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Informativo do STF 691 de 07/12/2012

Publicado por Supremo Tribunal Federal


PLENÁRIO

AP 470/MG - 207

O Plenário retomou julgamento de ação penal movida, pelo Ministério Público Federal, contra diversos acusados pela suposta prática de esquema a envolver crimes de peculato, lavagem de dinheiro, corrupção ativa, gestão fraudulenta e outras fraudes — v. Informativos 673 a 685 e 687 a 690. Na sessão de 5.12.2012, o Relator finalizou proclamação quanto ao crime de lavagem de dinheiro praticado por João Paulo Cunha, descrito no item III.1 (a.2) da denúncia, relativamente à contratação firmada entre empresa ligada a Marcos Valério pela Câmara dos Deputados. Consignou-se a pena em 3 anos de reclusão e 50 dias-multa, no valor de 10 salários mínimos cada. Na sequência, retificou-se a pena outrora definida para Rogério Tolentino — fixada em 3 anos, 8 meses e 10 dias de reclusão — a fim de estabelecê-la em 3 anos e 2 meses de reclusão no tocante ao delito de lavagem de dinheiro, narrado no capítulo IV da inicial. A Min. Rosa Weber destacou debate acerca da ocorrência de crime único ou de mais de uma operação de lavagem de dinheiro. Asseverou que votara no sentido de crime único e, ausentes elementos aptos a aumentar ou diminuir a reprimenda, tornara a pena-base definitiva. Vencidos os Ministros Relator e Luiz Fux, que consideravam a existência de 46 operações de lavagem de capital. Manteve-se a pena de 133 dias-multa, no valor de 10 salários mínimos cada.

AP 470/MG, rel. Min. Joaquim Barbosa, 5 e 6.12.2012. (AP-470)

AP 470/MG - 208

Em seguida, o Tribunal, por maioria, rejeitou questão suscitada pelo Min. Marco Aurélio no que se refere à regra da continuidade delitiva (CP, art. 71: “Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subsequentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços”). No ponto, prevaleceu o voto do Relator. Este explicou que a jurisprudência da Corte fixara que a citada norma somente seria aplicável se o agente praticasse o mesmo tipo penal e, ainda assim, se observadas certas condições. Examinou que, no caso, não haveria nexo de continuidade entre os crimes de corrupção ativa e peculato. Ao contrário, seriam condutas inteiramente distintas e conduziriam a diferentes resultados criminosos. Nenhum dos requisitos do art. 71 do CP — condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras — seria comum, presentes situações díspares e específicas para cada um desses delitos, cometidos com dolos autônomos. Frisou entendimento das Turmas do STF segundo o qual a incidência do aludido preceito — ao invés de concurso material — dependeria de os crimes subsequentes poderem ser considerados continuação do primeiro. Assim, deveria haver unidade objetiva e subjetiva de condutas. Destacou que delitos de igual espécie seriam fatos típicos equivalentes tanto do ponto de vista objetivo quanto do subjetivo. Acresceu não haver relação de dependência ou de subordinação entre condutas delituosas atentatórias a bens jurídicos diversos. Aquilatou que, na espécie, os crimes de corrupção ativa pelos quais condenados Marcos Valério, Cristiano Paz e Ramon Hollerbach não poderiam ser reputados uma unidade continuada, pois envolveriam renovação de contrato de empresa privada com entidade pública; pagamento do Presidente da Câmara para interferir em procedimento licitatório e permitir a contratação de outra empresa e pagamento de propina a parlamentares para apoio político. O único elemento comum entre esses crimes seria inerente ao tipo penal, insuficiente para concluir acerca de eventual unidade continuada de conduta criminosa.

AP 470/MG, rel. Min. Joaquim Barbosa, 5 e 6.12.2012. (AP-470)

AP 470/MG - 209

Ressaltou que os requisitos e as circunstâncias objetivas do art. 71 do CP seriam diferentes. Prova disso seriam os valores pagos tendo em vista a prática de diferentes atos de ofício, por agentes diversos, contra entidades públicas distintas. Também as empresas beneficiadas por esses atos de ofício seriam diferenciadas, assim como os lugares de execução dos crimes. O mesmo sucederia quanto às corrupções ativas de parlamentares, que teriam sido comandadas por outros réus em esquema totalmente diverso. Ponderou que Marcos Valério, Cristiano Paz e Ramon Hollerbach responderiam por outros atos ilícitos perpetrados por meio de suas agências de publicidade e inferiu que a jurisprudência da Corte seria pacífica no sentido de que a reiteração criminosa e a prática profissional de delitos não poderiam ser invocadas para aplicar o benefício da continuidade. Arrematou que não se poderia confundir o fato de os acusados terem cometido vários crimes ao longo de vários anos, por meio de quadrilha organizada, com a existência de continuidade delituosa, o que seria privilégio indevido. Reputou que a intensidade de lesão ao bem jurídico deveria ser objeto de análise para fixação da pena-base de qualquer crime, independentemente de reiteração da conduta. Por fim, registrou que essas diretrizes aplicar-se-iam aos demais corréus, no sentido de afastar o reconhecimento do nexo de continuidade delitiva.

AP 470/MG, rel. Min. Joaquim Barbosa, 5 e 6.12.2012. (AP-470)

AP 470/MG - 210

A Min. Rosa Weber reforçou entendimento segundo o qual delitos da mesma espécie — para efeitos de incidência da regra do art. 71 do CP — seriam aqueles descritos no mesmo tipo penal. O Min. Luiz Fux qualificou que delitos da mesma natureza seriam os previstos no mesmo tipo, bem como aqueles que apresentassem, pelos fatos que os constituíssem ou por seus motivos determinantes, caracteres fundamentais comuns. Não bastaria que se atingisse, portanto, o mesmo bem jurídico. Estabeleceu que a interpretação da continuidade delitiva deveria ser restritiva, e não elástica a ponto de se considerar como continuados crimes completamente diferentes. Sublinhou não ser possível utilizar a continuidade para privilegiar o agente que atuara em criminalidade organizada, pois a causa de aumento teria sido criada para beneficiar o criminoso oportunista, submetido por seu impulso, portanto menos perigoso. O Min. Gilmar Mendes sinalizou que a jurisprudência restringiria o lapso temporal e o âmbito espacial necessários à configuração de continuidade, e que interpretação diversa seria danosa ao sistema penal, ao beneficiar crimes graves.

AP 470/MG, rel. Min. Joaquim Barbosa, 5 e 6.12.2012. (AP-470)

AP 470/MG - 211

Vencido o Min. Marco Aurélio, no que foi acompanhado pelo Min. Ricardo Lewandowski. Aludiu que o crime continuado consistiria em cláusula de abertura do sistema jurídico que permitiria ao magistrado, dentro de certas balizas, dar proporcionalidade à pena abstratamente cominada na legislação penal. Mencionou que a continuidade delitiva seria ficção jurídica, verdadeira opção de política criminal, voltada à amenização de penas corporais excessivamente descompassadas com o grau de agressão causado a único bem jurídico. Observou que a ocorrência de desígnios autônomos não seria óbice ao reconhecimento dessa benesse. Ressaltou que para a configuração do mencionado instituto bastaria a proteção de um único bem jurídico. Desnecessário, portanto, que os crimes fossem idênticos ou pertencentes ao mesmo tipo penal. No caso das imputações referentes à lavagem de dinheiro, à gestão fraudulenta de instituição financeira e à evasão de divisas, apontou que haveria elemento comum que se consubstanciaria na fuga dos poderes regulatórios do Banco Central. Não aplicou a continuidade delitiva quanto ao crime de quadrilha por tratar-se de delito de natureza formal, enquanto os demais possuiriam natureza material, além de tutelar outro bem jurídico: a paz social. No que tange a peculato e corrupções ativa e passiva, a legislação criminal objetivaria a proteção do prestígio e do funcionamento da Administração Pública. Assim, haveria identidade de valores tutelados. Considerou atendidas as condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes exigidas pelo art. 71 do CP.

AP 470/MG, rel. Min. Joaquim Barbosa, 5 e 6.12.2012. (AP-470)

AP 470/MG - 212

Desse modo, mencionou as penais totais, de diversos réus, já proclamadas pelo Pleno seguidas do recálculo a que procedera, ao aplicar o art. 71 do CP: a) Marcos Valério, de 40 anos, 4 meses e 6 dias de reclusão para 10 anos e 10 meses de reclusão; b) Ramon Hollerbach, de 29 anos, 7 meses e 20 dias de reclusão para 8 anos e 1 mês de reclusão; c) Cristiano Paz, de 25 anos, 11 meses e 20 dias de reclusão para 8 anos e 1 mês de reclusão; d) Rogério Tolentino, de 10 anos e 6 meses de reclusão para 8 anos de reclusão; e) Simone Vasconcelos, de 12 anos, 7 meses e 20 dias de reclusão para 5 anos de reclusão; f) Kátia Rabello, de 16 anos e 8 meses de reclusão para 8 anos e 11 meses de reclusão; g) José Roberto Salgado, de 16 anos e 8meses de reclusão para 8 anos e 11 meses de reclusão; h) Henrique Pizzolato, de 12 anos e 7 meses de reclusão para 5 anos e 10 meses de reclusão; i) Romeu Queiroz, de 6 anos e 6 meses de reclusão para 4 anos, 9 meses e 18 dias de reclusão; j) Valdemar Costa Neto, de 7 anos e 10 meses de reclusão para 5 anos e 4 meses de reclusão; k) Pedro Henry, de 7 anos e 2 meses de reclusão para 4 anos e 8 meses de reclusão; l) Carlos Alberto Rodrigues, de 6 anos e 3 meses de reclusão para 3 anos, 9 meses e 15 dias de reclusão; m) Pedro Corrêa, de 9 anos e 5 meses de reclusão para 6 anos e 11 meses de reclusão; n) João Paulo Cunha, de 9 anos e 4 meses de reclusão para 3 anos, 10 meses e 20 dias de reclusão; e o) Roberto Jefferson, de 7 anos e 14 dias de reclusão para 4 anos, 6 meses e 13 dias de reclusão. Quanto a Vinícius Samarane, conquanto o tivesse absolvido, assentou que o mesmo critério deveria ser seguido, a teor do art. 580 do CPP, de maneira que a pena firmada em 8 anos, 9 meses e 10 dias de reclusão seria redimensionada para 5 anos e 9 meses de reclusão. Por fim, assinalou descaber a incidência da continuidade delitiva relativamente às penas de multa, em virtude do disposto no art. 72 do CP (“No concurso de crimes, as penas de multa são aplicadas distinta e integralmente”).

AP 470/MG, rel. Min. Joaquim Barbosa, 5 e 6.12.2012. (AP-470)

AP 470/MG - 213

Na assentada de 6.12.2012, o Revisor reajustou seu voto quanto às penas pecuniárias por ele aplicadas. Explicou que o fizera para aproximar dos valores alcançados pelo Plenário. Constatou, ao proceder ao levantamento dessas penas, que alguns réus com patrimônio declarado em valores aproximados haviam recebido multas diferenciadas, bem assim a existência de acusados com sanções pecuniárias acima de seus bens. Ante as distorções, expôs breve histórico quanto ao surgimento do sistema do dia-multa, e obtemperou que o legislador levara em consideração a situação econômica do apenado para a sua fixação. Asseverou que, a partir das modificações promovidas pela Lei 9.268/91, ter-se-ia pena pecuniária de natureza híbrida, ou seja, penal e fiscal. Entretanto, não haveria regra a encaminhar o julgador a critério meramente objetivo no que tange à sua especificação. Ensinou que haveria 3 correntes doutrinárias quanto à metodologia de fixação da quantidade de dias-multa. A primeira entenderia que o único critério a ser utilizado pelo magistrado seria aquele correspondente à situação econômica do réu. A segunda levaria em conta a culpabilidade do agente, porém, afastaria do cálculo a incidência de agravantes ou atenuantes e as causas de aumento e diminuição da pena. A terceira, a qual o Revisor se filiaria, propugnaria que o julgador não poderia afastar-se do critério trifásico de Nelson Hungria para o cálculo das penas em geral. Aduziu que essa posição encontraria embasamento na redação do art. 59 do CP (“O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime”). Relevou que seu inciso I estabeleceria, na primeira fase da dosimetria, a aplicação das penas cabíveis dentre as cominadas, sem distinguir entre a sanção corporal e a pecuniária.

AP 470/MG, rel. Min. Joaquim Barbosa, 5 e 6.12.2012. (AP-470)

AP 470/MG - 214

Exemplificou com o delito de corrupção passiva, cuja pena variaria entre 2 e 12 anos de reclusão. Na primeira fase da aplicação da reprimenda, em relação à pena privativa de liberdade, o julgador teria um intervalo de 10 anos entre o máximo e o mínimo da pena. Em relação à pena de multa, conforme disporia o art. 49 do CP, ela poderia ser fixada entre o mínimo de 10 e o máximo de 360 dias-multa. Significaria que o magistrado teria um interregno a ser percorrido de 350 dias-multa. Em outras palavras, se na dosimetria para o crime de corrupção passiva, o julgador fixasse a pena-base em 1 ano acima do mínimo legal, significaria que ele teria caminhado 1/10 do que poderia percorrer. A pena-base da multa, portanto, deveria ser também 1/10 dos 350 dias-multa possíveis, de forma a ser fixada em 45 dias-multa. Afirmou que nas demais fases, o juiz deveria aplicar à pena-base pecuniária os mesmos acréscimos que adotara em relação à pena privativa de liberdade. Esclareceu que, se a pena fosse aumentada em 1/6, a considerar alguma circunstância agravante, de igual modo exacerbar-se-ia, também, a multa. De maneira semelhante na fase subsequente. Por fim, na fixação do valor do dia-multa, o juiz atentaria, sobretudo, para a situação econômica do réu.

AP 470/MG, rel. Min. Joaquim Barbosa, 5 e 6.12.2012. (AP-470)

AP 470/MG - 215

Frisou que o juiz deveria fixar o valor do dia- multa com base no salário mínimo, de acordo com as regras do art. 49, § 1º, c/c o art. 70, parágrafo único, do CP [“Art. 49 - A pena de multa consiste no pagamento ao fundo penitenciário da quantia fixada na sentença e calculada em dias-multa. Será, no mínimo, de 10 (dez) e, no máximo, de 360 (trezentos e sessenta) dias-multa. § 1º - O valor do dia-multa será fixado pelo juiz não podendo ser inferior a um trigésimo do maior salário mínimo mensal vigente ao tempo do fato, nem superior a 5 (cinco) vezes esse salário. Art. 70 - Quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplica-se-lhe a mais grave das penas cabíveis ou, se iguais, somente uma delas, mas aumentada, em qualquer caso, de um sexto até metade. As penas aplicam-se, entretanto, cumulativamente, se a ação ou omissão é dolosa e os crimes concorrentes resultam de desígnios autônomos, consoante o disposto no artigo anterior. Parágrafo único - Não poderá a pena exceder a que seria cabível pela regra do art. 69 deste Código”]. Dessa forma, o Revisor expôs — acerca dos réus que condenara — os dias-multa anteriormente fixados pelo Plenário seguidos pelo quantum calculado a partir das premissas por ele fixadas: a) Marcos Valério, 673 e 670; b) Ramon Hollerbach, 816 e 431; c) Cristiano Paz, 716 e 306; d) Simone Vasconcelos, 288 e 163; e) Kátia Rabello, 386 e 231; f) José Roberto Salgado, 386 e 231; g) Delúbio Soares, 250 e 160; h) Jacinto Lamas, 200 e 25; i) Valdemar Costa Neto, 450 e 165; j) Enivaldo Quadrado, 260 e 11; k) Pedro Corrêa, 190 e 85; l) Roberto Jefferson, 127 e 48; m) Romeu Queiroz e José Borba, 150 e 85; n) Carlos Alberto Rodrigues (Bispo Rodrigues), 150 e 45; e o) Henrique Pizzolato, 530 e 253. Ato contínuo, o Min. Marco Aurélio reajustou seu voto para adotar o critério de cálculo trazido pelo Revisor em relação aos réus que condenara, sem, no entanto, o acompanhar nas matérias em que ficara vencido. As Ministras Cármen Lúcia e Rosa Weber também reajustaram seus votos quanto ao resultado, em conformidade com o Revisor, porém, não no que concerne aos fundamentos. O Relator sinalizou que verificaria os casos em que teria prevalecido a multa por ele fixada.

AP 470/MG, rel. Min. Joaquim Barbosa, 5 e 6.12.2012. (AP-470)

AP 470/MG - 216

Em passo seguinte, iniciou-se a apreciação sobre a perda de mandato parlamentar quanto aos deputados federais João Paulo Cunha, Valdemar Costa Neto e Pedro Henry, assim como em relação a José Borba, atualmente prefeito. O Relator destacou que a perda ou suspensão de direitos políticos, com a consequente privação de mandato eletivo, seria situação excepcional no Estado Democrático de Direito. Observou, ainda, que se trataria de hipóteses taxativamente dispostas no art. 15 da CF, norma de eficácia plena (“Art. 15. É vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de: I - cancelamento da naturalização por sentença transitada em julgado; II - incapacidade civil absoluta; III - condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos; IV - recusa de cumprir obrigação a todos imposta ou prestação alternativa, nos termos do art. 5º, VIII; V - improbidade administrativa, nos termos do art. 37, § 4º”). A par disso, aduziu previsão constitucional no sentido da possibilidade de o Poder Legislativo decretar a perda de mandato de deputado federal ou senador, tendo como causa perda ou suspensão de direitos políticos ou condenação criminal transitada em julgado (art. 55, IV e VI). Ressaltou, no ponto, que esta redação segregada explicar-se-ia pela viabilidade de a reprovação estatal da conduta delituosa ter ocorrido antes ou depois do início do mandato parlamentar. Consignou que a especialidade contida no art. 55, VI, da CF (“Art. 55. Perderá o mandato o Deputado ou Senador: ... VI - que sofrer condenação criminal em sentença transitada em julgado”) justificar-se-ia nos casos em que a sentença condenatória não tivesse decretado perda do mandato pelo parlamentar por não estarem presentes os requisitos legais [CP: “Art. 92 - São também efeitos da condenação: I - a perda de cargo, função pública ou mandato eletivo: a) quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a um ano, nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a Administração Pública; b) quando for aplicada pena privativa de liberdade por tempo superior a 4 (quatro) anos nos demais casos. II - a incapacidade para o exercício do pátrio poder, tutela ou curatela, nos crimes dolosos, sujeitos à pena de reclusão, cometidos contra filho, tutelado ou curatelado; III - a inabilitação para dirigir veículo, quando utilizado como meio para a prática de crime doloso. Parágrafo único - Os efeitos de que trata este artigo não são automáticos, devendo ser motivadamente declarados na sentença”] ou por ter sido proferida anteriormente à expedição do diploma, com o trânsito em julgado ocorrente em momento posterior.

AP 470/MG, rel. Min. Joaquim Barbosa, 5 e 6.12.2012. (AP-470)

AP 470/MG - 217

Asseverou que o procedimento estabelecido no art. 55 da CF disciplinaria circunstâncias em que a perda de mandato eletivo parlamentar poderia ser decretada com base em juízo político. Afirmou, no entanto, que conjectura diversa envolveria a aludida perda a partir de decisão do Poder Judiciário, a qual atingiria não somente o parlamentar eleito como qualquer outro mandatário político. Na decisão judicial, condenado deputado federal ou senador, no curso do mandato, pela mais alta instância judiciária, inexistiria espaço para o exercício de juízo político ou de conveniência pela Casa Legislativa, uma vez que a suspensão de direitos políticos, com a subsequente perda de mandato eletivo, seria efeito irreversível da sentença condenatória. Concluiu que a deliberação da Casa Legislativa, prevista no art. 55, § 2, da CF, possuiria efeito meramente declaratório, sem que aquela pudesse rever ou tornar sem efeito decisão condenatória final proferida pelo STF. Por outro lado, reputou que as premissas firmadas no julgamento da AP 481/PA (DJe de 29.6.2012) não seriam aplicáveis ao presente feito, haja vista que naquela oportunidade o parlamentar fora condenado a pena inferior a 4 anos de reclusão pela prática de esterilização cirúrgica irregular (Lei 9.263/96, art. 15) e não perpetrara o delito na vigência do mandato eletivo. Rememorou que João Paulo Cunha, Valdemar Costa Neto, Pedro Henry e José Borba, ao revés, cometeram crimes contra a Administração Pública quando no exercício do cargo, a revelar conduta incompatível com a função parlamentar. Assim, decretou a perda do mandato eletivo deles. Reiterou seu voto no que concerne a José Borba, de forma a converter a pena privativa de liberdade em 2 restritivas de direitos, consistentes em pena pecuniária de 300 salários mínimos e em interdição temporária de direitos (CP: “Art. 47. As penas de interdição temporária de direitos são: I - proibição do exercício de cargo, função ou atividade pública, bem como de mandato eleitivo”). O Min. Cezar Peluso, em voto outrora prolatado, também a determinara relativamente a João Paulo Cunha como efeito específico da condenação (CP, art. 92, I, b).

AP 470/MG, rel. Min. Joaquim Barbosa, 5 e 6.12.2012. (AP-470)

AP 470/MG - 218

Em divergência, o Revisor reconheceu ser da Câmara dos Deputados a competência para decretar a perda dos mandatos, nos termos do art. 55, § 2º, da CF (“Art. 55. Perderá o mandato o Deputado ou Senador: I - que infringir qualquer das proibições estabelecidas no artigo anterior; II - cujo procedimento for declarado incompatível com o decoro parlamentar; ...VI - que sofrer condenação criminal em sentença transitada em julgado. ...§ 2º - Nos casos dos incisos I, II e VI, a perda do mandato será decidida pela Câmara dos Deputados ou pelo Senado Federal, por voto secreto e maioria absoluta, mediante provocação da respectiva Mesa ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa”), de forma a caber ao STF apenas comunicar, à Casa Legislativa respectiva, o advento de trânsito em julgado de sentença condenatória, para que o órgão proceda conforme os ditames constitucionais. Registrou que, regra geral, a suspensão dos direitos políticos, inclusive no caso de condenação criminal transitada em julgado, traria como consequência a perda do mandato eletivo que, a princípio, aplicar-se-ia a todos os exercentes desse mister. Enfatizou que a norma contida no art. 15, III, da CF seria auto-aplicável. Assinalou, contudo, que, em relação a senadores e deputados, a Constituição contemplaria exceção, no §2º do art. 55 da CF, no tocante à perda imediata do mandato na hipótese de condenação criminal transitada em julgado. Nessa situação diferenciada, a perda do mandato não seria automática, não obstante vedado aos parlamentares atingidos pela condenação criminal, enquanto durarem seus efeitos, disputarem novas eleições, ante a perda de condição de elegibilidade. No ponto, afirmou que essa ressalva estender-se-ia a deputados estaduais e distritais (CF, artigos 27, §1º e 32, §3º).

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AP 470/MG - 219

Ressurtiu que, quando o mandato resultasse do livre exercício da soberania popular — excluída a existência de fraude e inocorrente impugnação a sua eleição — não caberia ao Poder Judiciário decretar a perda automática de mandato. Nesse caso, a Constituição outorgaria à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal competência para decidir e não meramente declarar a perda de mandato de parlamentares. De outro turno, enfatizou que a regra da cassação imediata de mandatos incidiria, por inteiro, no que concerne a vereadores, prefeitos, governadores e Presidente da República. Tendo isso em conta, acompanhou o Relator apenas no que diz respeito a José Borba. Por fim, entendeu que os acusados desta ação penal, eleitos no pleito de 2010, não poderiam, em decorrência de eventual inelegibilidade oriunda da Lei da “Ficha Limpa”, perder, de forma automática, os mandatos à revelia das regras constitucionais pertinentes. Abordou, ademais, a questão relativa à impossibilidade física de o condenado exercer mandato parlamentar se a ele imposto regimes fechado e semiaberto para o cumprimento de pena corporal, o que não aconteceria na hipótese de fixação de regime aberto, a exemplo de qualquer reeducando que exercesse atividade laboral fora do estabelecimento carcerário em que cumprisse pena, durante o dia, a ele retornando para o repouso noturno. Após, o julgamento foi suspenso.

AP 470/MG, rel. Min. Joaquim Barbosa, 5 e 6.12.2012. (AP-470)

PRIMEIRA TURMA

ED e recolhimento prévio de multa

A 1ª Turma, por maioria, acolheu segundos embargos de declaração para afastar a exigência de multa e conhecer dos primeiros embargos, mas rejeitá-los. Reputou-se que não se poderia cogitar da obrigatoriedade de recolhimento da multa para se conhecer do recurso, uma vez que a sua interposição partiria do pressuposto de que a prestação jurisdicional não se aperfeiçoara e, portanto, não poderia ser executada quanto à multa. Vencido o Min. Luiz Fux, que os rejeitava.

AI 588831 ED-ED/RN, rel. Min. Marco Aurélio, 4.12.2012. (AI-588831)

TCU e decadência administrativa

O disposto no art. 54 da Lei 9.784/99 (“O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé”) não se aplica à aposentadoria, porque esta reclama atos sequenciais. Com base nessa orientação, a 1ª Turma denegou mandado de segurança impetrado contra julgado do TCU. Este, ao apreciar a legalidade, para fins de registro, de atos concessórios de aposentadoria, determinara a glosa dos proventos considerada a incorporação da Unidade de Referência de Preços - URP concernente ao mês de fevereiro/89, no total de 26,05%, bem assim a restituição dos valores pagos durante a pendência do julgamento de eventuais recursos. Alegava-se decadência administrativa, além de nulidade por ofensa aos princípios da coisa julgada, do contraditório, da ampla defesa, da segurança jurídica, da boa-fé, da razoabilidade, da moralidade e da separação dos Poderes. Arguia-se que se trataria de valor percebido há mais de 17 anos assegurado por título judicial. Por fim, assinalava-se a inobservância ao disposto na Súmula Vinculante 3 (“Nos processos perante o Tribunal de Contas da União asseguram-se o contraditório e a ampla defesa quando da decisão puder resultar anulação ou revogação de ato administrativo que beneficie o interessado, excetuada a apreciação da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma e pensão”). O Colegiado consignou que o contraditório requereria, a teor do disposto no art. 5º, LV, da CF, litígio ou acusação não alcançando os atos alusivos ao registro de aposentadoria. Ademais, reputou-se inexistir coisa julgada presente a situação de inativo.

MS 28604/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 4.12.2012. (MS-28604)

SEGUNDA TURMA

HC: novo título e ausência de prejudicialidade

A superveniência de sentença condenatória que mantém preso o réu sob os mesmos fundamentos expostos no decreto de prisão preventiva não é causa de prejudicialidade de habeas corpus. Com base nessa orientação, a 2ª Turma concedeu a ordem apenas para determinar que fosse apreciado o mérito do writ apresentado no STJ, como entendesse de direito. Na espécie, o relator daquela Corte julgara prejudicada a impetração e cassara liminar nela deferida, tendo em conta a expedição de título condenatório pelo juízo de piso.

HC 113457/SP, rel. Min. Cármen Lúcia, 4.12.2012. (HC-113457)