Informativo do STF 595 de 13/08/2010
Publicado por Supremo Tribunal Federal
PLENÁRIO
Crime contra o Sistema Financeiro Nacional e Autoria - 7
Por reputar presentes indícios suficientes de autoria e de materialidade, o Tribunal, por maioria, recebeu denúncia contra ex-Governador de Estado, atual Senador, e outras três pessoas pela suposta prática do crime previsto no art. 20 da Lei 7.492/86, os quais teriam aplicado, em finalidade diversa da prevista, recursos provenientes de financiamento concedido, à República Federativa do Brasil, pelo BIRD - Banco Internacional para a Reconstrução e o Desenvolvimento. Na espécie, a União, mediante convênio, transferira ao Governo do Estado de Rondônia parte desses recursos, a fim de que fossem integralmente utilizados na execução do Plano Agropecuário e Florestal de Rondônia - PLANAFLORO — v. Informativos 464, 535 e 572. Asseverou-se, inicialmente, que o argumento de atipicidade da conduta, por ausência de dolo, seria questão a ser aferida no bojo da ação penal e que a denúncia não teria imputado aos acusados uma ordenação de despesa indevida, e sim a ilícita transferência de recursos que deveriam ser aplicados estritamente no PLANAFLORO e foram desviados para a Conta do Tesouro Estadual. Aduziu-se que o Senador denunciado, então Governador do referido Estado, comprometera-se, no Termo Simplificado de Convênio, na qualidade de convenente, a aplicar os recursos discriminados exclusivamente na consecução do objeto, tendo sido descrito, ainda, no anexo 1 do aludido convênio, como responsável pelo plano de trabalho. Além disso, constariam da denúncia documentos apontando para a materialidade do delito e contendo indícios de autoria contra os acusados. Ressaltou-se, ademais, que, pairando dúvida quanto à possibilidade de os outros denunciados com o Senador — à época dos fatos, o Secretário da Fazenda do Estado, o Coordenador do PLANAFLORO e a Chefe do seu Departamento Financeiro — terem agido com conhecimento e, mais, sob a determinação do então Governador, não seria adequado acolher, de plano, antes da instrução criminal, a tese defensiva. Considerou-se, por fim, que a alegação de inexistência de vínculo contratual de financiamento entre o BIRD e o Estado de Rondônia seria irrelevante, haja vista que os recursos supostamente desviados seriam, de fato, provenientes do financiamento concedido por instituição financeira, nos exatos termos do art. 20 da Lei 7.429/86. Vencidos os Ministros Gilmar Mendes, Dias Toffolli, Ricardo Lewandowski, Ellen Gracie e Cezar Peluso, que rejeitavam a denúncia. Inq 2027/RO, rel. Min. Joaquim Barbosa, 12.8.2010. (Inq-2027)
REPERCUSSÃO GERAL
Base de Cálculo da CSLL e da CPMF: Receitas Oriundas das Operações de Exportação - 5
A Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL e a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira - CPMF não são alcançadas pela imunidade sobre as receitas decorrentes de exportação prevista no inciso I do § 2º do art. 149 da CF, incluído pela EC 33/2001 (“Art. 149. ... § 2º. As contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico de que trata o ‘caput’ deste artigo... I - não incidirão sobre as receitas decorrentes de exportação;”). Com base nessa orientação, o Tribunal, por maioria, desproveu o RE 564413/SC, em que se alegava que a referida imunidade abarcaria a CSLL — v. Informativos 531 e 594. No ponto, prevaleceu o voto do Min. Marco Aurélio, relator. Ele asseverou que, se ficasse entendido que o vocábulo receita, tal com previsto no inciso I do § 2º do art. 149 da CF, englobaria o lucro, acabar-se-ia aditando norma a encerrar benefício para o contribuinte considerada certa etapa, além de deixar capenga o sistema constitucional, no que passaria a albergar a distinção entre receita e lucro, em face da incidência da contribuição social para as pessoas jurídicas em geral (CF, art. 195) e, de forma incongruente, a alusão explícita à receita a ponto de alcançar, também, o lucro quanto a certo segmento de contribuintes — os exportadores. Ressaltou que a EC 33/2001 fora editada à luz do texto primitivo da Carta Federal, não se podendo, em interpretação ampliativa, a ela conferir alcance que com este se mostrasse em conflito. Afirmou que o princípio do terceiro excluído, bem como o sistema constitucional até aqui proclamado pelo Tribunal afastariam a visão de se assentar que, estando o principal — a receita — imune à incidência da contribuição, também o estaria o acessório — o lucro. Concluiu que o legislador poderia ter estendido ainda mais a imunidade, mas, mediante opção político-legislativa constitucional, não o fez, não cabendo ao Judiciário esta tarefa. Vencidos os Ministros Gilmar Mendes, Cármen Lúcia, Eros Grau, Celso de Mello e Cezar Peluso (Presidente), que proviam o recurso.
RE 474132/SC, rel. Min. Gilmar Mendes, 12.8.2010. (RE-474132) RE 564413/SC, rel. Min. Marco Aurélio, 12.8.2010. (RE-564413)
Base de Cálculo da CSLL e da CPMF: Receitas Oriundas das Operações de Exportação - 6
De igual modo, por maioria, o Tribunal também desproveu o RE 474132/SC, no qual se pleiteava o reconhecimento da imunidade relativamente à CSLL e à CPMF. No tocante à CSLL, ficaram vencidos os Ministros Gilmar Mendes, relator, Cármen Lúcia, Eros Grau, Celso de Mello e Cezar Peluso (Presidente). Quanto à CPMF, prevaleceu o voto do Min. Gilmar Mendes, relator, no sentido de não enquadrá-la na hipótese de imunidade em questão, visto que ela não se vincularia diretamente à operação de exportação, mas a operações posteriormente realizadas, nos termos do art. 2º da Lei 9.311/96. Observou que a exportação, tomada isoladamente, não constituiria fato gerador para a cobrança da CPMF, conforme disposto na aludida lei. Acrescentou que, se fosse o caso de haver imunidade, ela seria garantida ao exportador apenas na operação de entrada do numerário no país, e, após esse primeiro momento, haveria a incidência da CPMF, pois a imunidade não marcaria o resultado da operação indeterminadamente. Assim, uma vez configurada a entrada no país da receita provinda da exportação, igualar-se-iam esses valores a qualquer outro existente no território nacional, de modo a submeter-se às regras pertinentes, inclusive à incidência da CPMF. Vencidos os Ministros Marco Aurélio e Menezes Direito.
RE 474132/SC, rel. Min. Gilmar Mendes, 12.8.2010. (RE-474132) RE 564413/SC, rel. Min. Marco Aurélio, 12.8.2010. (RE-564413)
Art. 149, § 2º, I, da CF e CPMF - 2
Ao aplicar o entendimento acima firmado, o Tribunal, por maioria, desproveu recurso extraordinário no qual se sustentava que a imunidade das receitas decorrentes de exportação, prevista inciso I do § 2º do art. 149 da CF, incluído pela EC 33/2001, abrangeria a CPMF — v. Informativo 532. Vencidos os Ministros Marco Aurélio e Cezar Peluso (Presidente), que lhe davam provimento.
RE 566259/RS, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 12.8.2010. (RE-566259)
Legitimidade do Ministério Público: Ação Civil Pública e Anulação de TARE - 5
O Ministério Público tem legitimidade para propor ação civil pública com o objetivo de anular Termo de Acordo de Regime Especial - TARE firmado entre o Distrito Federal e empresas beneficiárias de redução fiscal. Com base nesse entendimento, o Tribunal, por maioria, proveu recurso extraordinário interposto contra acórdão do STJ que afastara essa legitimidade — v. Informativos 510, 545 e 563. Na espécie, alegava o Ministério Público, na ação civil pública sob exame, que a Secretaria de Fazenda do Distrito Federal, ao deixar de observar os parâmetros fixados no próprio Decreto regulamentar, teria editado a Portaria 292/99, que estabeleceu percentuais de crédito fixos para os produtos que enumera, tanto para as saídas internas quanto para as interestaduais, reduzindo, com isso, o valor que deveria ser recolhido a título de ICMS. Sustentava que, ao fim dos 12 meses de vigência do acordo, o Subsecretário da Receita do DF teria descumprido o disposto no art. 36, § 1º, da Lei Complementar federal 87/96 e nos artigos 37 e 38 da Lei distrital 1.254/96, ao não proceder à apuração do imposto devido, com base na escrituração regular do contribuinte, computando eventuais diferenças positivas ou negativas, para o efeito de pagamento. Afirmava, por fim, que o TARE em questão causara prejuízo mensal ao DF que variava entre 2,5% a 4%, nas saídas interestaduais, e entre 1% a 4,5%, nas saídas internas, do ICMS devido.
RE 576155/DF, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 12.8.2010. (RE-576155)
Legitimidade do Ministério Público: Ação Civil Pública e Anulação de TARE - 6
Entendeu-se que a ação civil pública ajuizada contra o citado TARE não estaria limitada à proteção de interesse individual, mas abrangeria interesses metaindividuais, pois o referido acordo, ao beneficiar uma empresa privada e garantir-lhe o regime especial de apuração do ICMS, poderia, em tese, implicar lesão ao patrimônio público, fato que, por si só, legitimaria a atuação do parquet, tendo em conta, sobretudo, as condições nas quais celebrado ou executado esse acordo (CF, art. 129, III). Reportou-se, em seguida, à orientação firmada pela Corte em diversos precedentes no sentido da legitimidade do Ministério Público para ajuizar ações civis públicas em defesa de interesses metaindividuais, do erário e do patrimônio público. Asseverou-se não ser possível aplicar, na hipótese, o parágrafo único do art. 1º da Lei 7.347/85, que veda que o Ministério Público proponha ações civis públicas para veicular pretensões relativas a matérias tributárias individualizáveis, visto que a citada ação civil pública não teria sido ajuizada para proteger direito de determinado contribuinte, mas para defender o interesse mais amplo de todos os cidadãos do Distrito Federal, no que respeita à integridade do erário e à higidez do processo de arrecadação tributária, o qual apresenta natureza manifestamente metaindividual. No ponto, ressaltou-se que, ao veicular, em juízo, a ilegalidade do acordo que concede regime tributário especial a certa empresa, bem como a omissão do Subsecretário da Receita do DF no que tange à apuração do imposto devido, a partir do exame da escrituração do contribuinte beneficiado, o parquet teria agido em defesa do patrimônio público. Vencidos os Ministros Menezes Direito, Cármen Lúcia, Eros Grau e Gilmar Mendes que negavam provimento ao recurso.
RE 576155/DF, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 12.8.2010. (RE-576155)
PRIMEIRA TURMA
Não conhecimento de HC: “Exequatur” e Auxílio Judiciário - 1
Por reputar não configurado risco à liberdade de locomoção do paciente, a Turma, em votação majoritária, não conheceu de habeas corpus impetrado contra decisão da Presidência do STJ que concedera exequatur a carta rogatória expedida pelo Tribunal de Grande Instância de Paris. Na situação em apreço, o paciente e membros de sua família figuram como investigados pela suposta prática do crime de lavagem de dinheiro em procedimento instaurado no país rogante, o qual solicitara às autoridades brasileiras a realização de interrogatórios, a inquirição de testemunhas, o exame e a extração de cópias de documentos constantes de processos no Brasil em que envolvidos os demandados, bem como a remessa de parte da sua movimentação bancária. A impetração argumentava: a) descompasso do exequatur com a ordem constitucional brasileira; b) litispendência entre o procedimento francês e ação penal em curso no STF; c) ausência, na rogatória, de cópia integral das peças do aludido procedimento; d) negativa de vista dos autos ao advogado constituído pelo paciente, em ofensa aos princípios do contraditório e da ampla defesa; e) conseqüente desconhecimento dos fatos que envolvem as acusações dirigidas ao paciente e f) transgressão ao art. 3º, item 1, do Acordo de Cooperação Judiciária celebrado entre o Brasil e a França, objeto do Decreto 3.324/99, que condiciona a produção de provas requeridas pelo Estado rogante à observância da legislação local.
HC 97511/SP, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 10.8.2010. (HC-97511)
Não conhecimento de HC: “Exequatur” e Auxílio Judiciário - 2
Entendeu-se que, na espécie, tratar-se-ia de um mero pedido de auxílio judiciário, uma vez que a rogatória apenas pretendia a obtenção de provas a instruir procedimento em curso na França. Ademais, enfatizou-se que o paciente não poderá ser extraditado, porquanto é brasileiro nato. Consignou-se, ainda, que, mesmo que fosse possível adentrar o mérito do writ, as alegações da defesa não prosperariam. Primeiramente, mencionou-se que, para a concessão de exequatur das rogatórias, não seria preciso investigar em profundidade o mérito da causa originária, dado que as questões que o envolvem devem ser postas perante a Justiça estrangeira. Desse modo, afirmou-se irrelevante averiguar, para fins de concessão de exequatur, se o advogado do paciente tivera, ou não, acesso aos autos objeto de investigação na França. Acrescentou-se, no ponto, a inexistência de provas quanto à suposta negativa de vista. Rejeitou-se, também, a aludida litispendência, porquanto o procedimento no país rogante encontrar-se-ia em fase de investigação, não constituindo um processo penal. Além disso, registrou-se a desnecessidade de que a rogatória fosse instruída com todos os documentos referentes ao caso, sendo suficiente a narrativa razoável dos fatos envolvidos. Por fim, aduziu-se que as diligências requeridas pelas autoridades francesas estariam previstas também no ordenamento pátrio, a afastar a assertiva de ofensa à soberania ou à ordem interna. Vencido o Min. Marco Aurélio que admitia o writ por considerar pertinente o receio do paciente de vir a sofrer futuramente um ato de constrição de sua liberdade, se vier a viajar à França.
HC 97511/SP, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 10.8.2010. (HC-97511)
Princípio da Insignificância e Crime de Roubo - 2
Em conclusão de julgamento, a Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus no qual a Defensoria Pública da União pleiteava o reconhecimento do princípio da insignificância em favor de condenado por roubo majorado pelo concurso de pessoas (CP, art. 157, § 2º, II) — v. Informativo 567. Na espécie o paciente, em companhia de dois adolescentes, empregara grave ameaça, simulando portar arma de fogo sob a camiseta, e subtraíra a quantia de R$ 3,25. Enfatizou-se que, apesar de ínfimo o valor subtraído, houvera concurso de pessoas, dentre as quais adolescentes, o que agravaria o contexto. Reportou-se, ademais, à jurisprudência do STF no sentido de ser inaplicável o princípio da insignificância ao delito de roubo. O Min. Ayres Britto destacou que o reconhecimento do mencionado princípio, na situação concreta dos autos, poderia servir como estímulo à prática criminosa. Vencido o Min. Marco Aurélio que deferia o writ por concluir pela insignificância do procedimento, ante a peculiaridade da situação.
HC 97190/GO, rel. Min. Dias Toffoli, 10.8.2010. (HC-97190)
Tráfico de Drogas: Liberdade Provisória e Progressão de Regime
A Turma concedeu, de ofício, habeas corpus para que o juízo competente examine os requisitos necessários à obtenção da progressão de regime a condenado à pena de 10 anos de reclusão, em regime inicialmente fechado, por tráfico ilícito de entorpecentes e associação para o tráfico (Lei 11.343/2006, artigos 33 e 35). Na espécie, o paciente — preso em flagrante delito em 1º.2.2007 — permanecera enclausurado durante todo o processo. A impetração pleiteava o direito dele de recorrer em liberdade da condenação, não transitada em julgado, imposta pelo juízo de primeiro grau. Alegava, ainda, que a manutenção da prisão cautelar ocorrera sem a devida fundamentação legal. Preliminarmente, denegou-se a ordem. Reafirmou-se a jurisprudência da 1ª Turma, no sentido de ser vedada a concessão de liberdade provisória aos presos em flagrante por tráfico de drogas, não havendo ilegalidade na manutenção da custódia daquele que respondera a ação penal nessa condição. Por outro lado, observou-se que o paciente cometera o delito antes do advento da Lei 11.464/2007; já teria permanecido em regime fechado por mais de 1/6 da pena aplicada e que somente a defesa desta recorrera. Alguns precedentes citados:
HC 92747/SP (DJE de 25.4.2008); HC 98340/MG (DJE de 23.10.2009); HC 92612/PI (DJE de 11.4.2008); HC 101483/GO (DJE de 14.5.2010). HC 98679/SP, rel. Min. Dias Toffoli, 10.8.2010. (HC-98679)
Suspensão de Prazo: Portaria do STJ e Tempestividade
A Turma deferiu habeas corpus para reconhecer a tempestividade de embargos de declaração opostos pela paciente e determinar ao STJ que prossiga com o regular processamento do recurso. Tratava-se de writ impetrado contra acórdão daquela Corte que reputara intempestivos embargos de declaração em feito criminal, protocolizados em 2.2.2007, opostos em face de acórdão que desprovera agravo regimental em agravo de instrumento, publicado em 18.12.2006. O STJ, tendo em conta a entrada em vigor da EC 45/2004 (DOU de 31.12.2004) — que vedara as férias coletivas nos juízos e tribunais de segundo grau e determinara a não-interrupção da atividade jurisdicional —, entendera que “o prazo final para a interposição dos embargos declaratórios, considerando o recesso forense, seria o dia 02/01/2007”, não havendo mais a suspensão do prazo recursal no período de férias forenses. Consignou-se que o próprio STJ publicara a Portaria 191, de 5.12.2006, na qual ficara explicitamente definida a suspensão dos prazos para recursos a partir de 20.12.2006, voltando a fluir em 1º.2.2007. Ressaltou-se que a referida portaria, ao fixar expressamente a suspensão, induzira a parte em erro. Assim, ao considerar a jurisprudência do STF — segundo a qual a regra da contagem dos prazos recursais, prevista no art. 798 do CPP, pressupõe o funcionamento regular da Justiça —, e o teor da Portaria 191/2006, concluiu-se pela tempestividade dos embargos. Alguns precedentes citados:
HC 100344/RJ (DJE de 6.11.2009); HC 89827/SP (DJU de 27.4.2007); HC 69522/GO (DJU de 18.12.92). HC 99206/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, 10.8.2010. (HC-99206)
Serventia Extrajudicial: Aposentadoria Compulsória e Novo Titular Concursado - 1
Por considerar que a decisão questionada se limitara a aplicar pacífica jurisprudência do STF, a Turma, em votação majoritária, recebeu embargos de declaração como agravo regimental — vencido, no ponto, o Min. Marco Aurélio — e o denegou, à unanimidade, para manter a concessão da segurança. Impugnava-se, no caso, decisão monocrática do Min. Dias Toffoli que, ao prover recurso extraordinário do qual relator, declarara a nulidade de portaria que decretara a aposentadoria compulsória, aos 70 anos, de oficial de registro. Na ocasião, o relator salientara a inconstitucionalidade da aludida portaria, haja vista a orientação firmada pela Corte no julgamento da ADI 2602/MG (DJU de 31.3.2006), em que assentada a inaplicabilidade da aposentação compulsória, prevista no art. 40, §1º, II, da CF, a notários e registradores. O atual ocupante da serventia, ora embargante, alegava que: a) a decisão recorrida padecera de omissão, ao não se referir à questão concernente à situação dele, na condição de litisconsorte passivo necessário, que prestara concurso público e, assim, assumira a serventia; b) o impetrante — oficial registrador aposentado — não postulara a integração do concursado ao pólo passivo da ação mandamental, o qual nela ingressara voluntariamente, depois de proferida sentença de primeiro grau denegatória da segurança. Pleiteava, ainda, a sua permanência na serventia, em respeito aos princípios da segurança jurídica, do direito adquirido e da boa-fé. Alegava que o embargado se insurgira apenas contra o ato de aposentadoria, mas não contra o concurso — por meio do qual aquele fora investido — que se seguira depois de declarada a vacância da serventia. Ademais, o embargante afirmava que, à época dos fatos, a jurisprudência do STF estaria consolidada no sentido da aplicação da aposentadoria compulsória aos 70 anos de idade aos titulares de serventia extrajudicial, sendo irrepreensível o ato que decretara tal aposentadoria. Argumentava, também, que o Min. Eros Grau, quando da análise da mencionada ADI, reconhecera não serem os notários e registradores detentores de cargo público, o que tornaria inviável a pretendida recondução a uma serventia já ocupada por concursado, e que a Lei 8.935/94 assim disporia, de modo a vedar tal reintegração administrativa.
RE 556504 ED/SP, rel. Min. Dias Toffoli, 10.8.2010. (RE-556504)
Serventia Extrajudicial: Aposentadoria Compulsória e Novo Titular Concursado - 2
Inicialmente, rejeitou-se a apontada nulidade do feito, por ausência de citação do concursado na condição de litisconsorte passivo necessário, haja vista tratar-se de matéria de índole infraconstitucional, já devidamente decidida pelo STJ, detentor da competência constitucional para sua análise, não havendo que se falar em omissão do julgado. Asseverou-se que o agravado deveria ser reconduzido ao cargo que ocupava, cabendo ao agravante demandar contra o Estado. Reputou-se não haver se falar em ofensa ao princípio da boa-fé ou mesmo ao direito adquirido, pois o agravante pudera escolher dentre diversas serventias vagas, sendo lícito supor que procedera (ou deveria ter procedido) a uma ampla investigação sobre os diversos aspectos relacionados ao cartório em que pretendesse fazer incidir sua escolha. Além disso, observou-se que o agravante mantivera estreito contato com o agravado, com quem negociara diretamente a aquisição do mobiliário, não podendo alegar, destarte, que ignorava que este buscava a reversão do decreto da aposentadoria, o que afastaria eventual ofensa ao princípio da segurança jurídica. Destacou-se, ainda, que a ação mandamental fora impetrada logo após a decretação da aposentadoria, quando sequer havia sido conferida a outorga ao agravante, o que impediria, por conseguinte, que a impetração se voltasse contra este ato. Explicitou-se que a vacância decorrera diretamente da aposentadoria e a anulação desta, abarcaria, necessariamente, os atos que a seguiram, como decorrência lógica. Dessa forma, a outorga conferida ao agravante, não obstante derivada de regular aprovação em concurso público de títulos e provas, por estar sujeita ao resultado do julgamento do processo ajuizado pelo agravado, não poderia subsistir à nulidade do ato que concedera a aposentadoria. Reiterou-se que o embargante não possuiria direitos a serem resguardados no âmbito do referido mandamus. Consignou-se, por fim, que a aludida ação direta reconhecera a inconstitucionalidade de ato similar ao objeto desta impetração, pouco importando, para a sorte da demanda, a natureza de detentor de cargo público, e que o disposto na Lei 8.935/94, acerca de “reintegração administrativa”, não obstaria uma determinação de reintegração por ordem judicial, como a proferida neste feito.
RE 556504 ED/SP, rel. Min. Dias Toffoli, 10.8.2010. (RE-556504)
SEGUNDA TURMA
Art. 290 do CPM e Princípio da Insignificância
A Turma, ao aplicar o princípio da insignificância, deferiu dois habeas corpus em favor de militares condenados pela prática do delito previsto no art. 290 do CPM (“Receber, preparar, produzir, vender, fornecer, ainda que gratuitamente, ter em depósito, transportar, trazer consigo, ainda que para uso próprio, guardar, ministrar ou entregar de qualquer forma a consumo substância entorpecente, ou que determine dependência física ou psíquica, em lugar sujeito à administração militar, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar”), surpreendidos na posse de quantidade ínfima de substância entorpecente no interior de organização militar. Considerou-se que, enquanto não concluído o julgamento do HC 94685/CE (v. Informativos 519 e 526) pelo Plenário, no qual se discute o mesmo tema versado nestas impetrações, deveria ser preservada a jurisprudência firmada pela Turma no sentido de incidir o aludido postulado nas hipóteses semelhantes às situações ora analisadas. Por fim, tendo em conta o pleito subsidiário de aplicação do art. 28 da Lei 11.343/2006, asseverou-se, que a utilização do princípio da insignificância teria efeito mais abrangente e radical.
HC 97131/RS, rel. Min. Celso de Mello, 10.8.2010. (HC-97131) HC 101759/MG, rel. Min. Celso de Mello, 10.8.2010. (HC-101759)
Estupro e Atentado Violento ao Pudor: Lei 12.015/2009 e Continuidade Delitiva
Em observância ao princípio constitucional da retroatividade da lei penal mais benéfica (CF, art. 5º, XL), deve ser reconhecida a continuidade delitiva aos crimes de estupro e atentado violento ao pudor praticados anteriormente à vigência da Lei 12.015/2009 e nas mesmas condições de tempo, lugar e maneira de execução. Com base nesse entendimento, a Turma concedeu habeas corpus de ofício para determinar ao juiz da execução, nos termos do enunciado da Súmula 611 do STF, que realize nova dosimetria da pena, de acordo com a regra do art. 71 do CP. Tratava-se, na espécie, de writ no qual condenado em concurso material pela prática de tais delitos, pleiteava a absorção do atentado violento ao pudor pelo estupro e, subsidiariamente, o reconhecimento da continuidade delitiva. Preliminarmente, não se conheceu da impetração. Considerou-se que a tese defensiva implicaria reexame de fatos e provas, inadmissível na sede eleita. Por outro lado, embora a matéria relativa à continuidade delitiva não tivesse sido apreciada pelas instâncias inferiores, à luz da nova legislação, ressaltou-se que a citada lei uniu os dois ilícitos em um único tipo penal, não mais havendo se falar em espécies distintas de crimes. Ademais, elementos nos autos evidenciariam que os atos imputados ao paciente teriam sido perpetrados nas mesmas condições de tempo, lugar e maneira de execução.
HC 96818/SP, rel. Min. Joaquim Barbosa, 10.8.2010. (HC-96818)
Prevenção: Redistribuição do Feito e Atos Decisórios
Por reputar que a prática de atos decisórios implica prevenção, mesmo que em fase pré-processual, a Turma deferiu habeas corpus impetrado em favor de denunciado perante a Justiça Militar, para declarar prevento o juiz-auditor titular da 3ª Auditoria da 3ª Circunscrição da Justiça Militar e anular a ação penal desde o recebimento da peça acusatória. Considerou-se que, no caso, após o oferecimento da denúncia, o feito teria sido redistribuído ao juiz-auditor substituto, o que violaria as regras de distribuição por prevenção, previstas na legislação processual castrense (CPPM, artigos 94 e 98, parágrafo único), e o princípio do juiz natural. Aduziu-se que a existência de portaria do juízo de origem determinando a redistribuição do processo seria irrelevante, uma vez que não poderia se sobrepor à legislação federal.
HC 99403/RS, rel. Min. Joaquim Barbosa, 10.8.2010. (HC-99403)
Deserção: Diligência e Cerceamento de Defesa
A Turma proveu recurso ordinário em habeas corpus para anular o julgamento da ação penal de origem e determinar a sua conversão em diligência para que se verifique se o recorrente preenche a condição de arrimo de família. No caso, o juízo de primeiro grau indeferira diligência, requerida pelo Ministério Público Militar, com o intuito de se apurar se o recorrente preencheria a condição de arrimo de família, de modo a ensejar a extinção da ação penal de origem, na qual o paciente é acusado da suposta prática do crime de deserção. Considerou-se que o mencionado pedido tivera por base provas colhidas ao longo da instrução processual da ação de origem, não sendo desarrazoado, desprovido de fundamento ou procrastinatório. Asseverou-se que, em realidade, cuidar-se-ia de uma questão prejudicial de mérito.
RHC 102854/RJ, rel. Min. Joaquim Barbosa, 10.8.2010. (RHC-102854)
Estelionato Previdenciário: Natureza e Prescrição
O crime de estelionato previdenciário é instantâneo de efeitos permanentes, portanto, consuma-se com o recebimento da primeira prestação do benefício indevido. De acordo com essa orientação, a Turma deferiu habeas corpus impetrado em favor de condenada à pena de dois anos de reclusão pela prática do delito descrito no art. 251 do CPM (“Art. 251. Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento”), para reconhecer a prescrição da pretensão punitiva, considerada a pena em concreto. Registrou-se que as condutas delituosas teriam se iniciado em maio de 1998 e o lapso temporal compreendido entre a consumação do ilícito e o recebimento da denúncia teria ultrapassado 4 anos.
HC 103407/RJ, rel. Min. Joaquim Barbosa, 10.8.2010.(HC-103407)
Efeito Suspensivo a RE e Repercussão Geral
A Turma referendou decisão proferida pelo Min. Celso de Mello em ação cautelar, da qual relator, que deferira medida cautelar para atribuir efeito suspensivo ao RE 601914/DF, cujo sobrestamento fora determinado até final julgamento do RE 568645/SP, em que reconhecida a repercussão geral da matéria. Trata-se, na espécie, de ação cautelar ajuizada pelo Distrito Federal, objetivando inibir a expedição de requisição de pagamento de valores supostamente devidos a servidor. Salientou-se que a questão de fundo envolveria controvérsia relativa à expedição de precatórios ou requisições referentes a débitos de pequeno valor e ao parcelamento do montante total nos casos de litisconsórcio facultativo ou de ação coletiva. Precedente citado:
AC 2074 MC/SP (DJU de 12.12.2008). AC 2639 Referendo-MC/DF, rel. Min. Celso de Mello, 10.8.2010. (AC-2639)