JurisHand AI Logo
|

Informativo do STF 870 de 30/06/2017

Publicado por Supremo Tribunal Federal


PLENÁRIO

DIREITO PENAL - COLABORAÇÃO PREMIADA

Homologação de acordo de colaboração premiada e limites de atuação do relator

O Supremo Tribunal Federal (STF), em julgamento conjunto, resolveu questão de ordem e negou provimento a agravo regimental em petição em que se discutiam, respectivamente, os limites da atuação do relator em homologação de colaboração premiada e a distribuição ao ministro Edson Fachin (relator), por prevenção, da Pet 7.003/DF, em razão do Inq 4.112/DF, cujo objeto são fatos relacionados à operação Lava Jato. A questão de ordem foi suscitada pelo relator tendo em conta petição ajuizada pelo governador do Estado de Mato Grosso do Sul e recebida como agravo regimental. O agravante contestou a distribuição por prevenção, e não por sorteio, dos autos em que foram homologados os acordos de colaboração premiada celebrados entre o Ministério Público Federal (MPF) e integrantes de grupo empresarial. Na petição, o governador pretendia o reconhecimento da inexistência de conexão entre os fatos e condutas a ele imputados na Pet 7.003/DF, bem como aqueles apurados no Inq 4.112/DF, e a consequente determinação da livre distribuição do feito. No bojo desse debate, questionou-se o conteúdo dos acordos formalizados entre os colaboradores e o MPF, com destaque para os limites da atuação jurisdicional no instituto em análise e seus reflexos na “persecutio criminis”, à luz das garantias constitucionais e das normas regulamentadoras previstas na Lei 12.850/2013. Diante disso, a questão de ordem foi submetida à deliberação do Plenário do STF, com base no princípio da segurança jurídica, insculpido no art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal (CF). O Plenário, por maioria, resolveu a questão de ordem no sentido de reafirmar — nos limites dos §§ 7º e 11 do art. 4º (1) da Lei 12.850/2013 e incisos I e II do art. 21 (2) do Regimento Interno do STF (RISTF) — a atribuição do relator para, monocraticamente, homologar acordos de colaboração premiada, oportunidade na qual se limita ao juízo de regularidade, legalidade e voluntariedade da avença. Reafirmou, também, a competência colegiada do STF para avaliar, em decisão final de mérito, o cumprimento dos termos bem como a eficácia do acordo. Além disso, consignou que acordo homologado como regular, voluntário e legal gera vinculação condicionada ao cumprimento dos deveres assumidos pela colaboração. Salientou, ainda, que ao órgão colegiado é facultada a possibilidade de analisar fatos supervenientes ou de conhecimento posterior que firam a legalidade, nos termos do § 4º do art. 966 (3) do Código de Processo Civil/2015 (CPC/2015). Inicialmente, a Corte asseverou haver dois pontos em discussão: o poder do relator à luz do RISTF para a homologação do acordo de colaboração premiada, tanto no que concerne ao alcance quanto no que se refere aos limites dos atos; e o momento de aferição do cumprimento dos termos do acordo e sua eficácia. Diante disso, fixou dois nortes: a) os moldes do que foi decidido no HC 127.483/PR (DJE de 4.2.2016), a fim de reafirmar a atribuição do relator como corolário dos poderes instrutórios para ordenar a realização de meios de obtenção de provas, nos termos que lhe são conferidos pelos incisos I e II do art. 21 do RISTF, e, por conseguinte, homologar monocraticamente acordos de colaboração premiada — oportunidade em que se limita ao juízo de regularidade, legalidade e voluntariedade da avença, nos limites do art. 4º, § 7º, da Lei 12.850/2013; e b) o juízo sobre o cumprimento dos termos do acordo de colaboração e sua eficácia, conforme preceitua o art. 4º, § 11, da Lei 12.850/2013. Nesse sentido, frisou que o que se põe ao exame do Colegiado é o momento dessa apreciação, ou seja, o instante da análise de mérito. Essa é a ocasião da prolação da sentença no STF em decisão colegiada, em Turma ou Pleno, etapa em que se confere concretude ao princípio acusatório que rege o processo penal no Estado Democrático de Direito. Destacou, ainda, que atualmente não há mais controvérsia acerca da natureza jurídica do instituto, considerado, em termos gerais, um negócio jurídico processual firmado entre o Ministério Público e o colaborador. Essa característica é representada pelas normas extraídas dos §§ 6º e 7º do art. 4º da Lei 12.850/2013, as quais vedam a participação do magistrado na celebração do ajuste entre as partes e estabelecem os limites de cognoscibilidade dos termos pactuados. Trata-se, portanto, de meio de obtenção de prova cuja iniciativa não se submete à reserva de jurisdição, diferentemente do que ocorre, por exemplo, com a quebra do sigilo bancário ou fiscal e com a interceptação de comunicações telefônicas. Nesse panorama jurídico, as tratativas e a celebração da avença são mantidas exclusivamente entre o Ministério Público e o pretenso colaborador, o que ocorreu no caso concreto. O Poder Judiciário é convocado ao final dos atos negociais apenas para aferir os requisitos legais de existência e validade, com a indispensável homologação. Nesse sentido foram as conclusões sobre a homologação no julgamento do HC 127.483/PR. A Corte destacou, no ponto, que esse provimento interlocutório — o qual não julga o mérito da pretensão acusatória, mas resolve uma questão incidente — tem natureza meramente homologatória, limitando-se ao pronunciamento sobre a regularidade, legalidade e voluntariedade do acordo (art. 4º, § 7º, da Lei 12.850/2013). O juiz, ao homologar o acordo de colaboração, não emite juízo de valor a respeito das declarações eventualmente prestadas pelo colaborador à autoridade policial ou ao Ministério Público, nem confere o signo da idoneidade a seus depoimentos posteriores. Entendimento contrário colocaria em risco a própria viabilidade do instituto, diante da iminente ameaça de interferência externa nas condições acordadas pelas partes, reduzindo de forma significativa o interesse no ajuste. Essa “postura equidistante” do juiz em relação às partes no processo penal informa o citado comando legal que prestigia o sistema acusatório. Se as declarações do colaborador são verdadeiras ou respaldadas por provas de corroboração, esse juízo será feito apenas “no momento do julgamento do processo”, no momento diferido, qual seja, na sentença, conforme previsto no § 11 do art. 4º da Lei 12.850/2013. Nessa etapa, serão analisados os elementos trazidos pela colaboração e sua efetividade. Dessa forma, o Colegiado considerou ser imprescindível chancelar a importância da preservação da segurança jurídica e da própria figura da colaboração premiada como instrumento relevante para coibir delitos, sobretudo contra o erário. Em conclusão quanto ao primeiro ponto discutido, afirmou que, no ato de homologação da colaboração premiada, não cabe ao magistrado, de forma antecipada e extemporânea, tecer juízo de valor sobre o conteúdo das cláusulas avençadas, exceto nos casos de flagrante ofensa ao ordenamento jurídico vigente. Se assim agir, estará interferindo indevidamente na atuação dos órgãos de investigação, porque a celebração do acordo de colaboração premiada não trata de medida submetida à reserva de jurisdição. Repisou que, conforme decidido no julgamento do HC 127.483/PR (DJE de 4.2.2016), o art. 21, I e II, do RISTF confere ao relator poderes instrutórios para ordenar, de forma singular, a realização de quaisquer meios de obtenção de provas. Ressaltou que a natureza jurídica do acordo de colaboração premiada como meio de obtenção de prova é ato inserido nas atribuições regimentais do relator, ainda que os fatos apresentados pelos colaboradores envolvam supostas ações e omissões de ocupante de cargo da Presidência da República, a serem provadas e, se comprovadas, tornadas objeto de processamento de ação penal que compete ao Plenário do STF. Portanto, não há qualquer óbice à homologação do respectivo acordo mediante decisão monocrática. Quanto ao segundo ponto, o Colegiado esclareceu que o ensejo dessa oportunidade se relaciona ao momento para o exercício da aferição do cumprimento dos termos do acordo e da sua eficácia ao que está previsto no § 11 do art. 4º da Lei 12.850/2013. Havendo foro por prerrogativa de função no STF, somente o juízo colegiado — Turma ou Pleno — poderá examinar o recebimento da denúncia e, em caso afirmativo, julgar a respectiva ação penal (RISTF, art. 5º, I). Esse juízo não é do relator, mas do Colegiado, sem embargo, para efeitos ordinatórios e instrutórios, da previsão do art. 21, XV (4), do RISTF. A instauração de inquérito é fase preliminar investigatória, na qual estão as colaborações, que, como meios de obtenção de prova, não são idôneas para se condenar, mas apenas para se ensejar a investigação onde há dúvida a ser dirimida ou indício a ser provado. Por isso, no momento de homologação, o juízo é preliminar e preambular. Somente no julgamento de mérito o Poder Judiciário, autorizado pela lei, poderá definir a extensão da colaboração e analisar o benefício respectivo. A Corte observou, também, que a lei permite ao Judiciário, em fase diferida, após a conclusão da instrução probatória, avaliar se os termos da colaboração premiada foram cumpridos e se os resultados concretos foram atingidos, o que definirá sua eficácia. [Lei 12.850/2013, art. 4º, §§ 9º e 12 (5)] Consignou que a última palavra será sempre do Colegiado, inexistindo quaisquer óbices jurídicos de índole subjetiva ou objetiva aptos a impedir a atuação do relator. O julgamento de mérito será levado a efeito pelo colegiado de juízes do STF ao apreciar os termos e a eficácia do acordo de colaboração. Reside na ambiência inafastável do Pleno a atribuição de juiz natural nos termos da competência deferida pela ordem jurídica, o que não contrasta com os regimentais poderes instrutórios e mesmo cautelares do relator. Salientou, por fim, que o direito subjetivo do colaborador nasce e se perfectibiliza na exata medida em que ele cumpre seus deveres. Estes são “condictio sine qua non” para que o colaborador possa fruir desses direitos. Nesse contexto, o acordo homologado como regular, voluntário e legal gera vinculação, condicionada ao cumprimento dos deveres assumidos pela colaboração, salvo ilegalidade superveniente apta a justificar nulidade ou anulação do negócio jurídico. Vencidos os ministros Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Marco Aurélio. O ministro Ricardo Lewandowski divergiu pontualmente. Para ele, na delação premiada, apesar do relevante papel do MPF, a última palavra — não quanto à conveniência e oportunidade da celebração do acordo, mas quanto à legalidade “lato sensu” da avença — é do Poder Judiciário; neste caso, do juiz relator e também do Plenário, em última análise. Asseverou existirem dois momentos para analisar as cláusulas e condições das delações premiadas. O primeiro, precário e efêmero, é realizado pelo relator, com base no art. 21 do RISTF. Nele se verifica a presença dos requisitos de regularidade, voluntariedade e legalidade. Esta última, no entanto, é empregada em seu sentido amplo. O relator tem o dever de vetar cláusulas que excluam da apreciação do Judiciário lesão ou ameaça de lesão a direitos; estabeleçam o cumprimento imediato da pena ainda não fixada; fixem regime de cumprimento de pena não autorizado pela legislação em vigor; avancem sobre cláusulas de reserva de jurisdição; determinem o compartilhamento de provas e informações sigilosas sem intervenção da justiça; ou autorizem a divulgação de informações que atinjam a imagem ou a esfera jurídica de terceiros. Em um segundo momento, havendo falha ou dados porventura não examinados na análise perfunctória da legalidade pelo relator, caberá ao Plenário apreciar esses aspectos. A decisão do relator permite que a delação premiada possa efetivar-se no plano da realidade fática, mas, embora importante, não vincula o Plenário no que diz respeito aos aspectos da legalidade “lato sensu”. Em suma, a última palavra quanto à legalidade e à constitucionalidade das cláusulas e condições ajustadas no acordo de colaboração premiada é do juiz natural, que, nesse caso, é o Colegiado. Para o ministro Gilmar Mendes, a homologação dos acordos de colaboração premiada é de competência do Colegiado, especialmente em casos que envolvam dispensa da denúncia. O acordo de colaboração premiada deve ser admitido, desde que esteja nos limites da Lei 12.850/2013. Compete à Corte realizar o controle efetivo e eficaz dessa legalidade, que tem como limite apenas o espaço conferido pela lei para o juízo de conveniência e oportunidade da acusação e da defesa, mas é poder-dever do juiz aprofundar a avaliação da legalidade do acordo, inclusive quanto à extensão dos benefícios prometidos. Segundo ressaltou, o acordo de colaboração não é simples meio de obtenção de prova, mas um negócio jurídico com efeitos benéficos ao colaborador. Nessa mesma linha, os acordos, que podem envolver redução de penas, não podem vincular o Colegiado, o qual, na fase de julgamento, avaliará apenas sua eficácia. Em alguns casos, é oferecido perdão ao delator, com dispensa de denúncia, o que torna a decisão monocrática ainda mais incompatível com o sistema jurídico caso o processo não seja submetido ao Colegiado. Por fim, o ministro asseverou que a homologação do acordo não tem eficácia preclusiva completa, a afastar totalmente sua revisão, por ocasião do julgamento. Para o ministro Marco Aurélio, os poderes do relator no momento da homologação do acordo de colaboração premiada não deveriam ser tão amplos. Para ele, não compete ao relator avançar e endossar os parâmetros do acordo. Tal faculdade cabe apenas ao órgão que cumprirá o julgamento de eventual ação penal que venha a ser proposta. (1) Lei 12.850/2013: “Art. 4º O juiz poderá, a requerimento das partes, conceder o perdão judicial, reduzir em até 2/3 (dois terços) a pena privativa de liberdade ou substituí-la por restritiva de direitos daquele que tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e com o processo criminal, desde que dessa colaboração advenha um ou mais dos seguintes resultados: (...) § 7º Realizado o acordo na forma do § 6º, o respectivo termo, acompanhado das declarações do colaborador e de cópia da investigação, será remetido ao juiz para homologação, o qual deverá verificar sua regularidade, legalidade e voluntariedade, podendo para este fim, sigilosamente, ouvir o colaborador, na presença de seu defensor. (...) § 11. A sentença apreciará os termos do acordo homologado e sua eficácia.” (2) Regimento Interno do STF: “Art. 21. São atribuições do Relator: I – ordenar e dirigir o processo; II – executar e fazer cumprir os seus despachos, suas decisões monocráticas, suas ordens e seus acórdãos transitados em julgado, bem como determinar às autoridades judiciárias e administrativas providências relativas ao andamento e à instrução dos processos de sua competência, facultada a delegação de atribuições para a prática de atos processuais não decisórios a outros Tribunais e a juízos de primeiro grau de jurisdição;” (3) Código de Processo Civil de 2015: “Art. 966. A decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando: (...) § 4º Os atos de disposição de direitos, praticados pelas partes ou por outros participantes do processo e homologados pelo juízo, bem como os atos homologatórios praticados no curso da execução, estão sujeitos à anulação, nos termos da lei.” (4) Regimento Interno do STF: “Art. 21. São atribuições do Relator: (...) XV – determinar a instauração de inquérito a pedido do Procurador-Geral da República, da autoridade policial ou do ofendido, bem como o seu arquivamento, quando o requerer o Procurador-Geral da República, ou quando verificar: a) a existência manifesta de causa excludente da ilicitude do fato; b) a existência manifesta de causa excludente da culpabilidade do agente, salvo inimputabilidade; c) que o fato narrado evidentemente não constitui crime; d) extinta a punibilidade do agente; ou e) ausência de indícios mínimos de autoria ou materialidade.” (5) Lei 12.850/2013: “Art. 4º (...) § 9º Depois de homologado o acordo, o colaborador poderá, sempre acompanhado pelo seu defensor, ser ouvido pelo membro do Ministério Público ou pelo delegado de polícia responsável pelas investigações. (...) § 12. Ainda que beneficiado por perdão judicial ou não denunciado, o colaborador poderá ser ouvido em juízo a requerimento das partes ou por iniciativa da autoridade judicial.”

Pet 7074 QO/DF, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 21, 22, 28 e 29.6.2017. (Pet-7074) Pet 7074/DF, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 21, 22, 28 e 29.6.2017. (Pet-7074)

DIREITO PROCESSUAL PENAL - PREVENÇÃO

Colaboração premiada: prevenção e conexão

Quanto à prevenção da relatoria, o Supremo Tribunal Federal (STF) negou provimento ao agravo regimental. Inicialmente, o Plenário fez uma cronologia da tramitação dos feitos relacionados à operação Lava Jato. Registrou que, nos termos do art. 69 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal (RISTF), as ações e os recursos que tratam de fatos conexos ao objeto da Rcl 17.623/PR foram aglutinados sob a mesma relatoria, entre os quais figuram o Inq 3.883/PR e o Inq 4.112/DF, então distribuídos ao ministro Teori Zavascki. Em razão do falecimento do ministro e da posterior opção, por ato da ministra presidente Cármen Lúcia, para integrar a Segunda Turma do STF, o ministro Edson Fachin foi designado, por sorteio, como relator da aludida operação. A redistribuição dos feitos a sua relatoria foi materializada nos autos dos citados inquéritos; pois, à época, a Rcl 17.623/PR já estava arquivada, diante do trânsito em julgado da decisão de mérito. Por isso, tais inquéritos, desde então, vêm sendo utilizados como referência à distribuição por prevenção ao relator dos feitos relacionados à operação Lava Jato, importando afirmar que a correta delimitação do parâmetro de aferição das causas de modificação da competência (conexão e continência) deve ter por referência seus predecessores. Em seguida, o Colegiado teceu considerações acerca do instituto da colaboração premiada, necessárias ao correto desate da controvérsia quanto à prevenção. Nesse sentido, ressaltou que, no seio da avença, o colaborador presta declarações perante a autoridade policial e/ou o Ministério Público com vistas a um ou mais resultados elencados nos incisos do art. 4º da Lei 12.850/2013. Não raro, como ocorre na hipótese em análise, relata-se mais de um fato delituoso em contextos não necessariamente imbricados. Ponderou que, apesar de a Corte ter decidido, no Inq 4.130 QO/PR (DJE de 3.2.2016), que o juízo homologador do acordo não é, necessariamente, competente para o processamento de todos os fatos relatados, existindo, entretanto, entre esses episódios, ao menos um em que se verifique a presença de conexão com objeto de feito previamente distribuído, faz-se imperiosa a observância da regra prevista no art. 79, “caput” (1), do Código de Processo Penal (CPP), a demandar a distribuição por prevenção, nos exatos termos do art. 69, “caput”, do RISTF. Com efeito, verificada a existência de liame de natureza objetiva, subjetiva ou probatória entre o conteúdo de termos de depoimento prestados pelo colaborador e o objeto de investigação em curso, incumbe à autoridade judicial responsável pela supervisão do procedimento investigatório, por força da prevenção, homologar o acordo de colaboração celebrado e adotar, subsequentemente, as providências acerca de cada fato relatado. Tal conclusão resguarda o jurisdicionado dos efeitos da litispendência e da coisa julgada. O Colegiado frisou ser o juízo prevento o detentor de condições mais adequadas para analisar os pontos de contato entre as declarações dos colaboradores e as outras investigações em curso, impondo, se for o caso, a tramitação conjunta. Ressaltou que o pano de fundo da controvérsia está na homologação dos acordos de colaboração premiada celebrados entre integrantes de grupo empresarial e o Ministério Público Federal (MPF). Conforme requerimento ministerial na Pet 7.003/DF, no momento em que submetidos à homologação judicial, noticiou-se a existência, entre os termos de depoimento prestados, de fatos envolvendo autoridades com foro por prerrogativa de função no STF, entre os quais se identificaram procedimentos já distribuídos ao relator com objetos conexos. Salientou que, embora da narrativa exposta pelo MPF não seja possível constatar a prática de atos em detrimento da Petrobras S.A. — parâmetro inicialmente utilizado pela Corte para definir os limites da operação de repercussão nacional (Inq 4.130/PR) e, por conseguinte, a prevenção —, não se verifica qualquer mácula na distribuição do pedido de homologação dos acordos de colaboração. Lembrou, ademais, que a jurisprudência da Corte orienta-se no sentido de ser a fixação da competência de um ministro para relatar causas e recursos um assunto atinente à organização interna do Tribunal e, portanto, indisponível ao interesse das partes. Cuida-se de ato privativo da Presidência do STF, na qualidade de órgão supervisor da distribuição, e, como tal, de mero expediente, a atrair a incidência do art. 504 do Código de Processo Civil (CPC). Quanto ao caso em tela, afirmou que, conforme relatório da decisão proferida na Pet 7.003/DF em 18.5.2017, o colaborador, em seus termos de depoimento, relata, entre outros fatos, o sistema de conta-corrente que teria como beneficiário ex-parlamentar. Este, por sua vez, atuaria em favor de grupo empresarial em questões relativas a financiamentos da Caixa Econômica Federal (CEF), especialmente no âmbito do Fundo de Investimento do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FI-FGTS). O acordo de colaboração premiada submetido à homologação do STF, por conter menção a autoridades detentoras de foro por prerrogativa, demonstra evidente relação de conexidade com o objeto do Inq 4.266, deflagrado para apurar as condutas supostamente delituosas praticadas pelo então deputado federal em detrimento do FI-FGTS, administrado pela CEF. Considerou, ainda, que, embora o aludido inquérito tenha sido baixado ao primeiro grau de jurisdição, pois o investigado não mais ocupa o cargo que lhe garantia a prerrogativa de foro no STF, o art. 74, § 1º, do RISTF estabelece que “o inquérito ou a ação penal, que retornar ao Tribunal por restabelecimento da competência por prerrogativa de foro, será distribuído ao Relator original”. Em outras palavras, caso o investigado incorra em qualquer das situações jurídicas previstas no art. 102, I, “b” e “c”, da Constituição Federal (CF), os autos devem retornar ao ministro Edson Fachin, na qualidade de sucessor do ministro Teori Zavascki no que toca à cadeia de prevenção estabelecida com a distribuição da Rcl 17.623/DF. Por todas essas razões, o Plenário julgou não se verificar qualquer ilegalidade na distribuição por prevenção do pedido de homologação do acordo de colaboração premiada em análise, diante da evidente existência de fatos relatados conexos com investigações em curso sob a relatoria do ministro Edson Fachin. Entendeu não se poder falar, ainda, em violação ao princípio do juiz natural no tocante às providências adotadas na decisão proferida em 18.5.2017, relativamente às pessoas mencionadas nos depoimentos dos colaboradores e desprovidas de foro por prerrogativa na Suprema Corte. Constatado o envolvimento de alguma das autoridades elencadas no art. 102, I, “b” e “c”, da CF, cabe ao STF decidir, com exclusividade, sobre a permanência da investigação ou da ação penal deflagrada em desfavor das demais pessoas não submetidas à jurisdição criminal originária prevista no citado dispositivo constitucional, adotando-se, como regra, o desmembramento, salvo nas hipóteses em que a cisão possa causar prejuízo relevante. Desse modo, tendo em vista que os termos de depoimento prestados pelo colaborador fazem parte de um mesmo acordo de colaboração premiada, os fatos dos quais não há notícia de participação de autoridade detentora de foro por prerrogativa no STF, além daqueles em que não se observa qualquer relação de conexidade com investigações ou ações penais em curso, devem ser encaminhados para tratamento adequado perante a autoridade jurisdicional competente. Na hipótese em concreto, tendo em conta que o agravante atualmente ocupa o cargo de governador do Estado do Mato Grosso do Sul e que os fatos a ele relacionados não se afiguram conexos com quaisquer investigações ou ações penais em curso no STF, o relator autorizou o procurador-geral da República a utilizar os respectivos termos de depoimento perante o Superior Tribunal de Justiça, órgão do Poder Judiciário competente, nos termos do art. 105, I, “a”, da CF, para o adequado tratamento dos fatos em observância às garantias constitucionais aplicáveis. Por fim, concluiu não haver qualquer mácula no procedimento adotado na Pet 7.003/DF, seja na sua distribuição por prevenção, seja nas providências deferidas na decisão de 18.5.2017. (1) CPP: “Art. 79. A conexão e a continência importarão unidade de processo e julgamento, salvo:”

Pet 7074 QO/DF, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 21, 22, 28 e 29.6.2017. (Pet-7074) Pet 7074/DF, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 21, 22, 28 e 29.6.2017. (Pet-7074)

1ª Parte :

2ª Parte : 3ª Parte : 4ª Parte : 5ª Parte : 6ª Parte : 7ª Parte : 1ª Parte : 2ª Parte : 3ª Parte : 4ª Parte : 5ª Parte : 6ª Parte : 7ª Parte : 8ª Parte : 9ª Parte : 10ª Parte :

DIREITO CONSTITUCIONAL - PROCESSO LEGISLATIVO

Interpretação do art. 62, § 6º, da CF e limitação do sobrestamento - 3

O Supremo Tribunal Federal, em conclusão de julgamento e por maioria, denegou a ordem em mandado de segurança impetrado por parlamentares contra decisão do presidente da Câmara dos Deputados em questão de ordem. No ato coator, foi fixada a orientação de que a interpretação adequada do art. 62, § 6º (1), da Constituição Federal (CF) implicaria o sobrestamento apenas dos projetos de lei ordinária, apesar de o dispositivo prever o sobrestamento de todas as deliberações legislativas da Casa em que estiver tramitando medida provisória não seja apreciada em 45 dias (vide Informativos 572 e 778 ). O Colegiado entendeu que a interpretação emanada do presidente da Câmara dos Deputados reflete, com fidelidade, solução jurídica plenamente compatível com o modelo teórico da separação de poderes. Tal interpretação revela fórmula hermenêutica capaz de assegurar, por meio da preservação de adequada relação de equilíbrio entre instâncias governamentais (o Poder Executivo e o Poder Legislativo), a própria integridade da cláusula pertinente à divisão do poder. Nesse contexto, deu interpretação conforme ao § 6º do art. 62 da CF, na redação resultante da Emenda Constitucional 32/2001, para, sem redução de texto, restringir-lhe a exegese. Assim, afastada qualquer outra possibilidade interpretativa, fixou-se entendimento de que o regime de urgência previsto no referido dispositivo constitucional — que impõe o sobrestamento das deliberações legislativas das Casas do Congresso Nacional — refere-se apenas às matérias passíveis de regramento por medida provisória. Excluem-se do bloqueio, em consequência, as propostas de emenda à Constituição e os projetos de lei complementar, de decreto legislativo, de resolução e, até mesmo, de lei ordinária, desde que veiculem temas pré-excluídos do âmbito de incidência das medidas provisórias [CF, art. 62, § 1º, I, II e IV (2)]. Vencido o ministro Marco Aurélio, que concedeu a ordem. Para ele, o dispositivo constitucional em debate é claro no sentido de que a não aprovação de medida provisória após 45 dias deve paralisar toda a pauta, de modo a compelir a Casa Legislativa a se pronunciar de forma positiva quanto à aprovação, ou de forma negativa, considerado o teor da medida provisória. (1) Constituição Federal/1988: “Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional. (...) § 6º Se a medida provisória não for apreciada em até quarenta e cinco dias contados de sua publicação, entrará em regime de urgência, subsequentemente, em cada uma das Casas do Congresso Nacional, ficando sobrestadas, até que se ultime a votação, todas as demais deliberações legislativas da Casa em que estiver tramitando.” (2) Constituição Federal/1988: “Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional. § 1º É vedada a edição de medidas provisórias sobre matéria: I – relativa a: a) nacionalidade, cidadania, direitos políticos, partidos políticos e direito eleitoral; b) direito penal, processual penal e processual civil; c) organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, a carreira e a garantia de seus membros; d) planos plurianuais, diretrizes orçamentárias, orçamento e créditos adicionais e suplementares, ressalvado o previsto no art. 167, § 3º; II – que vise a detenção ou sequestro de bens, de poupança popular ou qualquer outro ativo financeiro; (...) IV – já disciplinada em projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional e pendente de sanção ou veto do Presidente da República.”

MS 27931/DF, rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 29.6.2017. (MS-27931)

DIREITO CONSTITUCIONAL - COMPETÊNCIA LEGISLATIVA

Meio ambiente e poluição: competência municipal - 5

O Município tem competência para legislar sobre meio ambiente e controle da poluição, quando se tratar de interesse local. Com esse entendimento, o Plenário, em conclusão de julgamento e por maioria, negou provimento a recurso extraordinário em que se debateu a competência dos Municípios para legislar sobre proteção do meio ambiente e controle da poluição. Cuida-se, na espécie, de recurso extraordinário contra acórdão de tribunal estadual que, ao julgar apelação em mandado de segurança, reconheceu a legitimidade de legislação municipal com base na qual se aplicaram multas por poluição do meio ambiente, decorrente da emissão de fumaça por veículos automotores no perímetro urbano (vide Informativos 347 , 431 e 807 ). O Colegiado, preliminarmente e por decisão majoritária, conheceu do recurso. Entendeu viável a utilização de mandado de segurança, uma vez ter sido impugnado, no caso, ato concreto fundado na legislação municipal, cuja alegada não recepção pelo ordenamento constitucional vigente é objeto de controvérsia no recurso. Vencido, no ponto, o ministro Dias Toffoli, que reputou extinto o mandado de segurança e, subsequentemente, prejudicado o recurso. Aduziu não caber mandado de segurança contra lei em tese (1). No mérito, o Plenário considerou que as expressões “interesse local”, do art. 30, I, da Constituição Federal (CF), e “peculiar interesse”, das Constituições anteriores, se equivalem e não significam interesse exclusivo do Município, mas preponderante. Assim, a matéria é de competência concorrente (CF, art. 24, VI), sobre a qual a União expede normas gerais. Os Estados e o Distrito Federal editam normas suplementares e, na ausência de lei federal sobre normas gerais, editam normas para atender a suas peculiaridades (2). Por sua vez, os Municípios, com base no art. 30, I e II, da CF (3), legislam naquilo que for de interesse local, suplementando a legislação federal e a estadual no que couber. Vencidos os ministros Cezar Peluso, Eros Grau e Gilmar Mendes, que proveram o recurso. Asseveraram que a matéria de fundo diz respeito ao art. 22, XI, da CF (4). (1) Enunciado 266 da Súmula do STF: “Não cabe mandado de segurança contra lei em tese.” (2) Constituição Federal/1988: “Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: (...) VI – florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição. § 1º No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais. § 2º A competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados. § 3º Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades.” (3) Constituição Federal/1988: “Art. 30. Compete aos Municípios: I – legislar sobre assuntos de interesse local; II – suplementar a legislação federal e a estadual no que couber.” (4) Constituição Federal/1988: “Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: (...) XI – trânsito e transporte.”

RE 194704/MG, rel. orig. Min. Carlos Velloso, red. p/ o ac. Min. Edson Fachin, julgamento em 29.6.2017. (RE-194704)

PRIMEIRA TURMA

DIREITO PROCESSUAL PENAL - PRISÃO PREVENTIVA

Prisão preventiva e destruição de provas

A Primeira Turma, por maioria, deu parcial provimento a agravos regimentais em que se discutiu a revogação de prisão preventiva de acusados do cometimento dos delitos de corrupção passiva, lavagem de dinheiro, constituição e participação em organização criminosa e obstrução à investigação de organização criminosa. De acordo com a decisão agravada, senador da república, com o auxílio de sua irmã, de seu primo e de assessor de outro senador, supostamente recebeu dinheiro espúrio. Segundo a deliberação, há indicativos da prática de lavagem dos valores e estabilidade na associação dos investigados para a realização de atividades delituosas múltiplas. Prevaleceu o voto do ministro Luiz Fux, que deu provimento ao agravo para substituir a prisão preventiva dos agravantes por prisão domiciliar. O ministro também determinou que se proibisse o contato dos investigados entre si, que se exigisse a entrega dos seus passaportes e se monitorassem eletronicamente todos eles. Ainda segundo o ministro, é possível que a atuação livre dos partícipes possa influir na instrução probatória futura. Porém, isso não foi objeto da decretação de prisão. Verificou, além disso, não haver elementos caracterizadores da destruição das provas no tocante ao delito de corrupção e ressaltou existirem indícios para julgar a ação penal quanto a esse delito. Afirmou que os crimes conexos são julgados simultaneamente, mas não há ainda denúncia oferecida. Concluiu que as medidas propostas são explícitas no sentido de inibir toda e qualquer forma de intromissão na produção da prova dos demais delitos. Vencido o ministro Marco Aurélio (relator), que deu provimento aos agravos para que houvesse a imediata expedição de alvará de soltura em favor dos agravantes. Além disso, seria impróprio considerar a gravidade concreta da imputação. Não existe a segregação automática tendo em conta o delito eventualmente cometido, levando à inversão da ordem do processo-crime, que direciona, presente o princípio da não culpabilidade, a apurar para, selada a culpa, prender. Em relação à reiteração delitiva e ao embaralhamento da investigação, é necessário haver dados concretos e individualizados, a demonstrar a indispensabilidade da custódia para a decretação da prisão preventiva. Vencidos, também, os ministros Roberto Barroso e Rosa Weber, que negaram provimento aos agravos. Para eles, a decisão em que se decretou a prisão preventiva dos agravantes está devidamente fundamentada. Reputaram não haver dúvidas quanto à autoria e à materialidade. Por fim, esclareceram que a decisão agravada demonstrou a habitualidade delituosa dos agravantes e a possibilidade de virem a embaralhar a justiça.

AC 4327 AgR/DF-segundo, rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Luiz Fux, julgamento em 20.6.2017. (AC-4327) AC 4327 AgR/DF-quarto, rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Luiz Fux, julgamento em 20.6.2017. (AC-4327) AC 4327 AgR/DF-sexto, rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Luiz Fux, julgamento em 20.6.2017. (AC-4327)

DIREITO PENAL - TIPO PENAL

Crime de estupro e “beijo lascivo”

A Primeira Turma iniciou julgamento de “habeas corpus” em que se pretende a desclassificação do delito previsto no art. 217-A (1) do Código Penal (CP) — estupro de vulnerável —, para a conduta versada no art. 65 (2) do Decreto-Lei 3.688/1941, a Lei de Contravenções Penais (LCP). Na origem, o paciente foi condenado a oito anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, em razão da suposta prática de estupro de vulnerável. A ação consistiu em ato libidinoso (beijo lascivo) contra vítima de cinco anos de idade. O impetrante ressaltou que a conduta do paciente não se enquadra no tipo penal do art. 217-A do CP, mas na contravenção penal de molestamento. Além disso, sustentou a ausência de dano psicológico à vítima, bem como a desproporcionalidade entre os fatos ocorridos e a sanção aplicada. O ministro Marco Aurélio (relator) deferiu a ordem. Para ele, a inovação legislativa reuniu no conceito mais abrangente de estupro os antigos crimes de estupro e de atentado violento ao pudor — redação anterior dos arts. 213 e 214 (3) do CP —, estipulando pena de oito a quinze anos para o delito de constranger menor de catorze anos à conjunção carnal ou à prática de ato libidinoso diverso. O relator asseverou que a conduta do réu se restringiu à consumação de beijo lascivo. Tal proceder não se equipara àquele em que há penetração ou contato direto com a genitália da vítima, situação em que o constrangimento é maior, a submissão à vontade do agressor é total e a violência deixa marcas físicas e psicológicas intensas. Ressaltou, ademais, que o estudo social realizado na fase de instrução processual não revelou alterações emocionais e comportamentais incomuns à faixa etária da menor. Concluiu que o Tribunal de origem, ao condenar o paciente à prática de contravenção penal de molestamento, atuou em harmonia com o Direito posto. Observado o desvalor menor da ação e presente o princípio da proporcionalidade, o juízo optou pela repressão menos severa. Em divergência, o ministro Alexandre de Moraes ponderou que, para determinadas idades, a conotação sexual é uma questão de poder, mais precisamente de abuso de poder e confiança. Entendeu presente, no caso, a existência de conotação sexual e de abuso de confiança para a prática de ato sexual. Para ele, não há como desclassificar a conduta do paciente para a contravenção de molestamento — que não detém essa conotação. Em seguida, o ministro Roberto Barroso pediu vista dos autos. (1) Código Penal: “Art. 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos: Pena – reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.” (2) Lei de Contravenções Penais: “Art. 65. Molestar alguém ou perturbar-lhe a tranquilidade, por acinte ou por motivo reprovável: Pena – prisão simples, de quinze dias a dois meses, ou multa, de duzentos mil réis a dois contos de réis.” (3) Código Penal: “Art. 213. Constranger mulher à conjunção carnal, mediante violência ou grave ameaça: Pena – reclusão, de três a oito anos; (...) Art. 214. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a praticar ou permitir que com ele se pratique ato libidinoso diverso da conjunção carnal: Pena – reclusão de dois a sete anos.” (Redação anterior à vigência da Lei 12.015/2009.)

HC 134591/SP, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 27.6.2017. (HC-134591)

SEGUNDA TURMA

DIREITO TRIBUTÁRIO - TAXAS

Base de cálculo de taxa de fiscalização e funcionamento e número de empregados

As taxas municipais de fiscalização e funcionamento não podem ter como base de cálculo o número de empregados ou ramo de atividade exercida pelo contribuinte. Com base nesse entendimento, a Segunda Turma, por maioria, negou provimento a agravo em que se discutiu a legitimidade da Taxa de Fiscalização de Estabelecimentos (TFE), instituída pela Lei 13.477/2002 do Município de São Paulo. No caso, o recorrente alegou que a base de cálculo da TFE é o custo do exercício do poder de polícia e que a lei paulistana utilizou como critério para aferição justa desse custo o tipo de atividade desenvolvida no estabelecimento. Aduziu, ainda, que o custo da fiscalização municipal é diretamente proporcional à atividade desenvolvida pelo contribuinte. A Turma afirmou não ser possível o conhecimento da matéria relativa à Lei 13.647/2003, que teria introduzido critérios secundários para diferenciar o tamanho de estabelecimentos dedicados a uma mesma atividade. O tema não foi debatido pelo tribunal de origem e o recorrente levantou a questão apenas em sede de agravo regimental manejado no Supremo Tribunal Federal (STF). Vencido o ministro Edson Fachin, que proveu parcialmente o agravo, para determinar a exigibilidade da referida taxa nos exercícios de 2003, 2004 e 2005. Pontuou que o critério adotado pela lei municipal é objetivo e permite presunção razoável do custo de fiscalização do estabelecimento por parte do Município. Dessa forma, é constitucional a adoção de valores fixos retirados da atividade econômica do contribuinte para a mensuração do “quantum debeatur” de taxa.

ARE 990914/SP, rel. Min. Dias Toffoli, julgamento em 20.6.2017. (ARE-990914)

DIREITO ADMINISTRATIVO - SISTEMA REMUNERATÓRIO

Decisão do CNJ e abono de férias de juízes

A Segunda Turma iniciou o julgamento de agravo regimental em mandado de segurança em que se pretende a cassação de decisão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Esta determinou que tribunais de justiça que tenham informado a existência de legislação estadual com previsão de majoração da parcela referida no art. 7º, XVII (1), da Constituição Federal (CF) encaminhem projetos de lei ao Poder Legislativo estadual com a previsão de redução da referida parcela. No caso, o CNJ entendeu serem inconstitucionais as leis estaduais que aumentaram o valor do abono de férias previsto no art. 7º, XVII, da CF. Diante disso, solicitou aos tribunais de justiça o encaminhamento de projetos de lei com alteração ou revogação das normas em vigor. Para os agravantes, o CNJ não poderia impor aos tribunais a promoção de iniciativa de lei para majorar ou reduzir a remuneração dos magistrados. Essa iniciativa, nos termos do texto constitucional, constituiria hipótese de competência privativa dos próprios tribunais. O ministro Dias Toffoli (relator) negou provimento ao agravo regimental. Ressaltou, de início, a juridicidade de o CNJ determinar a correção de ato de tribunal que, embora respaldado por legislação estadual, se distancie da interpretação dada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) aos ditames constitucionais. Para ele, a decisão agravada reconheceu que o CNJ agiu em sintonia com o entendimento do STF sobre o tema. Por isso, deliberou pela inexistência de óbice à adoção de tais providências pelo CNJ, porque tendentes a harmonizar a ordem normativa do tribunal local à interpretação adotada pela Suprema Corte. Assentou, ademais, que a deliberação do CNJ está em consonância com a jurisprudência do STF sobre a uniformidade dos direitos dos magistrados em âmbito nacional, contemplados na Lei Orgânica da Magistratura (LOMAN) (2) em âmbito infraconstitucional. Desse modo, sendo os direitos da magistratura matéria reservada à Loman em âmbito infraconstitucional, somente a essa legislação seria dado estipular fração ao abono de férias distinta daquela prevista na CF. Em seguida, o ministro Ricardo Lewandowski pediu vista dos autos. (1) Constituição Federal/1988: “Art. 7º (...) XVII – gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal.” (2) Lei Complementar 35/1979: “Dispõe sobre a Lei Orgânica da Magistratura Nacional.”

MS 31667/DF-AgR, rel. Min. Dias Toffoli, julgamento em 27.6.2017. (MS-31667)


Informativo do STF 870 de 30/06/2017 | JurisHand AI Vade Mecum