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Informativo do STF 635 de 12/08/2011

Publicado por Supremo Tribunal Federal


PLENÁRIO

Anistia: art. 9º do ADCT e prescrição

Ante a ocorrência de prescrição, o Plenário, por maioria, julgou extinta ação originária especial, ajuizada em 2.4.2008, por militar cassado pelo Ato Institucional 5 (AI-5). O autor requeria a nulidade de decreto de reforma compulsória, com as conseqüentes correção, na inatividade, de seu posicionamento na hierarquia castrense e percepção de proventos de posto superior. Sustentava sua pretensão não estaria prescrita, porquanto somente teria sido regulamentada a partir da Lei 10.599/2002, bem como que a anistia configuraria matéria de ordem pública. Em preliminar, consignou-se que o exercício do direito colimado nascera em 5.10.88, com a promulgação da Constituição, e não a partir da Lei 10.599/2002, diploma normativo que, por sua vez, não regulamentara o fundamento do pedido em tela — art. 9º do ADCT (“Art. 9º. Os que, por motivos exclusivamente políticos, foram cassados ou tiveram seus direitos políticos suspensos no período de 15 de julho a 31 de dezembro de 1969, por ato do então Presidente da República, poderão requerer ao Supremo Tribunal Federal o reconhecimento dos direitos e vantagens interrompidos pelos atos punitivos, desde que comprovem terem sido estes eivados de vício grave”) —, mas apenas o art. 8º desse mesmo ato. Entendeu-se que o reconhecimento, pelo STF, dos direitos e vantagens políticos interrompidos pelos atos de punição que se sucederam no período de 15 de julho a 31 de dezembro de 1969 deveria observar os critérios especiais fixados no Decreto 20.910/32, que regulamenta a prescrição qüinqüenal em face da Fazenda Pública (“Art. 1º - As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda Federal, Estadual ou Municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem”). Assim, o qüinqüídio prescricional para o exercício do direito já havia se esvaído quando a ação fora ajuizada. Vencidos os Ministros Luiz Fux, Ayres Britto e Celso de Mello, que consideravam os direitos decorrentes dos atos praticados no período revolucionário imprescritíveis. Precedente citado:

AOE 17/RS, (DJU de 25.5.2001). AOE 27/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, 10.8.2011. (AOE-27)

REPERCUSSÃO GERAL

Concurso público: vagas previstas em edital e direito subjetivo à nomeação - 1

O Plenário desproveu recurso extraordinário interposto de acórdão do STJ que, ao reconhecer o direito subjetivo à nomeação de candidato aprovado em concurso público no limite do número de vagas definido no edital, determinara que ela fosse realizada. Entendeu-se, em síntese, que a Administração Pública estaria vinculada às normas do edital e que seria, inclusive, obrigada a preencher as vagas previstas para o certame dentro do prazo de validade do concurso. Acrescentou-se que essa obrigação só poderia ser afastada diante de excepcional justificativa, o que não ocorrera no caso. Após retrospecto acerca da evolução jurisprudencial do tema na Corte, destacou-se recente posicionamento no sentido de haver direito subjetivo à nomeação, caso as vagas estejam previstas em edital. Anotou-se não ser admitida a obrigatoriedade de a Administração Pública nomear candidato aprovado fora do número de vagas previstas, simplesmente pelo surgimento de nova vaga, seja por nova lei, seja decorrente de vacância. Observou-se que também haveria orientação no sentido de que, durante o prazo de validade de concurso público, não se permitiria que candidatos aprovados em novo certame ocupassem vagas surgidas ao longo do período, em detrimento daqueles classificados em evento anterior. Reputou-se que a linha de raciocínio acerca do tema levaria à conclusão de que o dever de boa-fé da Administração Pública exigiria respeito incondicional às regras do edital, inclusive quanto à previsão das vagas do concurso público. Afirmou-se que, de igual maneira, dever-se-ia garantir o respeito à segurança jurídica, sob a forma do princípio de proteção à confiança. O Min. Ricardo Lewandowski ressalvou inexistir direito líquido e certo. Ademais, enfatizou o dever de motivação por parte do Estado, se os aprovados dentro do número de vagas deixarem de ser nomeados. O Min. Ayres Britto, por sua vez, afirmou que o direito líquido e certo apenas surgiria na hipótese de candidato preterido, ou de ausência de nomeação desmotivada.

RE 598099/MS, rel. Min. Gilmar Mendes, 10.8.2011. (RE-598099)

Concurso público: vagas previstas em edital e direito subjetivo à nomeação - 2

Explicou-se que, quando a Administração Pública torna público um edital de concurso, ela impreterivelmente geraria uma expectativa quanto ao seu comportamento segundo as regras previstas no edital. Assim, aqueles cidadãos que decidissem se inscrever para participar do certame depositariam sua confiança no Estado, que deveria atuar de forma responsável quanto às normas editalícias e observar o princípio da segurança jurídica como guia de comportamento. Ressaltou-se que a Constituição, em seu art. 37, IV, garantiria prioridade aos candidatos aprovados em concurso. Asseverou-se que, dentro do prazo de validade do certame, a Administração poderia escolher o momento no qual realizada a nomeação, mas não dispor sobre ela própria, a qual, de acordo com o edital, passaria a constituir um direito do concursando aprovado e, dessa forma, um dever imposto ao Poder Público. Em seguida, explicitou-se que esse direito à nomeação surgiria, portanto, quando realizadas as seguintes condições fáticas e jurídicas: a) previsão em edital de número específico de vagas a serem preenchidas pelos candidatos aprovados em concurso público; b) realização de certame conforme as regras do edital; c) homologação do concurso e proclamação dos aprovados dentro do número de vagas previsto, em ordem de classificação, por ato inequívoco e público da autoridade competente. Reputou-se que esse direito seria público subjetivo em face do Estado, fundado em alguns princípios informadores da organização do Poder Público no Estado Democrático de Direito, como o democrático de participação política, o republicano e o da igualdade. Dessa maneira, observou-se que a acessibilidade aos cargos públicos constituiria direito fundamental expressivo da cidadania, e limitaria a discricionariedade do Poder Público quanto à realização e gestão dos concursos públicos. A Min. Cármen Lúcia repisou que o princípio da confiança seria ligado ao da moralidade administrativa e que, nesse sentido, a Administração não possuiria poder discricionário absoluto.

RE 598099/MS, rel. Min. Gilmar Mendes, 10.8.2011. (RE-598099)

Concurso público: vagas previstas em edital e direito subjetivo à nomeação - 3

Ressalvou-se a necessidade de se levar em conta situações excepcionalíssimas, a justificar soluções diferenciadas, devidamente motivadas de acordo com o interesse público. Essas situações deveriam ser dotadas das seguintes características: a) superveniência, ou seja, vinculadas a fatos posteriores à publicação do edital; b) imprevisibilidade, isto é, determinadas por circunstâncias extraordinárias; c) gravidade, de modo a implicar onerosidade excessiva, dificuldade ou mesmo impossibilidade de cumprimento efetivo das regras editalícias; d) necessidade, traduzida na ausência de outros meios, menos gravosos, de se lidar com as circunstâncias. Asseverou-se a importância de que a recusa de nomear candidato aprovado dentro do número de vagas seja devidamente motivada e, dessa forma, passível de controle pelo Poder Judiciário. Por fim, reafirmou-se a jurisprudência da Corte segundo a qual não se configuraria preterição quando a Administração realizasse nomeações em observância a decisão judicial. Ratificou-se, de igual modo, a presunção de existência de disponibilidade orçamentária quando houver preterição na ordem classificatória, inclusive da decorrente de contratação temporária. Salientou-se, além disso, que o pedido de nomeação e posse em cargo público para o qual o candidato fora aprovado, em concurso público, dentro do número de vagas, não se confundiria com o pagamento de vencimentos, conseqüência lógica da investidura do cargo.

RE 598099/MS, rel. Min. Gilmar Mendes, 10.8.2011. (RE-598099)

PRIMEIRA TURMA

Extradição e tipo previsto em tratado multilateral

Por reputar atendidos os pressupostos do tratado firmado entre as partes, a 1ª Turma deferiu pedido de extradição formulado pelos Estados Unidos da América para fins de processamento de ações penais instauradas contra seu nacional pela suposta prática dos crimes de conspiração para o tráfico de software falsificado e de documentação falsificada de programa de computador. Assentou-se que, de acordo com a legislação do Brasil e do país requerente, não ocorrera a prescrição da pretensão punitiva. Ademais, destacou-se que os delitos imputados ao extraditando não teriam conotação política e que o pleito estaria devidamente instruído. Afirmou-se que o requisito da dupla tipicidade (Lei 6.815/80, art. 77) também fora satisfeito. Rejeitou-se, ainda, a alegação acerca da inexistência de previsão dos crimes no tratado bilateral estabelecido entre ambos os Estados, de modo a obstar a extradição. Aduziu-se ser possível a extradição, ainda que o crime não esteja previsto no tratado bilateral em comento, desde que o tratado multilateral — no caso, a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional — disponha sobre a hipótese de tipificação da conduta pelos ordenamentos internos e estes efetivamente a tipifiquem. Por fim, consignou-se que a detração do tempo de prisão preventiva a que submetido o extraditando no Brasil deveria ser efetuada. Ext 1212/Estados Unidos da América, rel. Min. Dias Toffoli, 9.8.2011. (Ext-1212)

Contrabando: princípio da insignificância e reincidência

A 1ª Turma denegou habeas corpus em que se requeria a incidência do princípio da insignificância. Na situação dos autos, a paciente, supostamente, internalizara maços de cigarro sem comprovar sua regular importação. De início, assinalou-se que não se aplicaria o aludido princípio quando se tratasse de parte reincidente, porquanto não haveria que se falar em reduzido grau de reprovabilidade do comportamento lesivo. Enfatizou-se que estariam em curso 4 processos-crime por delitos de mesma natureza, tendo sido condenada em outra ação penal por fatos análogos. Acrescentou-se que houvera lesão, além de ao erário e à atividade arrecadatória do Estado, a outros interesses públicos, como à saúde e à atividade industrial interna. Em seguida, asseverou-se que a conduta configuraria contrabando e que, conquanto houvesse sonegação de tributos com o ingresso de cigarros, tratar-se-ia de mercadoria sob a qual incidiria proibição relativa, presentes as restrições de órgão de saúde nacional. Por fim, reputou-se que não se aplicaria, à hipótese, o postulado da insignificância — em razão do valor do tributo sonegado ser inferior a R$ 10.000,00 — por não se cuidar de delito puramente fiscal. O Min. Marco Aurélio apontou que, no tocante ao débito fiscal, o legislador teria sinalizado que estampa a insignificância, ao revelar que executivos de valor até R$ 100,00 seriam extintos.

HC 100367/RS, rel. Min. Luiz Fux, 9.8.2011. (HC-100367)

Prescrição e cumprimento de pena por outro delito

A 1ª Turma iniciou julgamento de recurso ordinário em habeas corpus em que se discute a ocorrência, ou não, da prescrição da pretensão executória da pena, em virtude de o réu ser menor de 21 anos à época do delito. No caso, o paciente fora condenado à pena de 8 meses de detenção pelo crime de lesão corporal leve e a defesa sustenta a ocorrência da prescrição, haja vista que já decorrido o interregno de 1 ano do trânsito em julgado da sentença condenatória sem o início da execução da pena. Solicitada a certidão criminal para verificar eventual cumprimento da reprimenda, constatou-se que, embora não iniciada a execução dessa pena, o réu encontrava-se preso pela prática de latrocínio. O Min. Dias Toffoli, relator, ao salientar que o réu já estaria custodiado, desproveu o recurso por reputar possível a soma das penas. Após, pediu vista o Min. Luiz Fux.

RHC 105504/MS, rel. Min. Dias Toffoli, 9.8.2011. (RHC-105504)

Apelação: efeito devolutivo e “reformatio in pejus” - 5

Em conclusão de julgamento, a 1ª Turma indeferiu habeas corpus em que se discutia eventual reformatio in pejus de sentença em virtude de julgamento de apelação, uma vez que o recurso teria sido apresentado somente pela defesa. Na espécie, a paciente fora condenada, pelo crime de evasão de divisas, à pena de 3 anos e 6 meses de reclusão. No julgamento do recurso de apelação, embora reduzida a pena para 2 anos e 4 meses de reclusão, a defesa alegava que teriam sido consideradas circunstâncias judiciais alheias às mencionadas na sentença condenatória, o que vulneraria a voluntariedade recursal. Sustentava que, se afastados esses fundamentos, a sentença fixar-se-ia no mínimo legal e operar-se-ia a prescrição — v. Informativos 596 e 619.

HC 99972/PR, rel. Min. Cármen Lúcia, 9.8.2011. (HC-99972)

Apelação: efeito devolutivo e “reformatio in pejus” - 6

Considerou-se que a sentença de 1º grau assentara a existência de três circunstâncias judiciais desfavoráveis à paciente: a culpabilidade, as circunstâncias e as conseqüências do crime. O acórdão de 2º grau, por sua vez, levara em conta apenas a culpabilidade e as circunstâncias do crime como desabonadoras, de modo a reduzir a pena. Em seguida, reputou-se que o grau de reprovabilidade da conduta, ínsito à culpabilidade, já fora ponderado pelo juízo monocrático, ainda que com outras palavras. Asseverou-se, ademais, que a decisão recursal considerara o efeito devolutivo da apelação, ainda que interposta unicamente pela defesa, e estaria autorizada a rever os critérios de individualização da pena, nos termos do art. 59 do CP, limitada, tão-somente, pela prova produzida e pelas alegações das partes. Vencidos os Ministros Marco Aurélio e Luiz Fux, que deferiam a ordem por reputarem que, sendo a apelação interposta apenas pela defesa, o tribunal não poderia substituir as circunstâncias judiciais por outras não contempladas pelo juízo.

HC 99972/PR, rel. Min. Cármen Lúcia, 9.8.2011. (HC-99972)

Conjugação de leis e descabimento

Com base no princípio unitário, a 1ª Turma denegou habeas corpus em que se pleiteava a mescla da legislação nova com a antiga, nos trechos em que mais favoráveis ao paciente. Na espécie dos autos, ele fora condenado a 17 anos e 6 meses de reclusão e, em grau de recurso, o STJ concedera a ordem, de ofício, a fim de reduzir a pena para 13 anos e 4 meses de reclusão, nos termos dispostos pela Lei 12.015/2009 — que revogou o art. 9º da Lei 8.072/90 e criou o tipo específico de estupro de vulnerável (CP, art. 217-A). Alegava-se que o acórdão questionado prejudicara o paciente, visto que a sentença condenatória estabelecera a pena-base em 6 anos e, pela nova regra, aplicada pelo STJ, esta fora fixada em 8 anos. Considerou-se, ademais, que não houvera qualquer decisão contrária aos interesses do paciente, porque reduzida a pena final, de 17 para 13 anos.

HC 104193/RS, rel. Min. Marco Aurélio, 9.8.2011. (HC-104193)

SEGUNDA TURMA

Extradição com observância de restrição legal

A 2ª Turma deferiu, com restrição, pleito extradicional requerido pela República da Argentina em que se postulava a entrega de nacional processado pelos crimes correspondentes, no Brasil, a latrocínio e roubo qualificado pelo resultado, previstos nos artigos 157, § 3º, in fine e 157, § 3º, primeira parte, ambos na forma do art. 69, todos do CP. Frisou-se que, de acordo com as legislações brasileira e argentina, os delitos não estariam prescritos. Asseverou-se que o pedido de extradição fora deferido sob a condição de que o Estado requerente assuma, em caráter formal, o compromisso de comutar eventual pena de prisão ou de reclusão perpétua em pena privativa de liberdade, com o prazo máximo de 30 anos, nos termos do art. 13 do tratado de extradição firmado entre os Estados Partes do Mercosul. Destacou-se, ainda, que o extraditando responde a processo-penal no Brasil pela prática do crime de furto, aplicando-se, na espécie, o disposto no art. 89 da Lei 6.815/90 (“Quando o extraditando estiver sendo processado, ou tiver sido condenado, no Brasil, por crime punível com pena privativa de liberdade, a extradição será executada somente depois da conclusão do processo ou do cumprimento da pena, ressalvado, entretanto, o disposto no artigo 67”). Em face do que disposto nessa norma, deferiu-se o pedido, com a restrição do art. 67 (Desde que conveniente ao interesse nacional, a expulsão do estrangeiro poderá efetivar-se, ainda que haja processo ou tenha ocorrido condenação), observada a discricionariedade do Presidente da República. Ext 1133/República da Argentina, rel. Min. Gilmar Mendes, 9.8.2011. (Ext-1133)


Informativo do STF 635 de 12/08/2011