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Informativo do STF 886 de 01/12/2017

Publicado por Supremo Tribunal Federal


PLENÁRIO

DIREITO CONSTITUCIONAL – CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE

ADI: amianto e efeito vinculante de declaração incidental de inconstitucionalidade

O Supremo Tribunal Federal (STF), por maioria, julgou improcedentes pedidos formulados em ações diretas de inconstitucionalidade ajuizadas contra a Lei nº 3.579/2001 do Estado do Rio de Janeiro. O referido diploma legal proíbe a extração do asbesto/amianto em todo território daquela unidade da Federação e prevê a substituição progressiva da produção e da comercialização de produtos que o contenham. A Corte declarou, também por maioria e incidentalmente, a inconstitucionalidade do art. 2º(1) da Lei federal nº 9.055/1995, com efeito vinculante e “erga omnes”. O dispositivo já havia sido declarado inconstitucional, incidentalmente, no julgamento da ADI 3.937/SP (rel. orig. min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. min. Dias Toffoli, julgamento em 24.8.2017). A partir da manifestação do ministro Gilmar Mendes, o Colegiado entendeu ser necessário, a fim de evitar anomias e fragmentação da unidade, equalizar a decisão que se toma tanto em sede de controle abstrato quanto em sede de controle incidental. O ministro Gilmar Mendes observou que o art. 535 (2) do Código de Processo Civil reforça esse entendimento. Asseverou se estar fazendo uma releitura do disposto no art. 52, X (3), da CF, no sentido de que a Corte comunica ao Senado a decisão de declaração de inconstitucionalidade, para que ele faça a publicação, intensifique a publicidade. O ministro Celso de Mello considerou se estar diante de verdadeira mutação constitucional que expande os poderes do STF em tema de jurisdição constitucional. Para ele, o que se propõe é uma interpretação que confira ao Senado Federal a possibilidade de simplesmente, mediante publicação, divulgar a decisão do STF. Mas a eficácia vinculante resulta da decisão da Corte. Daí se estaria a reconhecer a inconstitucionalidade da própria matéria que foi objeto deste processo de controle abstrato, prevalecendo o entendimento de que a utilização do amianto, tipo crisotila e outro, ofende postulados constitucionais e, por isso, não pode ser objeto de normas autorizativas. A ministra Cármen Lúcia, na mesma linha, afirmou que a Corte está caminhando para uma inovação da jurisprudência no sentido de não ser mais declarado inconstitucional cada ato normativo, mas a própria matéria que nele se contém. O ministro Edson Fachin concluiu que a declaração de inconstitucionalidade, ainda que incidental, opera uma preclusão consumativa da matéria. Isso evita que se caia numa dimensão semicircular progressiva e sem fim. E essa afirmação não incide em contradição no sentido de reconhecer a constitucionalidade da lei estadual que também é proibitiva, o que significa, por uma simetria, que todas as legislações que são permissivas — dada a preclusão consumativa da matéria, reconhecida a inconstitucionalidade do art. 2º da lei federal — são também inconstitucionais. Em divergência, o ministro Marco Aurélio afirmou que o fenômeno previsto no inciso X do art. 52 da CF — regra que atende a independência e harmonia entre os poderes — é constitutivo e não simplesmente declaratório, visto que diz respeito à suspensão da execução da lei no território nacional. Quanto à improcedência dos pedidos, prevaleceu o voto da ministra Rosa Weber (Relatora). A ministra Rosa Weber entendeu que a competência legislativa dos Estados não é plena, e sim suplementar. Por isso, a norma estadual não pode confrontar a norma federal, de modo a provocar o seu afastamento. No caso, a Lei nº 3.579/2001, ao regular aspectos da exploração do amianto relacionados a produção e consumo, proteção do meio ambiente e controle da poluição e proteção e defesa da saúde, não excede dos limites da competência suplementar dos Estados, no tocante a essas matérias. Reputou que a lei atacada não possui conteúdo normativo que leve ao afastamento da norma geral consubstanciada na Lei nº 9.055/1995. A lei federal é norma geral editada pela União no exercício da limitada competência de conformação normativa conferida pelo art. 24, § 1º, da Constituição da República. No ponto, asseverou que os artigos 3º, 4º e 5º da Lei nº 3.579/2001, que proíbem a utilização, a pulverização (spray) e a venda a granel de qualquer tipo de asbesto contemplam enunciados normativos em tudo congruentes com o art. 1º, I, II e III, da Lei nº 9.055/1995. Por sua vez, os artigos 2º e 6º do diploma estadual impugnado, que vedam no território do Estado do Rio de Janeiro, a extração, a fabricação e a comercialização de produtos que contenham asbesto de qualquer tipo, traduzem o devido exercício, pelo legislador fluminense, da competência concorrente suplementar, a teor do art. 24, V, VI e XII, e § 2º, da Constituição da República. Para a ministra Rosa Weber, a Lei nº 9.055/1995, como norma geral que é, adota uma postura teleológica, frente à exploração econômica do amianto, e reconhece seus riscos e a necessidade de controle. Define as condições mínimas a serem observadas para que a exploração do asbesto da variedade crisotila seja tolerada como lícita. A simples tolerância não vincula a atividade legislativa de Estados e Municípios. De modo algum ostenta eficácia preemptiva de atividade legislativa estadual que, no exercício legítimo da competência concorrente, venha a impor controles mais rígidos ou proibitivos. Portanto, a Lei nº 9.055/1995 e a Lei nº 3.579/2001 estão orientadas na mesma direção, tendo a legislação estadual complementar, no caso, apenas avançado onde o legislador federal preferiu se conter. Ao impor um nível de proteção mínima a ser observado em todos os Estados da Federação, a Lei nº 9.055/1995 não pode ser interpretada como obstáculo à maximização dessa proteção, conforme escolha dos Estados, individualmente considerados. A proibição progressiva encartada na legislação estadual em apreço está alinhada à diretriz norteadora e à teleologia do regime previsto na Lei nº 9.055/1995. A mesma conclusão de ausência de inconstitucionalidade formal conduz ao entendimento de que inconstitucional, e em consequência nulo e ineficaz, o art. 2º da Lei nº 9.055/1995, a atrair, por si só, a incidência do art. 24, § 3º, da Lei Maior, segundo o qual “inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena”. Por isso, infundada a alegada afronta ao art. 24, V, VI e XII, e §§ 1º a 4º, da Constituição Federal. Também rejeitou a alegada inconstitucionalidade formal, seja ao fundamento da usurpação da competência privativa da União, seja ao fundamento de vício de iniciativa. Observou que o art. 7º do diploma fluminense estabelece limites de tolerância à exposição a fibras de amianto no ambiente de trabalho. Não expressa norma trabalhista em sentido estrito, mas de proteção do meio ambiente. Já os arts. 8º e 9º da lei fluminense disciplinam a rotulagem de produto quando no território do Estado, o que não representa legislar sobre comércio interestadual. Esclareceu que os arts. 7º, XII, XIII e XVII, e 10 da lei estadual, de iniciativa parlamentar, de fato incorriam em vício de iniciativa, a teor do art. 84, II e VI, “a”, da Lei Maior, na esteira da jurisprudência do STF, enquanto definiam procedimentos a serem observados pela Secretaria de Saúde do Estado do Rio de Janeiro e assinalavam atribuições a servidores do Poder Executivo. Todavia, reconhecida a constitucionalidade do seu art. 2º, e considerado o prazo de quatro anos, contados da sua publicação, para a fabricação e a comercialização de produtos contendo amianto crisotila em sua composição, já exauridos os efeitos dos seus arts. 7º, 8º, 9º e 10, pelo que não mais sujeitos ao controle de constitucionalidade em sede abstrata. Por fim, afastou a apontada inconstitucionalidade material da lei impugnada, por ofensa aos artigos 1º, IV, 5º, “caput”, II, XXII e LIV, e 170, caput, II, IV e parágrafo único, da CF. Explicou que, informada pelo consenso técnico e científico hoje estabelecido, no tocante às premissas fáticas de que (i) todos os tipos de amianto provocam câncer, não tendo sido identificado nenhum limite para o risco carcinogênico do crisotila, e (ii) a sua substituição se mostra absolutamente viável sob o aspecto econômico, a lógica da inconstitucionalidade da proteção insuficiente ampara a conclusão de que não desarrazoadas as iniciativas legislativas relativas à sua regulação, em qualquer nível federativo, ainda que resultem no banimento de todo e qualquer uso do amianto. Vencidos o ministro Marco Aurélio, que votou pela procedência do pedido, reportando-se ao voto por ele proferido na ADI 3.937/SP e, em parte, o ministro Alexandre de Moraes, que, por considerar que o art. 2º da Lei nº 9.055/1995, norma geral, é constitucional e não foi extirpado do ordenamento jurídico, julgou parcialmente procedente os pedidos para dar interpretação conforme ao art. 2º e ao art. 3º, ambos da Lei 3.579/2001 do Estado do Rio de Janeiro, respectivamente, no sentido de que fica proibida, em todo o território do Estado do Rio de Janeiro, a extração de asbesto, excluída a variedade crisotila, e de que fica proibida a utilização de asbesto, excluída a variedade crisotila. (1) Lei nº 9.055/1995: “Art. 2º O asbesto/amianto da variedade crisotila (asbesto branco), do grupo dos minerais das serpentinas, e as demais fibras, naturais e artificiais de qualquer origem, utilizadas para o mesmo fim, serão extraídas, industrializadas, utilizadas e comercializadas em consonância com as disposições desta Lei”. (2) CPC: “Art. 535 (...)§ 5º Para efeito do disposto no inciso III do caput deste artigo, considera-se também inexigível a obrigação reconhecida em título executivo judicial fundado em lei ou ato normativo considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou do ato normativo tido pelo Supremo Tribunal Federal como incompatível com a Constituição Federal, em controle de constitucionalidade concentrado ou difuso”. (3) CF: “Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal: (...)X - suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal”.

ADI 3406/RJ, rel. Min. Rosa Weber, julgamento em 29.11.2017. (ADI-3406) ADI 3470/RJ, rel. Min. Rosa Weber, julgamento em 29.11.2017. (ADI-3470)

1ª Parte :

2ª Parte :

DIREITO CONSTITUCIONAL – CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE

Amianto e competência legislativa concorrente - 16

O Supremo Tribunal Federal, por maioria, julgou improcedentes os pedidos formulados nas ações diretas de inconstitucionalidade ajuizadas contra a Lei nº 11.643/2001 do Estado do Rio Grande do Sul e a Lei nº 12.589/2004 do Estado de Pernambuco; bem como na arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF) ajuizada em face da Lei nº 13.113/2001 e do Decreto 41.788/2002, ambos do Município de São Paulo. Os diplomas impugnados proíbem o uso, a comercialização e a produção de produtos à base de amianto/asbesto naquelas unidades federativas (Informativos 407 , 686 , 848 , 872 e 874 ). A Corte, também por maioria, declarou incidentalmente a inconstitucionalidade do art. 2º da Lei nº 9.055/1995. A maioria dos ministros acompanhou o voto do ministro Edson Fachin (relator da ADPF 109/SP), que o reajustou no sentido do voto proferido na sessão do dia 29.11.2017, no julgamento das ADI 3.406/RJ e ADI 3.407/RJ, ambas de rel. min. Rosa Weber (acima relatados). O ministro Edson Fachin reiterou o acolhimento da declaração incidental de inconstitucionalidade do art. 2º da Lei nº 9.055/1995 suscitada a partir do voto do ministro Dias Toffoli. Na ADPF 109/SP e na ADI 3.357/RS, ficou vencido o ministro Marco Aurélio que julgava procedente o pedido. Na ADI 3356/PE, ficaram vencidos os ministros Eros Grau (Relator) e Marco Aurélio.

ADPF 109/SP, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 30.11.2017. (ADPF-109) ADI 3356/PE, rel. orig. Min. Eros Grau, red. p/ o ac. Min. Dias Toffoli, julgamento em 30.11.2017. (ADI-3356) ADI 3357/RS, rel. orig. Min. Ayres Britto, red. p/ o ac. Min. Dias Toffoli, julgamento em 30.11.2017. (ADI-3357)

DIREITO ADMINISTRATIVO E OUTRAS MATÉRIAS DE DIREITO PÚBLICO - SERVIÇOS

ADI e Programa Mais Médicos

O Plenário, por maioria, julgou improcedente pedido formulado em ação direta de inconstitucionalidade ajuizada contra diversos preceitos da Medida Provisória 621/2013, que instituiu o Programa Mais Médicos e foi, posteriormente, convertida na Lei 12.871/2013. Inicialmente, o Colegiado, por maioria, acolheu preliminar de ilegitimidade ativa “ad causam” da Confederação Nacional dos Trabalhadores Liberais Universitários Regulamentados (CNTU) e determinou a extinção da ADI 5037/DF, cujo objeto era mais abrangente que o da ADI 5035/DF. Prevaleceu o voto do ministro Alexandre de Moraes, que aduziu a falta de legitimidade com fundamento na ausência da pertinência temática e na invalidação do registro sindical da CNTU por decisão judicial transitada em julgado. No particular, reportou-se à ADI 4380/DF (DJE de 27.3.2017), extinta por perda superveniente da legitimidade ativa “ad causam” da mesma Confederação. Os ministros Roberto Barroso, Rosa Weber e Celso de Mello observaram que a invalidação do registro impede que se atribua à CNTU a condição de entidade sindical de grau superior. Vencido o ministro Marco Aurélio, relator, que reconheceu a legitimidade ativa da Confederação. No exame da ADI 5035/DF, o Pleno afastou a preliminar de irregularidade da representação processual da Associação Médica Brasileira (AMBR), em face da superveniente regularização. Aferiu não haver transgressão direta ao texto constitucional, a ensejar a admissibilidade da ação, no tocante aos argumentos envolvendo a falta de domínio do idioma, a indevida interferência na autonomia dos conselhos regionais e a necessidade de tratamento recíproco para validação de diploma obtido no exterior. Embora mencionadas normas constitucionais supostamente infringidas, todo o raciocínio veiculado pela requerente é desenvolvido a partir do cotejo com dispositivos infraconstitucionais. As supostas antinomias jurídicas, se existentes, devem ser resolvidas com base nos critérios hierárquico, cronológico ou da especialidade, revelando-se inadequado o controle normativo abstrato. O Supremo Tribunal Federal (STF) ponderou ser a conversão em lei incapaz de sanar eventuais nulidades inerentes à medida provisória, permanecendo hígida a possibilidade de controle. Sob o ângulo formal, reconheceu caber ao Chefe do Executivo a avaliação de conveniência e oportunidade, ressalvados os casos de excesso de poder. O controle de constitucionalidade das medidas provisórias, quanto aos requisitos de relevância e urgência, ainda que excepcional, mostra-se viável quando manifesto o abuso. Rechaçou as alegações de inconstitucionalidade formal e material suscitadas, porquanto ausente tema constitucional vedado e configurada, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), a situação de relevância e urgência a justificar a edição de normas provisórias pelo Presidente da República. Sob o ângulo material, descabe conferir aos conceitos de nacionalidade e cidadania sentido alargado, a abranger contratação e concessão de visto temporário para médicos intercambistas estrangeiros e dependentes legais. O texto impugnado não dispõe sobre o vínculo jurídico-político por meio do qual passam a conviver com os nacionais, nem versa acerca da participação nos negócios políticos do Estado ou em outras áreas de interesse público. Também é inadequado agasalhar a tese de que a medida provisória disciplinou matéria orçamentária. O ato normativo não trata de planejamento e execução de finanças públicas, tampouco contempla previsão de receitas e fixação de despesas. Veicula política pública referente à saúde, cumprindo ao Poder Executivo implementar, mediante instrumentos próprios, as providências necessárias ao custeio do programa. Na análise da alegada ofensa ao princípio da autonomia universitária, consagrado no art. 207 da Constituição Federal de 1988 (CF/1988) (1), acentuou subordinar-se a autonomia universitária aos preceitos constitucionais e legais. Não se pode confundi-la com soberania ou interpretá-la como independência. Lembrou que a Constituição Federal, no art. 22, XXIV, confere à União competência para estabelecer normas gerais sobre a educação nacional, fixando as diretrizes e bases que devem informar o ensino ministrado no país. Assentou haver limites legitimamente impostos à autonomia didático-científico. Avaliou que as orientações veiculadas na Lei 12.871/2013 estão em harmonia com os parâmetros fixados pelo art. 214 da CF/1988, segundo o qual um dos objetivos do plano nacional de educação consiste em definir diretrizes com o fim de assegurar a manutenção e o desenvolvimento do ensino por meio de ações integradas dos poderes públicos voltadas à “formação para o trabalho” e à “promoção humanística”. É impróprio considerar ofensivas à autonomia universitária as diretrizes fixadas quanto à autorização para o funcionamento de curso de graduação em medicina, à adequação da matriz curricular e ao aperfeiçoamento dos médicos participantes do programa. No tocante aos demais tópicos, salientou que o Projeto Mais Médicos é prioritariamente oferecido aos profissionais diplomados no Brasil. Na sequência, aos médicos formados no exterior. Assinalou que a ocorrência de problemas na aplicação da lei não afeta a constitucionalidade do modelo, opção legítima para a maior preocupação da sociedade que é a saúde. A norma atacada pode não ter sido a melhor opção do ponto de vista técnico, mas foi opção de política pública válida para tentar minimizar a dificuldade de se fazer chegar a possibilidade de atendimento médico aos locais mais distantes. Com esteio nos arts. 3º, III (2); 170 (3) e 198 (4) da CF/1988, verificou-se forma para que se pudesse levar o serviço médico a todos os rincões. Eventuais ilicitudes ou falhas na execução dessas políticas públicas devem ser investigadas e corrigidas. O Plenário apurou que o art. 16 da Lei 12.871/2013 (5), antigo art. 10 da medida provisória, não estaria permitindo o exercício ilegal da medicina ao dispensar a revalidação do diploma estrangeiro do médico intercambista. O próprio art. 5º, XIII, da CF/1988 firma a liberdade do exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer. Não foi a Constituição que determinou a obrigatoriedade de revalidação. A partir do comando constitucional, a legislação geral prevê essa revalidação. Estimou ser uma excepcionalidade para o médico intercambista, exclusivamente no âmbito das atividades de ensino, pesquisa e extensão do Projeto Mais Médicos para Brasil, a dispensa da revalidação nos três primeiros anos de participação. Não significa que essa lei específica deixou de exigir a qualificação necessária ao exercício da medicina, porque os demais artigos da lei colocam que o médico intercambista será supervisionado, a bolsa está ligada a uma universidade, a uma organização de ensino. Há fiscalização do conselho de medicina. O profissional tem todas as suas qualificações atestadas e fiscalizadas. Nada impede que o Congresso Nacional venha a editar lei transformando essa regra específica em geral, dizendo que não é preciso a validação do diploma para determinados países. Reafirmou dizer a lei que isso é temporário, somente para o Projeto Mais Médicos. Para os que não tiverem a revalidação, não é permitido praticar a medicina, no Brasil, em outras questões distintas do programa. Constatou que o arcabouço legal do Programa Mais Médicos trouxe métodos de fiscalização para que não houvesse problemas no exercício da medicina. Ademais, a norma adversada exige expressamente que a carteira de identificação do médico intercambista contenha a mensagem explícita sobre a vedação fora das atividades do Projeto Mais Médicos. Participou ser admitida, em outros países, a prática da não revalidação, exatamente para possibilitar o atendimento a determinadas comunidades. Nesse aspecto, concluiu pela constitucionalidade da lei. Noutro passo, entendeu que a prioridade estabelecida no SUS, com o Programa Mais Médicos, foi o binômio ensino e serviço. Assim, ao longo da especialização, há a obrigatoriedade da prestação de serviços supervisionada por médicos brasileiros. Em vez de se investir na especialização para depois auferir o retorno, o programa pensou em resolver isso fazendo a questão do ensino/serviço ao mesmo tempo. Em virtude disso, reputou não se tratar de vínculo empregatício. É forma acadêmico-profissional que foi encontrada e que é utilizada também em outros países, muito semelhante ao que se faz ao conscrito médico ou dentista. Como resultado, afastou a assertiva de violação ao concurso público. A regra é de um chamamento. Prioriza o médico brasileiro e, somente na falta, procede à sequência. Portanto, identificou inexistir relação trabalhista. Desse ponto de vista, é relação que se faz com entidades, países, de bolsas oferecidas, sem se dar diretamente entre o Brasil e o médico específico. No que concerne a Cuba, há um intermediário que realiza a escolha de médicos ou faz a implantação, mas não é uma diferenciação realizada pelo Brasil. Os médicos que se inscrevem sabem as condições da bolsa. O Brasil não trata desigualmente a bolsa que oferece no programa, faz o chamamento. A bolsa é oferecida a certas entidades e, no caso de Cuba, a entidade supervisora, ligada àquele governo, controla e fica com uma parcela. Entretanto, nada obriga o médico cubano a aceitar essa bolsa. Frisou não haver tratamento diferenciado em todos os requisitos para o médico intercambista. O que acontece é que cada país se estrutura de uma determinada maneira dentro dos pactos tratados com o Brasil ou, nesta situação, das bolsas oferecidas. Vencido o relator no ponto em que deferiu parcialmente o pedido, no que foi acompanhado pela ministra Rosa Weber. (1) CF/1988: “Art. 207. As universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão. § 1º É facultado às universidades admitir professores, técnicos e cientistas estrangeiros, na forma da lei. § 2º O disposto neste artigo aplica-se às instituições de pesquisa científica e tecnológica.” (2) CF/1988: “Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: (...) III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;” (3) CF/1988: “Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: I - soberania nacional; II - propriedade privada; III - função social da propriedade; IV - livre concorrência; V - defesa do consumidor; VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação; VII - redução das desigualdades regionais e sociais; VIII - busca do pleno emprego; IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País. Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.” (4) CF/1988: “Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes: I - descentralização, com direção única em cada esfera de governo; II - atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais; III - participação da comunidade. § 1º O sistema único de saúde será financiado, nos termos do art. 195, com recursos do orçamento da seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de outras fontes. § 2º A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios aplicarão, anualmente, em ações e serviços públicos de saúde recursos mínimos derivados da aplicação de percentuais calculados sobre: I - no caso da União, a receita corrente líquida do respectivo exercício financeiro, não podendo ser inferior a 15% (quinze por cento); II – no caso dos Estados e do Distrito Federal, o produto da arrecadação dos impostos a que se refere o art. 155 e dos recursos de que tratam os arts. 157 e 159, inciso I, alínea a, e inciso II, deduzidas as parcelas que forem transferidas aos respectivos Municípios; III – no caso dos Municípios e do Distrito Federal, o produto da arrecadação dos impostos a que se refere o art. 156 e dos recursos de que tratam os arts. 158 e 159, inciso I, alínea b e § 3º. § 3º Lei complementar, que será reavaliada pelo menos a cada cinco anos, estabelecerá: I - os percentuais de que tratam os incisos II e III do § 2º; II - os critérios de rateio dos recursos da União vinculados à saúde destinados aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, e dos Estados destinados a seus respectivos Municípios, objetivando a progressiva redução das disparidades regionais; III – as normas de fiscalização, avaliação e controle das despesas com saúde nas esferas federal, estadual, distrital e municipal; IV - (revogado). § 4º Os gestores locais do sistema único de saúde poderão admitir agentes comunitários de saúde e agentes de combate às endemias por meio de processo seletivo público, de acordo com a natureza e complexidade de suas atribuições e requisitos específicos para sua atuação. § 5º Lei federal disporá sobre o regime jurídico, o piso salarial profissional nacional, as diretrizes para os Planos de Carreira e a regulamentação das atividades de agente comunitário de saúde e agente de combate às endemias, competindo à União, nos termos da lei, prestar assistência financeira complementar aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, para o cumprimento do referido piso salarial. § 6º Além das hipóteses previstas no § 1º do art. 41 e no § 4º do art. 169 da Constituição Federal, o servidor que exerça funções equivalentes às de agente comunitário de saúde ou de agente de combate às endemias poderá perder o cargo em caso de descumprimento dos requisitos específicos, fixados em lei, para o seu exercício.” (5) Lei 12.871/2013: “Art. 16. O médico intercambista exercerá a Medicina exclusivamente no âmbito das atividades de ensino, pesquisa e extensão do Projeto Mais Médicos para o Brasil, dispensada, para tal fim, nos 3 (três) primeiros anos de participação, a revalidação de seu diploma nos termos do § 2º do art. 48 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. § 1º (VETADO). § 2º A participação do médico intercambista no Projeto Mais Médicos para o Brasil, atestada pela coordenação do Projeto, é condição necessária e suficiente para o exercício da Medicina no âmbito do Projeto Mais Médicos para o Brasil, não sendo aplicável o art. 17 da Lei nº 3.268, de 30 de setembro de 1957. § 3º O Ministério da Saúde emitirá número de registro único para cada médico intercambista participante do Projeto Mais Médicos para o Brasil e a respectiva carteira de identificação, que o habilitará para o exercício da Medicina nos termos do § 2º. § 4º A coordenação do Projeto comunicará ao Conselho Regional de Medicina (CRM) que jurisdicionar na área de atuação a relação de médicos intercambistas participantes do Projeto Mais Médicos para o Brasil e os respectivos números de registro único. § 5º O médico intercambista estará sujeito à fiscalização pelo CRM.”

ADI 5035/DF, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 30.11.2017. (ADI-5035). ADI 5037/DF, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 30.11.2017. (ADI-5037).

1ª Parte :

2ª Parte : 1ª Parte : 2ª Parte :

PRIMEIRA TURMA

DIREITO PENAL - PRESCRIÇÃO

Cômputo do tempo de prisão provisória e reconhecimento da prescrição da pretensão executória

A Primeira Turma rejeitou os embargos de declaração por entender ausentes as hipóteses autorizadoras de seu cabimento e julgou prejudicado o “habeas corpus”, tendo em vista a superveniência de decisão de Vara Federal Criminal, que reconheceu a prescrição da pretensão executória do Estado (vide Informativo 854 ). Na espécie, os embargantes alegaram que estiveram presos provisoriamente pelo período de 3 meses e 13 dias e que a detração desse período, nos termos do art. 42 (1) do Código Penal (CP), implicaria a redução da pena imposta para 3 anos, 11 meses e 18 dias. Argumentaram que, feita a detração do período de prisão provisória, estaria caracterizada, no caso, a prescrição da pretensão executória, conforme preceituam os arts. 109 e 110 (2) do Código de Processo Penal (CPP). (1) Código Penal: “Art. 42 - Computam-se, na pena privativa de liberdade e na medida de segurança, o tempo de prisão provisória, no Brasil ou no estrangeiro, o de prisão administrativa e o de internação em qualquer dos estabelecimentos referidos no artigo anterior”. (2) Código de Processo Penal: “Art. 109. Se em qualquer fase do processo o juiz reconhecer motivo que o torne incompetente, declará-lo-á nos autos, haja ou não alegação da parte, prosseguindo-se na forma do artigo anterior. Art. 110. Nas exceções de litispendência, ilegitimidade de parte e coisa julgada, será observado, no que Ihes for aplicável, o disposto sobre a exceção de incompetência do juízo”.

HC 122577 ED/RJ, rel. Min. Dias Toffoli, julgamento em 28.11.2017. (HC-122577)

DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO TRABALHO – RECURSOS

ED e juízo de admissibilidade de RE-2

Os embargos de declaração opostos contra a decisão de presidente do tribunal que não admite recurso extraordinário não suspendem ou interrompem o prazo para interposição de agravo, por serem incabíveis. Esse é o entendimento da Primeira Turma que, por maioria e em conclusão, converteu embargos declaratórios em agravos regimentais e a eles negou provimento (vide Informativo 700 ). Vencidos os ministros Marco Aurélio e Luiz Fux, que deram provimento aos agravos, por entenderem que todo pronunciamento com carga decisória desafia embargos declaratórios.

ARE 688776 ED/RS, rel. Min. Dias Toffoli, julgamento em 28.11.2017. (ARE-688776) ARE 685997 ED/RS, rel. Min. Dias Toffoli, julgamento em 28.11.2017. (ARE-685997)

DIREITO ADMINISTRATIVO E OUTRAS MATÉRIAS DE DIREITO PÚBLICO - SERVIDOR PÚBLICO CIVIL

Súmula Vinculante 37: reajuste de 13,23% e Lei 13.317/2016 – 2

Não cabe ao Poder Judiciário, que não tem função legislativa, aumentar vencimentos de servidores públicos sob o fundamento de isonomia. Com base nesse entendimento, a Primeira Turma, por maioria, deu provimento a agravo regimental em reclamação (vide Informativo 882 ). No caso, a agravante insurgira contra decisão de turma recursal que, ao apreciar o art. 6º da lei 13.317/2016 (1), concluíra pelo direito do servidor do Judiciário Federal ao reajuste de 13,23%. O Colegiado reputou haver ofensa ao Enunciado 37 da Súmula Vinculante (2). Assentou que a lei posterior nada mais fez do que tentar dar um “bypass” em outras leis de 2003. Vencido o ministro Marco Aurélio (relator), que negou provimento ao agravo, por entender não ter sido invocado o princípio da isonomia no caso. (1) Lei 13.317/2016: “Art. 6o. A vantagem pecuniária individual, instituída pela Lei no 10.698, de 2 de julho de 2003, e outras parcelas que tenham por origem a citada vantagem concedidas por decisão administrativa ou judicial, ainda que decorrente de sentença transitada ou não em julgado, incidentes sobre os cargos efetivos e em comissão de que trata esta Lei, ficam absorvidas a partir da implementação dos novos valores constantes dos Anexos I e III desta Lei”. (2) Súmula Vinculante 37: “Não cabe ao Poder Judiciário, que não tem função legislativa, aumentar vencimentos de servidores públicos sob o fundamento de isonomia”.

Rcl 24965 AgR/SE, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 28.11.2017. (Rcl-24965)

SEGUNDA TURMA

DIREITO ADMINISTRATIVO E OUTRAS MATÉRIAS DE DIREITO PÚBLICO – AGENTES POLÍTICOS

Conselho Nacional de Justiça: processo disciplinar e competência autônoma

A competência originária do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para a apuração disciplinar, ao contrário da revisional, não se sujeita ao parâmetro temporal previsto no art. 103-B, § 4º, V (1) da Constituição Federal. Com base nesse entendimento, a Segunda Turma negou provimento a agravo regimental em mandado de segurança em que se discutia deliberação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que aplicou pena de aposentadoria compulsória a magistrado em processo disciplinar administrativo. As acusações do processo administrativo disciplinar se referiam a demonstrações de proximidade com grupo político local, nepotismo, violação do dever de imparcialidade e atuação jurisdicional eivada de vícios. A defesa alegou que um dos fatos que constitui objeto da denúncia já havia sido julgado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), tendo o agravante sido eximido da responsabilidade por decisão de mérito. Sustentou também que, arquivado o processo, a revisão disciplinar só poderia ser instaurada a menos de um ano do julgamento, conforme o art. 103-B, § 4º, V (1) da Constituição. A Turma, entendeu que o CNJ tem preponderância sobre os dos demais órgãos do Poder Judiciário com exceção do Supremo Tribunal Federal (STF). O Colegiado compreendeu, ainda, que o processo administrativo disciplinar instaurado pelo CNJ se deu em virtude de reclamação disciplinar autônoma, não estando relacionado à decisão do TSE. Ademais, asseverou não haver evidências de ilegalidade ou abuso de poder na atuação do CNJ, que apresenta capacidade correicional e autônoma para apreciar o atendimento, pelo magistrado, dos deveres jurídicos da magistratura. Por fim, dada a ausência de comprovação quanto à parcialidade da atuação do CNJ, a Turma entendeu não caber ao STF adentrar no mérito do julgado disciplinar, visto que não constatado vício procedimental. (1) Constituição Federal/1988: “Art. 103-B. O Conselho Nacional de Justiça compõe-se de 15 (quinze) membros com mandato de 2 (dois) anos, admitida 1 (uma) recondução, sendo: ... § 4º Compete ao Conselho o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, cabendo-lhe, além de outras atribuições que lhe forem conferidas pelo Estatuto da Magistratura: ... V rever, de ofício ou mediante provocação, os processos disciplinares de juízes e membros de tribunais julgados há menos de um ano”.

MS 34685 AgR/RR, rel. Min. Dias Toffoli, julgamento em 28.11.2017. (MS-34685)