Informativo do STF 756 de 31/12/2003
Publicado por Supremo Tribunal Federal
PLENÁRIO
Prisão domiciliar e doença grave
O Plenário, por maioria, negou provimento a agravo regimental, interposto de decisão proferida em sede de execução penal, que indeferira pedido de conversão de regime semiaberto em prisão domiciliar humanitária. No caso, o agravante fora condenado à pena de 7 anos e 11 dias de reclusão em regime semiaberto pela prática dos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A defesa requerera a autorização para cumprimento da pena em regime domiciliar, tendo em conta o fato de o agravante sofrer de diabetes tipo II, hipertensão arterial sistêmica e histórico de obesidade mórbida, além de ter sido submetido à cirurgia oncológica para a remoção de parte do pâncreas. O Ministro Joaquim Barbosa (então Presidente e relator) indeferira o pedido pelos seguintes fundamentos: a) ausência de doença grave, atestada por junta médica oficial; e b) possibilidade de o sistema penitenciário oferecer a dieta e o acompanhamento médico e nutricional prescritos para o tratamento do sentenciado. O Tribunal afirmou que o laudo médico oficial, elaborado por médicos do Instituto Nacional do Câncer - INCA, ressaltara que o agravante não apresentaria qualquer evidência de doença neoplásica em atividade. Frisou que se teria constatado que, embora o estado clínico do agravante exigisse o uso continuado de medicamentos, sua situação não demandaria permanência em prisão domiciliar fixa. Recordou que o juízo da vara de execuções penais teria informado ao STF não haver impedimentos para o fornecimento da dieta e medicação necessárias. Salientou que, assim como referido no parecer ministerial, não haveria vedação que a família encaminhasse à unidade prisional eventuais medicamentos ou gêneros alimentícios que integrassem a prescrição médica e que não estivessem disponíveis no sistema. Vencidos os Ministros Luiz Fux, Marco Aurélio e Ricardo Lewandowski, que davam provimento ao agravo regimental por considerarem a situação do agravante notória. EP 23 AgR/DF, rel. Min. Roberto Barroso, 27.8.2014. (EP-23)
Aposentadoria: contagem recíproca e restrições indevidas
O Plenário julgou procedente pedido formulado em ação direta para declarar a inconstitucionalidade do art. 119, VI, da Lei 6.677/1994, do Estado da Bahia [“Art. 119. Contar-se-á para efeito de aposentadoria e disponibilidade: ... VI - até 10 (dez) anos do tempo de serviço em atividade privada vinculada à previdência social, desde que um decênio, pelo menos, no serviço público estadual, ressalvada a legislação federal regulamentadora da matéria”]. O Tribunal confirmou a liminar deferida e consignou que, na sua redação original, o § 2° do art. 202 da CF seria autoaplicável (“Art. 202. É assegurada aposentadoria, nos termos da lei, calculando-se o benefício sobre a média dos trinta e seis últimos salários de contribuição, corrigidos monetariamente mês a mês, e comprovada a regularidade dos reajustes dos salários de contribuição de modo a preservar seus valores reais e obedecidas as seguintes condições: ... § 2º - Para efeito de aposentadoria, é assegurada a contagem recíproca do tempo de contribuição na administração pública e na atividade privada, rural e urbana, hipótese em que os diversos sistemas de previdência social se compensarão financeiramente, segundo critérios estabelecidos em lei”).
ADI 1798/BA, rel. Min. Gilmar Mendes, 27.8.2014. (ADI-1798)
ADI: Diário Oficial estadual e iniciativa de lei
O Plenário confirmou medida cautelar e julgou procedente pedido formulado em ação direta para declarar a inconstitucionalidade da Lei 11.454/2000, do Estado do Rio Grande do Sul. A lei, de iniciativa parlamentar, disciplina as matérias suscetíveis de publicação pelo Diário Oficial do Estado, órgão vinculado ao Poder Executivo. O Tribunal consignou que, no caso, estaria configurada a inconstitucionalidade formal e material do ato normativo impugnado. Afirmou que a edição de regra que disciplinasse o modo de atuação de órgão integrante da Administração Indireta do Estado-membro somente poderia advir de ato do Chefe do Poder Executivo estadual. Haveria, ademais, na edição da norma em comento, nítida afronta ao princípio constitucional da separação dos Poderes, na medida em que, ao se restringir a proibição de publicações exclusivamente ao Poder Executivo, teria sido criada situação discriminatória em relação a um dos Poderes do Estado-membro.
ADI 2294/RS, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 27.8.2014. (ADI-2294)
TCU e critério de escolha de Ministro
O Plenário confirmou medida cautelar e julgou parcialmente procedente pedido formulado em ação direta para declarar a inconstitucionalidade do art. 105, III, da Lei 8.443/1992 - Lei Orgânica do TCU (“Art. 105. O processo de escolha de ministro do Tribunal de Contas da União, em caso de vaga ocorrida ou que venha a ocorrer após a promulgação da Constituição de 1988, obedecerá ao seguinte critério: ... III - a partir da décima vaga, reinicia-se o processo previsto nos incisos anteriores, observada a alternância quanto à escolha de auditor e membro do Ministério Público junto ao Tribunal, nos termos do inciso I do § 2° do art. 73 da Constituição Federal”), bem como do art. 280, III, do Regimento Interno do TCU. Referidas normas dispõem sobre o processo de escolha de Ministros daquela Corte de Contas. O Colegiado ressaltou que, a persistirem os dispositivos impugnados, haveria possibilidade de não se observar a razão de ser da distribuição das vagas, que se destacaria pela composição heterogênea daquele Tribunal. Registrou a necessidade de se respeitar a regra contida no § 2º do art. 73 da CF.
ADI 2117/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 27.8.2014. (ADI-2117)
ADI e estrutura organizacional de tribunal de justiça
O Plenário confirmou medida cautelar e julgou procedente pedido formulado em ação direta para assentar a inconstitucionalidade de dispositivos da Constituição do Estado do Ceará e de seu ADCT. Na espécie, foram declarados inconstitucionais: a) a expressão “ou a determinação de abertura de tal procedimento contra o juiz acusado” contida no art. 96, II, f; b) o § 1º do art. 105; c) a expressão “vinte e um”, constante do art. 107; d) o art. 109, “caput” e parágrafos; e) os artigos 110 a 113; f) o § 5º do art. 11 do ADCT; e g) o art. 12 do ADCT. As normas questionadas alteram a estrutura organizacional do tribunal de justiça cearense e a carreira da magistratura.
ADI 251/CE, rel. Min. Gilmar Mendes, 27.8.2014. (ADI-251)
ADI: aumento de despesas e vício de iniciativa - 2
No caso, a norma contestada resultara de processo legislativo desencadeado pela governadora do estado-membro que, com base no art. 37, § 12, da CF, encaminhara à assembleia legislativa proposta de alteração de um único artigo da Constituição Estadual (art. 26, XI), que passaria a prever o subsídio mensal, em espécie, dos desembargadores do tribunal de justiça, como teto para a remuneração de todos os servidores estaduais, à exceção dos deputados estaduais, conforme determinado pela Constituição Federal após a EC 41/2003. No curso de sua tramitação na casa legislativa, o projeto fora alterado pelos parlamentares para excluir, do referido teto, as verbas contidas no art. 31 do ADCT. O Tribunal afirmou que os traços básicos do processo legislativo estadual deveriam prestar reverência obrigatória ao modelo contemplado no texto da Constituição Federal, inclusive no tocante à reserva de iniciativa do processo legislativo. Sublinhou que, por força da prerrogativa instituída pelo art. 61, § 1º, II, a, da CF, somente o Chefe do Poder Executivo estadual teria autoridade para instaurar processo legislativo sobre o regime jurídico dos servidores estaduais, no que se incluiria a temática do teto remuneratório. Salientou que esta prerrogativa deveria ser observada mesmo quanto a iniciativas de propostas de emenda à Constituição Estadual. A Corte frisou que o dispositivo ora impugnado configuraria imoderação no exercício do poder parlamentar de emenda. Concluiu que, ao criar hipóteses de exceção à incidência do teto remuneratório do serviço público estadual e, consequentemente, exceder o prognóstico de despesas contemplado no texto original do projeto encaminhado pelo Chefe do Poder Executivo estadual, a assembleia legislativa atuara em domínio temático sobre o qual não lhe seria permitido interferir, de modo a configurar abuso de poder legislativo. Vencido, em parte, o Ministro Marco Aurélio, que deferia a medida cautelar em menor extensão para suspender, por vício material e formal, os dispositivos que excluem do teto o adicional por tempo de serviço e, de uma forma genérica, outras vantagens pessoais percebidas até 31.12.2003. Pontuava que a Constituição Federal excluiria do teto as verbas recebidas a título de indenização, nelas incluída o abono de permanência (CF, art. 40, § 19).
ADI 5087 MC/DF, rel. Min. Teori Zavascki, 27.8.2014. (ADI-5087)
REPERCUSSÃO GERAL
Ação perante o INSS e prévio requerimento administrativo - 1
O Plenário iniciou julgamento de recurso extraordinário em que se discute a possibilidade de propositura de ação judicial em matéria previdenciária sem que haja prévia postulação administrativa do benefício. No caso, trata-se de ação em que se pleiteia a concessão de aposentadoria rural por idade, proposta por segurada que não formulara requerimento administrativo. Preliminarmente, por maioria, o Colegiado conheceu do recurso. Vencida, no ponto, a Ministra Rosa Weber, que entendia cuidar-se de ofensa meramente reflexa à Constituição. No mérito, o Ministro Roberto Barroso (relator), acompanhado pelos Ministros Teori Zavascki, Rosa Weber, Luiz Fux, Gilmar Mendes, Celso de Mello e Ricardo Lewandowski (Presidente eleito), proveu parcialmente o recurso. Asseverou que a instituição de condições para o regular exercício do direito de ação seria compatível com o art. 5º, XXXV, da CF (“XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”). Assinalou que, na situação dos autos, para se caracterizar a presença de interesse em agir, seria preciso haver necessidade de ir a juízo. Reputou que a concessão de benefício previdenciário dependeria de requerimento do interessado, e não se caracterizaria ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e eventual indeferimento pelo INSS, ou se o órgão não oferecesse resposta após 45 dias. Ressalvou que a exigência de prévio requerimento não se confundiria, entretanto, com o exaurimento das vias administrativas. Consignou, ainda, que a exigência de prévio requerimento administrativo não deveria prevalecer quando o entendimento da Administração fosse notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado. Acresceu que, nas hipóteses de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido — uma vez que o INSS teria o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível — o pedido poderia ser formulado diretamente em juízo, porque nesses casos a conduta do INSS já configuraria o não acolhimento da pretensão.
RE 631240/MG, rel. Min. Roberto Barroso, 27.8.2014. (RE-631240)
Ação perante o INSS e prévio requerimento administrativo - 2
O Ministro Teori Zavascki ressaltou que, nos casos de prestação previdenciária cuja concessão só pudesse haver, se e quando requerido pelo segurado, o interesse de agir em juízo pressuporia prévio requerimento administrativo ou a demonstração de resistência por parte do INSS. O Ministro Luiz Fux frisou que a inexistência do prévio requerimento administrativo tornaria não demonstrada a lesão a que se refere a Constituição (art. 5º, XXXV), exigível para propiciar o acesso à Justiça. O Ministro Gilmar Mendes observou que a Constituição proibiria as disposições legais de obstaculizarem o exercício de direito, mas não as impediria de disciplinar a matéria. Lembrou o alto índice de judicialização do País, particularmente nos juizados especiais, em que tramitaria boa parte das causas sobre direito previdenciário. O Ministro Celso de Mello sintetizou que não ofenderia o direito fundamental ao processo ou a cláusula constitucional da inafastabilidade da proteção judicial efetiva, em situações de dano atual ou iminente a determinada prerrogativa jurídica, a estipulação e observância das condições da ação, requisitos mínimos de admissibilidade do exercício legítimo desse direito. O Ministro Ricardo Lewandowski apontou que a existência de questões fáticas a serem dirimidas, como, por exemplo, a submissão do interessado a junta médica, exigiria prévio pronunciamento administrativo. Em divergência, os Ministros Marco Aurélio e Cármen Lúcia desproveram o recurso. O Ministro Marco Aurélio pontuou que a Constituição não condicionaria a postulação judicial ao exaurimento prévio das vias administrativas. Por outro lado, em seu texto, haveria duas situações jurídicas em que indispensável o requerimento administrativo: dissídio coletivo de natureza econômica (CF, art. 114, § 2º); e ações submetidas à justiça desportiva. Ressaltou não haver exceção, mormente para situação em que o embate seria desequilibrado, a envolver cidadão e Estado, sob pena de beneficiar o polo mais forte da relação jurídica. Destacou não caber retrocesso em termos de cidadania, a obstaculizar o livre acesso ao Judiciário. A Ministra Cármen Lúcia assinalou que o art. 5º, XXXV, da CF, não poderia se submeter a condicionantes e que, no caso, o cidadão que optasse por provocar o Judiciário diretamente o faria por necessidade, tendo em vista algum embaraço como, por exemplo, a ausência de órgão do INSS na localidade. Sublinhou que esse entrave deveria ser provado perante a jurisdição competente.
RE 631240/MG, rel. Min. Roberto Barroso, 27.8.2014. (RE-631240)
Ação perante o INSS e prévio requerimento administrativo - 3
Na sequência, o relator ponderou que, tendo em vista a prolongada oscilação jurisprudencial na matéria, inclusive no STF, dever-se-ia estabelecer uma fórmula de transição, para lidar com as ações em curso, nos seguintes termos: a) as ações já ajuizadas até a data da presente decisão, sem que tivesse havido prévio requerimento administrativo, ficariam sobrestadas; b) o autor seria intimado a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção do processo; c) comprovado o protocolo, o INSS seria intimado a se manifestar em até 90 dias acerca do pedido, prazo dentro do qual a autarquia deveria colher todas as provas eventualmente necessárias e proferir decisão; d) se o pedido fosse acolhido administrativamente, ou não pudesse ter o seu mérito analisado por motivos imputáveis ao próprio requerente, extinguir-se-ia a ação; e) caso contrário, estaria caracterizado o interesse em agir e o processo deveria prosseguir. Em seguida, o julgamento foi suspenso para posterior deliberação quanto à aludida proposta.
RE 631240/MG, rel. Min. Roberto Barroso, 27.8.2014. (RE-631240)
Aumento de vencimento e isonomia
Não cabe ao Poder Judiciário, que não tem a função legislativa, aumentar vencimentos de servidores públicos sob o fundamento de isonomia. Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, reafirmou o Enunciado 339 da Súmula do STF e deu provimento a recurso extraordinário para reformar acórdão que estendera gratificação com base no princípio da isonomia. O Tribunal afirmou que a jurisprudência do STF seria pacífica no sentido de que o aumento de vencimentos de servidores dependeria de lei e não poderia ser efetuado apenas com base no princípio da isonomia. Salientou que tampouco seria possível a equiparação salarial, a pretexto de resguardar a isonomia entre servidores de mesmo cargo, quando o paradigma emanasse de decisão judicial transitada em julgado. Observou que, nos termos da Lei 2.377/1995 do Município do Rio de Janeiro, a gratificação de gestão de sistemas administrativos seria específica para os servidores em exercício na Secretaria Municipal de Administração - SMA. Frisou que o recorrido, apesar de ocupante de cargo efetivo da SMA, estaria em exercício em secretaria diversa. Dessa forma, não cumpriria os requisitos legais para o recebimento e a incorporação da referida gratificação. Vencidos os Ministros Marco Aurélio e Rosa Weber, quanto ao conhecimento do recurso. Pontuavam que o conflito de interesse teria solução final no âmbito do Poder Judiciário estadual, já que a controvérsia envolveria interpretação conferida à lei municipal e ao decreto que a regulamentara. Além disso, seria necessário revolver os elementos probatórios para assentar premissas diversas das constantes do acórdão recorrido. Vencido também no mérito o Ministro Marco Aurélio, que negava provimento ao recurso extraordinário.
RE 592317/RJ, rel. Min. Gilmar Mendes, 28.8.2014. (RE-592317)
Contratações pela Administração Pública sem concurso público e efeitos trabalhistas
É nula a contratação de pessoal pela Administração Pública sem a observância de prévia aprovação em concurso público, razão pela qual não gera quaisquer efeitos jurídicos válidos em relação aos empregados eventualmente contratados, ressalvados os direitos à percepção dos salários referentes ao período trabalhado e, nos termos do art. 19-A da Lei 8.036/1990, ao levantamento dos depósitos efetuados no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS. Com base nessa orientação, o Plenário negou provimento a recurso extraordinário no qual trabalhadora — que prestava serviços a fundação pública estadual, embora não tivesse sido aprovada em concurso público — sustentava que o § 2º do art. 37 da CF (“A não observância do disposto nos incisos II e III implicará a nulidade do ato e a punição da autoridade responsável, nos termos da lei”) não imporia a supressão de verbas rescisórias relativas a aviso prévio, gratificação natalina, férias e respectivo 1/3, indenização referente ao seguro desemprego, multa prevista no art. 477, § 8º, da CLT entre outras. Discutiam-se, na espécie, os efeitos trabalhistas decorrentes de contratação pela Administração Pública sem observância do art. 37, II, da CF. O Tribunal asseverou que o citado § 2º do art. 37 da CF constituiria referência normativa que não poderia ser ignorada na avaliação dos efeitos extraíveis das relações estabelecidas entre a Administração e os prestadores de serviços ilegitimamente contratados. Destacou a importância que a Constituição atribuiria ao instituto do concurso público e às consequências jurídicas decorrentes de sua violação. Mencionou, também, que as Turmas possuiriam jurisprudência assente no tocante à negativa de pagamento, com base na responsabilidade extracontratual do Estado (CF, art. 37, § 6º), de outras verbas rescisórias típicas do contrato de trabalho, ainda que a título de indenização. O Colegiado consignou que o suposto prejuízo do trabalhador contratado sem concurso público não constituiria dano juridicamente indenizável e que o reconhecimento do direito a salários pelos serviços efetivamente prestados afastaria a alegação de enriquecimento ilícito.
RE 705140/RS, rel. Min. Teori Zavascki, 28.8.2014. (RE-705140)
Inativos do DNER e Plano Especial de Cargos do DNIT
Estendem-se aos servidores aposentados e pensionistas os efeitos financeiros decorrentes do enquadramento de servidores ativos do extinto Departamento Nacional de Estradas de Rodagem - DNER, os quais passaram a gozar de benefícios e vantagens resultantes do Plano Especial de Cargos do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes - DNIT, instituído pela Lei 11.171/2005. Essa a conclusão do Plenário, que negou provimento a recurso extraordinário em que se discutia o direito de servidores aposentados e pensionistas do DNER — órgão extinto pela Lei 10.233/2001 — à paridade remuneratória em relação aos servidores ativos, que foram absorvidos pelo DNIT. De início, o Tribunal afastou a incidência do Enunciado 339 de sua Súmula. Consignou jurisprudência consolidada no sentido de que o art. 40, § 8º, da CF, com a redação dada pela EC 20/1998, ao estatuir a regra de paridade de vencimentos entre servidores ativos e inativos que tivessem exercido cargos correspondentes, dispensaria a edição de lei que promovesse a extensão das vantagens. Assim, o próprio texto constitucional, à luz do princípio da isonomia, estabeleceria essa extensão. Em seguida, no que se refere à reestruturação da carreira dos servidores ativos do DNER no Plano Especial de Cargos do DNIT, o Colegiado mencionou que, para se assegurar a inativos e pensionistas do DNER o direito à paridade, tendo em conta a autoaplicabilidade do preceito constitucional em comento, seria necessário apenas cogitar-se da: a) existência de lei que conferisse aos servidores ativos determinada vantagem ou benefício remuneratório; e b) natureza jurídica dos privilégios deferidos aos servidores da ativa. Logo, seria suficiente verificar-se se os servidores aposentados e os pensionistas gozariam dos benefícios caso estivessem em atividade. A Corte reconheceu a incidência da cláusula constitucional da paridade remuneratória, nos moldes previstos pela EC 20/1998, em favor dos inativos e pensionistas do DNER, haja vista a possibilidade inaugurada pela lei de que os servidores ativos do mencionado órgão pudessem ser alocados, por conta de suas atribuições, para o DNIT.
RE 677730/RS, rel. Min. Gilmar Mendes, 28.8.2014. (RE-677730)
Embargos de declaração e provimento para subir o RE
O Plenário proveu embargos de declaração para que o julgamento de recurso extraordinário tenha sequência, com a possibilidade de sustentação oral e deliberação presencial pelo Colegiado. No caso, o Tribunal reafirmara, por meio eletrônico (Plenário Virtual), jurisprudência dominante quanto à possibilidade da conversão de férias não gozadas em indenização pecuniária, por servidores que não podem mais delas usufruir. Sustentava o embargante a necessidade de esclarecimento da prestação jurisdicional e pedia a aplicação dos excepcionais efeitos infringentes ao acórdão questionado, sob argumento de que o servidor, ora embargado, encontra-se em atividade. De início, a Corte afastou a preliminar de incidência dos prazos e ritos dos juizados especiais perante o STF, porquanto o trâmite de recurso extraordinário subordina-se à Lei 8.038/1990. Por conseguinte, rejeitou a alegada intempestividade dos embargos declaratórios. Refutou, de igual modo, a aplicação do precedente firmado no julgamento do AI 855.810 RG-ED/RS (DJe de 1º.7.2013) e do art. 543-A do CPC, que afirmam a irrecorribilidade da decisão do Supremo quando não conhecer de recurso extraordinário por ausência de repercussão geral. O Tribunal consignou que, na situação dos autos, o acórdão embargado fora proferido no âmbito do Plenário Virtual, com o reconhecimento da repercussão geral e a reafirmação de jurisprudência. Assim, reputou cabíveis os embargos. Em seguida, o Colegiado asseverou que a controvérsia relativa a eventual direito de servidor em atividade à conversão em pecúnia de férias vencidas e não gozadas deveria ser submetida à apreciação do Pleno, razão pela qual se deveria dar continuidade ao recurso extraordinário.
ARE 721001 RG-ED/RJ, rel. Min. Gilmar Mendes, 28.8.2014. (ARE-721001)
PRIMEIRA TURMA
Inexigibilidade de licitação e critérios para contratação direta de escritório de advocacia - 1
Por ausência de justa causa para a propositura da ação penal, a 1ª Turma, por maioria, rejeitou denúncia ajuizada contra deputado federal — então prefeito à época dos fatos — pela suposta prática do crime previsto no art. 89 da Lei 8.666/1993 (“Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei, ou deixar de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade”). A acusação sustentava que o parlamentar teria contratado indevidamente, mediante inexigibilidade de licitação, escritório de advocacia para consultoria jurídica e patrocínio judicial na retomada dos serviços de abastecimento de água e esgoto do município. Constava da denúncia que inexistiria singularidade do objeto do contrato, pois o trabalho jurídico teria natureza ordinária e não seria dotado de complexidade que justificasse a contratação de profissional com notória especialização a justificar a inexigibilidade de licitação. O Ministro Roberto Barroso (relator) consignou que a contratação direta de escritório de advocacia deveria observar os seguintes parâmetros: a) necessidade de procedimento administrativo formal; b) notória especialização do profissional a ser contratado; c) natureza singular do serviço; d) demonstração da inadequação da prestação do serviço pelos integrantes do Poder Público; e e) cobrança de preço compatível com o mercado para o serviço. Inq 3074/SC, rel. Min. Roberto Barroso, 26.8.2014. (Inq-3074)
Inexigibilidade de licitação e critérios para contratação direta de escritório de advocacia - 2
O relator destacou que o procedimento formal teria sido regularmente observado, inclusive com a oitiva do Procurador-Geral do Município, e que teria havido publicação no Diário Oficial com um resumo do ato justificativo de inexigibilidade. Asseverou que as provas dos autos demonstrariam que a notória especialização estaria presente, pois comprovado que o escritório contratado teria atuado em serviços de advocacia afetos a concessão de saneamento básico de diversos municípios e estados-membros. Explicitou que, na situação dos autos, pela primeira vez, em 30 anos, seria feita a retomada de um serviço de saneamento básico que atenderia a quase 300 mil pessoas. Asseverou que essas circunstâncias, aliadas ao fato de haver resistência declarada da concessionária anterior e a magnitude financeira da operação, não indicariam se tratar de matéria trivial que não exigiria algum grau de sofisticação, razão pela qual a hipótese seria de singularidade do objeto. Acrescentou que a contratação de escritório de advocacia envolveria um teor mínimo de confiança tanto na “expertise”, como de confiança pessoal no advogado. Por fim, concluiu que o preço cobrado pelo escritório teria sido módico, uma vez que o serviço envolveria a retomada de uma concessão de valor vultoso, para uma ação judicial que, notadamente, se prolongaria por muito tempo. Vencido o Ministro Marco Aurélio, que recebia a denúncia. Aduzia se tratar de grande município que contaria com corpo jurídico estruturado, remunerado pela população e que estaria à altura de conduzir a defesa da entidade federada. Ressaltava que a Procuradoria já teria preparado inicial para a propositura da ação e, mesmo assim, se optara por contratar o escritório de advocacia. Inq 3074/SC, rel. Min. Roberto Barroso, 26.8.2014. (Inq-3074)
Reclamação: conflito federativo e usurpação de competência do STF
A 1ª Turma julgou procedente pedido formulado em reclamação para determinar a remessa ao STF de três ações correlacionadas que tramitam na 7ª Vara Federal da Seção Judiciária do Amazonas. [“Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: I - processar e julgar, originariamente: ... f) as causas e os conflitos entre a União e os Estados, a União e o Distrito Federal, ou entre uns e outros, inclusive as respectivas entidades da administração indireta”]. No caso, o Estado do Amazonas propusera, contra a União e o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - IPHAN, ação ordinária com o objetivo de anular o processo administrativo de tombamento do “Encontro das Águas dos Rios Negro e Solimões”. Em razão da alegada ofensa aos princípios ambientais da informação e da participação, o juízo reclamado deferira parcialmente o pedido para declarar a nulidade do processo administrativo a partir do tombamento provisório do fenômeno natural. Na exordial, o Ministério Público Federal argumentava que o juiz federal, ao conhecer da ação e demais causas a ela relacionadas, teria usurpado competência do STF por se tratar de ação instaurada entre o Estado do Amazonas, a União e uma autarquia federal. Aduzia que o Estado do Amazonas não se voltara simplesmente contra supostas irregularidades formais do processo de tombamento. Salientava que o fim último do ente estatal seria evitar a proteção do “Encontro das Águas” como forma de garantir a instalação de empreendimento portuário privado no seu entorno. A Turma destacou que, mesmo reconhecido o conflito entre entes da federação, a disputa deveria ter densidade suficiente para abalar o pacto federativo e, assim, deslocar a competência para o STF. Registrou que, após a decisão que anulara o tombamento provisório e suspendera a impossibilidade de licenciamento, o Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas - IPAAM concedera autorização de instalação para o porto privado em tempo recorde. Consignou, a partir da moldura fático-jurídica do objeto da reclamação, que o agente motivador oculto nos autos da ação ordinária de anulação seria a autonomia do Estado do Amazonas na gestão de seus recursos naturais. Asseverou que o tombamento do “Encontro das Águas” pela União — para preservação do cenário paisagístico como patrimônio cultural brasileiro — acabaria por se contrapor ao interesse jurídico, econômico, financeiro e social do Estado do Amazonas. Dessa forma, concluiu que a controvérsia seria apta a colocar em risco o equilíbrio federativo e suficiente para instaurar a jurisdição de competência originária do Supremo.
Rcl 12957/AM, rel. Min. Dias Toffoli, 26.8.2014. (Rcl-12957)
SEGUNDA TURMA
Princípio da insignificância e reincidência genérica
A 2ª Turma concedeu “habeas corpus” para restabelecer sentença de primeiro grau, na parte em que reconhecera a aplicação do princípio da insignificância e absolvera o ora paciente da imputação de furto (CP, art. 155). Na espécie, ele fora condenado pela subtração de um engradado com 23 garrafas de cerveja e seis de refrigerante — todos vazios, avaliados em R$ 16,00 —, haja vista que o tribunal de justiça local afastara a incidência do princípio da bagatela em virtude de anterior condenação, com trânsito em julgado, pela prática de lesão corporal (CP, art. 129). A Turma, de início, reafirmou a jurisprudência do STF na matéria para consignar que a averiguação do princípio da insignificância dependeria de um juízo de tipicidade conglobante. Considerou, então, que seria inegável a presença, no caso, dos requisitos para aplicação do referido postulado: mínima ofensividade da conduta; ausência de periculosidade social da ação; reduzida reprovabilidade do comportamento; e inexpressividade da lesão jurídica. Afirmou, ademais, que, considerada a teoria da reiteração não cumulativa de condutas de gêneros distintos, a contumácia de infrações penais que não têm o patrimônio como bem jurídico tutelado pela norma penal (a exemplo da lesão corporal) não poderia ser valorada como fator impeditivo à aplicação do princípio da insignificância, porque ausente a séria lesão à propriedade alheia.
HC 114723/MG, rel. Min. Teori Zavascki, 26.8.2014. (HC-114723)
Corrupção eleitoral e inépcia da denúncia
A 2ª Turma rejeitou denúncia oferecida em face de deputados federais em razão da suposta prática do delito previsto no art. 299 do Código Eleitoral (“Dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a oferta não seja aceita: Pena - reclusão até quatro anos e pagamento de cinco a quinze dias-multa”). A Turma, ao considerar o quanto disposto no art. 41 do CPP (“A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas”), considerou inepta a denúncia oferecida. Afirmou que, para ser apta, a referida peça deveria ter projetado ao caso concreto todos os elementos da figura típica em comento. Assim, deveria ter descrito: a) quem praticara o verbo típico — “dar, oferecer ou prometer” —; b) os meios empregados — “dinheiro, dádiva ou qualquer outra vantagem” —; e c) a ligação da conduta ao fim especial de obter o voto de pessoa determinada ou, se indeterminada, a especificação dessa circunstância. Consignou, então, que a inicial acusatória sem a definição dos elementos estruturais que compusessem o tipo penal, e que não narrasse, com precisão e de maneira individualizada, os elementos, tanto essenciais como acidentais, pertinentes ao tipo, incidiria em afronta à Constituição. Inq 3752/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, 26.8.2014. (Inq-3752)
Concurso público: prova oral e recurso administrativo
A 2ª Turma concedeu mandado de segurança para cassar decisão proferida pelo CNJ, que excluíra o ora impetrante de concurso público para ingresso em magistratura estadual. No caso, o então candidato ao cargo de juiz substituto, após ter sido reprovado na prova oral do concurso, tivera seu recurso administrativo provido pela comissão organizadora, a qual anulara algumas questões formuladas naquela fase e recalculara a nota a ele atribuída, o que resultara em sua aprovação. O CNJ, em processo de controle administrativo instaurado por outro candidato — que, a despeito de se encontrar em situação similar à do ora impetrante, tivera seu recurso administrativo negado —, excluíra ambos os concorrentes da fase subsequente à prova oral, sob o fundamento de que, segundo o art. 70, § 1º, da Resolução 75/2009 do CNJ, a nota atribuída na prova oral seria irretratável em sede recursal. A Turma, de início, afastou as alegações de ocorrência de ofensa ao devido processo legal e de extrapolação dos limites objetivos do processo de controle administrativo. Consignou que não se poderia transpor para o processo administrativo a integralidade das regras que regem o processo judicial, sob pena de desnaturá-lo. Afirmou que o exercício do controle da atuação administrativa dos órgãos que compõem o Poder Judiciário imporia ao CNJ o poder-dever de apurar e corrigir irregularidades, nos termos do art. 103-B da CF. Em razão disso, a inclusão do ora impetrante como interessado no processo administrativo em análise, aliada à faculdade que tivera, e exercera, de defender a validade da decisão administrativa que o beneficiara em detrimento de outro candidato, evidenciariam a improcedência das referidas assertivas de ofensa ao devido processo legal e de extrapolação dos limites objetivos do processo de controle administrativo. Quanto à discussão relativa à suposta impossibilidade de a comissão examinadora do concurso público revisar notas de prova oral, a Turma asseverou que o § 1º do art. 70 da Resolução 75/2009 do CNJ (“É irretratável em sede recursal a nota atribuída na prova oral”) pressuporia a validade da prova feita. Assinalou que conclusão diversa redundaria no não cabimento de recurso administrativo quando houvesse, inclusive, eventuais erros manifestos no processamento de concursos públicos. No caso, a comissão examinadora reconhecera o descumprimento de normas do edital do concurso no que diz com as questões que deveriam ter sido cobradas na fase oral. Ocorre que seria assente no STF o entendimento segundo o qual o edital de concurso público rege as relações entre os candidatos e a Administração Pública. Ambos estariam submetidos, portanto, às suas regras, e, eventual desrespeito ao que nele disciplinado consubstanciaria violação ao princípio da legalidade, o que autorizaria o candidato a buscar sua correção.
MS 32042/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, 26.8.2014. (MS-32042)