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    Informativo do STF 834 de 12/08/2016

    Publicado por Supremo Tribunal Federal


    REPERCUSSÃO GERAL

    Contas de prefeito e competência para julgar - 2

    A competência para apreciação das contas dos prefeitos, tanto as de governo quanto as de gestão, para os fins da causa de inelegibilidade prevista no art. 1º, I, “g”, da Lei Complementar 64/1990, é das câmaras municipais com o auxílio dos tribunais de contas competentes, cujo parecer prévio somente deixará de prevalecer por decisão de 2/3 dos vereadores, nos termos do art. 31, § 2º, da CF. Essa a conclusão do Plenário ao dar provimento, por maioria, ao RE 848.826/DF. No recurso extraordinário em questão, discutia-se a definição do órgão competente para julgar as contas do chefe do Poder Executivo que age na qualidade de ordenador de despesas: se do Poder Legislativo ou do tribunal de contas. O Colegiado considerou legítima a candidatura de deputado que tivera o registro indeferido pela justiça eleitoral em razão da rejeição, pelo tribunal de contas, de contas relativas a sua atuação como ordenador de despesas quando era prefeito municipal — v. Informativo 833. Ponderou que a câmara municipal representaria a soberania popular, o contribuinte e, por isso, teria a legitimidade para o exame. Observou que, nos termos do Decreto-lei 201/1967, que dispõe sobre a responsabilidade dos prefeitos e vereadores, a câmara legislativa teria, inclusive, poder de verificar os crimes de responsabilidade, entre os quais o de malversação do dinheiro público. Vencidos os Ministros Roberto Barroso (relator), Teori Zavascki, Rosa Weber, Luiz Fux e Dias Toffoli, que negavam provimento ao recurso. Destacavam que o ato de fiscalizar a Administração Pública compreende o exame da prestação de contas de duas naturezas: contas de governo e contas de gestão. Assentavam que a competência para julgamento seria atribuída à casa legislativa ou ao tribunal de contas em função da natureza das contas prestadas e não do cargo ocupado pelo administrador. Esclareciam que as contas de governo, também denominadas de desempenho ou de resultado, objetivariam demonstrar o cumprimento do orçamento dos planos e programas de governo. Referir-se-iam, portanto, à atuação do chefe do Poder Executivo como agente político. Pontavam que a Constituição reserva à casa legislativa correspondente a competência para julgá-las em definitivo, mediante parecer prévio do tribunal de contas, conforme determina o art. 71, I, da Constituição. Por sua vez, as contas de gestão, também conhecidas como contas de ordenação de despesas possibilitariam o exame não dos gastos globais, mas de cada ato administrativo que comporia a gestão contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial do ente público quanto à legalidade, à legitimidade e à economicidade. Por isso, a competência para julgá-las em definitivo seria do tribunal de contas, sem a participação da casa legislativa, conforme determina o art. 71, II, da Constituição. Consignavam que essa sistemática seria aplicável aos estados-membros e municípios por força do art. 75, “caput”, da Constituição.

    RE 848826/DF, rel. orig. Min. Roberto Barroso, red. p/ o acórdão Min. Ricardo Lewandowski, 10.8.2016. (RE-848826)

    Contas de prefeito e competência para julgar - 3

    Ao analisar o RE 729.744/MG, apreciado conjuntamente com o RE 848.826/DF (acima noticiado), a Corte, por decisão majoritária, negou provimento ao recurso extraordinário. No caso, a controvérsia diz respeito à competência exclusiva da câmara municipal para o julgamento das contas de prefeito, sendo o parecer prévio do tribunal de contas meramente opinativo. O Plenário manteve o deferimento do pedido de registro de candidato ao cargo de prefeito que tivera suas contas rejeitadas pelo tribunal de contas estadual. Frisou que, no tocante às contas do chefe do Poder Executivo, a Constituição conferiria ao Poder Legislativo, além do desempenho de funções institucionais legiferantes, a função de controle e fiscalização de contas, em razão de sua condição de órgão de Poder, a qual se desenvolveria por meio de processo político-administrativo, cuja instrução se iniciaria na apreciação técnica do tribunal de contas. No âmbito municipal, o controle externo das contas do prefeito também constituiria uma das prerrogativas institucionais da câmara dos vereadores, exercida com o auxílio dos tribunais de contas do estado ou do município, nos termos do art. 31 da CF. Ressaltou que a expressão “só deixará de prevalecer”, constante do § 2º do citado artigo, deveria ser interpretada de forma sistêmica, de modo a se referir à necessidade de quórum qualificado para a rejeição do parecer emitido pela corte de contas. O Tribunal avaliou que, se caberia exclusivamente ao Poder Legislativo o julgamento das contas anuais do chefe do Executivo, com mais razão não se poderia conferir natureza jurídica de decisão, com efeitos imediatos, ao parecer emitido pelo tribunal de contas que opinasse pela desaprovação das contas de prefeito até manifestação expressa da câmara municipal. O entendimento de que o parecer conclusivo do tribunal de contas produziria efeitos imediatos, que se tornariam permanentes no caso do silêncio da casa legislativa, ofenderia a regra do art. 71, I, da CF. Essa previsão dispõe que, na análise das contas do Chefe do Poder Executivo, os tribunais de contas emitiriam parecer prévio, consubstanciado em pronunciamento técnico, sem conteúdo deliberativo, com o fim de subsidiar as atribuições fiscalizadoras do Poder Legislativo, que não estaria obrigado a se vincular à manifestação opinativa daquele órgão auxiliar. O ordenamento jurídico pátrio não admitiria o julgamento ficto de contas, por decurso de prazo, sob pena de permitir-se à câmara municipal delegar ao tribunal de contas, órgão auxiliar, competência constitucional que lhe seria própria, além de criar-se sanção ao decurso de prazo, inexistente na Constituição. Do mesmo modo, não se conformariam com o texto constitucional previsões normativas que considerassem recomendadas as contas do município nos casos em que o parecer técnico não fosse emitido no prazo legal e permitissem às câmaras municipais o seu julgamento independentemente do parecer do tribunal de contas. Ademais, seria importante sublinhar que, na apreciação das contas anuais do prefeito, não haveria julgamento dele próprio, mas deliberação sobre a exatidão da execução orçamentária do município. A rejeição das contas teria o condão de gerar, como consequência, a caracterização da inelegibilidade do prefeito, nos termos do art. 1º, I, “g”, da Lei Complementar 64/1990. Não se poderia admitir, dentro desse sistema, que o parecer opinativo do tribunal de contas tivesse o condão de gerar tais consequências ao chefe de Poder local. Ressaltou, entretanto, que, no caso de a câmara municipal aprovar as contas do prefeito, o que se afastaria seria apenas a sua inelegibilidade. Os fatos apurados no processo político-administrativo poderiam dar ensejo à sua responsabilização civil, criminal ou administrativa. Vencidos os Ministros Luiz Fux e Dias Toffoli, que proviam o recurso. Aduziam que o parecer prévio emitido pelo tribunal de contas apenas deixaria de prevalecer por decisão de dois terços dos membros do Poder Legislativo local. Esse documento, então, passaria a produzir efeitos integralmente a partir de sua edição. A eficácia cessaria, porém, se e quando apreciado e rejeitado por deliberação dos vereadores. Analisou que entendimento contrário teria a conseqüência prática de tornar o parecer emitido pelo órgão competente um nada jurídico, dado o efeito paralisante de omissão do Poder Legislativo. Em seguida, o Tribunal suspendeu o julgamento e deliberou fixar a tese da repercussão geral em outra assentada.

    RE 848826/DF, rel. orig. Min. Roberto Barroso, red. p/ o acórdão Min. Ricardo Lewandowski, 10.8.2016. (RE-848826)

    PRIMEIRA TURMA

    Busca e apreensão, violação de correspondência e de domicílio

    A Primeira Turma iniciou julgamento de recurso ordinário em “habeas corpus” em que se discute a validade de atos realizados durante investigação pela suposta prática de falsidade documental. No caso, procurador do Ministério Público do Trabalho teria forjado a assinatura da procuradora-chefe, em promoção formulada por si próprio. O relator do inquérito deferira diligência requerida pelo “Parquet” apenas em relação ao equipamento usado pelo indiciado, com a finalidade de averiguar se a promoção fora lá elaborada. Quando do cumprimento do mandado, o procurador-chefe substituto autorizara a arrecadação também do computador do gabinete da chefia da Procuradoria Regional. A defesa insurge-se contra a apreensão desse equipamento, o que transbordaria os limites do mandado, bem assim contra a impossibilidade de indicar assistente técnico e de formular quesitos nessa fase inquisitorial. Além disso, sustenta que se teria procedido à análise do equipamento utilizado pelo recorrente de forma indevida, porque verificada sua correspondência eletrônica lá armazenada, em violação ao art. 5º, XII, da CF. O Ministro Marco Aurélio (relator) proveu parcialmente o recurso, para anular a apreensão e a perícia feitas em computador diverso do usado pelo recorrente. Determinou, também, o desentranhamento do processo. Além disso, reconheceu, no mais, a validade da perícia realizada no equipamento utilizado pelo acusado e assentou inexistir, no inquérito, direito da defesa à indicação de assistente técnico e à formulação de quesitos. Assentou que o art. 5º, XII, da CF tutela o sigilo das correspondências, das comunicações telegráficas e telefônicas. A referência a dados abrange a transmissão e o armazenamento, ambos passíveis de afastamento, por decisão judicial, na forma da lei, para fins penais. Por sua vez, a inviolabilidade do domicílio (CF, art. 5º, XI), alcança bens públicos de uso especial, como gabinetes, por serem o centro da vida privada laborativa de seus integrantes. Nesse sentido, o art. 150 do CP, ao tipificar a invasão de domicílio, esclarece que se tutela, também, compartimento não aberto ao público onde alguém exerce profissão ou atividade. Além disso, o art. 245 do CPP disciplina a forma de execução da busca domiciliar, e o art. 246 do mesmo diploma afirma que idêntica cautela engloba a busca em compartimento não aberto ao público, onde alguém exercer profissão ou atividade. No caso, o “Parquet” requerera a busca, a apreensão e a perícia nos computadores utilizados pelo recorrente e pela procuradora-chefe. Fora deferido o pedido apenas em relação ao primeiro, com o exclusivo fim de verificar se a promoção supostamente adulterada fora redigida no respectivo equipamento. O procurador-chefe substituto, ao entregar voluntariamente à polícia o computador utilizado pela titular, afastando a inviolabilidade do gabinete e o sigilo de dados dela, dispusera-se de direito alheio. Descabe invocar a teoria do órgão ou a natureza pública do equipamento, porquanto o conteúdo da máquina não diz respeito ao órgão, e sim à pessoa da procuradora que a manipulava. O acesso é possível, mas por ordem judicial. Se, por outro lado, a própria procuradora-chefe tivesse anuído à apreensão do computador, a situação seria diversa. Destacou entendimento do STF segundo o qual os limites objetivos e subjetivos da busca e apreensão hão de estar no ato que a determine, sem possibilidade de delegar a extensão à autoridade policial (CPP, art. 243, I e II). Nesse sentido, o mandado sob enfoque implementara a arrecadação do computador do recorrente com objetivo único e delimitado: verificar se certa promoção ministerial fora realizada no equipamento. O exame e a perícia dos dados armazenados na máquina se coadunam com o determinado pelo magistrado. A busca na caixa postal eletrônica do recorrente, para identificar se houvera o endereçamento da referida peça processual e, se positiva a resposta, o destino, não discrepa da finalidade da diligência. Nesse aspecto, a inviolabilidade de correspondência subsiste enquanto ela estiver em trânsito, porque uma vez recebida pelo destinatário, transforma-se em documento, passível de apreensão (CPP, art. 240, § 1º, “f”). Considerada a natureza documental ou de dados das mensagens contidas na caixa postal, a inviolabilidade é perfeitamente passível de afastamento por ordem judicial. No que se refere ao direito do recorrente de indicar assistente técnico (CPP, art. 159, § 5º, II), há de ser exercido durante o curso do processo, e não no inquérito. Uma vez admitida a assistência, a intervenção desenvolve-se após a conclusão dos exames e elaboração dos laudos periciais. A formulação de quesitos pela defesa obedece lógica idêntica. Inexiste, pois, prejuízo ao recorrente, porque é viável postular essas diligências durante a ação penal. O caráter inquisitório da persecução na fase investigatória persiste, inclusive nos feitos submetidos à Lei 8.038/1990. Em divergência, o Ministro Edson Fachin desproveu o recurso. Entendeu que, na hipótese, o fato de ter havido a entrega espontânea dos computadores traduz peculiaridade. Além disso, não cabe falar em violação ao direito à intimidade, por se tratar de material disponibilizado, inclusive, para o serviço público. Ademais, no que diz respeito à suposta violação do sigilo de correspondência eletrônica, não houvera quebra da troca de dados, mas sim acesso aos dados registrados nos computadores. Sublinhou, também, no que se refere ao cerceamento de defesa por indeferimento de diligência no curso da investigação, não ser o momento próprio para se invocar o exercício do contraditório e da ampla defesa. Lembrou, inclusive, que a denúncia já fora recebida. Em seguida, pediu vista a Ministra Rosa Weber.

    RHC 132062/RS, rel. Min. Marco Aurélio, 9.8.2015. (RHC-123062)

    Extradição de brasileiro naturalizado

    É possível conceder extradição para brasileiro naturalizado envolvido em tráfico de droga (CF, art. 5º, LI). Com base nesse entendimento, a Primeira Turma, em conclusão de julgamento e por maioria, afastou a alegada deficiência na instrução do pedido e deferiu a extradição. Na espécie, o extraditando fora condenado no Estado Requerente (França) à pena de três anos pela prática dos crimes de transporte, posse, aquisição e exportação de produtos estupefacientes, em observância da exigência contida no art. 36, II, “a”, da Convenção Única de Nova York sobre Entorpecentes de 1961. Não existiriam nos autos notícias de que os fatos correlacionados teriam dado início à persecução penal no Brasil. A medida constritiva do nacional francês fora efetivada em 9.7.2013 e, em 25.7.2013, a prisão preventiva fora substituída por medidas cautelares (uso de tornozeleiras eletrônicas, entrega do passaporte, proibição de ausentar-se do Estado-Membro sem autorização judicial e compromisso de comparecer semanalmente ao competente juízo da vara federal). De início, a Turma destacou a qualidade invulgar do trabalho profissional do extraditando que, em trinta anos de residência no Brasil, dedicara-se a atividade de grande relevância cultural para o País. Apontou a regularidade formal do pedido, que está devidamente instruído com a documentação prevista no art. 80, § 1º, da Lei 6.815/1980 (Estatuto do Estrangeiro) e no art. 10 do Tratado de Extradição. Consignou que os fatos criminosos do pedido extradicional não possuem conotação política e que o presente feito reveste-se de natureza executória. Assentou que, conforme informações da autoridade solicitante, o crime não estaria prescrito pela legislação francesa, tampouco pela brasileira. Ressaltou que, consideradas a data do crime (meados de 2009), a publicação da sentença condenatória (26.10.2010) e a pena em concreto (três anos de reclusão), o prazo prescricional de oito anos, nos termos do art. 109, IV, c/c art. 110, do CP, observados os respectivos marcos interruptivos (art. 117 do CP), teria lugar somente em 26.10.2018. De qualquer forma, a alínea “e” do art. 4 do Tratado de Extradição entre o Brasil e a França aponta “a interrupção da prescrição no momento do recebimento do pedido no Estado requerido”, o que se deu em 7.11.2011 (data de recebimento do pedido de extradição pelo Ministério das Relações Exteriores). Para a Turma, ao isolar cada conduta do tipo misto alternativo do tráfico de drogas, a pena mínima prevista é de cinco anos (Lei 11.343/2006, art. 33) e o prazo prescricional de 12 anos (CP, art. 109, III), a delinear, também por esse prisma, a inocorrência da prescrição da pretensão punitiva estatal. Esclareceu que a existência de circunstâncias favoráveis ao extraditando, como residência fixa, ocupação lícita e família estabelecida no Brasil, com mulher, três filhos e dois enteados, não são obstáculos ao deferimento da extradição. O Colegiado frisou que, em momento algum, houvera a substituição da prisão preventiva para fins de extradição por prisão domiciliar, mas tão somente por medidas cautelares diversas da prisão. Assim, não se poderia falar em detração da pena privativa de liberdade aplicada ao extraditando, pois ambas as sanções possuiriam natureza e finalidade distintas. Enfatizou que, para fins de detração, não poderia considerar mais do que o período de dezesseis dias, que iriam da prisão preventiva implementada à expedição do alvará de soltura com as medidas alternativas impostas. Vencidos os Ministros Luiz Fux e Roberto Barroso, que indeferiam a extradição. O Ministro Luiz Fux entendia que a situação excepcional de saúde do extraditando autorizara o cumprimento da prisão preventiva na modalidade de prisão cautelar e que a medida constritiva decretada teria completado 3 anos em 9.7.2016. Ponderava que o extraditando estaria preso por tempo superior ao da condenação que lhe fora imposta pela Justiça Francesa, o que inviabilizaria o compromisso pelo Estado requerente de promover a detração, uma vez que não mais sobejaria pena a ser cumprida na França. O Ministro Roberto Barroso acompanhou o voto do Ministro Luiz Fux não pela detração, mas por motivos humanitários previstos no Tratado de Extradição entre França e Brasil. Ext 1244/República Francesa, rel. Min. Rosa Weber, 9.8.2016. (Ext-1244)

    Concurso público: direito subjetivo a nomeação e surgimento de vaga - 2

    Em conclusão de julgamento, a Primeira Turma, por maioria, negou provimento a recurso ordinário em mandado de segurança em que se pretendia garantir a nomeação de candidato aprovado em concurso público fora das vagas originalmente previstas no edital. O recorrente sustentava haver direito subjetivo à nomeação, em virtude do advento de posto adicional, ainda na vigência do concurso. Isso decorreria da existência, durante a validade do certame anterior, de tratativas entre os órgãos competentes para a deflagração de novo concurso, bem como de dotação orçamentária e da necessidade de criação de novas vagas. Novo concurso fora realizado apenas dois meses depois de expirado o prazo do certame pretérito — v. Informativo 820. Prevaleceu o voto do Ministro Edson Fachin. Consignou que o prazo de validade do concurso em que aprovado o recorrente expirara antes da abertura do novo certame, a significar que o caso não se amoldaria ao precedente firmado pelo Plenário no RE 837.311/PI (DJe de 18.4.2016). Na ocasião, em sede de repercussão geral, o Tribunal fixara a tese de que a existência de direito subjetivo à nomeação está ligada ao surgimento de nova vaga durante a validade do certame. A mera existência de tratativas sobre a inauguração de novo concurso permite inferir, apenas, sobre a existência de vaga, mas não gera direito líquido e certo. O Ministro Roberto Barroso destacou, ainda, que a suposta vaga decorreria da aposentadoria de um servidor, mas não houvera manifestação do órgão competente quanto à disponibilidade orçamentária para que o cargo fosse provido, de modo a não se poder falar em preterição arbitrária. Vencido o Ministro Marco Aurélio (relator), que dava provimento ao recurso.

    RMS 31478/DF, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o acórdão Min. Edson Fachin, 9.8.2016. (RMS-31478)

    PAD: prova emprestada e nulidade - 2

    A prova colhida mediante autorização judicial e para fins de investigação ou processo criminal pode ser utilizada para instruir procedimento administrativo punitivo. Essa a conclusão da Primeira Turma ao negar provimento, por maioria, a recurso ordinário em mandado de segurança no qual se pretendia a declaração de nulidade de processo administrativo disciplinar. Na espécie, servidor público federal que fora demitido por ato de improbidade administrativa questionava: a) defeitos na formação da comissão de inquérito e no termo de indiciação; b) cerceamento de defesa proveniente da falta de intimação de relatório final; c) impossibilidade de compartilhamento de prova colhida em ação penal; e d) ausência de transcrição integral de dados obtidos por meio de interceptação telefônica — v. Informativo 800. A Turma apontou a admissibilidade de se emprestar provas provenientes de interceptações telefônicas autorizadas judicialmente, para o processo administrativo disciplinar. Em consequência, assentou a inexistência do direito líquido e certo do recorrente. Por outro lado, diante da lacuna quanto à existência efetiva do resultado em proveito próprio, cuja liquidez e certeza são requeridas em mandado de segurança, consignou a possibilidade de o recorrente resolver a lide nas vias ordinárias. Vencidos os Ministros Marco Aurélio (relator) e Edson Fachin, que davam provimento ao recurso para, afastadas as provas obtidas a partir de indevido aproveitamento, declarar a insubsistência de portaria da qual resultara a demissão do recorrente do serviço público. O relator destacava que a quebra do sigilo telefônico fora determinada por órgão judicial para efeito específico, qual seja, investigação criminal ou instrução processual penal. Assim, descaberia alargar, pela via da interpretação, o campo do preceito em questão, o qual objetiva a concretização da tutela constitucional da intimidade. Para o Ministro Edson Fachin, não fora comprovado nos autos que o indiciado tivesse levado, pessoalmente, vantagem com a sua conduta.

    RMS 28774/DF, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o acórdão Min. Roberto Barroso, 9.8.2016. (RMS-28774)

    SEGUNDA TURMA

    Nomeação de secretária parlamentar e configuração do crime de peculato

    A Segunda Turma, por maioria, deu provimento a apelação interposta contra sentença penal condenatória para absolver o apelante com fundamento no art. 386, III, do CPP (“Art. 386. O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça: ... III - não constituir o fato infração penal”). Na espécie, o recorrente fora condenado em primeira instância — ao tempo em que ainda não detinha foro no STF — pela suposta prática do crime previsto no art. 312, § 1º, do CP, em razão da contratação, como sua secretária parlamentar, de funcionária de sua própria empresa, que teria continuado no exercício de atividade privada embora recebendo pelos cofres públicos. Preliminarmente, a Turma não conheceu de petição formulada pelo Partido Republicano Brasileiro (PRB) e indeferiu seu pedido de intervenção como “amicus curiae”. Afirmou que a agremiação partidária, autoqualificando-se como “amicus curiae”, pretenderia, em verdade, ingressar numa posição que a relação processual penal não admitiria, considerados os estritos termos do CPP. O Colegiado, ainda, rejeitou pedido da defesa no sentido de que se aumentasse, no caso, o tempo de sustentação oral. A Turma ressaltou que, a despeito da classificação de ação penal originária, impor-se-ia o regime jurídico processual próprio da apelação, sendo aplicáveis, em razão disso, as disposições regimentais atinentes a essa classe recursal. No mérito, a Turma destacou a necessidade de se analisar o crime de peculato sob a óptica da jurisprudência do STF. No Inq 2.913 AgR/MT (DJe de 21.6.2012), o Plenário concluíra que, em tese, a nomeação de funcionário para o exercício de funções incompatíveis com o cargo em comissão ocupado tipificaria o crime de peculato-desvio (CP, art. 312, “caput”). Já no julgamento do Inq 3.776/TO (DJe de 4.11.2014), a Corte assentara que a “utilização dos serviços custeados pelo erário por funcionário público no seu interesse particular não é conduta típica de peculato (art. 312, do Código Penal), em razão do princípio da taxatividade (CF, art. 5º, XXXIX)”. O tipo em questão exigiria “apropriação ou desvio de dinheiro, valor ou outro bem móvel”. Assim, tendo essas premissas em conta, seria a hipótese de se verificar se, na situação em comento, teria havido: a) desvio de serviços prestados por secretária parlamentar à custa do erário, no interesse particular do apelante, fato este penalmente atípico; ou b) utilização da Administração Pública para pagar o salário de empregado particular, fato que constituiria crime. Contudo, a prova dos autos demonstraria que a pessoa nomeada secretária parlamentar pelo apelante teria, de fato, exercido atribuições inerentes a esse cargo, ainda que também tivesse desempenhado outras atividades no estrito interesse particular do recorrente. De acordo com o art. 8º do Ato da Mesa 72/1997, da Câmara dos Deputados, o secretário parlamentar tem as seguintes atribuições: “redação de correspondência, discurso e pareceres do parlamentar; atendimento às pessoas encaminhadas ao gabinete; execução de serviços de secretaria e datilográficos; pesquisas; acompanhamento interno e externo de assuntos de interesse do Parlamentar; condução de veículo de propriedade do parlamentar; recebimento e entrega de correspondência, além de outras atividades afins inerentes ao respectivo gabinete”. Essas atribuições, nos termos do art. 2º do referido ato normativo, devem ser desempenhadas no gabinete parlamentar na Câmara dos Deputados ou no Estado-Membro de representação do parlamentar, ou seja, no escritório político do parlamentar. Nesse contexto, teria ficado comprovado o efetivo exercício de atribuições inerentes ao cargo de secretária parlamentar — atendimento de pessoas que procuravam o deputado federal em seu escritório político — pela pessoa nomeada pelo apelante. Assim, a prova colhida sob o crivo do contraditório autorizaria a conclusão de que a conduta do apelante seria penalmente atípica, uma vez que teria consistido no uso de funcionário público que, de fato, exercia as atribuições inerentes ao seu cargo para, também, prestar outros serviços de natureza privada. A despeito disso, a emissão de qualquer juízo de valor a respeito da moralidade da conduta verificada ou de seu enquadramento em eventual ato de improbidade administrativa não caberia no processo em comento, isso tendo em consideração o seu caráter penal. Vencidos os Ministros Teori Zavascki e Cármen Lúcia (relatora). O Ministro Teori Zavascki desprovia a apelação. Mantinha a decisão do Plenário quando do recebimento da denúncia, no sentido do reconhecimento da tipicidade em tese da conduta verificada. A Ministra Cármen Lúcia (relatora), apesar de também considerar o fato imputado ao recorrente como típico, provia parcialmente o recurso unicamente para reduzir a pena fixada na sentença.

    AP 504/DF, rel. orig. Min. Cármen Lúcia, red. p/ o acórdão Min. Dias Toffoli, 9.8.2016. (AP-504)