Informativo do STF 548 de 29/05/2009
Publicado por Supremo Tribunal Federal
PLENÁRIO
ADI e Nova Lei de Falências - 1
O Tribunal, por maioria, julgou improcedente pedido formulado em ação direta de inconstitucionalidade proposta pelo Partido Democrático Trabalhista - PDT contra os artigos 60, parágrafo único, 83, I e IV, c, e 141, II, da Lei 11.101/2005, que regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária. Sustentava o requerente ofensa aos artigos 1º, III e IV, 6º, 7º, I, e 170, VIII, da CF. Afastou-se, inicialmente, a alegada inconstitucionalidade formal dos dispositivos legais impugnados, por afronta à reserva constitucional de lei complementar. Asseverou-se que, nos termos do art. 22, I, da CF, compete privativamente à União legislar sobre direito do trabalho, a qual não está obrigada a utilizar-se de lei complementar para disciplinar a matéria, o que somente é exigido, de acordo com o art. 7º, I, da CF, para regrar a dispensa imotivada, assunto, entretanto, que não constituiria objeto da Lei 11.101/2005. No ponto, salientou-se que, não obstante a eventual recuperação ou falência de certa empresa ou a venda de seus ativos implique indiretamente a extinção de contratos de trabalho, esse efeito subsidiário nada teria a ver com a despedida arbitrária ou sem justa causa, que decorre sempre de ato volitivo e unilateral do empregador.
ADI 3934/DF, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 27.5.2009. (ADI-3934)
ADI e Nova Lei de Falências - 2
Rejeitou-se, em seguida, a alegação de que os artigos 60, parágrafo único, e 141, II, da lei em questão seriam inconstitucionais por estabelecerem que o arrematante das empresas em recuperação judicial não responderia pelas obrigações do devedor, em especial as derivadas da legislação do trabalho. Considerou-se que a Constituição Federal não abrigaria nenhuma regra expressa sobre o eventual direito de cobrança de créditos trabalhistas em face daquele que adquire ativos de empresa em processo de recuperação judicial ou cuja falência tenha sido decretada. Além disso, não haveria ofensa direta a quaisquer valores implícita ou explicitamente protegidos pela Constituição Federal, podendo ocorrer, no máximo, uma colisão entre diferentes princípios constitucionais, sendo que, ainda assim, não se poderia falar em declaração de invalidade de um deles ou de instituição de uma cláusula de exceção, já que o legislador ordinário teria apenas estabelecido relações de precedência condicionada. Registrou-se que, no caso, o papel do legislador infraconstitucional teria se restringido a escolher dentre os distintos valores e princípios constitucionais, igualmente aplicáveis à espécie, aqueles que reputara mais idôneos para disciplinar a recuperação judicial e a falência das empresas, de forma a garantir-lhes a maior expansão possível, tendo em conta o contexto fático e jurídico com o que se defrontara. No ponto, observou-se que a Lei 11.101/2005 resultou de amplo debate com os setores socais diretamente afetados por ela, tendo surgido, também, da necessidade de se preservar o sistema produtivo nacional inserido em uma ordem econômica mundial caracterizada pela concorrência predatória entre seus principais agentes e pela eclosão de crises globais cíclicas altamente desagregadoras. Destarte, nesse contexto, o legislador teria optado por estabelecer que adquirentes de empresas alienadas judicialmente não assumiriam os débitos trabalhistas, por sucessão, porquanto isso não ensejaria prejuízo aos trabalhadores, já que a exclusão da sucessão tornaria mais interessante a compra da empresa e tenderia a estimular maiores ofertas pelos interessados na aquisição, o que aumentaria a garantia dos trabalhadores, em razão de o valor pago ficar à disposição do juízo da falência e ser utilizado para pagar prioritariamente os créditos trabalhistas. Além do mais, a venda em bloco da empresa possibilitaria a continuação da atividade empresarial, preservando empregos.
ADI 3934/DF, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 27.5.2009. (ADI-3934)
ADI e Nova Lei de Falências - 3
Aduziu-se que, do ponto de vista teleológico, o diploma em questão teria procurado garantir a sobrevivência das empresas em dificuldades, permitindo a alienação de seus ativos, considerada, especialmente, a função social que esses complexos patrimoniais exercem, nos termos do disposto no art. 170, III, da CF. Afirmou-se que o processo falimentar, nele abrangida a recuperação das empresas em dificuldades, visaria, em última análise, saldar o seu passivo por meio da realização do respectivo patrimônio, sendo reunidos todos os credores, segundo uma ordem pré-determinada, em consonância com a natureza do crédito de que são detentores. Assim, o referido processo teria como escopo, além de contribuir para que a empresa pudesse superar a crise econômica ou financeira, preservar, o máximo possível, os vínculos trabalhistas e a cadeia de fornecedores com os quais ela guardaria verdadeira relação simbiótica (Lei 11.101/2005, art. 47). Dessa forma, os artigos 60, parágrafo único, e 141, II, da lei impugnada seriam constitucionalmente hígidos, mormente porque o legislador, ao concebê-los, teria optado por dar concreção a determinados valores constitucionais, quais sejam, a livre iniciativa e a função social da propriedade em detrimento de outros, com mesma densidade axiológica, por julgá-los mais adequados ao tratamento da matéria.
ADI 3934/DF, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 27.5.2009. (ADI-3934)
ADI e Nova Lei de Falências - 4
Também repeliu-se a apontada inconstitucionalidade do art. 83 da Lei 11.101/2005, por ofensa aos artigos 5º, XXXVI e 7º, IV, da CF, na qualificação, como quirografários, dos créditos trabalhistas derivados da legislação do trabalho que ultrapassem 150 salários mínimos. Frisou-se não haver perda de direitos por parte dos trabalhadores, haja vista que, independentemente da categoria em que tais créditos fossem classificados, não deixariam de existir nem se tornariam inexigíveis, deixando de ter apenas caráter preferencial. Observou-se que o estabelecimento de um limite quantitativo para a inserção dos créditos trabalhistas na categoria de preferenciais, do ponto de vista histórico, implicou uma ruptura com a concepção doutrinária que dava suporte ao modelo abrigado no Decreto-lei 7.661/45, que tinha como enfoque principal a proteção do credor e não a preservação da empresa como fonte geradora de bens econômicos e sociais. Destacou-se, ainda, que a própria legislação internacional de proteção ao trabalhador (Convenção 173 da Organização Internacional do Trabalho - OIT) prevê a possibilidade do estabelecimento de limites legais aos créditos de natureza trabalhista, desde que preservado o mínimo essencial à sobrevivência do empregado. Considerou-se que, apesar de ainda não ter havido ratificação dessa Convenção pelo Brasil, poder-se-ia afirmar que os limites eleitos para a garantia dos créditos trabalhistas, na hipótese de falência ou recuperação judicial de empresas, teriam respaldo nas normas adotadas no âmbito da OIT. Nesse sentido, as disposições da Lei 11.101/2005 demonstrariam uma preocupação de caráter distributivo, fixando um critério razoável e proporcional, o mais possível equitativo no que diz respeito ao concurso de credores, ou seja, ao estabelecer um limite máximo para que os créditos trabalhistas tivessem um tratamento preferencial, teria buscado garantir que essa proteção alcançasse o maior número de trabalhadores, isto é, exatamente os que ganham os menores salários. Concluiu-se que o limite de conversão dos créditos trabalhistas em quirografários, portanto, não afrontaria a Constituição Federal, visto que teria por objetivo a proteção do patrimônio dos trabalhadores, especialmente os mais necessitados do ponto de vista econômico. Por fim, não se vislumbrou, de igual modo, nenhum vício na fixação do limite dos créditos trabalhistas, para o efeito de classificá-los como quirografários, em salários mínimos, ao fundamento de que o que a Constituição proíbe é a utilização do salário mínimo como indexador de prestações periódicas e não como parâmetro de indenizações ou condenações. Vencidos os Ministros Carlos Britto e Marco Aurélio, que julgavam parcialmente procedente o pedido formulado. Precedentes citados:
RE 449420/PA (DJU de 14.10.2005); ADI 789/DF (DJU de 19.12.94). ADI 3934/DF, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 27.5.2009. (ADI-3934)
REPERCUSSÃO GERAL
Recuperação Judicial: Execução de Créditos Trabalhistas e Competência da Justiça Comum - 1
Compete à Justiça Comum o julgamento de execução de créditos trabalhistas contra empresas em processo falimentar ou em recuperação judicial. Com base nesse entendimento, o Tribunal, por maioria, desproveu recurso extraordinário interposto contra acórdão do Superior Tribunal de Justiça que mantivera decisão, proferida em conflito de competência entre a Justiça do Trabalho e a Justiça Estadual Comum, que reputara ser da 1ª Vara Empresarial da Comarca do Rio de Janeiro a competência para julgar ação proposta pelo Sindicato Nacional dos Aeronautas - SNA e associações de comissários, mecânicos de vôo e pilotos das empresas Varig e Nordeste Linhas Aéreas. Alegava-se, na espécie, ofensa aos incisos I a IX do art. 114 da CF. Preliminarmente, asseverou-se que o debate relativo às condições de admissibilidade do recurso e à existência de repercussão geral estaria superado, ante o pronunciamento da Corte quanto à relevância constitucional do tema sob análise. Afirmou-se, ainda, não caber ao Supremo examinar — em recurso extraordinário em que se discute a exegese do art. 114 da CF, na redação que lhe deu a EC 45/2004 —, se o art. 60 da Lei 11.101/2005 estabeleceria, ou não, a sucessão de créditos trabalhistas, haja vista tratar-se de matéria totalmente estranha aos autos. Acrescentou-se, no ponto, que, no julgamento da ADI 3934/DF, acima relatado, a Corte já teria declarado a constitucionalidade do referido dispositivo.
RE 583955/RJ, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 28.5.2009. (RE-583955)
Recuperação Judicial: Execução de Créditos Trabalhistas e Competência da Justiça Comum - 2
Quanto à questão de fundo, salientou-se que, no âmbito infraconstitucional, o assunto seria atualmente disciplinado pelos §§ 1º e 2º do art. 6º da Lei 11.101/2005, os quais complementados pelo art. 76, e seu parágrafo único, do mesmo diploma legal (“Art. 6o A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial suspende o curso da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor, inclusive aquelas dos credores particulares do sócio solidário. § 1o Terá prosseguimento no juízo no qual estiver se processando a ação que demandar quantia ilíquida. § 2o É permitido pleitear, perante o administrador judicial, habilitação, exclusão ou modificação de créditos derivados da relação de trabalho, mas as ações de natureza trabalhista, inclusive as impugnações a que se refere o art. 8o desta Lei, serão processadas perante a justiça especializada até a apuração do respectivo crédito, que será inscrito no quadro-geral de credores pelo valor determinado em sentença ... Art. 76. O juízo da falência é indivisível e competente para conhecer todas as ações sobre bens, interesses e negócios do falido, ressalvadas as causas trabalhistas, fiscais e aquelas não reguladas nesta Lei em que o falido figurar como autor ou litisconsorte ativo.”). Observou-se que, tanto no regime anterior (Decreto-lei 7.661/45, artigos 7º, §§ 2º e 3º, e 23) quanto no atual, o legislador ordinário teria adotado o entendimento no sentido de que, decretada a falência — e agora deferida a recuperação judicial —, a execução de todos os créditos, inclusive os de natureza trabalhista, deveria ser processada no juízo falimentar. Afirmou-se que tais regras consagrariam o princípio da universalidade do juízo falimentar, que exerce uma vis attractiva sobre todas as ações de interesse da massa falida, caracterizando a sua individualidade.
RE 583955/RJ, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 28.5.2009. (RE-583955)
Recuperação Judicial: Execução de Créditos Trabalhistas e Competência da Justiça Comum - 3
Explicou-se que, num processo falimentar, o patrimônio da empresa nem sempre corresponde ao montante de suas dívidas, razão por que a regra da individualidade na execução dos créditos poderia ensejar a obtenção de vantagem indevida por certos credores em prejuízo dos demais. Dessa forma, estaria afastada a regra da execução individual dos créditos, instaurando-se, em substituição, o concurso de credores, a permitir a concretização do princípio da par condicio creditorum, que garante tratamento isonômico a todos os credores de uma mesma categoria na percepção do que lhes é devido. Dessa maneira, instalar-se-ia, no processo de falência, o denominado juízo universal, a atrair todas as ações aptas a afetar o patrimônio da empresa em processo de quebra ou recuperação judicial. Registrou-se que o juízo universal da falência atrairia apenas os créditos consolidados, estando excluídas, portanto, as ações que demandam quantia ilíquida, as trabalhistas e as de natureza fiscal, as quais terão prosseguimento nos juízos especializados (Lei 11.101/2005, art. 6º, §§ 1º, 2º e 7º). Aduziu-se, também, que, de acordo com o art. 83, I e VI, c, da Lei 11.101/2005, os créditos de até 150 salários mínimos teriam tratamento preferencial, sendo transformados em quirografários os que superassem esse valor. Mencionou-se, ainda, o disposto no art. 54 do aludido diploma legal, segundo o qual, o plano de recuperação judicial, aprovado pelo juízo da falência, não poderia prever prazo superior a 1 ano para pagamento dos créditos derivados da legislação do trabalho ou decorrentes de acidentes de trabalho, anteriormente vencidos, e nem prazo superior a 30 dias para o pagamento, até o limite de 5 salários mínimos por trabalhador, dos créditos de natureza estritamente salarial, vencidos nos 3 meses anteriores ao pedido. Assim, a Lei 11.101/2005 teria se mantido fiel ao princípio da par condicio creditorum no tocante aos créditos trabalhistas, contemplados com a devida precedência sobre os demais, em decorrência de sua natureza alimentar. Por sua vez, a Justiça do Trabalho teria conservado a jurisdição cognitiva sobre tais créditos cuja execução, quando líquidos, ficariam a cargo da Justiça Comum, uma vez instaurado o processo falimentar. O novo diploma teria ampliado a possibilidade de os empregados receberam o que lhes é devido, ao inserir no ordenamento jurídico o instituto da recuperação judicial, o qual teria por escopo manter em atividade as empresas que estivessem passando por dificuldades de caráter conjuntural, tendo em conta a função social que exercem. Por fim, após afastar qualquer violação aos incisos I a IX do art. 114 da CF, esclareceu-se, quanto a esse último inciso, que ele teria apenas outorgado ao legislador ordinário a faculdade de submeter à competência da Justiça do Trabalho outras controvérsias, além das taxativamente previstas nos incisos anteriores, desde que oriundas da relação de trabalho. Vencidos os Ministros Marco Aurélio e Carlos Britto, que davam provimento ao recurso. Precedentes citados:
AI 584049 AgR/RJ (DJU de 8.8.2006) e AI 585407 AgR/RJ (DJU de 1º.12.2006). RE 583955/RJ, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 28.5.2009. (RE-583955)
PRIMEIRA TURMA
Prova Emprestada em Processo Penal
A Turma manteve decisão do STJ que, em habeas corpus lá impetrado, admitira a utilização de prova emprestada em processo penal, desde que sobre ela ambas as partes fossem cientificadas, a fim de que pudessem exercer o contraditório. Tratava-se, na espécie, de writ — impetrado em favor de condenado em primeira instância pela prática do crime de extorsão mediante seqüestro (CP, art. 159, § 3º) — no qual se sustentava, em síntese, que a prova emprestada deveria ser julgada ilícita, na medida em que produzida sem a observância do devido processo legal e do contraditório, ainda que gerada em processo no qual o réu também figurara como parte. Considerou-se que, na verdade, a defesa pretendia o revolvimento de fatos e provas, incabível na via estreita do habeas corpus. Observou-se, ademais, relativamente à possibilidade de manifestação do paciente quanto à prova emprestada, bem como quanto à higidez das demais provas que serviram de embasamento para a condenação, que não haveria, no ponto, nenhuma ilegalidade.
HC 95186/SP, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 26.5.2009. (HC-95186)
Falsificação de Moeda e Princípio da Insignificância
A Turma indeferiu habeas corpus em que condenado pela prática do delito previsto no art. 289, § 1º, do CP — por guardar em sua residência duas notas falsas no valor de R$ 50,00 — pleiteava a aplicação do princípio da insignificância. Inicialmente, não se adotou o paradigma da 2ª Turma, apontado pela impetração, ante a diversidade de situações, dado que aquele órgão julgador considerara as circunstâncias da situação concreta apresentada para conceder a ordem, tais como: a) a falsificação grosseira, b) a inexpressividade da lesão jurídica causada, e c) o fato de ter sido apreendida uma nota falsa no valor de R$ 5,00 em meio a outras notas verdadeiras. Em seguida, asseverou-se que, na espécie, cuidar-se-ia de notas falsas, as quais poderiam perfeitamente provocar o engano. Enfatizou-se, ademais, que o bem violado seria a fé pública, a qual é um bem intangível e que corresponde à confiança que a população deposita em sua moeda, não se tratando, assim, da simples análise do valor material por ela representado. Precedentes citados:
HC 83526/CE (DJU de 26.3.2004), HC 93251/DF (DJE de 22.8.2008). HC 96153/MG, rel. Min. Cármen Lúcia, 26.5.2009. (HC-96153)
Devido Processo Legal e Falta de Fundamentação
Ante a excepcionalidade do caso, a Turma deu provimento a recurso extraordinário para, assentando a nulidade de acórdão referente a embargos de declaração, determinar que Turma Recursal de Juizado Especial Federal se pronuncie explicitamente sobre as causas de pedir constantes da apelação interposta pelo ora recorrente. Na espécie, não obstante a protocolação de embargos de declaração, em processo-crime, objetivando o exame de matéria de defesa, o colegiado de origem consignara a desnecessidade de o órgão julgador expender comentários sobre todos os argumentos levantados pela parte, quando, da sua fundamentação, pudessem ser extraídos elementos para a improcedência do pedido. Asseverou-se que o órgão investido do ofício judicante negara-se a aperfeiçoar a prestação jurisdicional, transgredindo, destarte, medula do devido processo legal — o direito de defesa da parte condenada. Salientou-se, ainda, que, na presente situação, não seria preciso sequer partir-se de interpretação de preceitos estritamente legais, na medida em que houvera, simplesmente, a recusa em atentar-se para certa matéria de defesa e emitir-se entendimento a respeito.
RE 435256/RJ, rel. Min. Marco Aurélio, 26.5.2009. (RE-435256)
Legitimidade do Ministério Público: Ação Civil Pública e Fornecimento de Medicamentos
O Ministério Público tem legitimidade para ajuizar ação civil pública objetivando o fornecimento de remédio pelo Estado. Com base nesse entendimento, a Turma proveu recurso extraordinário em que se questionava a obrigatoriedade de o Estado proporcionar a certa cidadã medicamentos indispensáveis à preservação de sua vida. No caso, tribunal local extinguira o processo sem julgamento de mérito, ante a mencionada ilegitimidade ativa ad causam do parquet, uma vez que se buscava, por meio da ação, proteção a direito individual, no caso, de pessoa idosa (Lei 8.842/94, art. 2º). Sustentava-se, na espécie, afronta aos artigos 127 e 129, II e III, da CF. Assentou-se que é função institucional do parquet zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados na Constituição, promovendo medidas necessárias a sua garantia (CF, art. 129, II).
RE 407902/RS, rel. Min. Marco Aurélio, 26.5.2009. (RE-407902)
Mandado de Segurança e Ato de Natureza Jurisdicional - 1
A Turma deu provimento a recurso ordinário em mandado de segurança para determinar que, afastado o óbice apontado quanto ao não cabimento do writ, este tenha seqüência no STJ. Tratava-se de recurso interposto contra ato de Ministro do STJ, que se fundara no Enunciado 121 da Súmula do extinto Tribunal Federal de Recursos (“Não cabe mandado de segurança contra ato ou decisão de natureza jurisdicional, emanado de Relator ou Presidente de Turma”). Alegava o recorrente que, nos autos de execução trabalhista por ele proposta, o juízo laboral de Londrina - PR ordenara a penhora de bens da empresa reclamada. Paralelamente à execução, todavia, a empresa cedera parte de seu capital social para a constituição de outras empresas, o que levara o recorrente a postular, no juízo trabalhista, a declaração de sucessão de empresas, tendo tal pleito sido deferido. Ocorre que, supervenientemente, a antiga empresa tivera sua falência decretada por Vara de Falências e Concordatas do Rio de Janeiro — após o trânsito em julgado da decisão que implicara a declaração de sucessão. Diante disso, a empresa sucessora suscitara, no STJ, conflito de competência entre a Vara do Trabalho de Londrina e a Vara de Falências e Concordatas do Rio de Janeiro, tendo sido fixada a competência desta, em virtude da decretação de falência da empresa sucedida. Tal fato ensejara a impetração da segurança no STJ.
RMS 26098/RJ, rel. Min. Marco Aurélio, 26.5.2009. (RMS-26098)
Mandado de Segurança e Ato de Natureza Jurisdicional - 2
Consignou-se, em primeiro lugar, não haver o impetrante do mandado de segurança figurado, sequer como interesse, no conflito de competência dirimido pelo Ministro-relator, no STJ, no qual — estando envolvidos o Juízo do Trabalho de Londrina-PR e o de Falências e Concordatas do Rio de Janeiro — se estabelecera incumbir a este último atuar na execução trabalhista. Aduziu-se, assim, que não se poderia vislumbrar óbice à tramitação do mandado de segurança. Considerou-se, destarte, que a jurisprudência no sentido da inadequação da via eleita do manuseio do mandado de segurança mostrara-se-lhe imprópria. Ressaltou-se, por oportuno, a existência do interesse em ver apreciado o tema de fundo e que viera a formalizar a causa de pedir da impetração, visto que, na execução em curso, presente anterior sucessão trabalhista, acabara por prevalecer o envolvimento não da sucessora em si, mas da sucedida no que insolvente considerados ativo e passivo. Salientou-se que, a não se entender cabível o remédio constitucional, restaria fechada a porta ao interessado e impetrante para reverter o quadro referente ao conflito de competência. Enfatizou-se que, não obstante houvesse uma decisão no campo judicial, ela não ganharia — diante da relação subjetiva do procedimento que a ensejara — contornos próprios a dizer-se da pertinência de recurso. Aduziu-se, ademais, que se deveriam distinguir situações concretas, não se generalizando a jurisprudência no sentido da inadmissibilidade de mandado de segurança contra ato judicial. Observou-se, por outro lado, que a premissa seria válida quando houvesse possibilidade de impugnação na via da recorribilidade.
RMS 26098/RJ, rel. Min. Marco Aurélio, 26.5.2009. (RMS-26098)
SEGUNDA TURMA
Crime Ambiental e Intimação para Julgamento de HC - 1
A intimação para sustentação oral em habeas corpus pode ser feita por qualquer meio que possibilite à parte conhecer a data da sessão e dela participar. Com base nesse entendimento, a Turma indeferiu habeas corpus em que condenados por armazenar irregularmente substância tóxica (Lei 9.605/98, artigos 54 e 56) requeriam a nulidade de acórdão proferido pelo tribunal local ante a falta de intimação para a realização de sustentação oral requerida pela defesa. Aduziu-se que, no caso, seria possível constatar, pelo endereço eletrônico daquela Corte, que informações acerca da inclusão do writ para julgamento foram disponibilizadas com antecedência de 48 horas, de modo que se tal comunicação não bastasse, ter-se-ia prejudicada a celeridade inerente ao rito dessa medida.
HC 94842/RS, rel. Min. Eros Grau, 26.5.2009. (HC-94842)
Crime Ambiental e Trancamento de Ação Penal - 2
Em seguida, de igual forma, rejeitou-se o pretendido trancamento da ação penal por ausência de justa causa. Enfatizou-se que a denúncia, apesar de sucinta, descreveria fato em tese delituoso, imputando-o aos pacientes e outros co-réus. Ademais, mencionou-se que o art. 2º da Lei dos Crimes Ambientais responsabiliza expressamente os administradores de pessoas jurídicas cujas atividades tenham acarretado danos que configurem crime contra o meio ambiente. Asseverou-se, ainda, que o reconhecimento da alegação de falta de materialidade quanto ao crime previsto no art. 54 da lei demandaria exame aprofundado do acervo fático-probatório, incabível na via escolhida. Também se afastou o pleito dos pacientes no tocante ao argumento de que não teria sido indicada a norma de segurança supostamente violada quando do armazenamento dos produtos da empresa. Registrou-se, nesse ponto, que a inicial acusatória apontaria irregularidade na armazenagem, fato que, em tese, encontra-se tipificado no art. 56 da mesma lei. Alguns precedentes citados:
HC 92797 AgR/SP (DJE de 19.12.2007); HC 90326 QO/RS (DJE de 29.2.20088); HC 85190/SC (DJU de 8.11.2005) e HC 86361/SP (DJE de 1º.2.2008). HC 94842/RS, rel. Min. Eros Grau, 26.5.2009. (HC-94842)
Art. 290 do CPM e Princípio da Insignificância
A Turma iniciou julgamento de habeas corpus em que se discute a incidência, ou não, do princípio da insignificância a militar condenado como incurso no art. 290 do CPM, por ter sido encontrada maconha em seu bolso. A Min. Ellen Gracie, relatora, manifestou-se pela denegação do writ, reiterando os fundamentos de seu voto no HC 94685/CE (pendente de conclusão), no sentido de que a conduta imputada ao paciente seria típica. Tendo em conta que a matéria encontra-se sob apreciação do Plenário, o julgamento foi suspenso para se aguardar a deliberação no aludido writ, que aguarda o voto-vista do Min. Carlos Britto.
HC 98447/RS, rel. Min. Ellen Gracie, 26.5.2009. (HC-98447)
Cerceamento de Defesa e Prova Pericial - 3
Em conclusão de julgamento, a Turma indeferiu habeas corpus impetrado em favor de condenado por atentado violento ao pudor (CP, art. 214, c/c o art. 61, c, última parte), no qual se pretendia a anulação do acórdão condenatório proferido pelo tribunal de origem, bem como a realização de prova pericial — v. Informativo 546. Enfatizou-se que a condenação do paciente tivera por fundamento o conjunto probatório, que incluía o auto de exame de corpo de delito, o relatório da vítima ao posto médico do local de trabalho — onde o crime teria ocorrido — e os depoimentos colhidos em juízo. Afirmou-se que a palavra da vítima, nesse contexto, não se encontrava isolada, mas em harmonia com as provas pericial e testemunhal, produzidas com observância das garantias do devido processo legal. Aduziu-se, ademais, que esta questão já fora submetida ao Supremo. Quanto à perícia almejada, asseverou-se que o juiz criminal deve proceder à reconstituição histórica dos fatos mediante a realização de provas, ordenando diligências que repute necessárias (CPP, art. 156, II). Contudo, salientou-se que, com exceção do exame de corpo de delito, a lei outorga ao juízo a ponderação da necessidade de nova prova pericial, de modo que, se motivadamente denega o pedido, com o objetivo de evitar perícias inúteis, impertinentes ou procrastinatórias, não há que se falar em cerceamento de defesa. Tendo em conta o contexto da situação descrita nos autos, afastou-se a reputada ofensa à garantia da ampla defesa. Por fim, concedeu-se a ordem de ofício, para autorizar a progressão de regime, se a ela, segundo decisão do juízo da execução, tiver jus o paciente, nos termos do art. 112 da Lei de Execução Penal - LEP, já que os fatos ocorreram antes do advento da Lei 11.464/2007.
HC 82587/RJ, rel. Min. Cezar Peluso, 26.5.2009. (HC-82587)
Falta Grave e Prescrição de Infração Disciplinar
Ante a ausência de norma específica quanto à prescrição da infração disciplinar, aplica-se o disposto no art. 109, VI, do CP, considerando-se o menor lapso temporal previsto, que é de 2 anos. Tendo em conta esse entendimento, a Turma indeferiu habeas corpus no qual recapturado sustentava a prescrição para a incidência de medida disciplinar pela sua fuga do estabelecimento prisional, sob a alegação de que, no caso, existiria legislação específica — Regimento Penitenciário do Estado do Rio Grande do Sul — que fixaria, de modo expresso, o prazo prescricional de 1 ano para a conclusão dos processos administrativos disciplinares instaurados para a apuração de falta grave. Asseverou-se que o mencionado regimento não poderia regular a prescrição, por competir à União legislar, privativamente, sobre direito penal (CF, art. 22, I). Por último, repeliu-se a apontada ofensa ao princípio da presunção de inocência consistente no argumento de que este não permitiria a punição por crime doloso antes do trânsito em julgado de sentença penal condenatória. Salientou-se que, para fins de regressão, a prática de fato definido como crime doloso não depende do trânsito em julgado da ação penal respectiva.
HC 97611/RS, rel. Min. Eros Grau, 26.5.2009. (HC-97611)
Enquadramento Jurídico e Latrocínio Tentado - 1
A Turma indeferiu habeas corpus no qual pronunciado por tentativa de latrocínio alegava que a não apreciação das teses da defesa, apresentadas antes da sentença monocrática, configuraria nulidade insanável, na medida em que, se essas tivessem sido examinadas, ele poderia ser responsabilizado apenas por lesões corporais. No caso, o paciente fora denunciado pela suposta prática do crime de tentativa de homicídio qualificado em concurso material com roubo circunstanciado (CP, art. 121, § 2º, V, c/c o art. 14, II e o art. 157, § 2º, I, II e V), mas sua defesa requerera a impronúncia tanto por homicídio quanto por latrocínio tentado ou, alternativamente, a desclassificação para lesões corporais. Ocorre que o juízo sentenciante o impronunciara somente das imputações contidas na denúncia, o que ensejara a interposição, pela defesa, de recurso em sentido estrito, ao argumento de ofensa ao princípio da ampla defesa, já que não examinados seus argumentos. Não provido esse recurso, foram impetrados habeas corpus perante as demais instâncias, também denegados. Daí a presente impetração, sob idêntico fundamento.
HC 97104/SP, rel. Min. Eros Grau, 26.5.2009. (HC-97104)
Enquadramento Jurídico e Latrocínio Tentado - 2
Aduziu-se que, reconhecido, pela sentença condenatória, o dolo de matar, ficara suficientemente respondida a preliminar da defesa. Entretanto, por considerar que a referida sentença não enquadrara corretamente os fatos, concedeu-se a ordem, de ofício, para anular a sentença condenatória, a fim de que o paciente seja submetido ao Tribunal do Júri. Asseverou-se que os fatos por ele praticados ocorreram em 2 momentos. Iniciado o roubo, os agentes, diante da reação inesperada das vítimas, teriam desistido da empreitada, saindo do veículo e liberando-as. No segundo momento, a vítima que estava na direção decidira perseguir os assaltantes em fuga, ocasião em que o paciente, temendo ser preso, atirara contra ela, causando-lhe ferimentos. Assim, tendo em conta que a cadeia causal relativa ao delito de roubo rompera-se quando o paciente desistira da sua prática, concluiu-se restar caracterizado o crime de constrangimento ilegal consumado (CP, art. 146) em concurso material com a tentativa de homicídio qualificado (“V - para assegurar ... a impunidade ... de outro crime;”). Observou-se, ao final, que, em caso de nova condenação, a pena aplicada não poderá superar aquela fixada na sentença anulada.
HC 97104/SP, rel. Min. Eros Grau, 26.5.2009. (HC-97104)
Ação de Usucapião: Art. 5º, LXXVIII, da CF e Regras de Competência - 1
Tendo em conta a peculiaridade do caso, a Turma desproveu recurso extraordinário no qual pleiteada a desconstituição de acórdão do TRF da 3ª Região e a conseqüente remessa do feito à comarca em que localizado o imóvel objeto de ação de usucapião. Tratava-se de recurso interposto contra decisão que declarara a ausência de interesse da União — pois nunca fora proprietária do imóvel usucapiendo — e mantivera sentença que julgara procedente pedido formulado em ação de usucapião. Na espécie, a ação fora proposta, em 1965, perante a 4ª Vara Cível de Santos, entretanto, após a criação da Comarca de Guarujá, os autos foram para lá remetidos, haja vista a localização do imóvel usucapiendo. Na nova comarca, o processo fora julgado extinto sem resolução de mérito (carência de ação), sendo esta decisão reformada, pelo tribunal de justiça local, para que o mérito da demanda fosse apreciado, o que ocorrera em favor dos autores. Posteriormente, a União comparecera alegando o domínio do referido imóvel, requerimento este ignorado pelo mesmo tribunal estadual que anulara a sentença, desta vez para que as defesas apresentadas pelos contestantes fossem examinadas pelo juiz sentenciante. A União reiterara seu interesse na causa e solicitara seu ingresso no pólo passivo. Acolhido o pedido, o feito fora deslocado para a Justiça Federal, cujo juízo ao qual distribuído o processo suscitara conflito negativo de jurisdição, reputado improcedente pelo extinto Tribunal Federal de Recursos - TFR. Nova sentença fora prolatada, julgando procedente a ação, após afastada a alegação de domínio formulada pela União. Contra essa decisão, os réus e a União recorreram ao extinto TFR, cujas apelações não foram conhecidas, bem como julgada prejudicada a remessa oficial. Interposto recurso extraordinário pelos réus, este fora provido a fim de anular o acórdão do TFR. Com a extinção deste, o processo fora distribuído ao referido TRF da 3ª Região. Daí o presente recurso extraordinário.
RE 433512/SP, rel. Min. Eros Grau, 26.5.2009. (RE-433512)
Ação de Usucapião: Art. 5º, LXXVIII, da CF e Regras de Competência - 2
Inicialmente, ressaltou-se que a aludida ação de usucapião fora ajuizada há mais de 40 anos e, desde então, o Estado, ministrando a prestação jurisdicional requerida, apreciara o mérito da demanda 2 vezes. A primeira sentença, proferida pelo Juízo da Comarca do Guarujá, em 1967, julgara procedente a demanda. A segunda, pelo Juízo Federal da 7ª Vara da Seção Judiciária de São Paulo, em 1975, também considerara procedente o pleito. A seguir, registrou-se que a EC 45/2004, em resposta à morosidade da justiça, consagrou o princípio da celeridade processual como postulado fundamental (CF, art. 5º, LXXVIII). Asseverou-se que, na situação dos autos, haveria, de um lado, as regras que garantem ao jurisdicionado segurança jurídica e, de outro, a afirmação constitucional da necessariamente rápida e, ao menos razoável, prestação jurisdicional. Ademais, aduziu-se que hipóteses de exceção não deveriam ficar à margem do ordenamento, sendo por este capturadas, e concluiu-se que a preservação dos princípios imporia a transgressão das regras. Tendo isso em conta, as regras de competência — cuja última razão se encontra na distribuição do exercício da jurisdição, segundo alguns critérios, aos órgãos do Poder Judiciário —, não poderiam prevalecer 43 anos após a propositura da ação. Concluiu-se que assim deveria ser em virtude da efetiva entrega da prestação jurisdicional — que já se dera — e à luz da garantia constitucional à razoável duração do processo. Precedente citado:
HC 94916/RS (DJE de 10.10.2008). RE 433512/SP, rel. Min. Eros Grau, 26.5.2009. (RE-433512)