JurisHand AI Logo

Informativo do STF 844 de 21/10/2016

Publicado por Supremo Tribunal Federal


PLENÁRIO

Substituição tributária e restituição - 15

É devida a restituição da diferença do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) pago a mais, no regime de substituição tributária para a frente, se a base de cálculo efetiva da operação for inferior à presumida. Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria e em conclusão, julgou improcedentes os pedidos formulados em ações diretas de inconstitucionalidade. Assim, declarou constitucionais o art. 19, II da Lei 11.408/1996 do Estado de Pernambuco e o art. 66-B, II, da Lei 6.374/1989 do Estado de São Paulo, com redação dada pela Lei estadual paulista 9.176/1995. Os referidos diplomas legais asseguram a restituição do ICMS pago antecipadamente no regime de substituição tributária, nas hipóteses em que a base de cálculo da operação for inferior à presumida — v. Informativos 331, 332, 397, 428, 443 e 455. O Tribunal observou haver distinção substancial entre a ADI 1.851/AL (DJU de 15.5.2003) e as presentes ações diretas, razão pela qual a afastou como paradigma destes julgamentos. Naquele caso, o contribuinte poderia optar pelo regime de substituição tributária com o benefício fiscal da redução da base de cálculo, porém sem a possibilidade de restituição, se o fato gerador ocorrer em valor menor comparado ao presumido. Ademais, ainda que tratassem da mesma questão, o Supremo Tribunal Federal poderia rediscutir o § 7º do art. 150 da Constituição, pois o efeito vinculante conferido àquela decisão estaria limitado aos demais órgãos do Poder Judiciário e ao Poder Executivo, mas não à Suprema Corte. As hipóteses de substituição tributária aqui discutidas são obrigatórias e não envolvem nenhum benefício fiscal, mas visam a assegurar a máxima arrecadação pelo Estado. Isso ocorre em virtude da antecipação ficta do fato gerador e da transferência da responsabilidade pelo recolhimento do imposto. Caso não ocorra o fato gerador no valor presumido, o Estado tem o dever de restituir o montante pago a maior, por não ter competência constitucional para a retenção da diferença, sob pena de violação ao princípio constitucional da vedação ao confisco. Além disso, o Tribunal afastou a alegação de que a restituição implicaria a inviabilidade do sistema de substituição tributária. Vencidos, em ambas as ações, os ministros Nelson Jobim, Eros Grau, Gilmar Mendes, Sepúlveda Pertence e Ellen Gracie, que julgavam procedentes os pedidos.

ADI 2675/PE, rel. min. Ricardo Lewandowski, 19.10.2016. (ADI-2675) ADI 2777/SP, rel. orig. min. Cezar Peluso, red. p/ o ac. min. Ricardo Lewandowski, 19.10.2016. (ADI-2777)

Ação rescisória e inconstitucionalidade de lei

O Plenário, por maioria, julgou procedente pedido formulado em ação rescisória, ajuizada para desconstituir acórdão da Segunda Turma (RE 193.285/RJ, DJU de 17-4-1998). Para o autor, o acórdão rescindendo teria declarado a validade da Lei 1.061/1987 do Município do Rio de Janeiro, não obstante houvesse pronunciamento anterior do Supremo Tribunal Federal no sentido da inconstitucionalidade dessa lei (RE 145.018/RJ, DJU de 10-9-1993). Naquela ocasião, a Corte entendeu que a referida lei municipal, além de violar a independência e harmonia entre os Poderes, desrespeitou a autonomia do ente municipal, pois vinculava a remuneração de seus servidores — sem o processo próprio de fixação e aumento da despesa pública com pessoal — ao Índice de Preços ao Consumidor (IPC) do governo federal. Segundo o Colegiado, o entendimento adotado no julgamento do RE 145.018/RJ, no sentido da inconstitucionalidade da Lei municipal 1.061/1987, não deve ser modificado. Afinal, é inadmissível o argumento de que a irredutibilidade de vencimentos deveria garantir a preservação do valor real da remuneração — com a manutenção de poder aquisitivo —, de forma que o aumento do gasto com pessoal não consistiria em aumento de vencimentos dos servidores, mas, tão somente, em reajuste dos valores devidos. Asseverou que o acórdão rescindendo violou os arts. 13, I, III e V; 43, V; 57, II, e 65 da Emenda Constitucional 1/1969. Enfatizou, também, que, salvo na hipótese de revisão da jurisprudência — art. 103 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal (RISTF) —, o que não se verificou na espécie, a declaração de inconstitucionalidade de lei proferida pelo Plenário, pronunciada por maioria qualificada, deve ser aplicada aos processos posteriormente submetidos ao julgamento das Turmas e do Plenário, conforme regra prevista no art. 101 do RISTF. Vencido o ministro Marco Aurélio, que julgava improcedente o pedido. Para ele, a ação rescisória pressupõe violência à literalidade da lei, não sendo cabível como sucedâneo de incidente de uniformização de jurisprudência. Além disso, a questão relativa ao pronunciamento anterior do Plenário não teria sido suscitada no processo de origem.

AR 1551/RJ, rel. Min. Gilmar Mendes, 19.10.2016. (AR-1551)

Crimes contra a humanidade e prescrição - 2

O Plenário retomou julgamento de pedido de extradição formulado pelo Governo da Argentina em desfavor de um nacional, ao qual se imputa a suposta prática de delitos de lesa-humanidade – v. Informativo 843. O ministro Teori Zavascki, em voto-vista, indeferiu o pedido, por considerar estar extinta a punibilidade dos crimes imputados ao extraditando, nos termos da legislação brasileira, e de não ter sido atendido, portanto, o requisito da dupla punibilidade. Destacou a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal nesse sentido, e relembrou o que contido no artigo 77, VI, do Estatuto do Estrangeiro e no artigo III, “c”, do tratado de extradição entre Brasil e Argentina, quanto à vedação do pleito de extradição quando extinta a punibilidade pela prescrição. Apresentou também o posicionamento da Corte em casos semelhantes, nos quais o pedido de extradição teria sido deferido apenas quanto aos crimes reputados de natureza permanente e considerados não prescritos, em virtude da não cessação da permanência, situação diversa da ora analisada. Relativamente à qualificação dos delitos imputados ao extraditando como de lesa-humanidade, entendeu que essa circunstância não afasta a aplicação da citada jurisprudência. O ministro se referiu a fundamentos expostos na ADPF 153/DF, no sentido da não aplicação, no Brasil, da imprescritibilidade dos crimes dessa natureza, haja vista o país não ter subscrito a Convenção sobre a Imprescritibilidade dos Crimes de Guerra e dos Crimes contra a Humanidade, nem ter a ela aderido, e, ainda, em razão de somente lei interna poder dispor sobre prescritibilidade ou imprescritibilidade da pretensão estatal de punir. Ponderou que, mesmo que houvesse norma de direito internacional de caráter cogente que estabelecesse a imprescritibilidade dos crimes contra a humanidade, ela não seria aplicável no Brasil, por não ter sido ainda reproduzida no direito interno. O Estatuto de Roma, portanto, ainda que considerado norma de estatura supralegal ou constitucional, não elide a força normativa do artigo 5º, XV, da Constituição da República, que veda a retroatividade da lei penal, salvo para beneficiar o réu. Afastou, em seguida, ofensa ao artigo 27 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, dado que, no caso, não se trata de invocação de limitações de direito interno para justificar o inadimplemento do tratado de extradição entre Brasil e Argentina, mas de simples incidência de limitação prevista nesse tratado. Concluiu que, estando prescritos os crimes, segundo o ordenamento jurídico brasileiro, eventual acolhimento do pedido extradicional acabaria por ofender o próprio tratado de extradição, que demanda a observância do requisito da dupla punibilidade. Após os votos dos ministros Rosa Weber, Luiz Fux, Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Marco Aurélio, que acompanhavam a divergência, e do voto do ministro Ricardo Lewandowski, que acompanhava o relator, pediu vista dos autos a ministra Cármen Lúcia (Presidente). Em seguida, o Tribunal deliberou transformar a prisão do extraditando, atualmente em regime fechado, em prisão domiciliar. Ext 1362/DF, rel. min. Edson Fachin, julgamento em 20.10.2016. (Ext-1362) 1ª Parte : 2ª Parte :

PIS/COFINS: base de cálculo e seguradoras - 10

O Tribunal retomou julgamento de embargos de declaração em agravo regimental em recurso extraordinário, afetado ao Pleno pela 2ª Turma, em que seguradora sustenta que as receitas de prêmios não integram a base de cálculo da COFINS, porquanto o contrato de seguro não envolve venda de mercadorias ou prestação de serviços — v. Informativo 556. O ministro Marco Aurélio, em voto-vista, abriu divergência para acolher os embargos de declaração e julgar integralmente procedente o pedido. Afirmou ser equivocado o entendimento do ministro Cezar Peluso (relator), baseado em premissas econômicas, para concluir que as sociedades empresárias em questão tenham de contribuir para o financiamento da seguridade social. Observou que, a toda evidência, o Constituinte de 1988 quis fazer referência à acepção social e jurídica do conceito em vigor no momento da edição da Carta, o qual permanece hígido até hoje. Aduziu que, se a interpretação do Supremo sempre foi no sentido de que o faturamento representa a receita bruta oriunda da venda de mercadorias e/ou prestação de serviços e essa é acepção corrente no vocabulário geral e no técnico-científico, descabe estendê-la a outros limites, a pretexto de fazer justiça tributária. O ministro reconheceu que, com o advento do Código Civil de 2002, teria sido alterado o eixo do direito comercial, que passou a ser empresarial, mas asseverou que a modificação no critério de identificação do empresário não teria o condão de promover a transformação no sentido de conceito secundário e específico, como o do faturamento. Concluiu, no ponto, que a visão do relator implica criação de nova base de incidência da contribuição, para, por meio da interpretação, superar o que pode ser entendido como uma deficiência normativo-constitucional. Acrescentou, por fim, que, ainda que o Colegiado adira ao conceito de faturamento expresso na proposta do relator, deverá prover o recurso, tendo em conta a configuração de vício de inconstitucionalidade formal, consubstanciado na derrogação da isenção estampada no artigo 11 da Lei Complementar nº 70/1991 pelo artigo 3º, § 5º, da Lei 9.718/1998, norma de hierarquia inferior. Afirmou que o inciso II do artigo 146 da Constituição Federal reserva, expressamente, à lei complementar a regulação das limitações constitucionais ao poder de tributar. Em seguida, pediu vista dos autos o ministro Dias Toffoli.

RE 400479 ED-AgR/RJ, rel. min. Cezar Peluso, julgamento em 20.10.2016. (RE-400479)

REPERCUSSÃO GERAL

Substituição tributária: direito à restituição e base de cálculo presumida maior que a efetiva - 2

É devida a restituição da diferença do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) pago a mais, no regime de substituição tributária para a frente, se a base de cálculo efetiva da operação for inferior à presumida. Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, deu provimento ao recurso extraordinário e reconheceu o direito da recorrente de lançar em sua escrita fiscal os créditos de ICMS pagos a maior, nos termos da legislação tributária do Estado de Minas Gerais, respeitado o lapso prescricional de cinco anos previsto na Lei Complementar 118/2005. O Tribunal declarou, também, a inconstitucionalidade do art. 22, § 10, da Lei 6.763/1975 [“§ 10. Ressalvadas as hipóteses previstas nos §§ 11 e 11-A deste artigo, o imposto corretamente recolhido por substituição tributária é definitivo, não ficando, qualquer que seja o valor das saídas das mercadorias: 1) o contribuinte e o responsável sujeitos ao recolhimento da diferença do tributo; 2) o Estado sujeito à restituição de qualquer valor, ainda que sob a forma de aproveitamento de crédito para compensação com débito por saída de outra mercadoria”] e do art. 21 do Decreto 43.080/2002 (“Art. 21. Ressalvada a situação em que o fato gerador presumido não se realizar, o imposto corretamente recolhido por substituição tributária é definitivo, não ficando, qualquer que seja o valor das saídas das mercadorias: I – o contribuinte ou o responsável sujeito ao recolhimento da diferença do tributo; II – o Estado sujeito à restituição de qualquer valor, ainda que sob a forma de aproveitamento de crédito para compensação com débito por saída de outra mercadoria”), ambos do Estado de Minas Gerais. Além disso, conferiu interpretação conforme à Constituição às expressões “não se efetive o fato gerador presumido” e “fato gerador presumido que não se realizou”, contidas, respectivamente, no § 11 do art. 22 da Lei estadual [“§ 11. É assegurado ao contribuinte substituído o direito à restituição do valor pago por força da substituição tributária, nas seguintes hipóteses: 1) caso não se efetive o fato gerador presumido” ] e no art. 22 do Regulamento do ICMS (“Art. 22. Para a restituição do valor do imposto pago a título de substituição tributária correspondente a fato gerador presumido que não se realizou, o contribuinte observará o disposto neste Capítulo”), para que sejam entendidas em consonância à tese fixada — v. Informativo 843. A Corte afirmou que a substituição tributária, prevista no art. 150, § 7º, da Constituição Federal, tem como fundamento o princípio da praticidade. Desse modo, promove comodidade, economicidade e eficiência na execução administrativa das leis tributárias. Ponderou, entretanto, que o princípio da praticidade tributária também encontra freio nos princípios da igualdade, capacidade contributiva e vedação do confisco, bem como na arquitetura de neutralidade fiscal do ICMS. Por conseguinte, é papel institucional do Poder Judiciário tutelar situações individuais que extrapolem o limite da razoabilidade. Deve-se, portanto, interpretar aquele dispositivo constitucional em consonância com o significado jurídico-político do Estatuto Constitucional dos Contribuintes, tal como instituído pela Seção “Das Limitações do Poder de Tributar” da Constituição Federal. Noutras palavras, na qualidade de invenção humana voltada a discriminar o público do privado e redistribuir renda e patrimônio, a tributação não pode transformar uma ficção jurídica em uma presunção “juris et de jure”, tal como ocorreria se o fato gerador presumido tivesse caráter definitivo, logo alheio à narrativa extraída da realidade do processo econômico. O Plenário observou, ainda, não haver autorização constitucional para cobrar mais do que resultaria da aplicação direta da alíquota sobre a base de cálculo existente na ocorrência do fato gerador. Assim, uma interpretação restritiva do § 7º do art. 150 da Constituição, com o objetivo de legitimar a não restituição do excesso, representaria injustiça fiscal inaceitável em um Estado Democrático de Direito, fundado em legítimas expectativas emanadas de uma relação de confiança e justeza entre Fisco e contribuinte. Desse modo, a restituição do excesso atende ao princípio que veda o enriquecimento sem causa, haja vista a não ocorrência da materialidade presumida do tributo. Vencidos os ministros Teori Zavascki, Dias Toffoli e Gilmar Mendes, que negavam provimento ao recurso extraordinário sob o argumento de que considerar a base de cálculo presumida como provisória, e não como definitiva, inviabilizaria o instituto da substituição tributária. Ademais, destacavam que o valor presumido não seria arbitrário, pois leva em conta a média praticada pelo mercado. Por fim, o Plenário, por maioria, modulou os efeitos do julgamento. Dessa forma, esse precedente poderá orientar todos os litígios judiciais pendentes submetidos à sistemática da repercussão geral e os casos futuros oriundos de antecipação do pagamento de fato gerador presumido, tendo em conta o necessário realinhamento das administrações fazendárias dos Estados-membros e de todo o sistema judicial. No entanto, em vista do interesse social e da segurança jurídica, decidiu que se preservem as situações passadas que transitaram em julgado ou que nem sequer foram judicializadas. Vencido, quanto à modulação, o Ministro Marco Aurélio.

RE 593849/MG, rel. min. Edson Fachin, 19.10.2016. (RE-593849)

1ª Parte :

2ª Parte : 3ª Parte :

Entidades beneficentes de assistência social e imunidade - 6

O Plenário retomou julgamento conjunto de recurso extraordinário e de quatro ações diretas de inconstitucionalidade em que debatida a constitucionalidade de dispositivos da legislação ordinária e infralegal que estabeleceram requisitos e procedimentos para fins de enquadramento na qualificação de “entidades beneficentes de assistência social”, indispensável para a fruição da imunidade prevista no art. 195, § 7º, da Constituição. Os dispositivos atacados “isentaram” das contribuições para a seguridade social apenas as entidades voltadas exclusivamente à assistência social beneficente de pessoas carentes e desde que prestada de modo gratuito e, no caso de serviços de saúde, desde que garantida a oferta de 60% dos atendimentos ao Sistema Único de Saúde (SUS). Alternativamente, às entidades sem fins lucrativos de saúde e de educação que não satisfizessem as condições anteriores foi concedida a possibilidade de desfrutar de “isenção parcial” das contribuições sociais, na proporção do valor das vagas ou dos atendimentos oferecidos gratuitamente a pessoas carentes. No caso, entidades dedicadas a serviços de saúde e de educação alegam que lei ordinária seria espécie normativa inidônea para estipular como requisito indispensável para a incidência de normas constitucionais de imunidade em geral a gratuidade (total ou parcial) dos serviços prestados a título de assistência social. Afirmam que, por traduzirem uma espécie de limitação ao poder de tributar, as normas de imunidade somente poderiam ser integradas por leis complementares, por imposição do art. 146, II, da Constituição, cuja força cogente não cederia diante da redação genérica da parte final do art. 195, § 7º ? v. Informativo 749. Em voto-vista, o ministro Teori Zavascki, preliminarmente, ao aplicar o princípio da fungibilidade, conheceu das ações diretas de inconstitucionalidade como ações de arguição de descumprimento de preceito fundamental. Nas arguições decorrentes da conversão da ADI 2.028/DF e da ADI 2.036/DF, acompanhou o ministro Joaquim Barbosa (relator), e julgou procedentes os pedidos formulados. Nas arguições decorrentes da conversão da ADI 2.228/DF e da ADI 2.621/DF, reputou-as procedentes, em parte, para declarar a inconstitucionalidade dos arts. 2º, IV; 3º, VI, §§ 1º e 4º, parágrafo único, do Decreto 2.536/1998, assim como dos arts. 1º, IV; 2º, IV e §§ 1º e 3º; 7º, § 4º, do Decreto 752/1993. No que se refere ao recurso extraordinário, haja vista que o acórdão recorrido se assentou não apenas na questão da reserva de lei complementar como veículo adequado à definição do modo beneficente de prestar assistência social ? única matéria tratada no recurso ?, mas também na circunstância de a demandante não ter preenchido uma das exigências validamente previstas pela Lei 8.212/1991 ? a de obtenção de título de utilidade pública federal ?, o ministro negou provimento ao recurso. Afirmou que a reserva de lei complementar aplicada à regulamentação da imunidade tributária, prevista no art. 195, § 7º, da Constituição Federal, limita-se à definição de contrapartidas a serem observadas para garantir a finalidade beneficente dos serviços prestados pelas entidades de assistência social, o que não impede seja o procedimento de habilitação dessas entidades positivado em lei ordinária. Explicou que, justamente por cumprir uma missão mais nobre, a imunidade se diferencia das isenções e demais figuras de desoneração tributárias. A imunidade de contribuições sociais serve não apenas a propósitos fiscais, mas à consecução de alguns dos objetivos que são fundamentais para a República, como a construção de uma sociedade solidária e voltada para a erradicação da pobreza. Objetivos fundamentais da República não podem ficar à mercê da vontade transitória de governos. Devem ser respeitados, honrados e valorizados por todos os governos, transcendendo a frequência ordinária em que se desenvolvem costumeiramente os juízos políticos de conveniência e oportunidade, para desfrutar da dignidade de políticas de Estado. Portanto, não se pode conceber que o regime jurídico das entidades beneficentes fique sujeito a flutuações legislativas erráticas, não raramente influenciadas por pressões arrecadatórias de ocasião. É inadmissível que tema tão sensível venha a ser regulado, por exemplo, por meio de medida provisória. O cuidado de inibir a facilitação de flutuações normativas nesse domínio justifica-se, sobretudo, pela própria jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que afirma não haver direito adquirido a determinado tratamento tributário. Assim, diante da relevância maior das imunidades de contribuições sociais para a concretização de uma política de Estado voltada à promoção do mínimo existencial e da necessidade de evitar que as entidades compromissadas com esse fim sejam surpreendidas com bruscas alterações legislativas desfavoráveis à continuidade de seus trabalhos, deve incidir nesse caso a reserva legal qualificada prevista no art. 146, II, da Constituição Federal. É essencial frisar, todavia, que essa proposição não produz uma contundente reviravolta na jurisprudência da Corte a respeito da matéria, mas apenas um reajuste pontual. Aspectos meramente procedimentais referentes à certificação, à fiscalização e ao controle administrativo continuam passíveis de definição em lei ordinária. A lei complementar é forma somente exigível para a definição do modo beneficente de atuação das entidades de assistência social contempladas pelo art. 195, § 7º, da Constituição, especialmente quanto às contrapartidas a serem observadas por elas. Por essas razões, o ministro Teori Zavascki concluiu pela inconstitucionalidade dos artigos da Lei 9.732/1998 que criaram contrapartidas a serem observadas pelas entidades beneficentes, e também dos dispositivos infralegais atacados nessas ações (arts. 1º, IV; 2º, IV e §§ 1º e 3º; 7º, § 4º, do Decreto 752/1993), que perderam o indispensável suporte legal do qual derivam. Contudo, não há vício formal – tampouco material – nas normas acrescidas ao inciso II do art. 55 da Lei 8.212/1991 pela Lei 9.429/1996 e pela MP 2.187/2001, essas últimas impugnadas pela ADI 2.228 e pela ADI 2.621. As sucessivas redações do art. 55, II, da Lei 8.212/1991 têm em comum a exigência de registro da entidade no CNAS, a obtenção do certificado expedido pelo órgão e a validade trienal do documento. Como o conteúdo da norma tem relação com a certificação da qualidade de entidade beneficente, fica afastada a tese de vício formal. Essas normas tratam de meros aspectos procedimentais necessários à verificação do atendimento das finalidades constitucionais da regra de imunidade. Nesse aspecto, sempre caberá lei ordinária. A ministra Rosa Weber e os ministros Luiz Fux e Ricardo Lewandowski acompanharam o voto do ministro Teori Zavascki. O ministro Dias Toffoli não converteu as ações diretas em arguição de descumprimento de preceito fundamental. Ressaltou que, havendo a inclusão de pauta de ação direta antes do exaurimento da eficácia da lei temporária impugnada, o Tribunal deveria julgá-la. No mérito, entretanto, acompanhou o ministro Teori Zavascki. Em seguida, o ministro Marco Aurélio pediu vista das ações diretas e indicou adiamento do recurso extraordinário.

ADI 2028/DF, rel. min. Joaquim Barbosa, 19.10.2016. (ADI-2028) ADI 2036/DF, rel. min. Joaquim Barbosa, 19.10.2016. (ADI-2036) ADI 2621/DF, rel. min. Joaquim Barbosa, 19.10.2016. (ADI-2621) ADI 2228/DF, rel. min. Joaquim Barbosa, 19.10.2016. (ADI-2228) RE 566622/RS, rel. min. Marco Aurélio, 19.10.2016. (RE-566622)

1ª Parte :

2ª Parte :

Princípio da legalidade tributária: taxa e ato infralegal - 7

O Plenário concluiu o julgamento conjunto de dois recursos extraordinários — v. Informativos 832 e 842. No RE 838.284/SC, discutiu-se a validade da exigência de taxa para a expedição da Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) baseada na Lei 6.994/1982, que estabelece limites máximos para a ART. O Colegiado, por maioria, negou provimento ao recurso. Assentou que não viola a legalidade tributária lei que, prescrevendo o teto, possibilita ao ato normativo infralegal fixar o valor de taxa em proporção razoável com os custos da atuação estatal, valor esse que não pode ser atualizado por ato do próprio conselho de fiscalização em percentual superior aos índices de correção monetária legalmente previstos. O Tribunal, de início, traçou retrospecto acerca do tratamento das taxas devidas em decorrência da ART. Demonstrou, em síntese, que diversas leis passaram a autorizar a fixação, por atos infralegais, de taxas a favor de conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas, sem a prescrição de teto legal ou mesmo homogeneidade de tratamento. A Lei 6.994/1982, por sua vez, delegou ao órgão federal de cada entidade a fixação dos valores das taxas correspondentes aos serviços relativos a atos indispensáveis ao exercício da profissão, observados os respectivos limites máximos. Com essa lei, a temática das taxas cobradas a favor dos conselhos de fiscalização de profissões ganhou nova disciplina. Cabe indagar, portanto, se a fixação de valor máximo em lei formal atende ao art. 150, I, da Constituição Federal, haja vista a natureza jurídica tributária da taxa cobrada em razão do poder de polícia (fiscalização de profissões). Em outras palavras, cumpre saber qual o tipo e o grau de legalidade que satisfazem essa exigência, sobretudo quanto à espécie tributária taxa. O Tribunal teceu considerações sobre o princípio da legalidade tributária e apontou para o esgotamento do modelo da tipicidade fechada como garantia de segurança jurídica. Dessa forma, o legislador tributário pode valer-se de cláusulas gerais, e as taxas cobradas em razão do exercício do poder de polícia podem ter algum grau de indeterminação, por força da ausência de minuciosa definição legal dos serviços compreendidos. Diante de taxa ou contribuição parafiscal, é possível haver maior abertura dos tipos tributários. Afinal, nessas situações, sempre há atividade estatal subjacente, o que acaba deixando ao regulamento uma carga maior de cognição da realidade, sobretudo em matéria técnica. Assim, a ortodoxa legalidade, absoluta e exauriente, deve ser afastada, em razão da complexidade da vida moderna e da necessidade de adaptação das leis tributárias à realidade em constante mudança. Nesse sentido, deve-se levar em conta o princípio da praticidade no direito tributário e a eficiência da Administração Pública, o que tem sido a tendência jurisprudencial da Corte. Especificamente no que se refere a taxas, ao contrário do que ocorre com impostos, o montante cobrado não pode variar senão em função do custo da atividade estatal, com razoável equivalência entre ambos. O grau de arbítrio do valor da taxa, no entanto, tende a ficar mais restrito nos casos em que o aspecto quantitativo da regra matriz de incidência é complementado por ato infralegal. Isso ocorre porque a razão autorizadora da delegação dessa atribuição anexa à competência tributária está justamente na maior capacidade de a Administração, por estar estritamente ligada à atividade estatal direcionada ao contribuinte, conhecer a realidade e dela extrair elementos para complementar o aspecto quantitativo da taxa. Assim, há, com maior grau de proximidade, a razoável equivalência do valor da exação com os custos a ressarcir. O Plenário ponderou, ainda, se a taxa devida pela ART, na forma da Lei 6.994/1982, insere-se nesse contexto. A princípio, não há delegação de poder de tributar no sentido técnico da expressão. A lei não repassa ao ato infralegal a competência de regulamentar, em toda profundidade e extensão, os elementos da regra matriz de incidência da taxa devida em razão da ART. Os elementos essenciais da exação podem estar nas leis de regência. Assim, no antecedente da regra matriz de incidência, está o exercício do poder de polícia relacionado à ART a que todo contrato está sujeito. O sujeito passivo é o profissional ou a empresa, ao passo que o sujeito ativo é o respectivo conselho regional. No aspecto quantitativo, a lei prescreve o teto sob o qual o regulamento poderá transitar. Esse diálogo realizado com o regulamento é um mecanismo que objetiva otimizar a justiça comutativa. As diversas resoluções editadas sob a vigência dessa lei parecem condizer com a assertiva. Afinal, em geral, esses atos normativos, utilizando-se de tributação fixa, determinam uma quantia determinada de taxa relativa à ART para cada classe do valor de contrato. Esse valor é utilizado como critério para incidência do tributo, como elemento sintomático do maior ou menor exercício do poder de polícia. Ademais, não cabe aos conselhos realizar a atualização monetária do teto legal, ainda que constatem que os custos a serem financiados pela taxa relativa à ART ultrapassam o limite. Entendimento contrário violaria o art. 150, I, da Constituição. Em suma, a norma em comento estabelece diálogo com o regulamento em termos de a) subordinação, ao prescrever o teto legal da taxa referente à ART; b) desenvolvimento da justiça comutativa; e c) complementariedade, ao deixar valoroso espaço para o regulamento complementar o aspecto quantitativo da regra matriz da taxa cobrada em razão do exercício do poder de polícia. Portanto, o Legislativo não abdica de sua competência acerca de matéria tributária e, a qualquer momento, pode deliberar de maneira diversa e firmar novos critérios políticos ou paradigmas a serem observados pelo regulamento. Vencidos os ministros Marco Aurélio e Ricardo Lewandowski, que proviam o recurso, por entenderem inconstitucional a exigência da taxa para expedição de ART nos termos da Lei 6.994/1982, considerada a ofensa ao art. 150, I, da CF. Já no que se refere ao RE 704.292/PR, o Colegiado debateu a natureza jurídica da anuidade de conselhos de fiscalização profissional, bem como a possibilidade de fixação de seu valor por meio de resolução interna de cada conselho. O Tribunal negou provimento ao recurso e declarou a inconstitucionalidade do art. 2º da Lei 11.000/2004. Assim, excluiu de sua incidência a autorização dada aos conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas para fixar as contribuições anuais devidas por pessoas físicas ou jurídicas. Por arrastamento, também reputou inconstitucional a integralidade do § 1º do aludido preceito. Para o Colegiado, é inconstitucional, por ofensa ao princípio da legalidade tributária, lei que delega aos conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas a competência de fixar ou majorar, sem parâmetro legal, o valor das contribuições de interesse das categorias profissionais e econômicas, usualmente cobradas sob o título de anuidades, vedada, ademais, a atualização desse valor pelos conselhos em percentual superior aos índices legalmente previstos. Reportou-se aos fundamentos teóricos do caso anterior (RE 838.284/SC) para afirmar que a lei impugnada, ao confiar ao ato infralegal a otimização dos princípios da capacidade contributiva e da isonomia, fixou diálogo com o regulamento. No entanto, ao prever a necessidade de graduação das anuidades conforme os níveis superior, técnico e auxiliar, não o fez em termos de subordinação nem de complementariedade. Os dispositivos não estabelecem expectativas e criam situação de instabilidade institucional, deixando ao puro arbítrio do administrador o valor da exação. Não há previsão legal de qualquer limite máximo para a fixação do valor da anuidade. Esses preceitos fazem com que a deliberação política de obter o consentimento dos contribuintes deixe de ser do parlamento e passe para os conselhos de fiscalização, entidades autárquicas eminentemente administrativas, portanto destituídas de poder político. Para o contribuinte, surge uma situação de intranquilidade e incerteza por não saber o quanto lhe poderá ser cobrado; para o fisco, significa uma atuação ilimitada e carente de controle. Tudo retrata que a remissão ao regulamento se deu de maneira insubordinada, sem delimitação do grau de concreção com que o elemento do tributo (seu valor) pode ser disciplinado pelo ato autorizado. Nesse sentido, o regulamento autorizado não complementa o aspecto quantitativo da regra matriz de incidência tributária (elemento essencial na definição do tributo), mas o cria, inovando, assim, a ordem jurídica. O grau de indeterminação do art. 2º da Lei 11.000/2004, na parte em que autoriza os conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas a fixar as contribuições anuais devidas por pessoas físicas ou jurídicas relacionadas com suas atribuições, provocou a degradação da reserva legal, consagrada pelo art. 150, I, da Constituição Federal. Isso porque a remessa ao ato infralegal não pode resultar em desapoderamento do legislador para tratar de elementos tributários essenciais. O respeito ao princípio da legalidade demanda que a lei, em sentido estrito, prescreva o limite máximo do valor da exação, ou os critérios para calculá-lo, o que não ocorreu na espécie. O Tribunal verificou que a jurisprudência tem acompanhado esse entendimento. Assim, da mesma forma que é vedado aos conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas fixar em abstrato as contribuições anuais, é defeso, a pretexto de atualização monetária, majorar as anuidades em patamar superior ao teto fixado em lei. Orientação diversa possibilitaria a efetiva majoração do tributo por ato infralegal, em nítida ofensa ao art. 150, I, da Constituição Federal. Por fim, na discussão sobre o correto índice de atualização monetária a ser aplicável ao período, seja para a correção do referido teto legal, seja para a correção do valor devido à recorrida, o Tribunal destacou que, geralmente, esse assunto tem natureza infraconstitucional, como na espécie. Impossível, portanto, seu reexame em recurso extraordinário. Por fim, o Plenário deliberou não modular os efeitos da decisão proferida em ambos os recursos extraordinários.

RE 838284/SC, rel. Min. Dias Toffoli, 19.10.2016. (RE-838284) RE 704292/PR, rel. Min. Dias Toffoli, 19.10.2016. (RE-704292)

COFINS: ampliação da base de cálculo e majoração de alíquota

O Tribunal iniciou julgamento de recurso extraordinário em que se discute a constitucionalidade da ampliação da base de cálculo e da majoração de alíquota da Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (COFINS), instituída pela Lei 10.833/2003, resultante da conversão da Medida Provisória 135/2003. O ministro Marco Aurélio (relator), conheceu em parte do recurso, e, na parte conhecida, deu-lhe provimento, declarando a inconstitucionalidade da norma. De início, entendeu configurado o vício formal, tendo em conta a vedação contida no art. 246 da Constituição Federal, a contaminar, por conseguinte, a lei de conversão. Asseverou que a alteração promovida no inciso I do artigo 195 da Constituição Federal, pela Emenda Constitucional 20/1998, passou a ter, como base de cálculo da contribuição, além de faturamento, receitas em geral, sendo versada matéria, de forma específica quanto à substituição, atinente à sistemática de recolhimento, creditamento e pagamento da COFINS. Ademais, reputou violado o princípio da isonomia. Afirmou, no ponto, que, de um lado, estabeleceu-se a não cumulatividade, excluídas as pessoas jurídicas tributadas pelo imposto de renda com base no lucro presumido ou arbitrado e no que se refere àquelas que se sujeitam à satisfação tributária pelo lucro real, previu-se a majoração da alíquota, passando a haver duplo percentual: o de 7,6% quanto às beneficiárias da não cumulatividade e o de 3% para as demais. O relator também salientou que o sistema de cálculo do imposto de renda com base no lucro presumido ou arbitrado depende do atendimento a requisitos impostos pelo Estado, não havendo, portanto, possibilidade, por parte do contribuinte, de optar por uma ou outra forma. Assim, sabendo-se de antemão o enquadramento do contribuinte, fixa-se alíquota menor ou maior, sendo esta última mais do que o dobro da primeira. Relativamente ao conflito entre a exposição de motivos da medida provisória e seu conteúdo, a refletir na lei de conversão, o relator afastou a apontada violação à Carta da República, ao fundamento de que, do ponto de vista normativo, considera-se o teor abstrato e autônomo da norma e não a exposição de motivos. Por ausência de prequestionamento, rejeitou a alegada afronta ao artigo 195, § 4º, da Lei Maior. Não verificou, por fim, ofensa aos princípios da proibição do confisco e da capacidade contributiva. Asseverou que o § 9º do artigo 195 da Constituição dispõe que as contribuições sociais previstas no inciso I do artigo podem ter alíquotas ou bases de cálculo diferenciadas, em razão da atividade econômica ou da utilização intensiva de mão de obra. Tendo em conta esse aspecto, a Constituição Federal, na sua redação primitiva, ao dispor, no § 12 do artigo 195, que lei definiria as situações jurídicas não cumulativas, abriu margem ao tratamento diferenciado que, em última análise, faz-se sem que se possa concluir pela existência de contribuintes em idêntica situação. Pelas mesmas razões, não se teria presente o confisco, em face da opção político-normativa. Em divergência, o ministro Edson Fachin negou provimento ao recurso. Quanto ao alegado vício formal, considerou a jurisprudência da Corte no sentido de não vislumbrar ofensa ao artigo 246 na hipótese de mera majoração de alíquotas de contribuições sociais. Pela mesma razão, reputou que o presente caso não atrai a aplicação da reserva de lei complementar, haja vista não se tratar de novo tributo. Quanto à vedação ao efeito confiscatório, concluiu ser juridicamente insustentável buscar guarida nesse princípio em sede de jurisdição constitucional, tendo em conta a orientação do STF segundo a qual a caracterização desse efeito pressupõe a análise de dados concretos e de peculiaridades de cada operação ou situação, tomando-se em conta custos, carga tributária global, margens de lucro e condições pontuais do mercado e de conjuntura econômica. Por fim, adotou o entendimento da Corte de que eventuais diferenças entre os regimes de lucro real ou de lucro presumido, inclusive a respeito do direito ao creditamento, não representam ofensa à isonomia ou à capacidade contributiva, porquanto a sujeição ao regime do lucro presumido é uma escolha feita pelo contribuinte, considerado o seu planejamento tributário. Após os votos dos ministros Roberto Barroso, Teori Zavascki, Rosa Weber e Luiz Fux, que acompanhavam a divergência, o ministro Dias Toffoli pediu vista dos autos.

RE 570122/RS, rel. min. Marco Aurélio, julgamento em 20.10.2016. (RE-570122)

PRIMEIRA TURMA

Causa de diminuição e Lei de Drogas

A Primeira Turma, ante o empate na votação, denegou a ordem em “habeas corpus”, no qual se pretendia a aplicação da causa de diminuição da pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006 (Lei de Drogas). Na espécie, o paciente foi condenado à pena de oito anos e três meses de reclusão, em regime inicial fechado, e ao pagamento de 833 dias-multa, pela prática de tráfico de entorpecentes (art. 33, “caput”, da Lei de Drogas), com a incidência da causa de aumento prevista no art. 40, V, do referido diploma legal. Segundo a defesa, o paciente — que teria exercido apenas a função de “mula” do tráfico — preencheria todos os requisitos para a incidência da causa de diminuição, sendo inadmissível afastar sua aplicação por meras suposições a respeito de sua participação em grupo criminoso. A defesa alegava, ainda, que o juízo sentenciante considerou a quantidade de droga apreendida tanto na dosimetria da pena-base, como na exclusão da causa de diminuição prevista no § 4º do art. 33 da Lei de Drogas. O Colegiado entendeu que, na análise das circunstâncias judiciais (art. 59 do Código Penal), a quantidade de entorpecente não foi observada para a dosimetria da pena-base, fixada no mínimo legal. Consignou, também, não ser crível que o paciente — surpreendido com 500 kg de maconha — não esteja integrado, de alguma forma, a organização criminosa, circunstância que justificaria o afastamento da incidência da causa de diminuição prevista no art. 33, §4º, da Lei de Drogas. Os ministros Roberto Barroso e Rosa Weber, por sua vez, não conheceram do “writ”, por ter sido impetrado em substituição ao recurso ordinário cabível.

HC 130981/MS, rel. Min. Marco Aurélio, 18.10.2016. (HC-130981)

Porte ilegal de munição e princípio da insignificância

A Primeira Turma denegou a ordem em “habeas corpus”, no qual se pretendia o reconhecimento da atipicidade material da conduta do paciente, caracterizada pelo porte ilegal de munição de uso permitido (art. 14, “caput”, da Lei 10.863/2003). No caso, o paciente foi condenado à pena de dois anos e dois meses de reclusão, em regime aberto, e ao pagamento de 11 dias-multa, em razão do porte de projétil de arma de fogo. A pena privativa foi substituída por duas restritivas de direito. A defesa alegava ser irrelevante a conduta praticada pelo paciente, bem como estarem presentes todos os requisitos exigidos pela Corte para a incidência do princípio da bagatela. Destacava a existência de precedentes deste Tribunal, nos quais assentada a aplicabilidade desse princípio a delitos de perigo abstrato (porte de drogas para consumo, desenvolvimento de atividade clandestina de telecomunicações, pesca irregular e moeda falsa, por exemplo). Apontava, ademais, a desproporcionalidade entre a conduta do paciente e a reprimenda imposta. Para o Colegiado, porém, a configuração da conduta tipificada no art. 14, “caput”, da Lei 10.826/2003 (“Art. 14. Portar, deter, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar:”) não depende do tipo ou da quantidade da munição portada pelo agente.

HC 131771/RJ, rel. Min. Marco Aurélio, 18.10.2016. (HC-131771)

SEGUNDA TURMA

Quebra de sigilo bancário de contas públicas e requisição pelo Ministério Público

A Segunda Turma iniciou julgamento de recurso ordinário em “habeas corpus” em que se pretende trancar ação penal instaurada para apurar crimes de desvio de verbas públicas, lavagem de dinheiro e fraudes em licitações. Argumenta-se que as provas seriam ilícitas, pois teriam sido colhidas por meio de quebra de sigilo bancário solicitada por ofício encaminhado pelo Ministério Público (MP), sem autorização judicial, a gerente de instituição financeira. O Tribunal de origem entendeu que as contas públicas, por força dos princípios da publicidade e da moralidade (CF, art. 37), não têm, em geral, direito à intimidade e à privacidade. Por conseguinte, não são abrangidas pelo sigilo bancário. A defesa alega que não estaria em discussão a publicidade inerente às contas públicas, conforme consignado no acórdão recorrido, mas sim a violação ao direito fundamental à intimidade da pessoa humana. Sustenta que a ação penal movida contra os recorrentes estaria edificada em provas obtidas por meio inidôneo, pois a autorização judicial é indispensável para a quebra de sigilo bancário. O ministro Dias Toffoli (relator) negou provimento ao recurso. Asseverou que o sigilo de informações necessário à preservação da intimidade é relativizado quando há interesse da sociedade em conhecer o destino dos recursos públicos. Citou como precedente o MS 33.340/DF, DJE de 3-8-2015. Para o relator, diante da existência de indícios da prática de ilícitos penais envolvendo verbas públicas, cabe ao MP, no exercício de seus poderes investigatórios (CF, art. 129, VIII), requisitar os registros de operações financeiras relativos aos recursos movimentados a partir de conta-corrente de titularidade da prefeitura municipal. Essa requisição compreenderia, por extensão, o acesso aos registros das operações bancárias sucessivas, ainda que realizadas por particulares, e objetivaria garantir o acesso ao real destino desses recursos públicos. Acrescentou, por fim, que decidir em sentido contrário implicaria o esvaziamento da própria finalidade do princípio da publicidade, que é permitir o controle da atuação do administrador público e do emprego de verbas públicas. Em seguida, o ministro Teori Zavascki pediu vista dos autos.

RHC 133118/CE, rel. Min. Dias Toffoli, 18.10.2016. (RHC-133118)

Produção antecipada de prova e pressupostos

A Segunda Turma iniciou julgamento de “habeas corpus” no qual se pretende reconhecer a ilegalidade de audiência realizada em ação penal em que o paciente figura como réu. No caso, ele foi denunciado pela suposta prática de homicídio culposo na direção de veículo automotor, delito previsto no art. 302 da Lei 9.503/1997. Por estar foragido, foi citado por edital, com a consequente suspensão do processo [Código de Processo Penal (CPP), art. 366]. O juízo determinou, em seguida, a realização de audiência de produção antecipada de prova. Na impetração, sustenta-se haver cerceamento de defesa em virtude da mencionada audiência. A produção antecipada de prova teria como único fundamento o decurso do tempo, o que, no caso, seria justificativa insuficiente. O ministro Ricardo Lewandowski (relator), acompanhado pelo ministro Dias Toffoli, concedeu a ordem. Entendeu não haver fundamento concreto a indicar a imprescindibilidade da produção antecipada de prova. Afinal, a justificativa oferecida pelo juízo — de que o decurso do tempo poderia implicar a imprestabilidade dos depoimentos das testemunhas — foi genérica, ao arrepio da norma processual penal. O relator reputou, ainda, que, para a produção antecipada de prova, é preciso combinar o art. 156, I, com os arts. 225 e 366 do CPP. Nesse sentido, somente se justificaria nas hipóteses em que a testemunha houver de ausentar-se, ou haja receio de que, ao tempo da instrução criminal, já não exista. No caso, entretanto, o juízo justificou a necessidade de produção antecipada de prova somente na possibilidade de as testemunhas não serem localizadas e no fato de uma delas ser policial militar. Em seguida, o ministro Gilmar Mendes pediu vista dos autos.

HC 135386/DF, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 18.10.2016. (HC-135386)

Ato de efeitos concretos e Enunciado 10 da Súmula Vinculante - 2

A Segunda Turma, em conclusão e por maioria, negou provimento a agravo regimental interposto contra decisão que havia desprovido reclamação em que se discutia se órgão fracionário de tribunal regional federal, ao afastar a aplicação do Decreto Legislativo 006/2010, editado pela Assembleia Legislativa do Estado de Roraima, teria violado o Enunciado 10 da Súmula Vinculante [“Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, art. 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público, afasta sua incidência, no todo ou em parte”]. O referido decreto havia sustado o andamento de ação penal movida contra deputado estadual, com fundamento no art. 53, § 3º, da Constituição Federal e no art. 34, §§ 4º e 5º, da Constituição do Estado de Roraima — v. Informativo 788. O agravante sustentava que o ato normativo possuiria grau de abstração, generalidade e impessoalidade suficientes a exigir a observância do art. 97 da CF e do Enunciado 10 da Súmula Vinculante. O Colegiado considerou que, em razão de o mencionado decreto legislativo não constituir lei em sentido formal ou material, nem possuir caráter de ato normativo, não se aplica ao caso a regra do art. 97 da CF, inexistindo, dessa forma, ofensa ao Enunciado 10 da Súmula Vinculante. Ademais, por ter um destinatário específico e referir-se a uma dada situação individual e concreta, exaurindo-se no momento de sua promulgação, o decreto não atende às exigências de abstração, generalidade e impessoalidade, o que caracteriza típico ato estatal de efeitos concretos. Vencidos os ministros Gilmar Mendes e Dias Toffoli, que proviam o agravo.

Rcl 18165 AgR/RR, rel. Min. Teori Zavascki, 18.10.2016. (Rcl-18165)

Roubo: pena-base no mínimo legal e regime inicial fechado - 2

A Segunda Turma, em conclusão e por maioria, deu provimento a recurso ordinário em “habeas corpus” em que o recorrente pleiteava a fixação do regime semiaberto para o início do cumprimento da pena. No caso, ele foi condenado pela prática de roubo duplamente circunstanciado, em razão do concurso de agentes e do uso de arma de fogo. Na sentença, o juízo fixou a pena-base no mínimo legal, mas estabeleceu o regime inicial fechado — v. Informativo 841. O Colegiado entendeu, de acordo com precedentes da Turma, que o juízo, ao analisar os requisitos do art. 59 do Código Penal, havia considerado todas as circunstâncias favoráveis. Concluiu que, fixada a pena no mínimo legal, não cabe determinar regime inicial fechado. Lembrou, também, orientação do Enunciado 440 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça nesse mesmo sentido (“Fixada a pena-base no mínimo legal, é vedado o estabelecimento de regime prisional mais gravoso do que o cabível em razão da sanção imposta, com base apenas na gravidade abstrata do delito”). Vencido o ministro Ricardo Lewandowski (relator), que desprovia o recurso.

RHC 135298/SP, rel. orig. Min. Ricardo Lewandowski, red. p/ o ac. Min. Teori Zavascki, 18.10.2016. (RHC-135298)

Administração municipal e publicidade de bebidas alcoólicas ou de cigarros - 2

A Segunda Turma, em conclusão de julgamento e por maioria, deu provimento a recurso extraordinário interposto contra acórdão que declarava a inconstitucionalidade da Lei 12.643/1998 do Município de São Paulo. De iniciativa parlamentar, o normativo veda a realização, em bens imóveis do Município, de eventos patrocinados ou copatrocinados por empresas produtoras, distribuidoras, importadoras ou representantes de bebidas alcoólicas ou de cigarros, com a utilização de propaganda — v. Informativo 381. O recorrente alegava que as hipóteses de iniciativa legislativa do prefeito para deflagrar o processo legislativo no Município deveriam ser interpretadas de forma restritiva e não ampliativa, sob pena de afronta ao princípio da harmonia e independência entre os Poderes. Para o Colegiado, a Lei 12.643/1998 não invadiu a esfera de atribuição própria do Poder Executivo. A competência do prefeito para exercer a administração do patrimônio municipal não impede que o Poder Legislativo estabeleça, mediante lei, limitações à realização, em imóveis do Município, de eventos patrocinados por empresas ligadas ao comércio de cigarros e de bebidas alcoólicas. Além disso, consignou que a realização de eventos não se enquadra nas atividades de mera administração dos bens públicos, sendo legítima sua regulamentação por lei. A Turma decidiu, ainda, que não houve desrespeito ao art. 22, XXIX, da Constituição Federal — que atribui à União a competência privativa para legislar sobre propaganda comercial. A Lei municipal 12.643/1998 não limita a veiculação de propagandas comerciais por distribuidoras de cigarro e de bebidas alcoólicas, mas apenas proíbe a realização, em imóveis do Município, de eventos patrocinados por empresas envolvidas no comércio dessas substâncias. Concluiu, dessa forma, que a restrição imposta pela lei local recai sobre a Administração Pública municipal e não sobre as empresas comercializadoras de cigarros e bebidas alcóolicas, encontrando-se, por conseguinte, no âmbito de competência do Poder Legislativo local. Vencida a ministra Ellen Gracie (relatora), que negava provimento ao recurso.

RE 305470/SP, rel. orig. Min. Ellen Gracie, rel. p/ o ac. Min. Teori Zavascki, 18.10.2016. (RE-305470)