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Informativo do STF 605 de 22/10/2010

Publicado por Supremo Tribunal Federal


PLENÁRIO

Indústria de Cigarro e Cancelamento de Registro Especial - 1

O Plenário iniciou julgamento de ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pelo Partido Trabalhista Cristão - PTC contra o art. 1º da Lei 9.822/99, na parte em que conferiu nova redação ao art. 2º, II, do Decreto-lei 1.593/77, bem como o próprio art. 2º do referido Decreto-lei e de seu § 5º, incluído pela Medida Provisória 2.158-35/2001. Os aludidos preceitos dispõem sobre o cancelamento sumário do registro especial a que estão submetidas as empresas tabagistas do país, caso constatado pelo Secretário da Receita Federal o inadimplemento de tributo ou de contribuição administrados pela Secretaria da Receita Federal. O requerente alega ofensa aos artigos 5º, XIII, LIV e LV, e 170, caput, da CF, ao argumento de que a restrição ao exercício de atividade econômica ou profissional lícita constituiria sanção política vedada pela Constituição, na medida em que não admitida a existência de instrumentos oblíquos destinados a coagir ou induzir o contribuinte ao pagamento de tributos. O Min. Joaquim Barbosa, relator, julgou procedente em parte o pedido para dar ao texto impugnado interpretação conforme a Constituição, de modo que a cassação seja considerada constitucional, se simultaneamente presentes as seguintes condições: 1º) observar o vulto dos créditos tributários devidos; 2º) respeitar o devido processo legal de controle da validade da imposição da restrição, ou seja, da penalidade e 3º) respeitar o devido processo legal de controle da validade dos créditos tributários. Preliminarmente, constatou que a ação reuniria os requisitos para ser conhecida, uma vez que a norma questionada estaria fundada em redação dada por lei publicada já sob a vigência da CF/88, de maneira que a hipótese versada não se referiria à recepção, ou não, de diploma criado sob a égide de Constituição pretérita. Salientou, ainda, que a circunstância de eventual declaração de inconstitucionalidade da norma revigorar texto constitucional potencialmente inquinado de vício semelhante não impediria o conhecimento da presente ação, haja vista que, se declarada inconstitucional a norma, o texto que voltaria a viger seria aquele publicado ao tempo da CF/67, emendada em 1969.

ADI 3952/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 20 e 21.10.2010. (ADI-3952)

Indústria de Cigarro e Cancelamento de Registro Especial - 2

No mérito, enfatizou que a questão sob exame não se limitaria à indústria do tabaco. Mencionou que leitura apressada da norma impugnada poderia levar à conclusão de que ela proibiria o exercício de atividade econômica em razão da existência de créditos tributários não pagos em quantia ínfima ou não expressiva. Ademais, assinalou que o art. 2º, II, do Decreto-lei 1.593/77 não traria expressamente qualquer parâmetro para mensuração do montante do crédito tributário não pago ou da gravidade do descumprimento de obrigação acessória que são pressupostos da permissão para cancelamento do registro especial. Aduziu que o inciso III do mesmo artigo possibilitaria a proibição do exercício da atividade econômica antes do encerramento do controle do ato administrativo ou do advento de decisão judicial que viesse a conformar as circunstâncias autorizadoras do fechamento do estabelecimento. Ressaltou, também, que o STF possui orientação consolidada no sentido da vedação constitucional às sanções políticas. Consignou, entretanto, que o desate da controvérsia seria mais sutil do que o reconhecimento, pura e simplesmente, do art. 2º, II, do Decreto-lei 1.593/77 como sanção política ou como salvaguarda da saúde pública e do equilíbrio concorrencial. Asseverou que, na verdade, a questão de fundo consistiria em saber se a interpretação específica adotada pelas autoridades fiscais configuraria, ou não, sanção política, dada a ambigüidade do texto normativo. Considerou que a função extrafiscal da tributação não poderia afastar a efetividade da jurisdição, intimamente ligada ao direito fundamental ao devido processo legal de controle da validade das exações. De igual forma, rejeitou as assertivas segundo as quais o art. 2º, II, do Decreto-lei seria inconstitucional em qualquer de suas interpretações possíveis. Destacou, no ponto, que a proibição da sanção política não conferiria imunidade absoluta e imponderada, pois não serviria como uma espécie de salvo-conduto geral aos contribuintes que fazem da frívola impugnação de lançamentos tributários uma ferramenta de vantagem competitiva. Ter-se-ia, de um lado, o direito fundamental à livre atividade econômica lícita e o de acesso à jurisdição e, de outro, o direito à livre concorrência e o dever fundamental de pagar tributos.

ADI 3952/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 20 e 21.10.2010. (ADI-3952)

Indústria de Cigarro e Cancelamento de Registro Especial - 3

O relator reputou que a norma passaria pelo teste de adequação, pois inequívoco que ela fomentaria o pagamento pontual dos tributos. Todavia, verificou que, à primeira vista, o mesmo não ocorreria quanto ao teste da necessidade, ante a existência de outros mecanismos menos sacrificantes ao direito à jurisdição postos a serviço da salvaguarda do dever fundamental de pagar tributos. Considerou que a norma deveria ser concebida para regular situações extremas e de grave desequilíbrio concorrencial. Explicitou que, para ser conforme a Constituição, uma norma com efeitos tão drásticos não poderia ser mero instrumento de combate ao inadimplemento, devendo, ao contrário, apresentar-se como mecanismo de proteção contra a resistência obstinada e infundada ao pagamento de tributo em quadro marcado também pela necessidade de rápida resposta estatal e em contexto em que os instrumentos ordinários não fossem suficientes. Relativamente ao teste da proporcionalidade em sentido estrito, ponderou que a norma extraída a partir da interpretação do art. 2º, II, do Decreto-lei seria inconstitucional se atentasse contra um dos três parâmetros constitucionais já apresentados, ou seja: 1º) relevância do valor dos créditos tributários em aberto, cujo não pagamento culminaria na restrição ao funcionamento da empresa; 2º) manutenção proporcional e razoável do devido processo legal de controle do ato de aplicação da penalidade e 3º) manutenção proporcional e razoável do devido processo legal de controle da validade dos créditos tributários, cujo não pagamento implicaria cassação do registro especial. Acrescentou que, dos parâmetros expostos, o último apresentaria o maior desafio ao órgão jurisdicional. Assim, enfatizou que haverá a observância da Constituição se a penalidade não for aplicada antes do exame das medidas e dos recursos apresentados pelo sujeito passivo, sempre que a irresignação possuir um mínimo de plausibilidade. Por derradeiro, registrou que a suspensão temporária das atividades ou a aplicação de regime especial de cumprimento de deveres instrumentais seria válida sempre que ficasse comprovado que a inadimplência contumaz fosse de monta e apta a afetar profundamente as condições de livre concorrência e iniciativa. Após, pediu vista a Min. Cármen Lúcia.

ADI 3952/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 20 e 21.10.2010. (ADI-3952)

Extradição e Prescrição - 1

O Plenário indeferiu pedido de extradição executória formulado pela República Italiana em que se postulava a entrega de nacional para cumprimento de execuções decorrentes de 4 acórdãos condenatórios proferidos por diversos tribunais de Roma. No caso, o extraditando fora condenado a uma pena total de 12 anos e 11 meses de reclusão pela prática dos crimes de desvio ou subtração de armas; armas clandestinas; transporte ilícito, para local público ou aberto, de armas, substâncias químicas, explosivos e engenhos; seqüestro de pessoas; assalto; receptação; atentado para o fim de terrorismo ou de eversão; favorecimento pessoal; quadrilha; associação subversiva e associação para fins de terrorismo ou de eversão da ordem democrática. Sua prisão preventiva para fins de extradição ocorrera em 3.7.2008, sendo revogada em 1º.10.2010, por força de liminar concedida pelo Min. Gilmar Mendes, relator. De início, verificou-se que o pleito extradicional preencheria as formalidades exigidas pelo art. 80 da Lei 6.815/80 e pelo art. 11 do tratado bilateral específico. Em passo seguinte, procedeu-se à análise do primeiro acórdão condenatório, no qual o Governo requerente afirmava que o extraditando seria membro de uma associação subversiva — denominada Nuclei Armati Rivoluzionari - R.A.R. — e que teria, entre os meses de dezembro de 1979 a março de 1982, atuado com finalidade terrorista e subvertido a ordem democrática. Consignou-se que o ponto mais complexo na apreciação desse aresto diria respeito à possível classificação dos fatos como crimes políticos puros, matéria prejudicial ao exame dos requisitos da dupla punibilidade e tipicidade. Constaria da nota verbal que o extraditando fora condenado por homicídio, tentativa de homicídio e lesões corporais — infligidas a 2 policiais e a 3 transeuntes — durante assalto a banco, bem como por roubo qualificado perpetrado contra outra instituição bancária e por extorsão mediante seqüestro. Considerou-se que, embora houvesse certa motivação política, os fatos narrados caracterizar-se-iam como crimes comuns, sendo, pois, passíveis de extradição. Ext 1140/República Italiana, rel. Min. Gilmar Mendes, 21.10.2010. (Ext-1140)

Extradição e Prescrição - 2

Assim, passou-se à apreciação da dupla punibilidade, requisito este reputado presente, com exceção aos delitos de detenção e porte ilegítimo de armas. Aduziu-se não ser possível o deferimento relativamente a eles, já que, no tocante aos crimes previstos nos artigos 10 e 12 da Lei italiana 497/74 — que estabeleceu disposições para o controle de armas —, no direito pátrio, tais delitos eram punidos a título de contravenção penal, consoante a legislação então em vigor. Quanto aos crimes constantes dos artigos 21 e 23 da Lei italiana 110/75 — que dispôs sobre o controle de armas, munições e substâncias explosivas —, salientou-se que as condutas delituosas seriam absorvidas pelos crimes de roubo qualificado, extorsão mediante seqüestro, homicídio e tentativa de homicídio qualificados. A posse de armas clandestinas, por sua vez, constituiria ante-fato não punível, haja vista caracterizar-se como meio necessário para atingir o desideratum maior. Procedeu-se, em seguida, à análise da prescrição nos termos das leis brasileira e italiana, e observou-se a sua ocorrência, a impedir a extradição. Assinalou-se, a respeito da primeira condenação, que, considerado o seu trânsito em julgado em 5.6.89, a pena de 3 anos e 4 meses de reclusão imposta pelo crime de atentado teria prescrito em junho de 1997. Já as demais condenações de 10 meses de reclusão cominadas ao extraditando a título de continuação teriam prescrito em junho de 1991. No tocante ao segundo acórdão condenatório, enfatizou-se que as condutas atribuídas ao extraditando teriam sido cometidas quando ele era menor de 18 anos, o que tornaria inviável o pedido de extradição, ante a inimputabilidade do acusado à época dos fatos. Com referência aos dois últimos objetos do pleito extradicional, afirmou-se a ocorrência da prescrição segundo a legislação brasileira, tendo em conta que, impostas penas de 6 meses e 10 dias de reclusão por ofensa aos artigos 12 e 14 da referida Lei 497/74 e de 1 ano de reclusão por participação em associação eversiva, as sentenças teriam transitado em julgado, respectivamente, em 11.12.91 e 20.7.93. Por fim, confirmou-se a liminar concedida para revogar a prisão preventiva decretada em desfavor do extraditando. Ext 1140/República Italiana, rel. Min. Gilmar Mendes, 21.10.2010. (Ext-1140)

Art. 290 do CPM e Princípio da Insignificância - 1

A posse, por militar, de reduzida quantidade de substância entorpecente em lugar sujeito à administração castrense (CPM, art. 290) não autoriza a aplicação do princípio da insignificância. Com base nesse entendimento, o Plenário indeferiu habeas corpus em que a Defensoria Pública da União pleiteava a incidência desse postulado, já que o paciente fora flagrado na posse de 0,1 g de maconha. A impetração também alegava que essa conduta não causaria risco de lesão à saúde pública. Inicialmente, destacou-se que o problema em questão não envolveria a quantidade ou o tipo de entorpecente apreendido, mas sim a qualidade da relação jurídica entre esse usuário e a instituição militar da qual ele faria parte, no instante em que flagrado com a posse da droga em recinto sob administração castrense. Em seguida, consignou-se que essa tipologia de relação não seria compatível com a figura da insignificância penal. Explicitou-se que esta consubstanciaria vetor interpretativo cujo propósito seria o de excluir a abrangência do Direito Penal de condutas provocadoras de ínfima lesão ao bem jurídico tutelado. Reputou-se que o uso de drogas e o dever militar seriam inconciliáveis, dado que a disposição em si para manter o vício implicaria inafastável pecha de reprovabilidade cívico-profissional por afetar tanto a saúde do próprio usuário quanto pelo seu efeito no moral da corporação e no conceito social das Forças Armadas.

HC 103684/DF, rel. Min. Ayres Britto, 21.10.2010. (HC-103684)

Art. 290 do CPM e Princípio da Insignificância - 2

Aduziu-se que a hierarquia e a disciplina militares não atuariam como meros predicados institucionais, constituindo-se, ao revés, em elementos conceituais e “vigas basilares” das Forças Armadas. Enfatizou-se, nesse ponto, que o maior rigor penal da lei castrense, na hipótese, se harmonizaria com a maneira pela qual a Constituição dispusera sobre as Forças Armadas. Ante o critério da especialidade, rejeitou-se a aplicação do art. 28 da Lei 11.343/2006. Mencionou-se que a referida lei revogara, expressamente, apenas as Leis 6.368/76 e 10.409/2002 e que o Código Penal Militar trataria da matéria de forma específica, embora em termos mais drásticos. De igual modo, afastou-se a assertiva, suscitada da tribuna, de ofensa ao princípio da proporcionalidade no sentido de que o art. 290 do CPM não distinguiria entre traficante e usuário. Asseverou-se que o aludido preceito cominaria somente a pena máxima aplicável ao delito, o que permitiria ao juiz sentenciante estabelecer a justa medida entre os atos praticados e o crime, a partir do exame das circunstâncias objetivas e subjetivas da situação concreta. Vencidos os Ministros Joaquim Barbosa, Gilmar Mendes, Celso de Mello e Cezar Peluso, Presidente, que deferiam o writ. O primeiro realçava o fato da quantidade ínfima ser insuscetível de colocar em risco o bem jurídico protegido pela norma, qual seja, a saúde. Os Ministros Gilmar Mendes e Celso de Mello, por sua vez, reconheciam a possibilidade de aplicação do princípio da insignificância a crime militar e, rejeitada essa tese, aplicavam o princípio da proporcionalidade. O Min. Cezar Peluso salientava que a admissão desse princípio em matéria de Direito Penal Militar permitiria que o magistrado não ficasse impossibilitado de, ao examinar o caso e verificar a inexistência de afronta às objetividades jurídicas do tipo, assentar a atipicidade por falta de ofensividade ou de lesividade ao bem jurídico.

HC 103684/DF, rel. Min. Ayres Britto, 21.10.2010. (HC-103684)

REPERCUSSÃO GERAL

Repercussão Geral e Alteração nas Premissas Fático-Jurídicas - 1

O Plenário resolveu questão de ordem no sentido de reconhecer a repercussão geral da matéria discutida em recursos extraordinários, relativa à possibilidade, ou não, de se aplicar a alíquota máxima do Imposto de Renda de Pessoa Física aos valores recebidos acumuladamente pelo beneficiário, por culpa exclusiva da autarquia previdenciária. Com base nisso, reformou decisão monocrática da Min. Ellen Gracie, que não admitira os recursos, dos quais relatora, ao fundamento de que a questão já teria sido considerada “sem repercussão geral” no âmbito do Plenário Virtual. No caso, após o STF haver deliberado que o tema versado nos autos não possuiria repercussão geral, o TRF da 4ª Região declarara a inconstitucionalidade, sem redução de texto, do art. 12 da Lei 7.713/88, o qual determina a incidência do Imposto de Renda no mês do recebimento de valores acumulados sobre o total dos rendimentos. A União, ao alegar a superveniente alteração nas premissas fático-jurídicas, sustentava, em sede de agravo regimental, que os recursos extraordinários interpostos com fulcro no art. 102, III, b, da CF teriam repercussão geral presumida.

RE 614232 AgR-QO/RS, rel. Min. Ellen Gracie, 20.10.2010. (RE-614232) RE 614406 AgR-QO/RS, rel. Min. Ellen Gracie, 20.10.2010. (RE-614232)

Repercussão Geral e Alteração nas Premissas Fático-Jurídicas - 2

Aduziu-se que a superveniência de declaração de inconstitucionalidade de lei por tribunal de segunda instância consubstanciaria dado relevante a ser levado em conta, uma vez que retiraria do mundo jurídico determinada norma que, nas demais regiões do país, continuaria a ser aplicada. Ao enfatizar que se cuidaria de matéria tributária, mais particularmente de imposto federal, asseverou-se que os princípios da uniformidade geográfica (CF, art. 151, I) e da isonomia tributária (CF, art. 150, II) deveriam ser considerados. Observou-se, ademais, que a negativa de validade da lei ou de ato normativo federal em face da Constituição indicaria a presença de repercussão geral decorrente diretamente dos dispositivos constitucionais aludidos, o que justificaria a apreciação do mérito dos recursos extraordinários, devendo-se reputar satisfeito o requisito de admissibilidade previsto no art. 102, § 3º, da CF. Assim, tendo em conta a declaração de inconstitucionalidade superveniente e a relevância jurídica correspondente à presunção de constitucionalidade das leis, à unidade do ordenamento jurídico, à uniformidade da tributação federal e à isonomia, assentou-se que o tema apresentaria repercussão geral. Os Ministros Ellen Gracie, Ayres Britto, Gilmar Mendes e Marco Aurélio admitiam, na situação em apreço, a revisão da tese anterior, nos termos mencionados no art. 543-A, § 5º, do CPC (“§ 5º Negada a existência da repercussão geral, a decisão valerá para todos os recursos sobre matéria idêntica, que serão indeferidos liminarmente, salvo revisão da tese, tudo nos termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal.”).

RE 614232 AgR-QO/RS, rel. Min. Ellen Gracie, 20.10.2010. (RE-614232) RE 614406 AgR-QO/RS, rel. Min. Ellen Gracie, 20.10.2010. (RE-614232)

PIS e COFINS incidentes sobre a Importação e Base de Cálculo - 1

O Plenário iniciou julgamento de recurso extraordinário em que se discute a constitucionalidade, ou não, do art. 7º, I, da Lei 10.865/2004, que determinou que a base de cálculo do PIS e da COFINS incidentes sobre a importação “será o valor aduaneiro, assim entendido, para os efeitos desta Lei, o valor que servir ou que serviria de base para o cálculo do imposto de importação, acrescido do valor do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação - ICMS incidente no desembaraço aduaneiro e do valor das próprias contribuições, na hipótese do inciso I do caput do art. 3º desta Lei”. A Min. Ellen Gracie, relatora, negou provimento ao recurso e, por vislumbrar afronta ao art. 149, § 2º, III, a, da CF, introduzido pela EC 33/2001, reconheceu a inconstitucionalidade da parte do citado art. 7º, I, da Lei 10.865/2004 que diz “acrescido do valor do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação - ICMS incidente no desembaraço aduaneiro e do valor das próprias contribuições”.

RE 559937/RS, rel. Min. Ellen Gracie, 20.10.2010. (RE-559937)

PIS e COFINS incidentes sobre a Importação e Base de Cálculo - 2

Asseverou, inicialmente, que as contribuições questionadas no presente recurso, PIS/PASEP-Importação e COFINS-Importação, teriam sido instituídas com fundamento nos artigos 149, § 2º, II e 195, IV, da CF. Afirmou que a semelhança delas com as contribuições PIS/PASEP e COFINS limitar-se-ia à identidade de finalidades e à possibilidade de apuração de crédito para fins de compensação no regime não-cumulativo. Observou, entretanto, que essa identidade de finalidades permitiria, por si só, que se classificassem as contribuições PIS/PASEP e COFINS sobre a importação como contribuições de seguridade social. Salientou, ainda, que a Lei 10.865/2004 teria dado um tratamento unitário para ambas, relativamente à não-incidência, ao fato gerador, ao sujeito passivo, à base de cálculo e à isenção, fazendo distinção apenas no que se refere às suas alíquotas (1,65% para o PIS/PASEP-Importação e 7,6% para a COFINS-Importação). Tal tratamento, bem como a simultaneidade da instituição dessas contribuições, faria com que, na prática, elas configurassem quase que uma única contribuição cujo percentual seria bipartido, de modo que cada parte recebesse destinação específica, não sendo impróprio, inclusive, que fossem denominadas simplesmente contribuições de PIS/COFINS-Importação.

RE 559937/RS, rel. Min. Ellen Gracie, 20.10.2010. (RE-559937)

PIS e COFINS incidentes sobre a Importação e Base de Cálculo - 3

Aduziu que a instituição simultânea dessas contribuições não estaria em confronto com a vedação de bis in idem, com invocação do art. 195, § 4º, da CF. Explicou que, se na instituição de novas contribuições de seguridade social haveria de ser observada a exigência de lei complementar, de não-cumulatividade e a proibição de que tenham fato gerador ou base de cálculo próprios dos discriminados nos incisos do art. 195, não se haveria de falar sobre invalidade da instituição originária e simultânea de contribuições idênticas com fundamento no inciso IV do art. 195, com alíquotas apartadas para fins exclusivos de destinação. Justificou que exatamente por constituírem contribuições cuja instituição fora devidamente prevista e autorizada, de modo expresso, em um dos incisos do art. 195 da CF, elas poderiam ser instituídas validamente por lei ordinária. Dessa forma, tratando-se de contribuições ordinárias de financiamento da seguridade social, com base no art. 195, IV, da CF, estaria afastada qualquer violação ao § 4º do mesmo preceito, o qual se limitaria a regular o exercício da competência residual, somente para tanto exigindo lei complementar, não cumulatividade e fato gerador e base de cálculo distintos das contribuições ordinárias. Portanto, sendo inaplicável o art. 195, § 4º, da CF, não se haveria de concluir que as contribuições em questão deveriam ser necessariamente não-cumulativas. Ademais, ressaltou que o fato de não admitirem crédito senão para as empresas sujeitas à apuração do PIS e da COFINS pelo regime não-cumulativo não implicaria ofensa à isonomia, de modo a fulminar o tributo. A sujeição ao regime do lucro presumido, que ensejaria submissão ao regime cumulativo, seria opcional, razão pela qual não se vislumbraria, também, afronta ao art. 150, II, da CF.

RE 559937/RS, rel. Min. Ellen Gracie, 20.10.2010. (RE-559937)

PIS e COFINS incidentes sobre a Importação e Base de Cálculo - 4

A Min. Ellen Gracie registrou que os dispositivos do art. 195 da CF seriam normas especiais que não afastariam a aplicação das normas gerais do art. 149 no que não fossem incompatíveis, havendo entre elas, portanto, uma relação de complementaridade. No que respeita à contribuição de seguridade social do importador, disse que ela teria como suportes diretos os artigos 149, II, e 195, IV, da CF, e se submeteria, ainda, ao art. 149, § 2º, III, da CF, acrescido pela EC 33/2001. Com a combinação desses dispositivos, ter-se-ia que a União seria competente para instituir contribuição do importador ou equiparado, para fins de custeio da seguridade social (art. 195, IV), com alíquota específica (art. 149, § 2º, III, b) ou ad valorem, esta tendo por base o valor aduaneiro (art. 149, § 2º, III, a). Disse não haver dúvida de que as contribuições caracterizar-se-iam, principalmente, por impor a um certo grupo de contribuintes — ou, até mesmo, a toda a sociedade, no que se refere às contribuições de seguridade social — o custeio de atividades públicas voltadas à realização de fins constitucionalmente fixados, e que não haveria, no texto originário da Constituição, uma pré-definição das bases a serem tributadas, salvo para fins de custeio da seguridade, no art. 195. Salientou que o critério da finalidade seria marca essencial das respectivas normas de competência, mas que ele não seria o único usado pelo constituinte para definir a competência tributária relativa à instituição de contribuições, visto que ele também teria se valido já no texto original da Constituição, quanto a contribuições de seguridade social, da enunciação de bases econômicas ou materialidades (art. 195, I a III). Portanto, a Constituição teria combinado os critérios da finalidade e da base econômica para delimitar a competência tributária concernente à instituição de contribuições de seguridade social.

RE 559937/RS, rel. Min. Ellen Gracie, 20.10.2010. (RE-559937)

PIS e COFINS incidentes sobre a Importação e Base de Cálculo - 5

Realçou que, com o advento da EC 33/2001, a enunciação das bases econômicas passou a figurar como critério quase que onipresente nas normas de competência relativas a contribuições, haja vista o § 2º do inciso III do art. 149 ter feito com que a possibilidade de instituição de quaisquer contribuições sociais ou interventivas ficasse circunscrita a certas bases ou materialidades, reduzindo o campo de discricionariedade do legislador na eleição do fato gerador e da base de cálculo desses tributos. Daí, no que tange à importação, ter estabelecido que a contribuição poderá possuir alíquota ad valorem, tendo por base o valor aduaneiro, ou específica, tendo por base a unidade de medida adotada. Frisou, no ponto, que o termo “poderão”, contido nesse preceito, não enunciaria mera alternativa de tributação em rol meramente exemplificativo. Dessa forma, a redação do art. 149, § 2º, III, a, da CF, ao circunscrever a tributação ao faturamento, à receita bruta e ao valor da operação ou, no caso de importação, ao valor aduaneiro, possuiria o efeito de impedir a pulverização de contribuições sobre bases de cálculo não previstas, e evitar, com isso, por exemplo, efeitos extrafiscais inesperados e adversos que poderiam resultar da eventual sobrecarga da folha de salários, reservada que ficou esta base ao custeio da seguridade social (art. 195, I, a), não ensejando, mais, a instituição de outras contribuições sociais e interventivas. Também não seria razoável, para a relatora, interpretar a referência às bases econômicas como meras sugestões de tributação, por não caber à Constituição sugerir, mas sim outorgar competências e traçar os seus limites. De igual modo, não seria correto entender que o art. 149, § 2º, III, a, da CF teria sobrevindo apenas para autorizar o bis in idem ou a bitributação, sendo certo que esse dispositivo efetivamente afastaria a possível argumentação de que as bases a que se refere, quando já gravadas anteriormente por outra contribuição ou por imposto, não poderiam ser objeto de nova contribuição social ou interventiva.

RE 559937/RS, rel. Min. Ellen Gracie, 20.10.2010. (RE-559937)

PIS e COFINS incidentes sobre a Importação e Base de Cálculo - 6

Prosseguindo, a relatora destacou que o constituinte derivado, ao estabelecer que as contribuições sociais e interventivas poderão ter alíquotas ad valorem, tendo por base o faturamento, a receita bruta ou o valor da operação e, no caso de importação, o valor aduaneiro, teria inovado por circunscrever a tais bases a respectiva competência, sem prejuízo do já previsto no art. 195 da CF. Assentou que as contribuições sobre a importação, portanto, não poderiam extrapolar a base do valor aduaneiro, sob pena de inconstitucionalidade por violação à norma de competência no ponto constante do art. 149, § 2º, III, a, da CF. Ao salientar a desnecessidade de aprofundamento da análise do alcance da expressão “valor aduaneiro”, asseverou que a Lei 10.865/2004, ao instituir o PIS/PASEP-Importação e a COFINS-Importação, não teria alargado propriamente o conceito de valor aduaneiro de modo a abarcar outras grandezas nele não contidas, para fins de apuração de tais contribuições, mas desconsiderado a imposição constitucional de que as contribuições sociais sobre a importação, quando tivessem alíquota ad valorem, fossem calculadas com base apenas no valor aduaneiro. Ou seja, a lei impugnada teria determinado que as contribuições fossem calculadas sobre esse valor e também sobre o valor do ICMS-Importação e o das próprias contribuições instituídas. Haveria, assim, expressa extrapolação da base permitida pela Constituição e que condicionava o exercício da competência legislativa.

RE 559937/RS, rel. Min. Ellen Gracie, 20.10.2010. (RE-559937)

PIS e COFINS incidentes sobre a Importação e Base de Cálculo - 7

Por fim, a relatora rejeitou a alegação de que a lei impugnada teria como escopo atender ao princípio da isonomia, ao conferir tratamento tributário igual aos bens produzidos e serviços prestados no país, e que sofrem a incidência do PIS e da COFINS para o financiamento da seguridade social, e aos bens e serviços importados de residentes ou domiciliados no exterior. Considerou que, no caso em questão, não haveria parâmetro de comparação adequado que permitisse conclusão no sentido de que a circunscrição das contribuições sobre a importação à base valor aduaneiro violasse a isonomia e que, de outro lado, a inserção do ICMS-Importação e das próprias contribuições PIS/PASEP-Importação e COFINS-Importação na base de cálculo destas últimas fosse um imperativo constitucional de isonomia tributária. Ressaltou que a ofensa à isonomia identificar-se-ia apenas quando fossem tratados diversamente contribuintes que se encontrassem em situação equivalente e sem que o tratamento diferenciado estivesse alicerçado em critério justificável de discriminação ou sem que a diferenciação levasse ao resultado que a fundamentasse. Observou que, na espécie, não haveria como equiparar de modo absoluto a tributação da importação com a tributação das operações internas. Após, pediu vista dos autos o Min. Dias Toffoli.

RE 559937/RS, rel. Min. Ellen Gracie, 20.10.2010. (RE-559937)

PRIMEIRA TURMA

Testemunha Não Arrolada em Denúncia e Oitiva pelo Juiz

A 1ª Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus em que se pleiteava a anulação de ação penal desde a audiência de oitiva de testemunhas, ao argumento de que testemunha, não arrolada na denúncia, teria sido ouvida, em primeiro lugar, pelo juízo processante. De início, ao salientar a condenação definitiva do paciente a 2 anos de reclusão por furto qualificado, substituída por pena restritiva de direitos e multa, observou-se não estar prejudicado o writ. No ponto, apurou-se, em contato com o juízo da execução, que a pena ainda não teria sido totalmente solvida, a possibilitar, caso não cumprida, eventual conversão em pena privativa de liberdade. Registrou-se que a primeira testemunha inquirida — patrulhador que abordara o paciente — realmente não fora arrolada na denúncia, comparecera à audiência e o juízo a ouvira como sua testemunha. Enfatizou-se que o CPP e a teoria jurídica processual penal não determinariam uma ordem necessária para a oitiva de testemunha do juízo. Avaliou-se que sua inquirição em momento anterior teria favorecido a defesa. Realçou-se a ausência de indicação de eventual prejuízo. Constatou-se, ainda, a preclusão da matéria, haja vista a presença, naquele momento, de defensora do réu, a qual, de acordo com o termo de deliberação da audiência, não teria impugnado imediatamente a inquirição da testemunha ou oferecido resistência ou oposição a esse fato, nem interposto recurso. O Min. Ricardo Lewandowski ressaltou que a busca da verdade real pelo juízo criminal permitiria uma atuação com certa amplitude, sendo possível ao juiz ouvir, como se fossem suas, tanto as testemunhas arroladas a destempo pelas partes quanto quaisquer outras. Vencido o Min. Marco Aurélio que deferia o writ ao fundamento de que o devido processo legal, no que se refere ao direito de defesa, seria sagrado e que a nulidade seria absoluta. Entendia desnecessária, ao versar matéria sobre o exercício do direito de defesa, a demonstração do prejuízo, por reputá-lo presumido, não obstante reconhecer que o próprio título condenatório poderia consistir certidão judicial pública desse prejuízo. Considerava, ainda, a possibilidade de oitiva nos termos do art. 209 do CPP, mas não na forma realizada no caso presente, em que a acusação indicara extemporaneamente a testemunha, segundo a decisão do STJ, tendo o juiz afastado a inércia do Estado, ao ouvi-la sob a roupagem de testemunha do juízo.

HC 95319/SP, rel. Min. Dias Toffoli, 19.10.2010. (HC-95319)

Inquérito Policial e Arquivamento Implícito

O sistema processual penal brasileiro não prevê a figura do arquivamento implícito de inquérito policial. Ao reafirmar esse entendimento, a 1ª Turma denegou habeas corpus em que se sustentava a sua ocorrência em razão de o Ministério Público estadual haver denunciado o paciente e co-réu, os quais não incluídos em denúncia oferecida anteriormente contra terceiros. Alegava a impetração que o paciente, por ter sido identificado antes do oferecimento da primeira peça acusatória, deveria dela constar. Inicialmente, consignou-se que o Ministério Público esclarecera que não incluíra o paciente na primeira denúncia porquanto, ao contrário do que afirmado pela defesa, não dispunha de sua identificação, o que impediria a propositura da ação penal naquele momento. Em seguida, aduziu-se não importar, de qualquer forma, se a identificação do paciente fora obtida antes ou depois da primeira peça, pois o pedido de arquivamento deveria ser explícito (CPP, art. 28). Nesse sentido, salientou-se que a ocorrência de arquivamento deveria se dar após o requerimento expresso do parquet, seguido do deferimento, igualmente explícito, da autoridade judicial (CPP, art. 18 e Enunciado 524 da Súmula do STF). Ressaltou-se que a ação penal pública incondicionada submeter-se-ia a princípios informadores inafastáveis, especialmente o da indisponibilidade, segundo o qual incumbiria, obrigatoriamente, ao Ministério Público o oferecimento de denúncia, quando presentes indícios de autoria e prova de materialidade do delito. Explicou-se que a indisponibilidade da denúncia dever-se-ia ao elevado valor social dos bens tutelados por meio do processo penal, ao se mostrar manifesto o interesse da coletividade no desencadeamento da persecução sempre que as condições para tanto ocorrerem. Ademais, registrou-se que, de acordo com a jurisprudência do Supremo, o princípio da indivisibilidade não se aplicaria à ação penal pública. Concluiu-se pela higidez da segunda denúncia. Alguns precedentes citados:

RHC 95141/RJ (DJe de 23.10.2009); HC 92445/RJ (DJe de 3.4.2009). HC 104356/RJ, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 19.10.2010. (HC-104356)

Execução de Pena e Falta Grave - 1

A 1ª Turma retomou julgamento de habeas corpus impetrado em favor de condenado que, no curso de execução da pena, empreendera fuga e fora preso em flagrante na suposta prática de nova infração penal. A impetração alega injusto constrangimento, visto que, somente após a sentença final condenatória, seria possível concluir pela ocorrência, ou não, do delito pelo qual o paciente fora recapturado, não servindo para tanto o simples recebimento da denúncia. Sustenta, ainda, que, quando do julgamento de recurso especial, o STJ teria extrapolado o pedido feito pelo Ministério Público estadual, haja vista que este, no agravo em execução, impugnara tão-somente a parte em que afastada a regressão no regime prisional. Na espécie, instaurou-se procedimento disciplinar para apurar o cometimento de falta grave no período em que foragido. O juízo da execução homologara o procedimento, entendera como suficiente à punição da infração disciplinar o isolamento do paciente por 30 dias, e mantivera o regime prisional aberto. Contra esta decisão, o parquet interpusera agravo que, desprovido, ensejara recurso especial, cuja decisão de provimento determinara a regressão no regime da pena e o estabelecimento de nova data-base para a concessão de futuros benefícios.

HC 96246/RS, rel. Min. Marco Aurélio, 19.10.2010. (HC-96246)

Execução de Pena e Falta Grave - 2

O Min. Marco Aurélio, relator, na sessão de 9.3.2010, concedera a ordem para tornar definitiva medida acauteladora e, com isso, restabelecer o acórdão prolatado no agravo em execução. Avaliara que as decisões do juízo e da Corte estadual não estariam a merecer censura. Ao ressaltar a estreiteza da via do recurso especial, reputara que, ante o quadro fático, não caberia o seu conhecimento. Salientara que o STJ teria potencializado a acusação criminal ao colocar em segundo plano o princípio da não-culpabilidade. Registrara que se, de um lado, não se poderia vislumbrar extravasamento do recurso do órgão ministerial — no que ficara restrito à regressão no regime de cumprimento da pena, com fixação de novo termo para alcançarem-se benefícios —, de outro, ter-se-ia a desautorização do que consignado nas instâncias de origem, a contrariar o texto constitucional referente ao princípio da não-culpabilidade. Frisara que a alusão à perda de dias remidos fizera-se de forma genérica no que mencionado o artigo da Lei de Execução Penal - LEP, não compondo esse tema a parte dispositiva da decisão do STJ.

HC 96246/RS, rel. Min. Marco Aurélio, 19.10.2010. (HC-96246)

Execução de Pena e Falta Grave - 3

Nesta assentada, o Min. Dias Toffoli, em divergência, julgou prejudicado o writ, em face da perda superveniente de seu objeto. Inicialmente, entendeu que o caso se subsumiria ao teor da Súmula Vinculante 9 [“O disposto no artigo 127 da Lei nº 7.210/1984 (Lei de Execução Penal) foi recebido pela ordem constitucional vigente, e não se lhe aplica o limite temporal previsto no caput do artigo 58”], a ensejar a denegação da ordem. Em seguida, repeliu a existência de bis in idem decorrente de simultânea decretação de perda dos dias remidos e imposição de regime de isolamento, haja vista que uma questão seria disciplinar e a outra penal. Nesse aspecto, assinalou que estaria correta a decisão emanada do STJ, que não poderia simplesmente desconsiderar as questões postas. Reputou que o conhecimento do recurso especial não implicaria revolvimento de matéria fática, porque o sentenciado: a) evadira-se durante o cumprimento de sua pena e b) fora recapturado por força de prisão em flagrante, ao praticar novo fato definido como crime doloso, pelo qual, conforme informação obtida, já teria sido condenado em primeira instância e estaria aguardando, em liberdade, a apreciação do recurso interposto contra a sentença condenatória. Mencionou que a fuga revelaria causa suficiente para o reconhecimento de cometimento de falta grave, a ensejar, por si só, a regressão de regime prisional. Frisou que a perda dos dias remidos seria conseqüência jurídica, prevista em lei, do cometimento de falta grave. Enfatizou que obtivera, por meio da consulta de juiz auxiliar de seu gabinete ao juiz da execução, a notícia de que o paciente encontrar-se-ia, desde 9.11.2009, em liberdade condicional, por força de decisão proferida em execução, com término de cumprimento de pena previsto para 21.12.2010. Assentou que, ante a superveniente concessão da liberdade — sem que eventual denegação da ordem e restabelecimento da decisão do STJ, nesta altura, tivesse algum efeito prático sobre o benefício —, o writ estaria prejudicado, por ausência de objeto, eis que buscaria, exclusivamente, o restabelecimento do regime prisional aberto. Concluiu que se tornaria despiciendo qualquer debate em torno do direito à concessão de regime prisional mais brando na execução criminal atualmente em curso, sem prejuízo de eventual revogação do livramento e readequação do regime prisional por força de condenação posterior a ele imposta, cuja execução, todavia, ainda não se iniciara. A Turma, então, determinou a juntada das certidões relativas à atual situação do paciente, já colhidas pelo juiz auxiliar do Min. Dias Toffoli. Após, diante do fato novo suscitado, pediu vista o Min. Marco Aurélio.

HC 96246/RS, rel. Min. Marco Aurélio, 19.10.2010. (HC-96246)

Recâmbio de Preso e Inércia Estatal

A 1ª Turma, por maioria, não conheceu de habeas corpus, mas concedeu a ordem, de ofício, para o fim de revogar a prisão preventiva decretada em ação penal de comarca do interior de Pernambuco, com a determinação de expedição de alvará de soltura clausulado. Na espécie, o paciente fora denunciado por homicídio quadruplamente qualificado, supostamente cometido naquela unidade federativa, sendo preso em 20.1.2009, em São Paulo, sem que providenciado, até o mês de setembro deste ano, o seu recâmbio àquela comarca. A impetração pleiteava a revogação da custódia preventiva em virtude de ausência de fundamentação idônea e excesso de prazo. Asseverou-se que, embora houvesse motivação adequada para a segregação cautelar do paciente, a situação dos autos apresentaria peculiaridade. Aduziu-se que, de acordo com informações obtidas junto ao juízo processante, o feito ficara paralisado desde a prisão do paciente. Fora produzida apenas antecipação da prova acusatória, e facultada à defesa a realização de interrogatório por precatória na capital paulista. Em razão disso, apontou-se a aparente irregularidade do caso, pois não haveria a indicação de que teria ocorrido formal intimação para o oferecimento de defesa prévia e de apresentação de rol de testemunhas e, ainda, porque não incumbiria à defesa requerer a providência do interrogatório. Enfatizou-se que, apesar da gravidade do crime imputado ao paciente, sua liberdade individual não poderia ficar ao arbítrio do Estado-acusador, quanto ao andamento, ou não, do processo. Destacou-se a inércia estatal em recambiar de ofício o réu. Reputou-se que a demora no desfecho da ação penal não poderia ser debitada à defesa e que o juízo processante desconsiderara recomendação da Corte pernambucana no sentido de priorizar o recâmbio do réu àquela comarca. Vencidos os Ministros Ricardo Lewandowski, quanto à concessão de ofício, e Marco Aurélio, que conhecia do writ e concedia a ordem ante o excesso de prazo.

HC 104667/PE, rel. Min. Dias Toffoli, 19.10.2010. (HC-104667)

SEGUNDA TURMA

Roubo: Emprego de Arma de Fogo e Causa de Aumento

É desnecessária a apreensão e a perícia da arma de fogo para caracterizar a majorante prevista no art. 157, § 2º, I, do CP, se por outros meios for comprovado seu emprego na prática criminosa. A 2ª Turma, em homenagem aos princípios da segurança jurídica e da colegialidade, e para evitar decisões díspares entre as Turmas, deliberou acompanhar essa orientação, formalizada pelo Plenário no julgamento do HC 96099/RS (DJe de 5.6.2009) e, em conseqüência, indeferiu habeas corpus em que sustentada a necessidade de apreensão e perícia de arma de fogo para fins de verificação da sua potencialidade lesiva e conseqüente incidência da referida causa de aumento. Consignou-se que tal entendimento já vinha sendo adotado pela 1ª Turma e que a 2ª Turma teria, em casos análogos, sufragado tese em sentido diametralmente oposto após a prolação do citado paradigma. Os Ministros Gilmar Mendes, relator, e Celso de Mello ressalvaram sua convicção pessoal.

HC 103046/RJ, rel. Min. Gilmar Mendes, 19.10.2010. (HC-103046) HC 104984/RS, rel. Min. Gilmar Mendes, 19.10.2010. (HC-103046)

Roubo: Emprego de Arma Branca e Causa de Aumento

Ao aplicar a orientação anteriormente exposta, a 2ª Turma indeferiu habeas corpus em que a defesa pretendia fosse anulada condenação imposta ao paciente pela prática de roubo circunstanciado pelo emprego de arma branca (CP, art. 157, § 2º, I), sem que o referido instrumento tivesse sido apreendido e periciado.

HC 100854/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, 19.10.2010. (HC-100854)

Crime Militar praticado por Civil e Competência

A 2ª Turma deferiu habeas corpus para extinguir a ação penal instaurada contra civil pela suposta prática do crime de dano contra o patrimônio castrense (CPM, art. 259), consistente na colisão de veículo automotor, por ele conduzido, com uma viatura militar. Aduziu-se que a materialização do delito militar perpetrado por civil, em tempo de paz, seria de caráter excepcional e que a Corte teria firmado entendimento segundo o qual o art. 9º do CPM deve ser interpretado restritivamente, no sentido da necessidade de haver deliberada intenção de ofensa a bens jurídicos tipicamente associados à estruturação militar ou à função de natureza castrense. Asseverou-se, no caso, que o paciente não teria manifestado tal intento, o que afastaria a competência da justiça especial. Precedente citado: CC 7040/RS (DJU de 22.11.1996).

HC 105348/RS, rel. Min. Ayres Britto, 19.10.2010. (HC-105348)

HC e Transferência de Presídio

A 2ª Turma indeferiu habeas corpus em que pretendida a transferência de interno do sistema prisional a presídio distinto do que se encontra e mais perto da residência de seus familiares. Alegava a impetração que estabelecimento em que ora cumprida a pena seria destinado ao recolhimento de presos de alta periculosidade, o que não seria o caso do paciente. Aduziu-se que a via estreita do writ não seria adequada para analisar os fundamentos pelos quais o paciente fora encaminhado à unidade prisional tida como de maior rigor. Reputou-se, ademais, que a defesa não teria formulado nenhum pedido de transferência em favor do apenado perante o juízo das execuções, ao qual caberia analisar o pleito, pois mais próximo da realidade factual. Entretanto, observou-se que o simples fato de o paciente estar condenado a delitos tipificados como de gravidade elevada não obstaria, por si só, a possibilidade de ser transferido para um presídio não distante de sua família, considerada a base da sociedade e dotada de especial proteção por parte do Estado (CF, art. 226).

HC 101540/SP, rel. Min. Ayres Britto, 19.10.2010. (HC-101540)

HC: Prescrição e Redimensionamento da Pena

A 2ª Turma indeferiu habeas corpus em que se sustentava a extinção da pretensão executória de pena in concreto de 6 anos, pois já transcorridos mais de 12 anos entre a sentença condenatória e o redimensionamento da pena pelo STJ. Reputou-se que o redimensionamento da pena, em sede de habeas corpus, não influiria na contagem da prescrição, porquanto inexistente, dentre os marcos interruptivos desta (CP, art. 117), decisão proferida na via mandamental. Ao salientar que medida de igual natureza a presente somente fora distribuída ao STJ mais de 9 anos após o trânsito em julgado do acórdão da Corte estadual, concluiu-se que entender de outra forma possibilitaria que todos os condenados aguardassem o período que bem pretendessem para tentar obter, por meio de habeas corpus, redução da pena e a conseqüente prescrição retroativa.

HC 92717/RJ, rel. Min. Gilmar Mendes, 19.10.2010. (HC-92717)

Pena de Multa e Súmula 719 do STF

A 2ª Turma indeferiu habeas corpus em se pleiteava a aplicação de multa, em substituição à pena privativa de liberdade imposta a condenado a 1 ano de reclusão, ao argumento de ser mais benéfica ao paciente do que a pena restritiva de direitos, consoante Enunciando 719 da Súmula do STF (“A imposição do regime de cumprimento mais severo do que a pena aplicada permitir exige motivação idônea.”). Entendeu-se que o referido Verbete não diria respeito a penas restritivas de direitos, mas ao regime de cumprimento de pena privativa de liberdade. Além disso, considerou-se que o juiz não estaria obrigado a substituir a pena privativa de liberdade por pena de multa (CP, art. 44, § 2º). Ressaltou-se que este órgão julgador, em precedente firmado no HC 83092/RJ (DJU de 29.8.2003), já se pronunciara no sentido da impossibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por multa nas hipóteses de condenação superior a 6 meses. Ademais, afirmara que: a) se a pena imposta ultrapassar 6 meses e for menor ou igual a 1 ano deverá ser aplicada uma restritiva de direitos; b) se superior a esse tempo, duas restritivas de direitos.

HC 98995/RS, rel. Min. Gilmar Mendes, 19.10.2010. (HC-98995)

Tráfico de Drogas: Combinação de Leis e Princípio do “Ne Reformatio in Pejus”

A 2ª Turma indeferiu habeas corpus impetrado contra acórdão do STJ que determinara ao Juízo das Execuções que aplicasse à pena de condenado, como incurso no art. 12 da Lei 6.368/76, a causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006, no montante de 1/6 a 2/3, até o limite de 1 ano e 8 meses de reclusão. No caso, a defesa insurgia-se contra a fixação desse limite de redução, porquanto utilizada a pena mínima cominada em abstrato do art. 33 da Lei 11.343/2006 (5 anos de reclusão), mas não aquela em vigor à época dos fatos (3 anos de reclusão). Reputou-se não ser possível combinar dispositivos contidos em ambos os diplomas, sob pena de invasão da competência do Poder Legislativo e ofensa, por conseguinte, ao princípio constitucional da separação dos Poderes. Salientou-se que, muito embora o ato apontado como coator tivesse permitido a combinação de leis, contrariando entendimento fixado por esta Corte, ele não poderia ser desconstituído, em obediência ao princípio do ne reformatio in pejus. Precedentes citados:

HC 96884/MS (DJe de 5.2.2010) e RHC 101278/RS, (DJe de 21.5.2010). HC 97221/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, 19.10.2010. (HC-97221)

Acumulação de Cargos e Demissão - 1

A 2ª Turma desproveu recurso ordinário em mandado de segurança impetrado em favor de médico demitido por acumular 4 vínculos profissionais, sendo 2 com o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, 1 com a Prefeitura de Eldorado do Sul/RS e outro com a Prefeitura de São Leopoldo/RS. O recorrente alegava que o § 5º do art. 133 da Lei 8.112/90 lhe asseguraria o direito de optar por uma combinação lícita de cargos públicos até o momento da apresentação da defesa no procedimento administrativo (“§ 5o A opção pelo servidor até o último dia de prazo para defesa configurará sua boa-fé, hipótese em que se converterá automaticamente em pedido de exoneração do outro cargo”). Sustentava, ainda, que teria sido desconsiderada a opção oferecida junto com a defesa escrita; que o vínculo funcional com a Prefeitura de São Leopoldo apresentava caráter emergencial, não se prestando para impedir a acumulação de cargo; e por fim, que a entrega de pedido de exoneração dos cargos às prefeituras seria suficiente para se reconhecer a boa-fé.

RMS 26929/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 19.10.2010. (RMS-26929)

Acumulação de Cargos e Demissão - 2

Ressaltou-se que, em 9.6.2003, o recorrente reconhecera que sua situação funcional era irregular e se comprometera a apresentar a exoneração dos cargos ocupados nos Municípios de Eldorado do Sul e de São Leopoldo. Não obstante, em 3.11.2003, ele fora readmitido, por meio de contrato emergencial, como médico da Prefeitura de São Leopoldo. Observou-se que o § 5º do art. 133 da Lei 8.112/90 não socorreria o recorrente. Aduziu-se, tendo em conta, inclusive, que o recorrente residiria na capital, que caberia a ele demonstrar que o recebimento do termo de opção fora protocolado tempestivamente,ou seja, dentro do prazo de 5 dias do recebimento da citação — para apresentar defesa e fazer a opção pelo cargo público. Consignou-se, entretanto, que a cópia da defesa escrita acusara o seu recebimento pelo INSS somente em 24.5.2004, 12 dias depois da data que constaria do mandado de citação. Asseverou-se que, muito embora a Lei 8.112/91 preveja uma caracterização impositiva da boa-fé, dever-se-ia registrar que o recorrente tivera a oportunidade de corrigir a situação quase um ano antes do prazo para apresentação da defesa. Ademais, rejeitou-se a assertiva de que o caráter emergencial do contrato assumido com a Prefeitura de São Leopoldo afastaria a ilicitude da cumulação. Destacou-se, no ponto, que o dispositivo constitucional que trata de acumulação de cargos para a área de saúde não faz distinção entre contratos permanentes e não permanentes (“Art. 37... XVI - é vedada a acumulação remunerada de cargos públicos, exceto, quando houver compatibilidade de horários, observado em qualquer caso o disposto no inciso XI. ... c) a de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde, com profissões regulamentadas”). Por fim, concluiu-se que a mera entrega do pedido de exoneração não seria suficiente para desfazer o vínculo funcional, porquanto o recorrente contrariara a expectativa oferecida à Administração ao não se desligar dos cargos, tendo, ao contrário, assumido novo contrato junto à Prefeitura de São Leopoldo.

RMS 26929/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 19.10.2010. (RMS-26929)