencial de alíquota representa um novo recolhimento que não pode ser creditado, criando-se um regime jurídico menos favorecido, portanto maléfico. Em seguida, o julgamento foi suspenso ante o pedido de vista do ministro Gilmar Mendes (1) LC 123/2006: “Art. 13. O Simples Nacional implica o recolhimento mensal, mediante documento único de arrecadação, dos seguintes impostos e contribuições: (...) § 1º O recolhimento na forma deste artigo não exclui a incidência dos seguintes impostos ou contribuições, devidos na qualidade de contribuinte ou responsável, em relação aos quais será observada a legislação aplicável às demais pessoas jurídicas: (...) XIII – ICMS devido: (...) g) nas operações com bens ou mercadorias sujeitas ao regime de antecipação do recolhimento do imposto, nas aquisições em outros Estados e Distrito Federal: (...) 2. sem encerramento da tributação, hipótese em que será cobrada a diferença entre a alíquota interna e a interestadual, sendo vedada a agregação de qualquer valor; h) nas aquisições em outros Estados e no Distrito Federal de bens ou mercadorias, não sujeitas ao regime de antecipação do recolhimento do imposto, relativo à diferença entre a alíquota interna e a interestadual.” (2) CF: “Art. 146. Cabe à lei complementar: (...) III – estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre: (...) d) definição de tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de pequeno porte, inclusive regimes especiais ou simplificados no caso do imposto previsto no art. 155, II, das contribuições previstas no art. 195, I e §§ 12 e 13, e da contribuição a que se refere o art. 239.” (3) CF: “Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (...) IX – tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País.” (4) CF: Art. 179. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios dispensarão às microempresas e às empresas de pequeno porte, assim definidas em lei, tratamento jurídico diferenciado, visando a incentivá-las pela simplificação de suas obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e creditícias, ou pela eliminação ou redução destas por meio de lei.”

RE 970821/RS, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 07.11.2018. (RE-970821)

PRIMEIRA TURMA

DIREITO CONSTITUCIONAL – DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS

Sustentação oral e ampla defesa -

A sustentação oral do representante do Ministério Público que diverge do parecer juntado ao processo, com posterior ratificação, não viola a ampla defesa. Com base nesse entendimento, a Primeira Turma denegou a ordem de habeas corpus.

HC 140780/DF, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 30.10.2018. (HC-140780)

DIREITO CONSTITUCIONAL – DIREITO À EDUCAÇÃO

Pessoas com deficiência: políticas públicas educacionais e intervenção do Judiciário -

A Primeira Turma iniciou julgamento de agravo em recurso extraordinário no qual se discute a possibilidade de o Poder Judiciário intervir na discricionariedade do Executivo na consecução de política pública voltada ao atendimento educacional de adolescente portador de deficit intelectual e transtorno comportamental. Na origem, o Ministério Público estadual propôs ação civil pública buscando compelir o Estado a contratar professor auxiliar para acompanhar aluno em suas necessidades educacionais diárias e de forma individual, seja na escola onde se encontra (privada), seja em escola estadual para a qual se transferir. A parte agravante sustentou a inviabilidade de contratação de segundo professor para cada aluno que tiver necessidades especiais. Ressaltou que a rede estadual oferece uma sala de atendimento especial para essa finalidade, onde são reunidos alunos com necessidades especiais. Os pais da criança, no entanto, não aceitaram o ingresso do filho nessas salas e postularam que ele estudasse em sala normal com professor específico para auxiliá-lo. O relator, ministro Alexandre de Moraes, negou provimento ao agravo interno para manter a decisão monocrática por meio da qual deu provimento ao recurso extraordinário, sob o argumento de que o poder público não pode ser compelido, por ação civil pública, a contratar professor auxiliar para um caso específico. Afirmou que isso representa uma indevida ingerência do Poder Judiciário sobre o Executivo, pois não cabe àquele intervir na discricionariedade do administrador. Entendeu não ter o acórdão recorrido amparo na jurisprudência do STF, refratária às decisões judiciais que obrigam o Poder Executivo a contratar servidores públicos. A ação civil pública foi ajuizada não com fundamento na falta de um serviço público, mas, sim, porque não se concordou com o serviço prestado. O Poder Executivo realiza esse serviço em salas especiais, onde os alunos com demandas especiais são reunidos. Os pais do adolescente, porém, optaram por matriculá-lo em uma escola regular da rede privada, solicitando a presença de um professor auxiliar em sala de aula para acompanhá-lo na compreensão dos conteúdos. Essa solução pode até ser ideal do ponto de vista educacional; porém, do ponto de vista de gerenciamento da rede escolar pública, houve ingerência indevida do Judiciário. Uma vez implementada política pública que dá acesso à educação especial por meio de professores especializados, não cabe ao Judiciário afastar a opção implementada pelo Executivo para exigir uma outra alternativa. Por esse prisma, o acesso à educação não foi negado ao aluno. Para o ministro, se a política pública do administrador não estivesse produzindo os efeitos concretos, se estivesse realmente afetando o acesso à educação de crianças nessa situação, aí sim caberia ação contra esse quadro. Portanto, não é possível rejeitar uma política pública que não foi declarada insuficiente pelo Judiciário para fins de contratação individual de professor. A divergência foi inaugurada pela ministra Rosa Weber, que negou provimento ao recurso extraordinário para manter o acórdão recorrido, que assegurara a implementação da assistência educacional individualizada. Para isso, invocou o art. 208, III, da Constituição Federal (CF) (1), segundo o qual o dever do Estado com educação será efetivado mediante a garantia de atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino. Afirmou, ainda, que o art. 227, § 1º, II (2), da Carta Magna estabelece o dever do Estado de promover programas de assistência integral à saúde da criança, do adolescente e do jovem, mediante políticas de prevenção e atendimento especializado às pessoas portadoras de deficiência física, sensorial ou mental, bem como de integração social do adolescente e do jovem portador de deficiência, por meio de treinamento para o trabalho e a convivência, e a facilitação do acesso aos bens e serviços coletivos, com a eliminação de obstáculos arquitetônicos e de todas as formas de discriminação. Essas determinações asseguram a absoluta prioridade na garantia à criança, ao adolescente e ao jovem, do direito à vida, à saúde, à educação, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à convivência familiar e comunitária, a salvo de toda forma de negligência e discriminação. Nesse sentido, para a ministra, o que está em análise é a obrigação do Estado de garantir o acesso do estudante portador de necessidades especiais a tratamento diferenciado no ambiente escolar, na concretização das condições materiais de igualdade no acesso à educação, cultura, profissionalização, aspectos da formação da criança e do adolescente que se revelam essenciais à inclusão na vida em comunidade. A dificuldade no desempenho de atividades normais acarreta ao indivíduo em desenvolvimento situação de vulnerabilidade, a exigir atenção especial do Estado na concretização dos direitos fundamentais especiais. Nesse âmbito, o acórdão recorrido está em consonância com a jurisprudência do STF ( ADI 5357 MC ), no sentido de ser lícito ao Poder Judiciário, em face do princípio da supremacia da Constituição, em situações excepcionais, determinar que a Administração Pública adote medidas assecuratórias de direitos constitucionalmente reconhecidos como essenciais, sem que isso configure violação ao princípio da separação dos poderes. Essa orientação foi aplicada, inclusive, em outros processos que determinaram a contratação de professores especializados na Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS). Em seguida, o julgamento foi suspenso ante o pedido de vista do ministro Luís Roberto Barroso. (1) CF: “Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de: (...) III – atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino. ” (2) CF: “Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. § 1º O Estado promoverá programas de assistência integral à saúde da criança, do adolescente e do jovem, admitida a participação de entidades não governamentais, mediante políticas específicas e obedecendo aos seguintes preceitos: (...) II – criação de programas de prevenção e atendimento especializado para as pessoas portadoras de deficiência física, sensorial ou mental, bem como de integração social do adolescente e do jovem portador de deficiência, mediante o treinamento para o trabalho e a convivência, e a facilitação do acesso aos bens e serviços coletivos, com a eliminação de obstáculos arquitetônicos e de todas as formas de discriminação.”

ARE 1145501/SP, rel. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 30.10.2018. (ARE-1145501)

DIREITO CONSTITUCIONAL – TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO

TCU: decadência e suspensão de pagamentos de contratos -

A Primeira Turma iniciou julgamento de agravo regimental interposto contra decisão que denegou mandado de segurança impetrado contra ato do Tribunal de Contas da União (TCU). Na espécie, o relator de processo no TCU concedeu medida cautelar para determinar ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), ao BNDES Participações S.A. (BNDESPAR) e à Agência Especial de Financiamento Industrial (FINAME) a suspensão temporária dos pagamentos dos contratos de confissão de dívida celebrados com a Fundação de Assistência e Previdência Social do BNDES (FAPES) até que se delibere em definitivo sobre a questão. Considerou inexistir qualquer disposição no sentido de amparar a revisão do plano de benefícios realizada pelos contratos de confissão de dívida, porque, a partir da edição da Emenda Constitucional (EC) 20/1998, eventual revisão do plano de benefícios sem aplicação da regra de paridade somente poderia ser feita até 16.12.2000. A Fapes, impetrante, sustenta inviável, em face do art. 54 da Lei 9.784/1999 (1), a pretensão de invalidar, por meio de processo administrativo iniciado em 23.11.2016, contratos de confissão de dívida firmados em 2002 e 2004. Alega, ademais, que o TCU não possui a prerrogativa de, diretamente, sustar ou anular contratos. Aduz que a manutenção da decisão do TCU pode aumentar, de forma expressiva, o deficit atuarial da Fapes. Além disso, o futuro espelhamento da dívida implica a criação de outro plano de equacionamento de deficit (PED); a convivência da instituição com dois PEDs simultâneos; e danos à coletividade dos participantes e assistidos da Fapes, em decorrência da eventual majoração da carga contributiva. Aponta ofensa ao art. 71, IX e X, e § 1º, da Constituição Federal (CF) e aos artigos 45, § 2º, da Lei 8.443/1992 e 54 da Lei 9.784/1999. A ministra Rosa Weber (relatora) negou provimento ao recurso. Inicialmente, afastou a decadência administrativa, haja vista a inaplicabilidade do prazo decadencial quinquenal, previsto no art. 54 da Lei 9.784/1999, para regular a atuação da autoridade impetrada em processo de tomada de contas, regido pela Lei 8.443/1992, que consubstancia norma especial. No ponto, citou precedentes do STF: MS 25.641 ; MS 33.414 AgR ; MS 26.297 AgR . Segundo a relatora, o ato impugnado no mandado de segurança foi proferido em representação que pode ser convertida em tomada de contas especial, circunstância a conjurar, por si só, a pretendida aplicação linear do disposto no art. 54 da Lei 9.784/1999. Ressaltou que, ao contrário do que sustenta a Fapes, a tese chancelada pelo STF, nos precedentes mencionados, não foi meramente a da ausência de “decadência intercorrente”, mas, sim, a de que o prazo decadencial para anulação de atos de que decorram efeitos favoráveis aos administrados, previsto no art. 54 da Lei 9.784/1999, não se aplica aos processos de tomada de contas. A compreensão de que o prazo decadencial quinquenal é impróprio para regular a atuação da Corte de Contas em processo que pode resultar na apuração de prejuízo ao erário e na correlata imputação de débito aos responsáveis é consentânea com o entendimento firmado pelo STF no julgamento do RE 852.475 , com repercussão geral reconhecida ( Tema 897 ), no qual assentou a seguinte tese: “São imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa”. Frisou, ainda, que o estágio primitivo das apurações conduzidas pela autoridade impetrada não autoriza descartar a configuração de flagrante inconstitucionalidade nos contratos de confissão de dívida, a qual, se demonstrada, poderá afastar o prazo decadencial da Lei 9.784/1999. Somente após a fixação de todos os parâmetros de índole fática – a análise da efetiva existência dos débitos reconhecidos pelos patrocinadores (BNDES, BNDESPAR e FINAME) e, em caso positivo, da data dos respectivos fatos geradores, bem como da natureza das contribuições vertidas em decorrência dos contratos de confissão de dívida, o que não pode ser feito em mandado de segurança –, o TCU poderá se pronunciar sobre a compatibilidade dos contratos de confissão de dívida com o previsto no art. 202, § 3º, da CF (2). Asseverou não ser possível falar em “inconstitucionalidade flagrante presumida”, mas registrou o aceno da autoridade impetrada no sentido de que mesmo a demarcação das datas dos fatos geradores das dívidas em período anterior à EC 20/1998 não é suficiente, por si, para elidir a regra da paridade contributiva. Isso porque, na espécie, os contratos de confissão de dívida só foram celebrados após o prazo previsto nos artigos 5º e 6º da referida emenda (3). Além disso, a relatora observou que, ainda que se admitisse a submissão do TCU, em processo administrativo que pode resultar na instauração de tomada de contas especial, aos ditames do art. 54 da Lei 9.784/1999, a etapa embrionária das apurações empreendidas não autoriza juízo antecipado sobre a configuração da decadência, ante a possível identificação de má-fé ou de medida impugnativa apta a impedir o decurso do prazo decadencial (Lei 9.784/1999, art. 54, caput, parte final, e § 2º, respectivamente). Esclareceu não se estar a presumir a má-fé. Consta na decisão agravada apenas que a má-fé, ou a adoção de medida impugnativa apta a impedir o decurso do prazo decadencial, poderá ser evidenciada pelo TCU quando do julgamento definitivo da representação. Isso impede o enquadramento linear, com a liquidez e a certeza exigidas em sede mandamental, do ato impugnado como eivado de ilegalidade ou abuso de poder, enquanto violador do art. 54 da Lei 9.784/1999. Em suma, para a ministra Rosa Weber, considerados os precedentes do STF que (1) não admitem a submissão de processo de tomada de contas especial ao estabelecido no art. 54 da Lei 9.784/1999; (2) afastam a aplicação desse dispositivo legal se evidenciada flagrante inconstitucionalidade; e (3) asseveram a possibilidade de apuração de má-fé e a de indicação de medida impugnativa, ao longo do processo administrativo, não se vislumbra o direito líquido e certo vindicado pela impetrante, no tocante à sustentada incidência do prazo decadencial quinquenal. A relatora rejeitou, também, a apontada ofensa ao art. 71, § 1º, da CF (4). Para ela, o TCU, embora não possa, diretamente, sem prévia submissão da matéria ao Congresso Nacional, determinar a sustação ou a anulação de contrato, pode determinar, com base no art. 71, IX, da CF (4), às unidades fiscalizadas que adotem medidas voltadas à anulação de ajustes contratuais. Ademais, as atribuições constitucionais conferidas ao TCU pressupõem a outorga de poder geral de cautela àquele órgão. Ambas prerrogativas conduzem ao reconhecimento da legitimidade do ato impugnado e afastam a configuração de ilegalidade ou de abuso de poder. Se a autoridade impetrada pode vir a determinar que BNDES, BNDESPAR e Finame, patrocinadores da Fapes, anulem os contratos de confissão de dívida, atrelado a essa possível determinação está o poder geral de cautela de impor a suspensão dos repasses mensais decorrentes dessas avenças, como forma de assegurar o próprio resultado útil da futura manifestação da Corte de Contas. Concluiu que a possibilidade de o TCU impor a indisponibilidade de bens contempla a prerrogativa de decretar a indisponibilidade de créditos devidos, como decorrência do contrato de confissão de dívida, pelos patrocinadores à Fapes. Em seguida, o ministro Luís Roberto Barroso pediu vista dos autos. (1) Lei 9.784/1999: “Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé. § 1º No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de decadência contar-se-á da percepção do primeiro pagamento. § 2º Considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade administrativa que importe impugnação à validade do ato. ” (2) CF: “Art. 202. O regime de previdência privada, de caráter complementar e organizado de forma autônoma em relação ao regime geral de previdência social, será facultativo, baseado na constituição de reservas que garantam o benefício contratado, e regulado por lei complementar. (...) § 3º É vedado o aporte de recursos a entidade de previdência privada pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios, suas autarquias, fundações, empresas públicas, sociedades de economia mista e outras entidades públicas, salvo na qualidade de patrocinador, situação na qual, em hipótese alguma, sua contribuição normal poderá exceder a do segurado. ” (3) EC 20/1998: “Art. 5º O disposto no art. 202, § 3º, da Constituição Federal, quanto à exigência de paridade entre a contribuição da patrocinadora e a contribuição do segurado, terá vigência no prazo de dois anos a partir da publicação desta Emenda, ou, caso ocorra antes, na data de publicação da lei complementar a que se refere o § 4º do mesmo artigo. Art. 6º As entidades fechadas de previdência privada patrocinadas por entidades públicas, inclusive empresas públicas e sociedades de economia mista, deverão rever, no prazo de dois anos, a contar da publicação desta Emenda, seus planos de benefícios e serviços, de modo a ajustá-los atuarialmente a seus ativos, sob pena de intervenção, sendo seus dirigentes e os de suas respectivas patrocinadoras responsáveis civil e criminalmente pelo descumprimento do disposto neste artigo. ” (4) CF: “Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete: (...) § 1º No caso de contrato, o ato de sustação será adotado diretamente pelo Congresso Nacional, que solicitará, de imediato, ao Poder Executivo as medidas cabíveis. ” (5) CF: “Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete: (...) IX – assinar prazo para que o órgão ou entidade adote as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, se verificada ilegalidade; ”

MS 35038/DF, rel. Min. Rosa Weber, julgamento em 6.11.2018. (MS-35038)

DIREITO PROCESSUAL PENAL – PENA

Condenação pelo tribunal do júri e execução provisória da pena -

Nas condenações pelo tribunal do júri não é necessário aguardar julgamento de recurso em segundo grau de jurisdição para a execução da pena. Com base nesse entendimento, a Primeira Turma, por maioria, não conheceu da impetração de habeas corpus e revogou liminar que suspendia a execução da pena privativa de liberdade. O paciente foi condenado pelo tribunal do júri a doze anos, cinco meses e dez dias de reclusão, em regime inicial fechado, pela tentativa de homicídio qualificado. O Conselho de Sentença, porém, o absolveu da imputação do delito de homicídio consumado. Em sede de apelação, o tribunal de justiça afastou a redução de 2/3 da pena e estabeleceu o patamar de 1/3 para cada uma das condenações, fixando a pena definitiva em dezenove anos, cinco meses e dez dias de reclusão. Determinou a realização de novo júri no tocante à absolvição do crime de homicídio, bem como o início da execução provisória da pena, reportando-se ao decidido, pelo Supremo, no exame do HC 126.292. A defesa argumentou que a execução da pena dependeria de novo julgamento pelo tribunal do júri e que fundamentar a decisão exclusivamente no entendimento firmado no HC 126.292 ofenderia o princípio da fundamentação das decisões jurídicas, previsto no art. 93, IX, da CF (1). A Turma asseverou que as decisões do tribunal do júri são soberanas. Por isso, o tribunal de justiça pode, eventualmente, anulá-las, mas não pode substituí-las. Vencido o ministro Marco Aurélio (relator), que concedeu a ordem e rejeitou a preliminar de inadequação de habeas corpus. (1) CF: “Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios: (...) IX – todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação;”

HC 140449/RJ, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, julgamento em 6.11.2018. (HC-140449)

DIREITO PROCESSUAL PENAL – RECURSO

Apelação: inclusão de circunstâncias judiciais sem incremento da pena e “reformatio in pejus” – 2 -

Não viola o princípio da proibição da reformatio in pejus a reavaliação das circunstâncias judiciais em recurso de apelação penal, no âmbito do efeito devolutivo, desde que essa não incorra em aumento de pena. Com base nesse entendimento, a Primeira Turma, por maioria, denegou a ordem de habeas corpus. No julgamento em primeira instância, a pena-base foi fixada em dois anos e seis meses acima do mínimo legal devido à avaliação de três circunstâncias negativas: antecedentes, consequências do crime e culpabilidade. O tribunal de justiça local, ao reavaliar as circunstâncias em face de apelação defensiva, retirou a relativa aos antecedentes, por falta de sentença transitada em julgado; acrescentou fundamentação, antes omissa, às consequências do crime; reafirmou a culpabilidade; e incluiu um terceiro fator, circunstâncias do crime, não mencionado anteriormente. Dessa forma, manteve a pena-base. A defesa aduziu a ausência de embasamento fático em relação aos aspectos culpabilidade e consequências do crime e afirmou o caráter desfavorável da reanálise da sentença ao réu, apesar da não alteração da pena ( Informativo 877 ). Vencido o ministro Marco Aurélio (relator), que concedeu a ordem. Ressaltou a impossibilidade de decisão prejudicial ao réu em recurso da defesa e, por conseguinte, a incoerência quanto à substituição das circunstâncias judiciais.

HC 126457/PA, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 6.11.2018. (HC 126457/PA)

SEGUNDA TURMA

DIREITO PROCESSUAL PENAL – PROVAS

Colaboração premiada e termo de compartilhamento -

Não há óbice ao compartilhamento de delação premiada desde que haja delimitação dos fatos. Com base nesse entendimento, a Segunda Turma negou provimento a agravo regimental em que se discutia a possibilidade de compartilhamento de delação premiada entre o Ministério Público Federal (MPF) e o estadual. O Ministério Público estadual requereu acesso aos termos de depoimento de colaborador para fins de apuração de eventual prática de ato de improbidade administrativa por parte de agente público. O MPF, por outro lado, sustentou a superveniente incompetência do Supremo Tribunal Federal (STF) para deliberar sobre as pretensões que envolvam o compartilhamento de provas já remetidas a outras instâncias do Poder Judiciário. A Turma entendeu que remanesce a competência do juízo homologador do acordo de colaboração premiada para deliberação acerca de pretensões que envolvam o compartilhamento de termos de depoimento prestados pelo colaborador, ainda que haja remessa a outros órgãos do Poder Judiciário. Salientou ser pacífica a jurisprudência no sentido de se admitir, em procedimentos administrativos, o empréstimo de prova do processo penal, bem como para subsidiar apurações de cunho disciplinar. Por fim, afirmou que, reconhecidas as delimitações consubstanciadas, no caso, pelo termo de depoimento, não há causa impeditiva ao compartilhamento requerido.

PET 7065/DF, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 30.10.2018. (PET-7065)

DIREITO ADMINISTRATIVO – SISTEMA REMUNERATÓRIO

Forças Armadas e reestruturação remuneratória -

A Segunda Turma, em conclusão de julgamento e por maioria, negou provimento a recurso extraordinário em que se discutia a extensão a servidores públicos civis da majoração de vencimentos, no percentual de 45%, concedida a servidores militares, a título de reestruturação de cargos, com base na Lei 8.237/1991 e no princípio da isonomia dos índices revisionais disciplinados na redação original do art. 37, X, da Constituição Federal (CF) (1). A Turma, inicialmente, destacou que o Supremo Tribunal Federal (STF) firmou orientação no sentido de que a solução de controvérsia referente à natureza de vantagem pecuniária concedida por lei, em revisão geral ou não, possui índole infraconstitucional, o que inviabiliza o prosseguimento do recurso ( Informativo 188 ). Ademais, conforme o Enunciado 339 da Súmula do STF, não cabe ao Poder Judiciário promover aumento de vencimentos de servidores públicos, com base na isonomia. Até porque, neste caso, há lei específica – Lei 8.237/1991 – que se refere, exclusivamente, aos integrantes das Forças Armadas. Assim, tendo em vista tratar-se de reestruturação remuneratória da carreira militar, redefinindo remuneração, soldo, gratificações, adicionais, auxílios, indenizações e proventos, não há que se falar em extensão aos servidores públicos civis. Vencido o ministro Marco Aurélio (relator), que proveu o recurso extraordinário. Entendeu que a majoração de vencimentos concedida aos militares pela referida lei, por alcançar o restabelecimento do poder aquisitivo da remuneração, caracteriza-se como reajuste extensível aos servidores públicos civis – em percentual a ser definido em liquidação de sentença –, à vista do que dispõe o inciso X do art. 37 da CF. (1) CF: “Art. 37. A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e, também, ao seguinte: (...) X – a revisão geral da remuneração dos servidores públicos, sem distinção de índices entre servidores públicos civis e militares, far-se-á sempre na mesma data; (redação original) ”

RE 229637/ SP, rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ ac. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 6.11.2018. (RE-229637)