Informativo do STF 714 de 09/08/2013
Publicado por Supremo Tribunal Federal
PLENÁRIO
Detentor de mandato eletivo e efeitos da condenação - 1
O Plenário condenou senador (prefeito à época dos fatos delituosos), bem assim o presidente e o vice-presidente de comissão de licitação municipal pela prática do crime descrito no art. 90 da Lei 8.666/93 [“Art. 90. Frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, o caráter competitivo do procedimento licitatório, com o intuito de obter, para si ou para outrem, vantagem decorrente da adjudicação do objeto da licitação: Pena - detenção, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa”] à pena de 4 anos, 8 meses e 26 dias de detenção em regime inicial semiaberto. Fixou-se, por maioria, multa de R$ 201.817,05 ao detentor de cargo político, e de R$ 134.544,07 aos demais apenados, valores a serem revertidos aos cofres do município. Determinou-se — caso estejam em exercício — a perda de cargo, emprego ou função pública dos dois últimos réus. Entendeu-se, em votação majoritária, competir ao Senado Federal deliberar sobre a eventual perda do mandato parlamentar do ex-prefeito (CF, art. 55, VI e §2º). Reconheceu-se, também por maioria, a data deste julgamento como causa interruptiva da prescrição. Ademais, considerado o empate na votação, o Tribunal absolveu os sócios dirigentes das empresas envolvidas nas licitações em questão, denunciados pelo mesmo crime. Absolveu, outrossim, os sócios não detentores do cargo de gerência das empresas no tocante a essa imputação. Além disso, por decisão majoritária, absolveu todos os acusados no tocante ao crime de quadrilha (CP: “Art. 288. Associarem-se mais de três pessoas, em quadrilha ou bando, para o fim de cometer crimes: Pena - reclusão, de um a três anos”). A inicial narrava suposto esquema articulado com o propósito de burlar licitações municipais, perpetrado durante o mandato do então prefeito.
AP 565/RO, rel. Min. Cármen Lúcia, 7 e 8.8.2013. (AP-565)
Detentor de mandato eletivo e efeitos da condenação - 2
Inicialmente, a Corte resolveu duas questões de ordem. A primeira, para determinar o imediato julgamento do feito, não obstante alegação da defesa acerca da necessidade de sobrestamento, diante da pendência de decisão final do TCU em processo de tomada de contas. A segunda, para manter o julgamento conjunto de todos os réus no STF. Vencidos os Ministros Marco Aurélio, suscitante, e Ricardo Lewandowski, que votavam pelo desdobramento do processo em relação aos acusados que não detivessem prerrogativa de foro perante o Supremo. Em seguida, o Plenário rejeitou todas as questões preliminares arguidas. Quanto à primeira delas — inépcia da denúncia e nulidade por prejuízo ao contraditório e à ampla defesa —, aduziu-se que a inicial conteria a exposição do fato criminoso com todas as suas circunstâncias e com a narração satisfatória de todas as condutas imputadas aos acusados em atendimento aos requisitos do art. 41 do CPP. Com relação à segunda — nulidade decorrente da realização de investigação criminal pelo Ministério Público —, ressaltou-se que, na espécie, a denúncia fora formulada com base em dados probatórios coligidos no âmbito de inquérito civil, questão distinta da legitimidade constitucional do poder investigatório do Ministério Público.
AP 565/RO, rel. Min. Cármen Lúcia, 7 e 8.8.2013. (AP-565)
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No tocante à terceira preliminar — quebra de sigilo bancário e fiscal pelo STJ —, assentou-se que o procedimento cautelar de quebra de sigilo bancário e fiscal estaria relacionado à ação de improbidade administrativa, de modo a não incidir norma concernente à prerrogativa de foro. Relativamente à quarta — vício de prova pericial em razão de o perito responsável pelos laudos ser “compadre” do promotor de justiça encarregado pelas investigações iniciais —, sublinhou-se que essa prova fora juntada e valorada como mero documento e não como prova pericial. No que tange à quinta — ausência de condição de punibilidade e de justa causa para ação penal, ante a aprovação, por tribunal de contas estadual e câmara municipal, de contas referentes aos exercícios em que constatados os fatos delituosos —, afirmou-se inexistir relação de dependência ou prejudicialidade entre a aprovação de contas pelos órgãos administrativos e a persecução penal. Por fim, afastou-se, ainda, prejudicial de mérito quanto à prescrição da pretensão punitiva. Esclareceu-se que as imputações seriam sancionadas com penas privativas de liberdade de dois a quatro anos e que não teriam transcorrido oito anos, seja entre a data dos fatos narrados na inicial e a do recebimento da denúncia, seja entre o recebimento da inicial e a presente data.
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No mérito, prevaleceu o entendimento da relatora, que afirmou ser a licitação regra obrigatória no País, e que objetivaria à escolha, pela Administração, de prestadores de serviço e fornecedores de bens, em observância aos princípios gerais descritos no art. 37, caput, da CF. Além disso, a legislação pertinente exigiria o atendimento estrito ao que estabeleceriam as diferentes modalidades de licitação, que variariam de acordo com o valor de seu objeto. Acresceu que a licitação teria por escopo permitir a escolha, pelo Poder Público, de bens ou serviços dentro de um universo de competitividade, para se obter o melhor produto por um preço justo. Assim, a norma do art. 90 da Lei 8.666/93 buscaria proteger essa situação. Reputou que o tipo penal em comento seria crime próprio, restrito a quem interviesse em procedimento licitatório, a abranger agente público ou particular, desde que participasse do ajuste para impedir a regular disputa no processo de licitação. Analisou que o dolo seria específico no sentido de obtenção da vantagem indevida por meio da fraude ou frustração ao caráter competitivo. Explicou que, no caso em exame, a forma de cerceamento da ampla competição teria sido feita por meio de fracionamento dos valores das obras contratadas, para que as licitações ocorressem por convite, ao invés de tomada de preços. Dessa maneira, as licitações indevidamente realizadas seriam dirigidas a determinados fornecedores de bens e serviços, e nisso constituir-se-ia a fraude. No ponto, destacou que as obras teriam sido realizadas e que não houvera superfaturamento, mas esses fatos não obstariam o aperfeiçoamento do tipo penal, que não exigiria resultado naturalístico. Asseverou que as empresas pertencentes aos sócios dirigentes supostamente envolvidos no esquema delituoso frequentemente disputavam licitações na municipalidade, durante o mandato do então prefeito, e seus proprietários teriam ligação próxima com o ora parlamentar, de amizade ou parentesco. Entretanto, esse contexto isoladamente considerado não seria suficiente para caracterizar o crime. Frisou que as empresas contratadas não teriam estrutura suficiente para atender aos objetos licitados, de maneira que o argumento de serem as únicas capazes de cumprir o respectivo contrato não se sustentaria. Assentou que a autoria do delito estaria comprovada em relação ao então prefeito, ao presidente da comissão de licitação do município e ao vice-presidente dessa mesma comissão. No que se refere aos sócios das empresas vencedoras das licitações em exame, não considerou haver provas suficientes quanto a eventual conluio para o cometimento do crime, sequer acerca de possível dolo específico. No que se refere ao crime de quadrilha, afirmou que, tendo em vista o total de agentes em relação aos quais seria certa a prática do delito do art. 90 da Lei 8.666/93, não seria possível imputar-lhes o crime do art. 288 do CP, que exigiria a existência de mais de três pessoas. Destacou, não obstante, que não se poderia falar em associação para prática reiterada de crimes, mas apenas em concurso de agentes.
AP 565/RO, rel. Min. Cármen Lúcia, 7 e 8.8.2013. (AP-565)
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Acompanharam essa orientação os Ministros Teori Zavascki, Rosa Weber, Gilmar Mendes e Celso de Mello. O Min. Teori Zavascki sublinhou a natureza formal do crime descrito no art. 90 da Lei 8.666/93, que se aperfeiçoaria com a obtenção do status de vencedor da licitação. Assinalou que não seria necessário haver superfaturamento. Reconheceu a frustração da competitividade licitatória por meio da adoção indevida da modalidade convite e da escolha de certas empresas ligadas por laços de parentesco ou amizade, condutas imputáveis apenas aos membros da Administração. Analisou que o delito em questão seria plurissubjetivo e que não haveria elementos caracterizadores de quadrilha. O Min. Celso de Mello observou que o crime seria formal, e a obtenção de qualquer vantagem constituiria mero exaurimento. Além disso, sinalizou que, se considerasse que a prática delitiva tivesse sido realizada por mais de três agentes, julgaria o pleito procedente também em relação ao crime de quadrilha, porque presentes os demais requisitos deste tipo penal.
AP 565/RO, rel. Min. Cármen Lúcia, 7 e 8.8.2013. (AP-565)
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O Min. Dias Toffoli, revisor, acompanhou a relatora no tocante à condenação imposta ao então prefeito e aos demais membros da Administração. Em sua análise, frisou que os integrantes da comissão de licitação teriam sido indicados pelo prefeito, responsável pela homologação final dos certames. Assim, não se poderia falar em responsabilização penal objetiva em relação a ele, pois a comissão de licitação seria composta por pessoas de sua estrita confiança, que teriam ocupado funções semelhantes em âmbito estadual, quando o réu, posteriormente, ocupara o cargo de governador. Consignou que os atos praticados pelos prepostos do Chefe do Executivo municipal teriam por finalidade atender aos anseios particulares dele. Registrava, entretanto, o vínculo — de parentesco ou amizade — entre os sócios administradores das empresas vencedoras dos certames com o prefeito, de modo que estes, conhecedores do esquema narrado e dele beneficiários, seriam também agentes do tipo penal em questão. Entendeu não configurado o crime de quadrilha, pois não vislumbrou associação dos acusados para prática reiterada de crimes, mas apenas coautoria. Nesse mesmo sentido votaram os Ministros Roberto Barroso e Ricardo Lewandowski. O Min. Ricardo Lewandowski discorreu que o tipo penal do art. 90 da Lei 8.666/93 trataria de “vantagem” em sentido amplo, que poderia ser pecuniária, social, política e de outra natureza. Ademais, poderia ser lícita ou ilícita. Isso decorreria do fato de o bem tutelado pela norma não ser apenas patrimonial, mas relacionado à moralidade administrativa, à lisura, à idoneidade, à credibilidade e à regularidade na licitação. Reputava que o conluio em análise não seria possível sem a participação consciente dos dirigentes das empresas.
AP 565/RO, rel. Min. Cármen Lúcia, 7 e 8.8.2013. (AP-565)
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Os Ministros Marco Aurélio e Joaquim Barbosa, Presidente, além de acompanharem o revisor no que pertine ao delito do art. 90 da Lei 8.666/93, julgavam o pleito procedente no tocante à quadrilha. O Min. Marco Aurélio afirmava existir liame subjetivo entre os membros da Administração e os beneficiários das licitações, ocorrida a adjudicação. Considerava, ainda, configurada a quadrilha. Nesse sentido, o Presidente reputava evidenciada a associação permanente dos acusados para frustrar reiteradamente o caráter competitivo dos diversos procedimentos licitatórios. Aduzia que as empresas teriam sido criadas assim que o prefeito fora eleito, com o fim exclusivo de fraude. Ressaltava que as práticas delitivas teriam ocorrido ao longo de quatro anos e que seria característica do crime em discussão o cometimento reiterado e especializado de delitos idênticos ou semelhantes. Na sequência, verificou-se empate acerca da caracterização do delito previsto no art. 90 da Lei 8.666/93 em relação aos sócios dirigentes das empresas beneficiárias do esquema criminoso. O Plenário deliberou que, nessa circunstância, o entendimento mais favorável aos réus deveria prevalecer. Dessa maneira, a pretensão acusatória deveria ser acolhida apenas em relação ao prefeito, ao presidente e ao vice-presidente da comissão de licitações municipal pelo mencionado delito. O Min. Marco Aurélio registrava, a exemplo de como procedera no julgamento da AP 470/MG (DJe de 22.4.2013), que o empate na votação deveria implicar a adoção da corrente defendida pelo Presidente, ou seja, a condenação dos membros da Administração municipal e dos sócios dirigentes das empresas.
AP 565/RO, rel. Min. Cármen Lúcia, 7 e 8.8.2013. (AP-565)
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Passou-se à definição das reprimendas. Quanto às penas privativas de liberdade, adotou-se parâmetro de aproximação dos votos de cada Ministro, independentemente dos critérios utilizados, para fixação das sanções no julgamento. Assim, preponderou o voto do revisor, que fixou aos condenados a sanção de 4 anos, 8 meses e 26 dias de detenção em regime inicial semiaberto. Na dosimetria pertinente ao parlamentar, aplicou a agravante do art. 61, II, g, do CP [“g) com abuso de poder ou violação de dever inerente a cargo, ofício, ministério ou profissão”] e entendeu não incidir a causa especial de aumento disposta no § 2º do art. 84 da Lei 8.666/93 (“Art. 84. Considera-se servidor público, para os fins desta Lei, aquele que exerce, mesmo que transitoriamente ou sem remuneração, cargo, função ou emprego público ... § 2º A pena imposta será acrescida da terça parte, quando os autores dos crimes previstos nesta Lei forem ocupantes de cargo em comissão ou de função de confiança em órgão da Administração direta, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista, fundação pública, ou outra entidade controlada direta ou indiretamente pelo Poder Público”). Para tanto, levou em conta a distinção entre os regimes de responsabilização político-administrativa, no sistema constitucional brasileiro, dos agentes políticos em relação demais agentes públicos. Na fixação das reprimendas daqueles que integravam a comissão municipal, considerou inexistente circunstância agravante, uma vez que incidiria o § 2º do art. 84 da Lei 8.666/93. Reconheceu a continuidade delitiva entre os diversos crimes praticados por todos os apenados e somou 1/3 à sanção. Os Ministros Teori Zavascki e Rosa Weber acompanharam o Min. Dias Toffoli. O Min. Gilmar Mendes seguiu o revisor pela inaplicabilidade da causa de aumento ao parlamentar, em face da legalidade estrita. O Min. Roberto Barroso definia a reprimenda em 4 anos, 5 meses e 9 dias aos condenados, em cujo cálculo final foi acompanhado pelo Min. Ricardo Lewandowski. O Min. Roberto Barroso fixava as penas com o emprego dos critérios explicitados pelo revisor nas duas últimas etapas da dosimetria, porém, no concurso de crimes, aplicava o aumento de 2/3.
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Por sua vez, a relatora estabelecia as penas de detenção de 5 anos, 6 meses e 20 dias, ao ex-prefeito; e de 5 anos, ao então presidente e ao então vice-presidente da comissão licitatória. Na dosimetria, aplicava a todos os condenados a causa especial do art. 84, § 2º, da Lei 8.666/93 e, quanto à continuidade delitiva, o aumento de 2/3. Esclareceu que atribuía referida majorante ao ora congressista haja vista que, na apreciação da AP 470/MG, o STF teria entendido pela incidência da causa de aumento do art. 327, § 2º, do CP — de teor análogo a do § 2º do art. 84 — a agentes políticos, conceito que abrangeria tanto o Chefe do Poder Executivo, independentemente da esfera, como aqueles que exercessem mandatos parlamentares. Afastava a possibilidade de substituição das penas por restritivas de direitos, pois excederiam o limite firmado na lei (CP, art. 44, I) e, pelas mesmas razões, de suspensão condicional (CP, artigos 77 e seguintes). No mesmo sentido votaram os Ministros Celso de Mello e Presidente. No que pertine à causa de aumento, o decano ressaltou que aderiria ao voto da relatora em atenção ao princípio da colegialidade, haja vista possuir entendimento em sentido diverso. O Min. Marco Aurélio estipulava pena de 8 anos e 10 meses de detenção para o agente político. Aplicava tanto a agravante do art. 61, II, g, do CP quanto a causa de aumento da Lei de Licitações, porquanto seriam institutos distintos. Além disso, majorava a reprimenda em 2/3 (CP, art. 71). No mais, condenava o presidente da comissão a 6 anos e 8 meses e o vice-presidente a 3 anos de detenção.
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No tocante à pena de multa, o Plenário, por maioria, fixou-a em R$ 201.817,05 para o então prefeito e em R$ 134.544,70 para os membros da comissão licitatória [Lei 8.666/93: “Art. 99. A pena de multa cominada nos arts. 89 a 98 desta Lei consiste no pagamento de quantia fixada na sentença e calculada em índices percentuais, cuja base corresponderá ao valor da vantagem efetivamente obtida ou potencialmente auferível pelo agente. § 1º Os índices a que se refere este artigo não poderão ser inferiores a 2% (dois por cento), nem superiores a 5% (cinco por cento) do valor do contrato licitado ou celebrado com dispensa ou inexigibilidade de licitação”], monetariamente atualizadas a partir da formalização de cada um dos contratos impugnados na denúncia. Esclareceu-se que as importâncias corresponderiam a 3% e a 2%, respectivamente, do valor dos contratos questionados e deveriam ser revertidas à Fazenda Pública municipal (art. 99, § 2º). Destacou-se que a lei de regência preveria a imposição de dupla punição: pena privativa de liberdade acrescida de multa. Os Ministros Celso de Mello e Gilmar Mendes complementaram que a teoria monista justificaria a aplicação da sanção pecuniária. O decano ressaltou que a vantagem não precisaria ser econômica e que a base de cálculo da multa teria sido definida de forma objetiva. O Presidente aduziu que a lei teria estipulado a reprimenda em função do valor do contrato e não do lucro. Vencidos os Ministros Teori Zavascki, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio, que não aplicavam a sanção pecuniária, porquanto entendiam inexistir base adequada para isso. O primeiro afirmava não ser possível incidir a sanção nos casos em que o crime ocorresse sem vantagem pecuniária, em virtude do princípio da legalidade estrita. O segundo complementava que haveria possibilidade de que ela excedesse o patrimônio de alguns dos réus e, dessa forma, equivalesse a confisco, o que seria vedado pela Constituição.
AP 565/RO, rel. Min. Cármen Lúcia, 7 e 8.8.2013. (AP-565)
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Além disso, o Tribunal determinou a perda de cargo, emprego ou função pública do então presidente e vice-presidente da comissão licitatória, se estiverem em exercício. Relativamente ao atual mandato de senador da República, decidiu-se, por maioria, competir à respectiva Casa Legislativa deliberar sobre sua eventual perda (CF: “Art. 55. Perderá o mandato o Deputado ou Senador: ... VI - que sofrer condenação criminal em sentença transitada em julgado. ... § 2º - Nos casos dos incisos I, II e VI, a perda do mandato será decidida pela Câmara dos Deputados ou pelo Senado Federal, por voto secreto e maioria absoluta, mediante provocação da respectiva Mesa ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa”). A relatora e o revisor, no que foram seguidos pela Min. Rosa Weber, reiteraram o que externado sobre o tema na apreciação da AP 470/MG. O revisor observou que, se por ocasião do trânsito em julgado o congressista ainda estivesse no exercício do cargo parlamentar, dever-se-ia oficiar à Mesa Diretiva do Senado Federal para fins de deliberação a esse respeito. O Min. Roberto Barroso pontuou haver obstáculo intransponível na literalidade do § 2º do art. 55 da CF. O Min. Teori Zavascki realçou que a condenação criminal transitada em julgado conteria como efeito secundário, natural e necessário, a suspensão dos direitos políticos, que independeria de declaração. De outro passo, ela não geraria, necessária e naturalmente, a perda de cargo público. Avaliou que, no caso específico dos parlamentares, essa consequência não se estabeleceria. No entanto, isso não dispensaria o congressista de cumprir a pena. O Min. Ricardo Lewandowski concluiu que o aludido dispositivo estaria intimamente conectado com a separação dos Poderes. Vencidos os Ministros Gilmar Mendes, Marco Aurélio, Celso de Mello e o Presidente, que reafirmavam os votos proferidos na ação penal já indicada. Reputavam ser efeito do trânsito em julgado da condenação a perda do mandato. Dessa maneira, caberia à mesa da Casa respectiva apenas declará-la. O Colegiado ordenou que, após a decisão se tornar definitiva e irrecorrível, os nomes dos réus fossem lançados no rol dos culpados e expedidos os competentes mandados de prisão. Por fim, em votação majoritária, registrou-se que a data desta sessão plenária constituiria causa interruptiva da prescrição (CP, art. 117, IV), vencido, neste aspecto, o Min. Marco Aurélio, que considerava necessária a publicação.
AP 565/RO, rel. Min. Cármen Lúcia, 7 e 8.8.2013. (AP-565)
ADI: uso de veículos apreendidos e competência - 3
Revestem-se de constitucionalidade as Leis 5.717/98 e 6.931/2001, do Estado do Espírito Santo, que autorizam a utilização, pela polícia militar ou pela polícia civil estadual, de veículos apreendidos e não identificados quanto à procedência e à propriedade, exclusivamente no trabalho de repressão penal. Essa a orientação do Plenário que, em conclusão, por maioria, julgou improcedente pedido formulado em ação direta de inconstitucionalidade ajuizada contra as mencionadas normas — v. Informativos 701 e 706. Avaliou-se não se tratar de matéria correlata a trânsito, mas concernente à administração. Recordou-se que norma do Código de Trânsito Brasileiro permitiria que veículos fossem levados a hasta pública, embora constituísse permissão que nem sempre ocorreria. Destacou-se que as normas disporiam sobre a regulação no plano estritamente administrativo, na esfera de autonomia do estado-membro. Vencidos os Ministros Dias Toffoli, relator, Rosa Weber, Luiz Fux, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio, que julgavam o pleito procedente. Aduziam que as leis em comento teriam invadido a esfera de competência privativa da União para legislar sobre trânsito e transporte.
ADI 3327/ES, rel. orig. Min. Dias Toffoli, red. p/ o acórdão Min. Cármen Lúcia, 8.8.2013. (ADI-3327)
PRIMEIRA TURMA
Imunidade tributária e imóvel vago
A 1ª Turma, por maioria, negou provimento a recurso extraordinário em que discutido se imóvel não edificado pertencente ao Serviço Social da Indústria - SESI estaria alcançado pela imunidade tributária. Na espécie, reconheceu-se que, por ser o recorrido entidade de direito privado, sem fins lucrativos, encaixar-se-ia na hipótese do art. 150, VI, c, da CF e, por isso, estaria imune. Apontou-se que a constatação de que imóvel vago ou sem edificação não seria suficiente, por si só, para destituir a garantia constitucional da imunidade tributária. Ponderou-se que, caso já tivesse sido deferido o status de imune ao contribuinte, o afastamento dessa imunidade somente poderia ocorrer mediante prova em contrário produzida pela administração tributária. Asseverou-se não ser possível considerar que determinado imóvel destinar-se-ia a finalidade diversa da exigida pelo interesse público apenas pelo fato de, momentaneamente, estar sem edificação ou ocupação. Assinalou-se que a qualquer momento poderia deixar sua condição de imóvel vago. Vencido o Min. Marco Aurélio, que dava provimento ao recurso. Assentava não poder concluir que um imóvel não edificado estivesse diretamente relacionado a serviço prestado. Explicitava que a imunidade do art. 150, VI, c, da CF não seria linear, tendo em vista a restrição disposta no seu § 4º (“As vedações expressas no inciso VI, alíneas ‘b’ e ‘c’, compreendem somente o patrimônio, a renda e os serviços, relacionados com as finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas”).
RE 385091/DF, rel. Min. Dias Toffoli, 6.8.2013. (RE-385091)
Crime ambiental: absolvição de pessoa física e responsabilidade penal de pessoa jurídica - 1
É admissível a condenação de pessoa jurídica pela prática de crime ambiental, ainda que absolvidas as pessoas físicas ocupantes de cargo de presidência ou de direção do órgão responsável pela prática criminosa. Com base nesse entendimento, a 1ª Turma, por maioria, conheceu, em parte, de recurso extraordinário e, nessa parte, deu-lhe provimento para cassar o acórdão recorrido. Neste, a imputação aos dirigentes responsáveis pelas condutas incriminadas (Lei 9.605/98, art. 54) teria sido excluída e, por isso, trancada a ação penal relativamente à pessoa jurídica. Em preliminar, a Turma, por maioria, decidiu não apreciar a prescrição da ação penal, porquanto ausentes elementos para sua aferição. Pontuou-se que o presente recurso originara-se de mandado de segurança impetrado para trancar ação penal em face de responsabilização, por crime ambiental, de pessoa jurídica. Enfatizou-se que a problemática da prescrição não estaria em debate, e apenas fora aventada em razão da demora no julgamento. Assinalou-se que caberia ao magistrado, nos autos da ação penal, pronunciar-se sobre essa questão. Vencidos os Ministros Marco Aurélio e Luiz Fux, que reconheciam a prescrição. O Min. Marco Aurélio considerava a data do recebimento da denúncia como fator interruptivo da prescrição. Destacava que não poderia interpretar a norma de modo a prejudicar aquele a quem visaria beneficiar. Consignava que a lei não exigiria a publicação da denúncia, apenas o seu recebimento e, quer considerada a data de seu recebimento ou de sua devolução ao cartório, a prescrição já teria incidido.
RE 548181/PR, rel. Min. Rosa Weber, 6.8.2013. (RE-548181)
Crime ambiental: absolvição de pessoa física e responsabilidade penal de pessoa jurídica - 2
No mérito, anotou-se que a tese do STJ, no sentido de que a persecução penal dos entes morais somente se poderia ocorrer se houvesse, concomitantemente, a descrição e imputação de uma ação humana individual, sem o que não seria admissível a responsabilização da pessoa jurídica, afrontaria o art. 225, § 3º, da CF. Sublinhou-se que, ao se condicionar a imputabilidade da pessoa jurídica à da pessoa humana, estar-se-ia quase que a subordinar a responsabilização jurídico-criminal do ente moral à efetiva condenação da pessoa física. Ressaltou-se que, ainda que se concluísse que o legislador ordinário não estabelecera por completo os critérios de imputação da pessoa jurídica por crimes ambientais, não haveria como pretender transpor o paradigma de imputação das pessoas físicas aos entes coletivos. Vencidos os Ministros Marco Aurélio e Luiz Fux, que negavam provimento ao extraordinário. Afirmavam que o art. 225, § 3º, da CF não teria criado a responsabilidade penal da pessoa jurídica. Para o Min. Luiz Fux, a mencionada regra constitucional, ao afirmar que os ilícitos ambientais sujeitariam “os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas”, teria apenas imposto sanções administrativas às pessoas jurídicas. Discorria, ainda, que o art. 5º, XLV, da CF teria trazido o princípio da pessoalidade da pena, o que vedaria qualquer exegese a implicar a responsabilidade penal da pessoa jurídica. Por fim, reputava que a pena visaria à ressocialização, o que tornaria impossível o seu alcance em relação às pessoas jurídicas.
RE 548181/PR, rel. Min. Rosa Weber, 6.8.2013.(RE-548181)
SEGUNDA TURMA
Título da dívida agrária e inadimplemento
Exaurido o período vintenário para resgate de títulos da dívida agrária, o pagamento complementar de indenização fixada em decisão final em ação expropriatória deve ser efetuado na forma do art. 100 da CF, e não em títulos da dívida agrária complementares. Com base nessa orientação, a 2ª Turma conheceu, em parte, de recurso extraordinário e, nesta, negou-lhe provimento. No caso, por decisão judicial, fora determinado o pagamento de indenização complementar em expropriação para fins de reforma agrária. Decorrido o lapso temporal de vinte anos, teria sido exigido que a referida complementação fosse feita por precatório, à vista e em dinheiro, e não por meio de título da dívida agrária. Preliminarmente, a Turma não conheceu das assertivas de inclusão de juros compensatórios na aludida complementação e de não cabimento de indenização em relação à cobertura florestal, porquanto ambas as alegações não teriam sido suscitadas na decisão recorrida. No mérito, reputou-se que o pagamento por título da dívida agrária, após o mencionado período, violaria o princípio da prévia e justa indenização. Aduziu-se que se fosse atendida a pretensão da recorrente, passados vinte anos, postergar-se-ia ad aeternum o pagamento da indenização.
RE 595168/BA, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 6.8.2013. (RE-595168)