Informativo do STF 670 de 15/06/2012
Publicado por Supremo Tribunal Federal
PLENÁRIO
FGTS e contribuição social - 1
O Plenário, por maioria, julgou parcialmente procedente pedido formulado em ações diretas de inconstitucionalidade ajuizadas, pelo Partido Social Liberal - PSL e pela Confederação Nacional da Indústria - CNI, contra os artigos 1º; 2º; 3º; 4º, I e II; 6º, § 7º; 12; 13 e 14, caput, I e II, da Lei Complementar 110/2001. A norma adversada instituíra contribuição social, devida pelos empregadores em caso de despedida de empregado sem justa causa, à alíquota de 10% sobre o montante de todos os depósitos devidos, referentes ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS. Também criara contribuição social, a cargo dos empregadores, à alíquota de 0,5% sobre a remuneração devida, no mês anterior, a cada trabalhador. De início, afastou-se alegação, suscitada após a conclusão dos autos, de que as exações seriam indevidas, por terem cumprido suas finalidades, já que a União ressarcira integralmente todos os beneficiários do FGTS. Ressaltou-se que a perda da necessidade pública legitimadora do tributo não seria objeto da inquirição e, portanto, a Corte e os envolvidos no controle de constitucionalidade não teriam tido a oportunidade de exercer poder instrutório em sua plenitude. Descaberia, neste momento, reiniciar o controle de constitucionalidade nestes autos, com base na nova arguição. Em seguida, o Tribunal declarou o prejuízo das ações diretas de inconstitucionalidade, em relação ao art. 2º da LC 110/2001, porquanto a aludida contribuição, calculada à alíquota de 0,5% sobre remuneração devida no mês anterior a cada trabalhador, teria se extinguido por ter alcançado o prazo de vigência de sessenta meses, contado a partir da sua exigibilidade.
ADI 2556/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 13.6.2012. (ADI-2556) ADI 2568/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 13.6.2012. (ADI-2568)
FGTS e contribuição social - 2
Observou-se que a espécie tributária “contribuição” ocuparia lugar de destaque no sistema constitucional tributário e na formação de políticas públicas, além de caracterizar-se pela previsão de destinação específica do produto arrecadado com a tributação. As contribuições escapariam à força atrativa do pacto federativo, pois a União estaria desobrigada a partilhar o dinheiro recebido com os demais entes federados. Por outro lado, a especificação parcimoniosa do destino da arrecadação, antes da efetiva coleta, seria importante ferramenta técnica e de planejamento para garantir autonomia a setores da atividade pública. Relembrou-se que o uso compartilhado de base de cálculo própria de imposto pelas contribuições não se revelaria bitributação. Enfatizou-se que a tributação somente se legitimaria pela adesão popular e democrática, cujo expoente seria a regra da legalidade. Além disso, afirmou-se que a cobrança de contribuições somente se justificaria se a exação respeitasse os limites constitucionais e legais que a caracterizariam. Assim, a existência das contribuições com todas as suas vantagens e condicionantes deveria preservar sua destinação e finalidade. Frisou-se que a constitucionalidade das contribuições seria aferida pela necessidade pública atual do dispêndio vinculado e pela eficácia dos meios escolhidos para alcançar essa finalidade. Sublinhou-se que a jurisprudência do Supremo teria considerado constitucionais as referidas contribuições, que objetivariam custear os dispêndios da União, em decorrência de decisão do STF que entendera devido o reajuste do saldo do FGTS, desde que respeitado o prazo de anterioridade para início das respectivas exigibilidades.
ADI 2556/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 13.6.2012. (ADI-2556) ADI 2568/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 13.6.2012. (ADI-2568)
FGTS e contribuição social - 3
Consignou-se que as restrições previstas nos artigos 157, II, e 167, IV, da CF, seriam aplicáveis aos impostos e, no caso em exame, tratar-se-ia da espécie tributária contribuição, nitidamente caracterizada pela prévia escolha da destinação específica do produto arrecadado. Afastou-se a suposta ofensa ao art.194 e seguintes da CF, uma vez que o produto arrecadado não seria vinculado a qualquer dos programas, ou iniciativa de seguridade social. Não se vislumbrou vulneração ao art.10, I, do ADCT, em face de a exação, em análise, não se confundir com a contribuição devida ao FGTS, tendo em conta a diferente finalidade do produto arrecadado. O tributo não se destinaria à formação do próprio fundo, mas visaria custear uma obrigação da União. Repeliu-se, ainda, a assertiva de violação da capacidade contributiva (CF, art. 145, § 1º). O perfil da exação não se remeteria às características de ordem pessoal do contribuinte ou dos demais critérios da regra matriz, mas tomaria por hipótese de incidência a circunstância objetiva da demissão sem justa causa do trabalhador. Essa materialidade não constituiria ato ilícito por se inserir na esfera de livre gestão do empregador, ainda que desencorajada pelo sistema jurídico e, portanto, poderia ser tomada por hipótese de incidência tributária. Por fim, julgaram-se parcialmente procedentes os pleitos para declarar a inconstitucionalidade do art. 14, caput, I e II, da norma questionada, no que se refere à expressão “produzindo efeitos”. Vencido o Min. Marco Aurélio, que assentava a procedência do pedido. Reputava que teriam sido criadas contribuições com o objetivo não contemplado na Constituição, qual seja, reforçar o caixa e a responsabilidade do Tesouro Nacional. Asseverava que os valores arrecadados não colimariam beneficiar os empregados, porém cumprir o que o STF reconhecera como direito dos trabalhadores em geral: a reposição do poder aquisitivo dos saldos das contas do FGTS, a prescindir de normatividade.
ADI 2556/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 13.6.2012. (ADI-2556) ADI 2568/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 13.6.2012. (ADI-2568)
CNJ: PAD e punição de magistrado - 1
Em conclusão, o Plenário denegou mandado de segurança impetrado por juíza de direito contra decisão proferida pelo CNJ, que instaurara Processo Administrativo Disciplinar - PAD contra ela, a despeito de a Corte local, à qual vinculada, haver determinado a não instauração de procedimento. A impetrante sustentava nulidade do ato impugnado, visto que: a) o CNJ somente teria competência para rever decisões proferidas ao término de PAD; b) não haveria demonstração de que o tribunal de justiça teria agido em contrariedade às provas contidas em sindicância levada a termo pela corregedoria estadual; c) os fundamentos defensivos apresentados perante o CNJ não teriam sido apreciados; e d) a sessão em que proferido o ato fora presidida por integrante do STJ, em suposta afronta ao art. 103-B da CF. Preliminarmente, por maioria, decidiu-se não ser necessário que as sessões do CNJ fossem presididas por Ministro do STF. Destacou-se que, embora o art. 103-B, § 1º, da CF, prescrevesse que o “Conselho será presidido pelo Ministro do Supremo Tribunal Federal”, o inciso I do mesmo dispositivo reservaria apenas um assento do CNJ para membro do Supremo. Assim, a previsão constitucional de apenas um Ministro do STF, considerado o caráter ordinário e previsível de eventuais afastamentos temporários em qualquer órgão colegiado, infirmaria a interpretação de que, em toda e qualquer oportunidade, as sessões do CNJ devessem necessariamente ser presididas por Ministro desta Corte. Ademais, como o Vice-Presidente do Supremo, que em tese poderia substituir o Presidente em eventual ausência, teria outras atribuições, não seria razoável interpretar a Constituição de modo a condicionar a atuação do CNJ à criação de cronograma voltado a garantir que mais um Ministro da Corte ficasse de prontidão, em prejuízo de suas obrigações constitucionais principais. Afirmou-se que posição contrária levaria à paralisação do colegiado do CNJ. O Min. Luiz Fux consignou decisão da Corte na qual se deliberara não haver nulidade quando sessão do CNJ fosse presidida pelo Corregedor-Geral de Justiça, desde que a assentada tivesse sido realizada antes da vigência da EC 61/2009, ou seja, anteriormente a 12.11.2009, como no caso dos presentes autos. Vencidos os Ministros Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio, que acolhiam a preliminar. O Min. Marco Aurélio observava que a EC 61/2009 teria apenas explicitado o que já contido na ordem jurídica, ou seja, a substituição do Presidente do CNJ pelo Vice-Presidente do STF. O Min. Ricardo Lewandowski ressalvava que, por motivos de segurança jurídica, dever-se-ia preservar as decisões tomadas no passado.
MS 28102/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 14.6.2012. (MS-28102)
CNJ: PAD e punição de magistrado - 2
No mérito, reportou-se ao que discutido na sessão de 2.6.2011. Considerou-se não haver cisão ontológica ou compartimentalização entre o PAD e a respectiva sindicância precedente. Afirmou-se que o resultado da sindicância integraria a motivação do ato de instauração do PAD ou sinalizaria a inércia do órgão correcional. Portanto, a competência para controlar a validade da tramitação e do resultado do PAD também incluiria o controle de sua motivação, em outras palavras, da sindicância e de seu resultado. Ademais, se o CNJ somente pudesse examinar os processos disciplinares efetivamente instaurados, sua função seria reduzida à de órgão revisor de decisões desfavoráveis a magistrados, pois a decisão negativa de instauração de PAD pelos tribunais teria eficácia bloqueadora de qualquer iniciativa do CNJ. Reafirmou-se que o entendimento pela instauração de PAD no âmbito das corregedorias locais não seria pressuposto necessário, pelo CNJ, do exercício da competência para rever, de ofício ou mediante provocação, os processos disciplinares de juízes e membros de tribunais julgados há menos de um ano. Reputou-se inexistente a alegada violação à legalidade, consistente na ausência de autorização específica no RICNJ para determinar a instauração de processo disciplinar. Salientou-se que esse diploma deveria limitar-se a regulamentar a estrutura administrativa e o trâmite interno necessário ao exercício das atribuições outorgadas pela Constituição. Assim, o RICNJ não poderia aumentar a competência constitucional, nem reduzi-la. Declarou-se que o CNJ teria o poder-dever de exercer o controle externo da atividade administrativa dos tribunais, sem que se permitisse ao órgão dispor de seus encargos. Frisou-se decorrer dessa indisponibilidade e da regra da legalidade que o órgão não poderia ser impedido de rever pronunciamentos administrativos contrários à abertura de PAD. Além disso, inexistiria autodeterminação do órgão para imunizar decisões de rejeição de início de PAD. Do contrário, em regra, o CNJ atuaria precipuamente em processos nos quais houvesse decisão desfavorável ao magistrado. No tocante aos argumentos defensivos aduzidos perante o CNJ, sublinhou-se que o atendimento do pleito dependeria de ampla instrução probatória, incabível na via eleita. Acresceu-se que a decisão proferida pelo CNJ estaria fundamentada, ainda que com ela não concordasse a impetrante.
MS 28102/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 14.6.2012. (MS-28102)
CNJ: PAD e punição de magistrado - 3
Ato contínuo, o Plenário, por maioria, concedeu parcialmente mandado de segurança, impetrado pela mesma magistrada referente ao MS 28102/DF, para cassar decisão do CNJ, proferida no PAD tratado no caso anterior, que lhe impusera aposentadoria compulsória. Determinou-se que outra decisão fosse prolatada, afastada a reprimenda imposta e a possibilidade de vir a ser novamente implementada. Na espécie, imputara-se à juíza a prática de infrações aos deveres funcionais da magistratura, consistentes na manutenção de prisão em flagrante de menor, do sexo feminino, em carceragem ocupada por detentos do sexo masculino; bem como na utilização de documento ideologicamente falso com o fim de justificar a omissão perpetrada. Assinalou-se que o CNJ decidira pela punição da impetrante com base em três argumentos: a) ao examinar o auto de prisão em flagrante, a magistrada sabia, ou deveria saber, que o lugar de custódia da menor a colocaria em situação de risco. Entretanto, não tomara nenhuma providência acauteladora; b) ao receber o ofício da autoridade policial sobre a questão, ela deveria ter tentado solucionar a situação lesiva imediatamente; e c) ao ficar ciente da ampla comoção social decorrente de sua desídia, a juíza teria fraudado documentação com o objetivo de comprovar a tomada imediata de providências. Asseverou-se inexistir imunidade absoluta aos titulares do ofício jurisdicional. Os juízes, como agentes públicos, responderiam por violações a que dessem causa, na medida da culpa caracterizadora das respectivas condutas. Registrou-se que a impetrante interpretara mal as condições locais ao ignorar a possibilidade de a menor ter por destino a carceragem em que recolhida. Presumir-se-ia, também, que a precária situação das celas locais fosse foco de inúmeras violações de direitos, não apenas contra menores e mulheres, mas contra qualquer custodiado.
MS 28816/DF, rel. orig. Min. Joaquim Barbosa, red. p/ o acórdão Min. Marco Aurélio, 14.6.2012. (MS-28816)
CNJ: PAD e punição de magistrado - 4
Aludiu-se, entretanto, que o auto de prisão em flagrante não indicaria o local de custódia, informação que existiria de modo indireto na nota de comunicação à família do preso ou à pessoa por este indicada. Ademais, os outros documentos que instruiriam aquele auto não indicariam qualquer situação de risco para os prisioneiros. Apontou-se que o CNJ teria partido de presunção sem amparo no acervo instrutório inicial, referente à prisão em flagrante. Advertiu-se que, para sustentar a presunção de ciência do local de encarceramento e de suas condições por parte da impetrante, a decisão impugnada invocara sua experiência geral e uma inspeção local feita poucos dias antes das violações perpetradas contra a menor. Enfatizou-se que a magistrada argumentara que seu relatório — sobre as condições da carceragem — e manifestação do conselho tutelar atestariam a precariedade da situação e a possibilidade de segregação rudimentar de alguns presos em corredor adaptado, portanto ambiente diverso das celas, o que tornaria o local apto ao isolamento de pessoas de sexos diferentes. Articulou-se que, por maior que fosse a experiência geral e a acuidade técnica da juíza, isso seria insuficiente para afastar a possibilidade de erro. Comentou-se que caberia, em princípio, ao juiz responsável certificar a situação e notificar as autoridades competentes para as providências cabíveis. Porém, o magistrado não teria competência para substituir-se ao Executivo ou ao Legislativo e determinar, de ofício, a construção de novos estabelecimentos penais ou a realização de obras e serviços destinados a adequar os existentes à LEP. Assim, desprovido de ferramentas executivas, o juiz operaria a partir de quadros de escassez de recursos e abundância de necessidades. Portanto, o CNJ não poderia ter presumido ser possível à impetrante tomar atitudes próprias do Executivo. Sua parcela de culpa na proteção que o Estado deveria à integridade da menor, em relação ao juízo primeiro feito no momento da homologação do flagrante, teria sido exacerbada.
MS 28816/DF, rel. orig. Min. Joaquim Barbosa, red. p/ o acórdão Min. Marco Aurélio, 14.6.2012. (MS-28816)
CNJ: PAD e punição de magistrado - 5
Deduziu-se, ainda em relação ao ato confirmatório da prisão em flagrante, que o CNJ teria excedido sua competência administrativa, ao realizar juízo de valor e de validade sobre ato jurisdicional. Discorreu-se que, ao homologar o flagrante, a autoridade judicial poderia examinar questões jurídicas incidentais relativas à custódia do preso, exame este que não seria extensão da atividade administrativa de polícia do Estado, pois o juiz não seria órgão de controle interno da administração. A decisão judicial a estabelecer local específico para acautelamento de preso provisório somente poderia ser revista pelo órgão jurisdicional competente. Desse modo, ao aplicar penalidade à impetrante com base em definição equivocada quanto ao local de encarceramento da menor, o CNJ teria invadido campo de competência reservado com exclusividade às autoridades judiciárias. Ressurtiu-se que a ofensa aos direitos da menor decorrera de condutas sucessivas de todos os agentes estatais envolvidos. A circunstância de os policiais terem o dever e a possibilidade real de impedir as sevícias seria suficiente para afastar a responsabilidade das demais autoridades envolvidas no caso.
MS 28816/DF, rel. orig. Min. Joaquim Barbosa, red. p/ o acórdão Min. Marco Aurélio, 14.6.2012. (MS-28816)
CNJ: PAD e punição de magistrado - 6
Estatuiu-se que, no tocante à imputação de falsidade ideológica, o CNJ não poderia aplicar, de igual modo, a pena de aposentadoria compulsória, que seria desproporcional, mas deveria impor outra reprimenda, de menor gravidade. Assim, impenderia inaugurar novo PAD, expungida a imputação alusiva à custódia em prisão masculina. Esclareceu-se que a aposentadoria estaria definitivamente afastada porque ela só seria compatível com o fato cujo fundamento fora excluído. Vencidos os Ministros Joaquim Barbosa, relator, Cármen Lúcia e Dias Toffoli. O relator, acompanhado pela Min. Cármen Lúcia, cassava apenas o primeiro fundamento da decisão do CNJ que determinara a aposentadoria compulsória, relativo à custódia em prisão masculina. Não alterava, entretanto, o segundo, alusivo à falsidade ideológica, por impossibilidade de fazê-lo em mandado de segurança. Assim, a questão deveria ser remetida novamente ao CNJ, para recalibrar a pena. O Min. Dias Toffoli, por sua vez, concedia totalmente a ordem, para cassar a reprimenda imposta à magistrada. No tocante ao ofício subscrito com data incorreta, mencionava que o fato seria irrelevante, pois impenderia saber apenas a data em que produzidos seus efeitos. A Min. Rosa Weber, em razão de não haver participado da sessão em que realizada sustentação oral (2.6.2011), por não integrar a Corte à época, não participou do julgamento (RISTF, art. 134, § 2º).
MS 28816/DF, rel. orig. Min. Joaquim Barbosa, red. p/ o acórdão Min. Marco Aurélio, 14.6.2012. (MS-28816)
Lei 8.072/90 e regime inicial de cumprimento de pena - 1
O Plenário julgou prejudicado habeas corpus, afetado pela 1ª Turma, em que discutida a constitucionalidade do § 1º do art. 2º da Lei 8.072/90. Na espécie, os pacientes foram condenados, pela prática do crime de tráfico de entorpecentes privilegiado, a penas inferiores a oito anos de reclusão. Alegava a defesa que, de acordo com a regra geral prevista no Código Penal, caberia a imposição de regime inicial semiaberto e que, portanto, a norma impugnada atentaria contra o princípio da individualização da pena. Ocorre que os pacientes estariam, atualmente, em livramento condicional, daí a perda superveniente de objeto do presente writ.
HC 101284/MG, rel. Min. Dias Toffoli, 14.6.2012. (HC-101284)
Lei 8.072/90 e regime inicial de cumprimento de pena - 2
Em seguida, o Plenário iniciou julgamento de habeas corpus em que também se debate a constitucionalidade do § 1º do art. 2º da Lei 8.072/90. No caso, o crime de tráfico perpetrado pelo paciente, que resultara em reprimenda inferior a oito anos de reclusão, ocorrera na vigência da Lei 11.464/2007, que instituíra a obrigatoriedade de imposição de regime de pena inicialmente fechado a crimes hediondos e assemelhados. O Min. Dias Toffoli, acompanhado pelos Ministros Rosa Weber, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski e Cezar Peluso, concedeu a ordem, para alterar o regime inicial de pena para o semiaberto. Incidentalmente, declarou a inconstitucionalidade do § 1º do art. 2º da Lei 8.072/90, na parte em que contida a obrigatoriedade de fixação de regime fechado para início de cumprimento de reprimenda aos condenados pela prática de crimes hediondos ou equiparados. Inicialmente, o relator destacou que o juízo de piso, em análise das circunstâncias judiciais do art. 59 do CP, estabelecera a pena-base em 1/6 acima do mínimo legal, no total de seis anos de reclusão e 600 dias-multa. Ademais, fixara regime inicial fechado exclusivamente com fundamento na lei em vigor. Observou que não teriam sido referidos requisitos subjetivos desfavoráveis ao paciente, considerado tecnicamente primário. Assim, entendeu desnecessário o revolvimento fático-probatório para concluir-se pela possibilidade da pretendida fixação do regime semiaberto para início de cumprimento de pena.
HC 111840/ES, rel. Min. Dias Toffoli, 14.6.2012. (HC-111840)
Lei 8.072/90 e regime inicial de cumprimento de pena - 3
Ressaltou que a Corte, ao analisar o HC 97256/RS (DJe de 16.12.2010), declarara incidenter tantum a inconstitucionalidade dos artigos 33, § 4º, e 44, caput, da Lei 11.343/2006, na parte em que vedada a substituição de pena privativa de liberdade por restritiva de direitos em condenação pelo delito de tráfico. Ponderou que a negativa de substituição, naquele caso, calcara-se exclusivamente na proibição legal contida no referido art. 44, sem qualquer menção às condições pessoais do paciente, o que não seria possível. Afirmou que o legislador facultaria a possibilidade de substituição com base em critérios objetivos e subjetivos, e não em função do tipo penal. Ressaltou que se a Constituição quisesse permitir à lei essa proibição com base no crime em abstrato, teria incluído a restrição no tópico inscrito no art. 5º, XLIII, da CF. Desse modo, a convolação de pena privativa de liberdade por restritiva de direitos deveria sempre ser analisada independentemente da natureza da infração, mas em razão de critérios aferidos concretamente, por se tratar de direito subjetivo garantido constitucionalmente ao indivíduo. Sublinhou que, à luz do precedente citado, não se poderia, em idêntica hipótese de tráfico, com pena privativa de liberdade superior a quatro anos — a impedir a possibilidade de substituição por restritiva de direitos —, sustentar a cogência absoluta de que o cumprimento da reprimenda se desse em regime inicialmente fechado, como preconizado pelo § 1º do art. 2º da Lei 8.072/90. Consignou que a Constituição contemplaria as restrições a serem impostas aos incursos em dispositivos da Lei 8.072/90, e dentre elas não se encontraria a obrigatoriedade de imposição de regime extremo para início de cumprimento de pena. Salientou que o art. 5º, XLIII, da CF, afastaria somente a fiança, a graça e a anistia, para, no inciso XLVI, assegurar, de forma abrangente, a individualização da pena.
HC 111840/ES, rel. Min. Dias Toffoli, 14.6.2012. (HC-111840)
Lei 8.072/90 e regime inicial de cumprimento de pena - 4
Assinalou que, a partir do julgamento do HC 82959/SP (DJe de 1º.9.2006), o STF passara a admitir a possibilidade de progressão de regime a condenados pela prática de crimes hediondos, tendo em conta a declaração de inconstitucionalidade do art. 2º, § 1º, da Lei 8.072/90. Frisou que essa possibilidade viera a ser acolhida, posteriormente, pela Lei 11.464/2007, que modificara a Lei 8.072/90, para permitir a progressão. Contudo, estipulara que a pena exarada pela prática de qualquer dos crimes nela mencionados seria, necessariamente, cumprida inicialmente em regime fechado. Concluiu que, superado o dispositivo adversado, deveria ser admitido o início de cumprimento de reprimenda em regime diverso do fechado, a condenados que preenchessem os requisitos previstos no art. 33, § 2º, b; e § 3º, do CP.
HC 111840/ES, rel. Min. Dias Toffoli, 14.6.2012. (HC-111840)
Lei 8.072/90 e regime inicial de cumprimento de pena - 5
Os Ministros Luiz Fux, Joaquim Barbosa e Marco Aurélio, em divergência, indeferiram a ordem. O Min. Luiz Fux registrou que a restrição, quanto ao regime inicial de cumprimento de pena, em relação a crimes hediondos, seria opção legislativa. Aludiu que o Judiciário, nesse campo, deveria ter postura minimalista e respeitar a orientação do legislador ordinário, visto que, no Estado Democrático de Direito, a supremacia seria do parlamento. A primazia judicial, por sua vez, só se instauraria em vácuo legislativo, o que não seria o caso. Apontou que o constituinte originário preocupara-se com os delitos perturbadores da higidez estatal. Por esse motivo, a Constituição estabelecera que a lei consideraria crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática de tráfico ilícito de entorpecentes. Advertiu acerca da gravidade do tema, razão pela qual o legislador constitucional elegera o tráfico de drogas como delito a merecer especial proteção de lei. Articulou que, se a Constituição não permitiria a liberdade em si, na forma de graça, anistia ou fiança, a lei ordinária poderia atuar na escala de valoração da pena, que também abarcaria seu regime de execução. Assim, a lei discutida não seria inconstitucional, apenas atenderia a mandamento da Constituição no sentido de tratar de modo especial o crime de tráfico. Deduziu que a proibição legal justificar-se-ia em razão da presunção de periculosidade do crime e de seu agente, a merecer maior rigor. Enfatizou que, do contrário, haveria estímulo à conduta.
HC 111840/ES, rel. Min. Dias Toffoli, 14.6.2012. (HC-111840)
Lei 8.072/90 e regime inicial de cumprimento de pena - 6
Discorreu, por outro lado, que a execução penal em regime fechado faria parte do contexto da repressão penal, eleita pelo Estado como eficiente para combater delito que preocupara especialmente o constituinte originário. Ademais, entendimento diverso levaria à conclusão de que o art. 33, § 2º, a, do CP, a exigir o cumprimento de pena superior a oito anos em regime inicialmente fechado, seria também inconstitucional, bem como todas as penas mínimas. Ressurtiu que o tratamento legal dado a essa espécie de crime não objetivaria que o cidadão cumprisse a pena em regime fechado, mas teria por escopo a inibição da prática delitiva. Assim, as penas graves e o regime inicial igualmente severo fariam parte dessa estratégia de prevenção. O Min. Marco Aurélio acrescentou que assertiva no sentido de que o preceito em voga seria inconstitucional levaria, de igual modo, à conclusão de que a prisão provisória por trinta dias, na hipótese de crimes hediondos, seria incompatível com a Constituição. Da mesma maneira, seria necessário inferir-se quanto aos requisitos para progressão de regime no que concerne aos crimes da Lei 8.072/90. Estatuiu que o princípio da individualização da pena deveria ser contextualizado, e que aquele que cometesse crime de menor gradação não poderia ter o mesmo regime inicial de cumprimento de pena relativo a quem perpetrasse delito de maior gravidade, como os crimes hediondos. Após, deliberou-se suspender o julgamento para aguardar o voto dos demais Ministros.
HC 111840/ES, rel. Min. Dias Toffoli, 14.6.2012. (HC-111840)
REPERCUSSÃO GERAL
Contratação sem concurso público e direito ao FGTS - 3
O art. 19-A da Lei 8.036/90, acrescido pelo art. 9º da Medida Provisória 2.164-41/2001, que assegura direito ao FGTS à pessoa que tenha sido contratada sem concurso público não afronta a Constituição. Esse a orientação do Plenário que, em conclusão de julgamento, desproveu recurso extraordinário no qual se discutia a constitucionalidade, ou não, do dispositivo — v. Informativo 609. Salientou-se tratar-se, na espécie, de efeitos residuais de fato jurídico que existira, não obstante reconhecida sua nulidade com fundamento no próprio § 2º do art. 37 da CF. Mencionou-se que o Tribunal tem levado em consideração essa necessidade de se garantir a fatos nulos, mas existentes juridicamente, os seus efeitos. Consignou-se a impossibilidade de se aplicar, no caso, a teoria civilista das nulidades de modo a retroagir todos os efeitos desconstitutivos dessa relação. Ressaltou-se, ainda, que a manutenção desse preceito legal como norma compatível com a Constituição consistiria, inclusive, em desestímulo aos Estados que quisessem burlar concurso público. Aludiu-se ao fato de que, se houvesse irregularidade na contratação de servidor sem concurso público, o responsável, comprovado dolo ou culpa, responderia regressivamente nos termos do art. 37 da CF. Portanto, inexistiria prejuízo para os cofres públicos.
RE 596478/RR, rel. orig. Min. Ellen Gracie, red. p/ o acórdão Min. Dias Toffoli, 13.6.2012. (RE-596478)
Contratação sem concurso público e direito ao FGTS - 4
Vencidos os Ministros Ellen Gracie, relatora, Cármen Lúcia, Joaquim Barbosa, Luiz Fux e Marco Aurélio, que davam provimento ao recurso para assentar a inconstitucionalidade do artigo adversado. Sublinhavam que a nulidade da investidura impediria o surgimento de direitos trabalhistas — resguardado, como único efeito jurídico válido resultante do pacto celebrado, o direito à percepção do salário referente ao período efetivamente trabalhado, para evitar o enriquecimento sem causa do Estado —, não tendo o empregado, por conseguinte, jus aos depósitos em conta vinculada a título de FGTS. O Min. Joaquim Barbosa afirmava que a exigência de prévia aprovação em concurso público para provimento de cargo seria incompatível com o objetivo essencial para a qual o FGTS fora criado. O Min. Marco Aurélio asseverava vício formal da aludida medida provisória por não vislumbrar os pressupostos de urgência e relevância.
RE 596478/RR, rel. orig. Min. Ellen Gracie, red. p/ o acórdão Min. Dias Toffoli, 13.6.2012. (RE-596478)
PRIMEIRA TURMA
Subsídio de prefeito e vice-prefeito e critério de fixação
A 1ª Turma negou provimento a recurso extraordinário do Município de Belo Horizonte, em que se discutia critério de estabelecimento de remuneração de prefeito e de vice-prefeito mediante a Resolução 2021/96 da Câmara daquela municipalidade. Na origem, o parquet ajuizara ação civil pública sob argumento de que o subsídio deveria ser equivalente ao valor fixado para os deputados, e não ao que realmente percebido, pois estaria sujeito à variação mês a mês, sob pena de se conceder reajuste salarial mensal, em afronta aos princípios da legalidade e da moralidade. O pedido fora julgado procedente, tendo sido confirmada a declaração de inconstitucionalidade pelo tribunal de justiça. A municipalidade alegava contrariedade aos artigos 29, V, e 37 da CF. Consignou-se que o acórdão do tribunal estadual não conteria abordagem da problemática alusiva à possível confusão entre ação civil pública e ação direta de inconstitucionalidade. Nesse tocante, enfatizou-se que o recurso padeceria da ausência do indispensável prequestionamento. No mais, considerou-se que o extraordinário não mereceria provimento. Esclareceu-se que a Constituição mostrar-se-ia expressa ao revelar que subsídio de prefeito e vice-prefeito, bem como de secretários municipais, seriam determinados por lei de iniciativa da respectiva câmara (CF, art. 29, V, na redação existente à época), com disciplina idêntica no texto em vigor. Observou-se que, no caso, ela adotaria critério flexível, remetendo à remuneração dos integrantes de assembleia legislativa. Salientou-se que fora implementada vinculação conflitante com a Carta de 1988, haja vista que se abriria possibilidade de haver variação mês a mês, consoante o que percebido no todo — e a isso remeteria o vocábulo remuneração — por este ou aquele deputado estadual.
RE 434278/MG, rel. Min. Marco Aurélio, 12.6.2012. (RE-434278)
Latrocínio e nexo causal - 1
A 1ª Turma, por maioria, deferiu habeas corpus a fim de invalidar decisão que condenara o paciente pelo crime de latrocínio (CP, art. 157, §3º) e determinar fosse prolatada nova sentença relacionada à imputação do crime de roubo tentado. Na espécie, o ora impetrante fora denunciado pelos seguintes delitos praticados em conjunto com outro agente não identificado: a) roubo qualificado consumado (CP, art. 157, §2º, I e II), em padaria; b) roubo qualificado tentado (CP, art. 157, §2º, I e II, c/c art. 14, II), em farmácia; e c) receptação (CP, art. 180), por conta de utilização de veículo subtraído. A vítima do primeiro delito acionara a polícia militar, que prendera em flagrante o paciente no interior da farmácia, enquanto este praticava o segundo crime. O seu cúmplice aguardava do lado de fora do estabelecimento para garantir o sucesso da subtração. Quando vários policiais chegaram ao local, detiveram o paciente, ao passo que o coautor empreendera fuga e matara policial que seguira em seu encalço. O juízo singular, ao aplicar o art. 383 do CPP, condenara o paciente, respectivamente, pelos crimes de roubo consumado (padaria); latrocínio, em decorrência da morte do policial (farmácia); e receptação, porquanto entendera que a conduta estaria narrada na inicial acusatória, tendo apenas se dado classificação inadequada do tipo criminal. Na fase recursal, as condenações foram mantidas, mas com diminuição das penas.
HC 109151/RJ, rel. Min. Rosa Weber, 12.6.2012. (HC-109151)
Latrocínio e nexo causal - 2
Inicialmente, a Min. Rosa Weber, relatora, rememorou jurisprudência da Corte no sentido de que o coautor que participa de roubo armado responderia pelo latrocínio, ainda que o disparo tivesse sido efetuado só pelo comparsa. Entretanto, reputou que não se poderia imputar o resultado morte ao coautor quando houvesse ruptura do nexo de causalidade entre os agentes. O Min. Luiz Fux acrescentou que seria necessário o nexo biopsicológico no quesito relativo à culpabilidade. Explicou que a coautoria resultaria da ciência de ambos a respeito do que iriam fazer e que um deles já estaria preso enquanto o outro fugia. O Min. Dias Toffoli, ante as peculiaridades do caso, acompanhou a relatora. Vencido o Min. Marco Aurélio, que indeferia o writ ao fundamento de existir elemento a ligar o resultado morte ao roubo. Considerava ser esta a exigência do Código Penal ao retratar o latrocínio. Versava pouco importar que o segundo agente tivesse atirado tentando escapar à sua prisão, o que denotaria elo entre o roubo e o resultado morte. Precedente citado:
HC 74861/SP (DJU de 25.3.97). HC 109151/RJ, rel. Min. Rosa Weber, 12.6.2012. (HC-109151)
Organização criminosa e enquadramento legal - 3
Em conclusão, a 1ª Turma deferiu habeas corpus para trancar ação penal instaurada em desfavor dos pacientes. Tratava-se, no caso, de writ impetrado contra acórdão do STJ que denegara idêntica medida, por considerar que a denúncia apresentada contra eles descreveria a existência de organização criminosa que se valeria de estrutura de entidade religiosa e de empresas vinculadas para arrecadar vultosos valores, ludibriando fiéis mediante fraudes, desviando numerários oferecidos para finalidades ligadas à Igreja, da qual aqueles seriam dirigentes, em proveito próprio e de terceiros. A impetração sustentava a atipicidade da conduta imputada aos pacientes — lavagem de dinheiro e ocultação de bens, por meio de organização criminosa (Lei 9.613/98, art. 1º, VII) — ao argumento de que a legislação brasileira não contemplaria o tipo “organização criminosa” — v. Informativo 567. Inicialmente, ressaltou-se que, sob o ângulo da organização criminosa, a inicial acusatória remeteria ao fato de o Brasil, mediante o Decreto 5.015/2004, haver ratificado a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional — Convenção de Palermo [“Artigo 2 Para efeitos da presente Convenção, entende-se por: a) ‘Grupo criminoso organizado’ - grupo estruturado de três ou mais pessoas, existente há algum tempo e atuando concertadamente com o propósito de cometer uma ou mais infrações graves ou enunciadas na presente Convenção, com a intenção de obter, direta ou indiretamente, um benefício econômico ou outro benefício material”].
HC 96007/SP, rel. Min. Marco Aurélio, 12.6.2012. (HC-96007)
Organização criminosa e enquadramento legal - 4
Em seguida, aduziu-se que o crime previsto na Lei 9.613/98 dependeria do enquadramento das condutas especificadas no art. 1º em um dos seus incisos e que, nos autos, a denúncia aludiria a delito cometido por organização criminosa (VII). Mencionou-se que o parquet, a partir da perspectiva de haver a definição desse crime mediante o acatamento à citada Convenção das Nações Unidas, afirmara estar compreendida a espécie na autorização normativa. Tendo isso em conta, entendeu-se que a assertiva mostrar-se-ia discrepante da premissa de não existir crime sem lei anterior que o definisse, nem pena sem prévia cominação legal (CF, art. 5º, XXXIX). Asseverou-se que, ademais, a melhor doutrina defenderia que a ordem jurídica brasileira ainda não contemplaria previsão normativa suficiente a concluir-se pela existência do crime de organização criminosa. Realçou-se que, no rol taxativo do art. 1º da Lei 9.613/98, não constaria sequer menção ao delito de quadrilha, muito menos ao de estelionato — também narrados na exordial. Assim, arrematou-se que se estaria potencializando a referida Convenção para se pretender a persecução penal no tocante à lavagem ou ocultação de bens sem se ter o delito antecedente passível de vir a ser empolgado para tanto, o qual necessitaria da edição de lei em sentido formal e material. Estendeu-se, por fim, a ordem aos corréus.
HC 96007/SP, rel. Min. Marco Aurélio, 12.6.2012. (HC-96007)
Princípio da insignificância e furto - 1
A 1ª Turma indeferiu, em julgamento conjunto, habeas corpus nos quais se postulava trancamento de ação penal em virtude de alegada atipicidade material da conduta. Ademais, cassou-se a liminar anteriormente deferida em um deles (HC 110932/RS). Tratava-se, no HC 109183/RS, de condenado por furtar, com rompimento de obstáculo, bens avaliados em R$ 45,00, equivalente a 30% do salário mínimo vigente à época. No HC 110932/RS, de acusado por, supostamente, subtrair, mediante concurso de pessoas, bicicleta estimada em R$ 128,00, correspondente a 50% do valor da cesta básica da capital gaúcha em outubro de 2008. Mencionou-se que o Código Penal, no art. 155, § 2º, ao se referir ao pequeno valor da coisa furtada, disciplinaria critério de fixação da pena — e não de exclusão da tipicidade —, quando se tratasse de furto simples. Consignou-se que o princípio da insignificância não haveria de ter como parâmetro tão só o valor da res furtiva, devendo ser analisadas as circunstâncias do fato e o reflexo da conduta do agente no âmbito da sociedade, para decidir sobre seu efetivo enquadramento na hipótese de crime de bagatela. Discorreu-se que o legislador ordinário, ao qualificar a conduta incriminada, teria apontado o grau de afetação social do crime, de sorte que a relação existente entre o texto e o contexto — círculo hermenêutico — não poderia conduzir o intérprete à inserção de norma não abrangida pelos signos do texto legal. Assinalou-se que, consectariamente, as condutas imputadas aos autores não poderiam ser consideradas como inexpressivas ou de menor afetação social, para fins penais, adotando-se tese de suas atipicidades em razão do valor dos bens subtraídos.
HC 109183/RS, rel. Min. Luiz Fux, 12.6.2012. (HC-109183) HC 110932/RS, rel. Min. Luiz Fux, 12.6.2012. (HC-110932)
Princípio da insignificância e furto - 2
O Min. Luiz Fux, relator, ponderou que não se poderia entender atípica figura penal que o Código assentasse típica, porquanto se atuaria como legislador positivo. Aduziu que, por menor, ou maior, que fosse o direito da parte, seria sempre importante para aquela pessoa que perdera o bem. Aludiu à solução com hermenêutica legal. O Min. Marco Aurélio complementou que a atuação judicante seria vinculada ao direito posto. Enfatizou haver balizamento em termos de reprimenda no próprio tipo penal. Admoestou que o furto privilegiado dependeria da primariedade do agente e, na insignificância, esta poderia ser colocada em segundo plano. O Min. Dias Toffoli subscreveu a conclusão do julgamento, tendo em conta as circunstâncias específicas de cada caso. Ante as particularidades das situações em jogo, a Min. Rosa Weber, acompanhou o relator, porém sem adotar a fundamentação deste. Vislumbrava que o Direito Penal não poderia — haja vista os princípios da interferência mínima do Estado e da fragmentariedade — atuar em certas hipóteses.
HC 109183/RS, rel. Min. Luiz Fux, 12.6.2012. (HC-109183) HC 110932/RS, rel. Min. Luiz Fux, 12.6.2012. (HC-110932)
Prisão cautelar e livramento condicional
A 1ª Turma denegou habeas corpus em que se pretendia fosse revogada prisão ordenada por juízo da execução, bem assim determinada análise de pedido de livramento condicional somente com base em condenação definitiva. Na espécie, o paciente fora sentenciado em duas ações penais. A primeira decisão transitara em julgado anteriormente à segunda condenação, por delito distinto, ainda pendente de exame de recurso da defesa. Esclareceu-se que, na época desta última, o paciente estaria em liberdade e o juiz teria assentado a necessidade de prisão cautelar. Dessumiu-se não se tratar de revogação de livramento condicional, mas de mera consequência decorrente de condenação posterior com vedação a recurso em liberdade. Acrescentou-se que, diante deste novo título prisional, até que se decidisse definitivamente sobre ele, o balizamento a que estaria jungido o juízo da execução seria aquele resultante do somatório da condenação definitiva, ostentada pelo paciente, e daqueloutra pena provisoriamente estabelecida.
HC 109618/RJ, rel. Min. Dias Toffoli, 12.6.2012. (HC-109618)
Princípio da insignificância e militar da reserva
A 1ª Turma denegou habeas corpus em que pleiteada a aplicação do princípio da insignificância em favor de policial militar da reserva acusado de utilizar documento falso — passe livre conferido àqueles da ativa — para obter passagem de ônibus intermunicipal sem efetuar pagamento do preço. Explicitou-se que, embora o valor do bilhete fosse apenas de R$ 48,00, seria inaplicável o referido postulado. Asseverou-se que a conduta revestir-se-ia de elevada reprovabilidade, porquanto envolveria policial militar.
HC 108884/RS, rel. Min. Rosa Weber, 12.6.2012. (HC-108884)
Devido processo legal e negativa de prestação jurisdicional - 3
Em conclusão, a 1ª Turma, preliminarmente, indeferiu pedido formulado pela recorrente de renovação de julgamento do processo, com republicação de pauta e nova oportunidade para sustentação oral. Na sequência, por maioria, negou provimento a recurso extraordinário, em que alegada negativa de prestação jurisdicional e ofensa aos princípios do devido processo legal e da ampla defesa. Na espécie, a Presidência do STJ desprovera agravo de instrumento em que se pretendia a subida de recurso especial inadmitido na origem, ao consignar que a empresa agravante não infirmara os fundamentos decisórios nem demonstrara, no recurso especial, ofensa a determinados dispositivos do CPC, bem como que o tribunal de origem não extrapolara, em juízo primeiro de admissibilidade, seu limite de cognição. Seguiram-se embargos de declaração, rejeitados, ao fundamento de ausência de seus pressupostos.
RE 417819/DF, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o acórdão Min. Ricardo Lewandowski, 12.6.2012. (RE-417819)
Devido processo legal e negativa de prestação jurisdicional - 4
Contra esse acórdão, a empresa apresentara o presente recurso extraordinário, no qual indicada violação aos artigos 5º, LIV e LV, e 105, III, ambos da CF. Sustentava que o STJ não examinara fundamento autônomo do recurso especial, relativamente à recusa do tribunal de justiça em analisar a matéria da confissão de dívida extrajudicial e que o mencionado recurso atenderia ao que disposto no Enunciado 211da Súmula daquela Corte (“Inadmissível recurso especial quanto à questão que, a despeito da oposição de embargos declaratórios, não foi apreciada pelo Tribunal”), uma vez que opusera embargos declaratórios para prequestionar transgressão aos artigos 348 e 353 do CPC e, alternativamente, ao art. 535 do mesmo diploma legal. Aduzia, por fim, que o tema constitucional poderia surgir no julgamento do recurso especial — v. Informativo 494.
RE 417819/DF, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o acórdão Min. Ricardo Lewandowski, 12.6.2012. (RE-417819)
Devido processo legal e negativa de prestação jurisdicional - 5
Prevaleceu o voto do Min. Ricardo Lewandowski, que, em assentada anterior, desprovera o extraordinário, ao entender que a discussão envolveria conteúdo infraconstitucional, no que fora acompanhado pelo Min. Ayres Britto. Nesta sessão, o Min. Dias Toffoli acresceu que a questão de fundo debatida nos autos seria a validade da confissão extrajudicial como título executivo, pelo que a ora recorrente teria ingressado originariamente com ação executiva. Anotou que ela insistiria na falta de apreciação de ofensa aos artigos 348 e 353 do CPC, de forma que seria inequívoca a necessidade de reapreciação de matéria fática. Assim, não teriam ocorrido as violações às normas constitucionais indicadas no recurso extraordinário. Sobrelevou, ainda, que esta Corte já reconhecera a inexistência de repercussão geral do tema alusivo ao cabimento de recursos da competência de outros tribunais. Além disso, a problemática também se restringiria ao âmbito infraconstitucional (RE 598365 RG/MG, DJe de 26.3.2010).
RE 417819/DF, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o acórdão Min. Ricardo Lewandowski, 12.6.2012. (RE-417819)
Devido processo legal e negativa de prestação jurisdicional - 6
Vencidos os Ministros Marco Aurélio e Cármen Lúcia, que davam provimento ao recurso extraordinário. Esta, com fundamento no art. 5º, XXXV, da CF (“a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”). Aquele, para que o STJ, afastado o óbice à sequência do especial, examinasse-o como entendesse de direito. Ao ressaltar que o Supremo encontrar-se-ia no ápice da organização judiciária brasileira e que o devido processo legal seria garantia constitucional, considerava não ter cabimento proclamar-se a irrecorribilidade das decisões do STJ que resultassem na inadmissibilidade de recurso especial, cujos pressupostos de recorribilidade estariam previstos na Constituição. Asseverava que a definição sobre até que ponto o acórdão proferido pela mencionada Corte implicaria violência à Constituição deveria ser analisada caso a caso. Assim, não se teria como afirmar que o exame dos requisitos de admissibilidade do recurso especial seria providência privativa do STJ, como ocorrera na hipótese. Entendia que a assertiva segundo a qual não teria a empresa veiculado a afronta aos artigos 348 e 353 do CPC mostrar-se-ia discrepante das balizas constitucionais, não apenas do devido processo legal, como também das definidoras do cabimento do especial, haja vista que a questão da confissão fora posta tanto no tribunal de justiça quanto no próprio STJ.
RE 417819/DF, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o acórdão Min. Ricardo Lewandowski, 12.6.2012. (RE-417819)
Entidade de previdência privada e imunidade tributária
A 1ª Turma, por maioria, proveu agravo regimental em recurso extraordinário para restabelecer posicionamento de que a agravante, entidade de previdência privada, gozaria de imunidade tributária garantida pela Constituição. Na espécie, consta do acórdão recorrido, objeto do extraordinário, que “De início, deve-se examinar se a remuneração dos serviços prestados descaracteriza a impetrante como instituição de assistência social. (...) Observe-se que a cobrança dos serviços prestados pelas entidades em tela não as descaracteriza como assistenciais, pois a gratuidade não constitui requisito previsto tanto pela Constituição Federal como por lei complementar”. Na monocrática ora adversada, afastara-se a imunidade, por entender afirmado no acórdão que a mencionada sociedade prestaria serviços a seus associados mediante pagamento de contribuição. Prevaleceu o voto do Min. Marco Aurélio. Inferiu inexistir assertiva na decisão do Tribunal a quo àquele respeito. Ato contínuo, consignou haver reiterados pronunciamentos do Supremo no sentido de que a entidade agravante seria detentora de imunidade tributária. Complementou que não se poderia ter descompasso em determinados processos, reconhecendo-se essa imunidade, porque não haveria contribuição dos beneficiários para a manutenção do próprio benefício, e, em outros, ter-se decisão diversa. Ante o contexto, entendeu que a ela conferir-se-ia imunidade tributária, consoante o Verbete 730 da Súmula do STF (“A imunidade tributária conferida a instituições de assistência social sem fins lucrativos pelo art. 150, VI, ´c’, da Constituição, somente alcança as entidades fechadas de previdência social privada se não houver contribuição dos beneficiários”). Vencido o Min. Dias Toffoli, relator, que desprovia o agravo.
RE 163164 AgR/SP, rel. orig. Min. Dias Toffoli, red. p/ o acórdão Min. Marco Aurélio, 12.6.2012. (RE-163164)
SEGUNDA TURMA
Falsificação documental e incompetência da justiça militar
A justiça castrense é incompetente para processar e julgar militar reformado acusado pela suposta prática dos crimes de falsificação e uso de documentos falsos em face da Caixa Econômica Federal. Com base nessa orientação, a 2ª Turma concedeu habeas corpus para determinar a extinção de procedimento penal instaurado contra o paciente perante a justiça militar. Asseverou-se que o delito praticado contra aquela instituição financeira não ofenderia as organizações militares e, portanto, competente a justiça federal. Determinou-se a invalidação de todos os atos processuais, desde a denúncia, inclusive, por incompetência absoluta daquela justiça especializada.
HC 106683/RS, rel. Min. Celso de Mello, 12.6.2012. (HC-106683)
Limites da competência de juízo de primeiro grau - 1
O juízo de primeiro grau não pode rescindir acórdão de instância superior, mesmo na hipótese de existência de nulidade absoluta, sob pena de violação das normas processuais penais e constitucionais relativas à divisão de competência. Essa a conclusão da 2ª Turma ao conhecer, em parte, de habeas corpus e, nessa extensão, indeferir a ordem impetrada em favor de denunciado pela suposta prática dos delitos de moeda falsa, falsidade ideológica e identidade falsa. Na espécie, em virtude de o paciente não ter sido localizado, o juízo processante decretara a revelia e a sua prisão preventiva, ocasião em que nomeado defensor dativo para patrocinar a defesa. Baixados os autos à vara de origem, em virtude do trânsito em julgado da sentença condenatória, a juíza sentenciante declarara a nulidade de todos os atos processuais, a partir do recebimento das contrarrazões da apelação, sob o fundamento de que o paciente não teria sido intimado pessoalmente da sentença condenatória, mas somente o seu defensor. Os autos retornaram ao tribunal ad quem para que fosse julgada a apelação interposta pelo parquet, sendo anulada a decisão da magistrada de piso, por entender que o juízo de primeiro grau não teria competência para rescindir julgado de instância superior.
HC 110358/SP, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 12.6.2012. (HC-110358)
Limites da competência de juízo de primeiro grau - 2
Neste habeas, buscava-se a nulidade dos autos da ação penal, a partir da sentença de primeiro grau, sob o argumento de que o paciente não teria sido intimado pessoalmente, nem por meio de edital, da sentença condenatória, mas somente o seu defensor dativo. Enfatizou-se que apenas o tribunal prolator de uma decisão teria competência para, nas hipóteses legais e pela via própria, rescindir, originariamente, seus julgados. Asseverou-se que o órgão colegiado limitara-se a anular a decisão do juízo de primeira instância que rescindira indevidamente o seu julgado, sem manifestar-se, expressamente, sobre eventual nulidade decorrente da falta de intimação do paciente. Assim, não competiria ao STF analisar, per saltum, essa questão. Aduziu-se, ademais, que a impetrante não demonstrara o efetivo prejuízo causado pela ausência de intimação da sentença condenatória ao paciente mediante edital, visto que defendido em todas as fases do processo por defensor designado pelo juízo.
HC 110358/SP, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 12.6.2012. (HC-110358)