Informativo do STF 57 de 13/12/1996
Publicado por Supremo Tribunal Federal
PLENÁRIO
Reserva Remunerada e Acumulação
Deferida a suspensão de eficácia do inciso IV e do § 2º do art. 91 do Estatuto dos Policiais Militares do Estado do Mato Grosso do Sul (LC 53, de 30.08.90), requerida em ação direta ajuizada pelo Governador desse Estado. O Tribunal entendeu que o primeiro dispositivo, ao arrolar entre as causas de transferência ex officio para a reserva remunerada a posse do policial militar "em cargo público permanente, estranho à sua carreira, cuja função não seja a de magistério", ofende, aparentemente, o disposto no art. 42, § 3º, da CF, que prevê a transferência para a reserva - e não para a reserva remunerada - do militar em atividade que aceitar cargo público civil permanente. Quanto ao segundo preceito, que admite a possibilidade de acumulação da remuneração do referido cargo com os proventos da reserva, foi tido, à primeira vista, como incompatível com o art. 37, XVI, da CF ("é vedada a acumulação remunerada de cargos públicos, exceto..."). Precedentes citados:
RE 163204-SP (DJ de 15.03.96); MS 22182-RJ (DJ de 10.08.95). ADIn 1.541-MS, rel. Min. Octavio Gallotti, 09.12.96.
Competência para Julgamento de HC
Considera-se, em tese, coator - para efeito de justificar a competência originária do STF (CF, art. 102, i) -, o tribunal que, podendo fazê-lo de ofício, se omite em apreciar fato do qual tenha inequívoco conhecimento, passível de ser tido como favorável ao acusado. Com base nesse entendimento, o Tribunal rejeitou preliminar de não conhecimento suscitada pela Procuradoria Geral da República, a propósito de habeas corpus impetrado contra decisão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que deixara de pronunciar-se sobre a aplicação retroativa do art. 89 da Lei 9099/95 em benefício de réu condenado por sentença não transitada em julgado.
HC 74.305-SP, rel. Min. Moreira Alves, 09.12.96.
Lex Mitior: Hipótese de Não-Retroatividade
Julgando o mérito desse habeas corpus, o Tribunal afastou, por unanimidade, a aplicação do citado art. 89 a processos nos quais já proferida sentença condenatória, ainda que sem trânsito em julgado. Leia em "Transcrições" os trechos essenciais do relatório e do voto condutor do acórdão.
HC 74.305-SP, rel. Min. Moreira Alves, 09.12.96.
IPTU e Taxas do Município de São Paulo
Declarada incidentemente a inconstitucionalidade de dispositivos de lei do Município de São Paulo que estabelecem para o imposto predial e territorial urbano (IPTU) alíquotas progressivas em função do valor venal do imóvel e prevêem a cobrança de taxa pelos serviços de conservação e limpeza de rua (Lei 6989/66 com modificações introduzidas pela Lei 10921/90). No tocante às alíquotas, o Tribunal reiterou o entendimento firmado no julgamento do RE 153.771-MG (Pleno, 20.11.96; v. Informativo 54), no sentido de que a única progressividade admitida pela CF/88, em relação ao IPTU, é a extrafiscal, destinada a assegurar o cumprimento da função social da propriedade urbana, nos termos dos arts. 156, § 1º, e 182, § 4º, II, da CF. Quanto às taxas de conservação e limpeza de rua, foram elas consideradas inconstitucionais por possuírem base de cálculo própria de imposto, o que ofende o § 2º do art. 145 da CF, e pelo fato de não serem divisíveis os serviços públicos que elas visam a custear, o que ofende o inciso II do mesmo art. 145. Vencido o Min. Carlos Velloso.
RE 204.827-SP, rel. Min. Ilmar Galvão, 12.12.96.
Insumos para Produção de Jornais: Imunidade
A imunidade prevista no art. 150, VI, d, da CF (proibição de instituir impostos sobre "livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão") não alcança todos os insumos utilizados na impressão de livros, jornais e periódicos, mas somente aqueles compreendidos no significado da expressão "papel destinado a sua impressão". Com esse fundamento, julgando recursos extraordinários provenientes dos Estados de São Paulo e Rio Grande do Sul, o Tribunal afastou, por maioria de votos, a pretensão dos recorrentes (empresas jornalísticas) de excluir a incidência do ICMS na entrada das seguintes mercadorias, importadas do exterior e utilizadas na produção e distribuição de jornais: solução de base alcalina concentrada, motor de corrente contínua, "drive" de retificação de corrente e tiras de plástico para amarrar jornais. Vencidos os Ministros Carlos Velloso, relator, Marco Aurélio e Celso de Mello que estendiam a imunidade a todos os insumos necessários à produção de jornais. Precedente citado:
RREE 174476-SP e 190761-SP (v. Informativo 46). RREE 203.267-RS, 204.234-RS e 203.859-SP, rel. orig. Min. Carlos Velloso; rel. p/ ac. Min. Maurício Corrêa, 11.12.96.
PRIMEIRA TURMA
Competência do Júri
"A interpretação sistemática dos arts. 74, § 3º, 81 e 492, § 2º, do CPP, conduz à conclusão de que, negando os jurados a ocorrência de tentativa de homicídio, que funcionava como vis attractiva, passa a ser competente o Juiz presidente para o julgamento de todas as infrações remanescentes, inclusive as submetidas ao Júri ratione conexitatis. A perpetuatio jurisdictionis determinada pela norma geral do art. 81 do mencionado estatuto não se aplica ao Júri, mas aos órgãos monocráticos ou colegiados da justiça togada." Este entendimento, adotado pela 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, foi confirmado pela Turma em julgamento de habeas corpus no qual se sustentava, com a concordância do Ministério Público Federal, a ocorrência de violação à regra da perpetuatio jurisdictionis (CPP, art. 81) pelo fato de o juiz presidente do júri, em face da desclassificação para lesões corporais da tentativa de homicídio imputada aos réus, haver avocado para si o julgamento das demais infrações conexas. Precedentes citados:
HC 59487-SP (RTJ 101/997); HC 59890-SP (RTJ 102/599). HC 74.295-RJ, rel. Min. Celso de Mello, 10.12.96.
Ato Jurídico Perfeito e Retroatividade
Enquanto garantia do indivíduo contra o Estado, a regra que assegura a intangibilidade do direito adquirido e do ato jurídico perfeito (CF, art. 5º, XXXVI) não impede o Estado de dispor retroativamente, mediante lei ou simples decreto, em benefício do particular. Com base nesse entendimento, a Turma confirmou acórdão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal que, fundado em decreto do Executivo local (Dec. 10349/87), determinara a correção monetária do valor de contrato firmado com a Administração em dezembro de 1986, a despeito da inexistência de cláusula de reajuste.
RE 184.099-DF, rel. Min. Octavio Gallotti, 10.12.96.
Pedido de Adiamento e Prazo
Indeferido habeas corpus no qual se pretendia a anulação de julgamento realizado apesar de solicitação de adiamento cujo exame acabou prejudicado por não haver sido levada em tempo ao conhecimento do relator. Com base no art. 799 do CPP, que estabelece o prazo de dois dias para a prática dos atos determinados em lei ou ordenados pelo juiz, a Turma entendeu que, havendo a mencionada solicitação dado entrada no protocolo do Tribunal a quo na antevéspera da data marcada para o julgamento, não estava a secretaria obrigada a remetê-la ao relator do feito antes dessa data, de maneira que a parte, se quisesse assegurar a apreciação de seu requerimento, deveria tê-lo apresentado diretamente ao relator.
HC 74.179-SP, rel. Min. Sydney Sanches, 10.12.96.
HC: Extensão Indeferida
Indeferido habeas corpus impetrado contra decisão do STJ que negara, por três votos contra dois, a extensão de ordem concedida anteriormente pelo mesmo órgão, por empate, a co-réu do paciente. A Turma entendeu que a extensão pretendida retiraria do magistrado cuja ausência na sessão em que deferido o primeiro habeas corpus ensejara a ocorrência do empate o poder de manifestar seu ponto de vista sobre a matéria. Afastou-se, com esse fundamento, a aplicação do art. 580 do CPP ["No concurso de agentes (Código Penal, art. 25), a decisão do recurso interposto por um dos réus, se fundado em motivos que não sejam de caráter exclusivamente pessoal, aproveitará aos outros.").
HC 74.683-RJ, rel. Min. Ilmar Galvão, 10.12.96.
Competência da Justiça Federal - 1
Tanto em virtude do disposto no inciso I, como em razão do que estabelece o inciso XI do art. 109 da CF ("Aos juízes federais compete processar e julgar: I - as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras e rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho;" e "XI - a disputa sobre direitos indígenas;" ), compete à Justiça Federal de primeira instância o julgamento de ação ajuizada por particular em face da Fundação Nacional do Índio (FUNAI) - entidade autárquica federal - e de comunidade indígena, tendo por objeto área ocupada por essa comunidade.
Competência da Justiça Federal - 2
Com base nesse fundamento, a Turma conheceu e deu provimento a recursos extraordinários interpostos pela Comunidade Indígena de Jaguapiré, pela FUNAI, pelo Ministério Público Federal e pela União (que manifestara anteriormente o seu interesse no feito), contra decisão do Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso do Sul que, afirmando a competência da Justiça Estadual para o seu julgamento - à consideração de que não se cuidava, na espécie, de área indígena, mas de terras particulares invadidas pelos índios -, confirmara a procedência de ação de reintegração de posse movida contra os dois primeiros recorrentes.
RE 183.188-MS, rel. Min. Celso de Mello, 10.12.96.
Coação Inexistente
Se o STF acolhe pedido de habeas corpus e determina que o tribunal a quo complemente o julgamento da apelação no tocante à concessão do sursis, esse tribunal atua corretamente ao limitar-se, na continuação do julgamento, ao exame dessa questão, não se podendo imputar a uma decisão proferida dentro de tais limites constrangimento pela não aplicação de lei superveniente supostamente mais favorável ao réu. Com base nesse entendimento, a Turma indeferiu pedido de habeas corpus no qual se alegava que o tribunal apontado como coator, ao completar o julgamento da apelação, deixara de aplicar o art. 89 da Lei 9099/95.
HC 74.552-SP, rel. Min. Octavio Gallotti, 10.12.96,
SEGUNDA TURMA
Cabimento de Habeas Corpus
O art. 102, II, a, da CF, que prevê a competência do STF para julgar em recurso ordinário o habeas corpus decidido em única instância pelos Tribunais Superiores, se denegatória a decisão, não impede que contra tal decisão se impetre diretamente perante o STF novo pedido de habeas corpus, nos termos do art. 102, I, i, da CF. Precedente citado:
HC 73.598-RN (DJU de 20.09.96). HC 73.423-RJ, rel. Min. Francisco Rezek, 10.12.96.
Reunião ou Separação de Processos
O art. 82, do CPP ("Se, não obstante a conexão ou continência, forem instaurados processos diferentes, a autoridade de jurisdição prevalente deverá avocar os processos que corram perante outros juízes, salvo se já estiverem com sentença definitiva.") não prevalece sobre a faculdade atribuída ao juiz de determinar a separação dos processos quando, pelo excessivo número de acusados, ou por outro motivo relevante, esta separação seja conveniente. Com esse fundamento, a Turma indeferiu pedido de habeas corpus, no qual se sustentava a obrigatoriedade da reunião dos diversos processos instaurados contra o paciente - acusado da prática de crimes relacionados com o "jogo do bicho", no Estado do Rio de Janeiro -, em virtude da existência de conexão probatória.
HC 73.423-RJ, rel. Min. Francisco Rezek, 10.12.96.
Delegação para Colheita de Provas
Rejeitou-se ainda, no julgamento desse habeas corpus, a alegação de nulidade das provas colhidas pelo juiz de primeiro grau por delegação do relator da ação penal movida contra o paciente perante o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. A Turma entendeu que a questionada delegação, além de prevista pelo art. 9º, § 1º, da Lei 8038/90 ("o relator poderá delegar a realização do interrogatório ou de outro ato da instrução ao juiz ou membro de tribunal com competência territorial no local de cumprimento da carta de ordem"), não acarretara, na espécie, prejuízo para a defesa; de qualquer modo, o princípio da identidade física do juiz não se aplica no processo penal. Vencido o Ministro Marco Aurélio, ao fundamento de que o referido § 1º não autoriza a delegação de atos de instrução que devam ser praticados na mesma comarca em que situado o tribunal ao qual pertença o relator. Precedente citado:
AP 312-DF; AP 231-RN (RTJ 88/739). HC 73.423-RJ, rel. Min. Francisco Rezek, 10.12.96.
Cabimento de Reclamação
Não cabe ao STF o julgamento de habeas corpus impetrado contra acórdão de Tribunal de Justiça ao qual se atribui o vício de haver interpretado erroneamente decisão proferida pelo STJ a propósito da mesma causa. Hipótese em que o alcance do que decidido pelo STJ deve ser por ele interpretado, via reclamação.
HC 73.705-RJ, rel. Min. Francisco Rezek, 10.12.96.
Investidura em Cargo Público
Concluído o julgamento de uma série de recursos extraordinários provenientes do Estado de Santa Catarina, nos quais se discutia sobre a validade, em face do art. 37, II, da CF ("a investidura em cargo ou emprego público depende da aprovação prévia em concurso público..."), de norma estadual que prevê o "acesso" como forma de investidura em carreira diversa daquela para a qual o servidor ingressou no serviço público. Afirmando a necessidade de concurso público para a investidura nos cargos pretendidos pelos servidores, conforme decidido no julgamento da ADIn 231-RJ (RTJ 144/24), a Turma conheceu e deu provimento aos recursos extraordinários interpostos pelo Estado. Vencido o Min. Marco Aurélio, sob o entendimento de que os referidos cargos fazem parte da mesma carreira na qual os servidores ingressaram por concurso público.
RREE 177.402-SC, 193.161-SC, 180.310-SC e 180.914-SC, rel. Min. Carlos Velloso, 24.06.96.
Tráfico Internacional e Competência
Com base na Súmula 522 do STF ("Salvo ocorrência de tráfico para o exterior, quando, então, a competência será da Justiça Federal, compete à Justiça dos Estados o processo e julgamento dos crimes relativos a entorpecentes."), a Turma deferiu habeas corpus impetrado contra acórdão do TRF da 4ª Região que, apesar de haver excluído da condenação imposta à paciente a causa de aumento prevista no art. 18, I, da Lei 6368/76 (tráfico internacional), reconhecendo apenas o crime de tráfico interno, entendera prevalente a competência da Justiça Federal para o julgamento da ação penal. Com o deferimento do writ, decretou-se a nulidade do processo, determinando-se a remessa dos autos à justiça estadual competente.
HC 74.479-RS, rel. Min. Carlos Velloso, 13.12.96.