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Informativo do STF 533 de 19/12/2008

Publicado por Supremo Tribunal Federal


PLENÁRIO

Piso Salarial Nacional dos Profissionais da Educação Básica - 1

O Tribunal deferiu parcialmente pedido de liminar formulado em ação direta de inconstitucionalidade proposta pelos Governadores dos Estados do Mato Grosso do Sul, do Paraná, de Santa Catarina, do Rio Grande do Sul e do Ceará contra os artigos 2º, §§ 1º, 4º; 3º, caput, II e III; e 8º, todos da Lei 11.738/2008, que dispõe sobre o piso salarial nacional para os profissionais do magistério público da educação básica [“Art. 2o O piso salarial profissional nacional para os profissionais do magistério público da educação básica será de R$ 950,00 (novecentos e cinqüenta reais) mensais, para a formação em nível médio, na modalidade Normal, prevista no art. 62 da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. § 1o O piso salarial profissional nacional é o valor abaixo do qual a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios não poderão fixar o vencimento inicial das Carreiras do magistério público da educação básica, para a jornada de, no máximo, 40 (quarenta) horas semanais. ... § 4o Na composição da jornada de trabalho, observar-se-á o limite máximo de 2/3 (dois terços) da carga horária para o desempenho das atividades de interação com os educandos. ... Art. 3o O valor de que trata o art. 2o desta Lei passará a vigorar a partir de 1o de janeiro de 2008, e sua integralização, como vencimento inicial das Carreiras dos profissionais da educação básica pública, pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios será feita de forma progressiva e proporcional, observado o seguinte: ... II – a partir de 1o de janeiro de 2009, acréscimo de 2/3 (dois terços) da diferença entre o valor referido no art. 2o desta Lei, atualizado na forma do art. 5o desta Lei, e o vencimento inicial da Carreira vigente; III – a integralização do valor de que trata o art. 2o desta Lei, atualizado na forma do art. 5o desta Lei, dar-se-á a partir de 1o de janeiro de 2010, com o acréscimo da diferença remanescente. ... Art. 8o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.”].

ADI 4167 MC/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 17.12.2008. (ADI-4167)

Piso Salarial Nacional dos Profissionais da Educação Básica - 2

O Tribunal deferiu em parte a cautelar para fixar interpretação conforme ao art. 2º da Lei 11.738/2008, no sentido de que, até o julgamento final da ação, a referência do piso salarial é a remuneração. Entendeu-se, primeiro, ausente a plausibilidade da alegada violação da reserva de lei de iniciativa do Chefe do Executivo local (CF, art. 61, § 1º, II), do pacto federativo (CF, artigos 1º, caput, 25, caput e § 1º, e 60, § 4º, I) e da proibição de excesso (razoabilidade e proporcionalidade), no que se refere à fixação da jornada de trabalho de 40 horas semanais. Esclareceu-se que essa jornada tem por função compor o cálculo do valor devido a título de piso, juntamente com o parâmetro monetário de R$ 950,00, e que a inexistência de parâmetro de carga horária para condicionar a obrigatoriedade da adoção do valor do piso poderia levar a distorções regionais e potencializar o conflito judicial, na medida em que permitiria a escolha de cargas horárias desproporcionais ou inexeqüíveis. Quanto à assertiva de que o vencimento ao qual seria aplicável o piso corresponderia à remuneração do servidor, ou seja, à soma dos valores recebidos a título de contraprestação direta pelo trabalho, o vencimento, e de todas as vantagens pecuniárias, tendo em conta que a própria lei, no § 2º do seu art. 3º (“Até 31 de dezembro de 2009, admitir-se-á que o piso salarial profissional nacional compreenda vantagens pecuniárias, pagas a qualquer título, nos casos em que a aplicação do disposto neste artigo resulte em valor inferior ao de que trata o art. 2º desta Lei, sendo resguardadas as vantagens daqueles que percebam valores acima do referido nesta Lei.”), utilizou mecanismo de calibração que confere ao Estado margem temporal para estudo e possível adequação das conseqüências financeiras que poderão advir da equiparação do piso ao vencimento básico, o Tribunal resolveu dar interpretação conforme para que essa prorrogação alcance especificamente a data de julgamento da ADI. Ressaltou-se que a data eleita pela lei, não coincidindo com aquela, poderia gerar dificuldades em razão de não estar estabelecida ainda a fixação, pela Suprema Corte, de orientação acerca dos conceitos básicos discutidos.

ADI 4167 MC/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 17.12.2008. (ADI-4167)

Piso Salarial Nacional dos Profissionais da Educação Básica - 3

Também deferiu-se a cautelar em relação ao § 4º do art. 2º da lei impugnada, por se considerar que ela invade competência legislativa dos Estados e Municípios. Asseverou-se, no ponto, que, no momento em que se autorizasse a União a fixar que num determinado município a carga horária deveria ser distribuída de uma determinada maneira, poder-se-ia inclusive gerar algum tipo de ociosidade na atividade docente. Por fim, deu-se interpretação conforme ao art. 3º da lei para estabelecer que o cálculo das obrigações relativas ao piso salarial se dará a partir de 1º.1.2009, a fim de afastar a ambigüidade causada em função da manutenção da expressão “passará a vigorar a partir de janeiro de 2008”, nele contida, não obstante o veto ao seu inciso I, que dispunha que, a partir de 1º.1.2008, haveria acréscimo de um terço da diferença entre o valor referido no art. 2º da lei e o vencimento inicial vigente da carreira. Vencido, em parte, o Min. Ricardo Lewandowski, que deferia a cautelar também quanto ao inciso II do art. 3º, ao fundamento de que o dispositivo, ao determinar a forma como será paga a verba devida aos professores, ou seja, segundo frações anuais, ofenderia a autonomia financeira dos entes federados. Vencido, também, o Min. Marco Aurélio, que deferia integralmente o pedido de cautelar. O Tribunal, ainda, rejeitou questão de ordem suscitada pelo Min. Marco Aurélio que, em razão das ausências dos Ministros Cármen Lúcia e Eros Grau, que se retiraram após terem proferidos seus votos, e antes da tomada do voto do Min. Cezar Peluso, assentava a falta de quórum para prosseguimento da votação sobre matéria constitucional.

ADI 4167 MC/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 17.12.2008. (ADI-4167)

ADI e Princípio do Concurso Público

O Tribunal julgou procedente pedido formulado em ação direta ajuizada pelo Procurador-Geral da República para declarar a inconstitucionalidade dos artigos 14, § 2º; 26, parágrafo único; 27; 28; 29 e 31 da Lei 13.778/2006, do Estado do Ceará, bem como dos seus Anexos V, VI e VII, que aprovou o plano de cargos e carreira do Grupo Operacional Tributação, Arrecadação e Fiscalização - TAF, da Secretaria da Fazenda estadual. Entendeu-se que os dispositivos impugnados não observam o princípio do concurso público (CF, art. 37, II), pois, a pretexto de levar a efeito uma mera reorganização na carreira dos servidores que integram a administração fazendária do Estado, na verdade criam novos cargos, permitindo o seu provimento por simples transposição. Asseverou-se que os referidos preceitos transformam os antigos cargos de Auditor Adjunto do Tesouro Estadual e Técnico do Tesouro Estadual e Fiscal da Receita Estadual, de nível médio, em cargos de Auditor Adjunto da Receita Estadual e Fiscal da Receita Estadual, para os quais se exige graduação em cursos de nível superior, bem como possibilitam o aproveitamento de servidores de qualquer carreira da Administração Direta nos quadros da Secretaria da Fazenda estadual. Vencido o Min. Marco Aurélio, que julgava parcialmente procedente o pleito, para declarar a inconstitucionalidade apenas do parágrafo único do art. 26 da lei, que possibilita o aludido aproveitamento de servidores de qualquer carreira da Administração Direta, afirmando que, nos demais dispositivos atacados, estar-se-ia diante de junção de atribuições idênticas, para a qual, considerada a disciplina pretérita de ingresso dos titulares desses cargos mencionados no art. 27 da lei, em um avanço desta, ter-se-ia o abandono da nova escolaridade, situação essa, entretanto, residual e tendente a findar com a aposentadoria desses servidores. Precedente citado:

ADI 3061/AP (DJU de 9.6.2006). ADI 3857/CE, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 18.12.2008. (ADI-3857)

Retificação de Edital após Início de Concurso Público e Anulação pelo CNJ

O Tribunal, por maioria, denegou mandado de segurança impetrado por candidatos ao concurso público para provimento de vagas de juiz de direito substituto do Estado do Piauí, em face de decisão do Conselho Nacional de Justiça - CNJ, tomada em procedimento de controle administrativo, que anulara edital do referido concurso. Na espécie, o Tribunal de Justiça local, mediante publicação do edital anulado, retificara subitens do primeiro edital do concurso, a fim de esclarecer critério de determinação da ordem de classificação para efeito de convocação para a realização da prova oral. O edital original previu a convocação para a prova oral dos candidatos aprovados na prova escrita prática e classificados até a 50ª posição. Por sua vez, o edital anulado previu a convocação para a prova oral dos candidatos que estivessem classificados até a 50ª posição, considerando-se a soma das notas obtidas na prova escrita de múltipla escolha e na prova escrita prática. Preliminarmente, afastou-se a alegação de que o CNJ seria incompetente para apreciar o pedido, porque a mesma questão, referente ao critério para convocação para as provas orais, estaria sendo discutida no âmbito jurisdicional, em mandado de segurança impetrado na aludida Corte estadual. Considerou-se, no ponto, que a atuação do CNJ se dera nos limites de sua competência (CF art. 103-B, § 4º), na medida em que o edital atacado seria ato administrativo praticado por órgão do Poder Judiciário. Quanto ao mérito, entendeu-se inexistir ilegalidade na decisão impugnada, haja vista que o CNJ, ao anular o edital posterior, dera concretude a comando já existente no primeiro edital, o qual determinara, de forma clara, o critério de convocação para as provas orais e para a inscrição definitiva no certame, qual seja, o de que deveriam ser convocados para as provas orais os candidatos que, na prova escrita prática, obtiveram as 50 melhores notas. Concluiu-se que não haveria dúvida no edital original, portanto, a justificar qualquer esclarecimento por edital superveniente. Afirmou-se, ademais, que, após a publicação do edital e no curso do certame, a alteração de suas regras só pode ser feita se houver modificação na legislação que disciplina a carreira a que se refere o concurso, o que não ocorrera no caso. Vencidos os Ministros Menezes Direito, Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio e Cezar Peluso, que concediam a ordem, por não vislumbrar alteração substantiva no edital original do concurso. Os vencidos reputaram equívoca a interpretação dada ao edital original no sentido de que seriam convocados para a prova oral somente os candidatos classificados até a 50ª posição na prova escrita prática, independentemente da nota obtida na de múltipla escolha, porque essa interpretação feriria a sistemática e a coerência presentes no edital de abertura, pois dos 105 pontos possíveis nas provas escritas apenas 15 corresponderiam à prova prática. Asseveraram que, com o novo edital, portanto, fez-se uma interpretação para compatibilizar o objetivo central do concurso, valorizando as duas provas existentes, dando-se conseqüência ao estabelecimento original do certame, a fim de não se tornar inútil a existência da prova de múltipla escolha que não seria levada em conta para efeito da nota de convocação final. Precedentes citados:

MS 26163/DF (DJE de 5.9.2008); ADI 3367/DF (DJU de 22.9.2006); RE 318106/RN (DJU de 18.1.2005). MS 27165/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 18.12.2008. (MS-27165)

Extradição de Israelense: Crime Cometido em Território Ocupado e Competência - 1

O Tribunal iniciou julgamento de pedido de extradição instrutória, formulado pelo Governo de Israel, de seu nacional, acusado pela suposta prática dos delitos criminais de abuso de menor ou pessoa incapaz, incitamento para abuso de menor ou pessoa incapaz, violência contra menor ou pessoa incapaz, incitamento à violência contra menor ou pessoa incapaz e conspiração para cometer crime, previstos nos artigos 368C, 368B (a) + (b), 30 c/c 368B (a) + (b), 30 c/c 368C e 499, respectivamente, da Lei Penal Israelense 5737-1977. A defesa sustenta, em síntese: a) que os crimes de incitamento e conspiração não encontram correspondência na legislação brasileira; b) que o extraditando não foi formalmente acusado pelas testemunhas, devendo prevalecer a presunção de sua inocência; c) que não foi regularmente citado; d) que o Estado de Israel não tem competência para processar e julgá-lo, tendo em conta que os supostos crimes teriam ocorrido no território da Cisjordânia; e) que o pedido não trouxe cópia da decisão judicial que decretou sua prisão, nem indicou com precisão os locais e as datas dos delitos; f) que as lesões corporais e os maus-tratos não geraram seqüelas graves ou gravíssimas, devendo-se impor a tais crimes a pena máxima de 1 ano de detenção, o que constitui um óbice ao deferimento do pedido de extradição (Lei 6.815/80, art. 77, IV); g) que os crimes foram praticados por terceiros. O Min. Carlos Britto, relator, deferiu, parcialmente, o pedido extradicional relativamente aos crimes de abuso de menor ou pessoa incapaz, violência contra menor ou pessoa incapaz, e conspiração para cometer crime, reputando, para tanto, plenamente preenchidos todos os requisitos previstos na Lei 6.815/80. No que tange aos crimes de abuso de menor ou pessoa incapaz e violência contra menor ou pessoa incapaz, considerou o relator que o conjunto das ações imputadas ao extraditando revelaria a prática do delito de tortura (Lei 9.455/98, art. 1º, II, e § 3º), ressaltando que o extraditando, na companhia de mais de 4 pessoas, teria submetido 8 crianças a intenso sofrimento físico e mental, com o objetivo de aplicar-lhes castigos, dado que supostamente “possuídas pelo demônio”. No que respeita ao crime de conspiração, tendo em conta estar-se diante de associação com mais de 3 pessoas para a prática de diversas condutas criminosas contra diversas crianças, entendeu o relator que o delito se amoldaria ao crime de quadrilha ou bando (CP, art. 288). Ext 1122/Estado de Israel, rel. Min. Carlos Britto, 18.12.2008. (Ext-1122)

Extradição de Israelense: Crime Cometido em Território Ocupado e Competência - 2

O relator também afastou a mencionada falta de competência territorial do Estado requerente. Asseverou que tanto a República Federativa do Brasil — Decreto 40 de 15.2.91 — quanto o Estado de Israel ratificaram, sem ressalva que impeça o deferimento da extradição, a Convenção contra Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes, aprovada pela Assembléia Geral das Nações Unidas, em 10.12.84, e que, a par da declaração formal do Governo de Israel em relação a sua competência para o julgamento dos crimes objeto desta extradição, o fato é que a própria nacionalidade israelense do acusado e de suas supostas vítimas já autorizaria o julgamento do extraditando perante as autoridades judiciárias daquele país, conforme previsto no art. 78, I, da Lei 6.815/80. Acrescentou que a comunidade internacional ainda não reconhece à Palestina a natureza jurídica de Estado soberano, embora autônomo, e que, no caso, a jurisdição israelense se impunha pelo domínio factual, concreto, do território. Em seguida, o Tribunal converteu o julgamento em diligência, para o fim de determinar que o Estado de Israel, por intermédio de sua missão diplomática, o extraditando e a Procuradoria-Geral da República pronunciem-se, especificamente, até o dia 12.2.2009, sobre a existência, ou não, para efeitos extradicionais, de competência jurisdicional do Estado de Israel sobre fatos delituosos ocorridos em território alegadamente administrado pela Autoridade Nacional Palestina, cidade de Beitar Illit, atualmente ocupada pelo Estado de Israel. O Tribunal também determinou que o Ministério das Relações Exteriores - MRE (Itamaraty), até 12.2.2009, manifeste-se, por meio de sua Consultoria Jurídica, sobre a questão jurídica acima referida. Em seguida, o Tribunal indeferiu proposta de liberdade provisória do extraditando e o pedido, feito da tribuna pelo advogado, de expedição de ofício para que o Estado de Israel apresentasse perícia sobre as condições físicas das crianças. Ext 1122/Estado de Israel, rel. Min. Carlos Britto, 18.12.2008. (Ext-1122)

Extradição e Infração de Menor Potencial Ofensivo

O Tribunal indeferiu pedido de extradição instrutória, formulado pelo Governo do Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, de seu nacional, acusado pela suposta prática dos crimes de “jogar líquido corrosivo intencionalmente” e de “posse de arma ofensiva”, previstos, respectivamente, no parágrafo 29 do Código de Delitos contra o Indivíduo de 1861 e no parágrafo 1 (1) do Código de Prevenção ao Crime de 1953, ambos do Reino Unido. Aplicou-se, relativamente ao primeiro delito descrito — correspondente ao crime de lesão corporal leve, cuja pena máxima em abstrato é de 1 ano, pelo CP brasileiro — o disposto no art. 2º do Tratado bilateral de extradição firmado entre o Brasil e o Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, que autoriza a extradição apenas a crimes puníveis nas legislações de ambos os Estados contratantes com penas de privação de liberdade iguais ou superiores a um ano, ou com uma pena mais severa. Quanto ao segundo delito, reputou-se ausente o requisito de dupla tipicidade, haja vista que a conduta de possuir ou portar em local público uma chave de fenda, uma tiara circular metálica ou um cano plástico não encontra correspondente no CP pátrio. Determinou-se, por fim, a expedição, desde logo, de alvará de soltura em favor do extraditando, se por al não estiver preso. Ext 1145/Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, rel. Min. Celso de Mello, 18.12.2008. (Ext-1145)

Extradição: Prisão Domiciliar e Saúde do Extraditando

Diante das peculiaridades do caso, o Tribunal, ao apreciar questão de ordem, deferiu pedido de prisão domiciliar a extraditando ao qual imputada a prática dos crimes de privação de liberdade e de associação ilícita, previstos, respectivamente, nos artigos 144, alínea 1ª, e 210, ambos do Código Penal argentino — v. Informativos 519 e 526. Na espécie, o extraditando, já em 17.6.2008, em mandado de segurança impetrado perante o Supremo, informara sofrer de grave doença cardiovascular e que seria impostergável a intervenção cirúrgica. Sustentava o extraditando que a carceragem não possuiria condições indispensáveis para sua recuperação pós-operatória. Tendo em conta estarem devidamente comprovadas as alegações quanto à saúde debilitada do extraditando, com a necessidade da operação, e de ter ele mais de 70 anos de idade, transformou-se a prisão em domiciliar, e determinou-se que o extraditando deposite o passaporte na polícia federal, sendo alertado de que deverá permanecer no Brasil, e confiar na jurisdição brasileira, até o término deste processo. A Min. Cármen Lúcia fez ressalva no sentido de que qualquer deslocamento, inclusive para fins de tratar o extraditando, deveria ser acompanhado do devido controle policial. O Min. Carlos Britto proferiu voto na mesma linha. Ext 974 QO/República Argentina, rel. Min. Marco Aurélio, 19.12.2008. (Ext-974)

Responsabilidade da União por Fundo de Previdência Complementar e Aspecto Social da Questão

O Tribunal iniciou julgamento de agravo regimental interposto contra decisão do Min. Gilmar Mendes, Presidente, que deferira suspensão da execução de decisão concessiva de efeito suspensivo ativo, proferida em agravo de instrumento interposto, perante o TRF da 1ª Região, contra despacho de indeferimento do pedido de antecipação dos efeitos da tutela formulado em ação civil pública. Na espécie, o Sindicato Nacional dos Aeroviários e outros ajuizaram ação civil pública, visando responsabilizar a União, as empresas dos grupos VARIG e TRANSBRASIL e o Fundo de Previdência Complementar AERUS por supostas ações e omissões na gestão do referido fundo de pensão, que teriam causado inúmeros prejuízos aos seus membros participantes. A decisão concessiva de efeito suspensivo do agravo de instrumento obrigara a União a arcar com as despesas decorrentes das complementações das aposentadorias e pensões devidas pelo aludido fundo. A decisão ora agravada reconhecera que a decisão concessiva de efeito suspensivo impusera à União obrigação vedada (CF, art. 202, § 3º) e afrontara o disposto no art. 100 da CF, a evidenciar risco de lesão à ordem e à economia públicas, asseverando não ser possível admitir que uma decisão proferida em juízo de cognição sumária determinasse o imediato dispêndio de recursos financeiros pela União, sem o anterior trânsito em julgado de decisão que expressamente reconhecesse a sua responsabilidade. O Min. Gilmar Mendes deu parcial provimento ao agravo regimental, de modo que a suspensão dos efeitos da decisão liminar proferida no agravo de instrumento perdure até a prolação da sentença na ação civil pública. Considerou haver a necessidade de se mitigarem os efeitos da suspensão, em razão das gravosas repercussões sociais da decisão. Ressaltou não ser possível ignorar a situação dos milhares de segurados da entidade que, embora tenham contribuído toda uma vida para o fundo, encontrar-se-iam, na velhice, privados da percepção dos benefícios dos quais têm direito. Alertou, contudo, que esse fato não autorizaria a completa subversão da ordem processual e a célere atribuição de responsabilidade à União, como se ela fosse uma espécie de “seguradora universal”. Assim, concluiu que a necessidade de se resguardarem os interesses contrapostos imporia uma solução diferenciada, e que a limitação dos efeitos da suspensão até a sentença de mérito no processo em curso na 1ª instância constituiria uma forma de solução conciliatória para o caso. Em obiter dictum, fez recomendação para que haja um encaminhamento alternativo para essa complexa questão, tendo em vista a gravidade do tema posto sob a perspectiva social. Após os votos dos Ministros Menezes Direito, Cármen Lúcia e Ricardo Lewandowski, que acompanhavam o voto do relator, pediu vista dos autos o Min. Eros Grau. SL 127 AgR/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, 19.12.2008. (SL-127)

PRIMEIRA TURMA

Excesso de Prazo e Internação Provisória

Por considerar que a internação provisória extrapolaria, em muito, o prazo assinalado pelo art. 108 do Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA, de modo a afastar a excepcionalidade própria da restrição preventiva da liberdade, assumindo a feição de punição antecipada, a Turma, em votação majoritária, superou o Enunciado 691 da Súmula do STF e deferiu habeas corpus impetrado em favor de menor cuja apreensão ocorrera em 11.7.2007 (ECA: “Art. 108. A internação, antes da sentença, pode ser determinada pelo prazo máximo de quarenta e cinco dias.”). De início, ressaltou-se que o feito encontrar-se-ia na fase de defesa prévia, quando da concessão de medida liminar (3.4.2008) pelo Min. Carlos Britto, relator, sem que a demora na prestação jurisdicional pudesse ser imputada à defesa ou à complexidade da causa. Tendo isso em conta, asseverou-se que deveriam ser sopesados, de um lado, os valores constitucionais do exercício do poder-dever de julgar (art. 5º, XXXV) e, de outro, o direito subjetivo à razoável duração do processo e aos meios que garantam a celeridade de sua tramitação (art. 5º, LXXVIII), sobretudo quando em jogo a liberdade de locomoção daqueles a quem a Constituição assegura o mais amplo acesso aos direitos de prestação positiva e um particular conjunto normativo-protetivo (artigos 227 e 228). Vencidos os Ministros Menezes Direito e Ricardo Lewandowski relativamente ao conhecimento do writ. Ordem concedida para assegurar ao paciente o direito de aguardar, em liberdade assistida, o julgamento da ação.

HC 93784/PI, rel. Min. Carlos Britto, 16.12.2008. (HC-93784)

Recaptura: Condenação por Crime Posterior e Data-Base

A Turma deferiu habeas corpus para que seja mantida a data da recaptura do paciente como termo inicial para a concessão de benefícios prisionais. Discutia-se qual seria a data-base para o reinício da contagem dos prazos para os fins de progressão de regime e de deferimento de outras benesses: se a data da unificação das penas ou a da recaptura. Na espécie, o paciente cumpria pena em regime semi-aberto quando se evadira, sendo capturado posteriormente, o que implicara a regressão de regime e a interrupção do lapso temporal para a obtenção de novos benefícios. Ocorre que, durante o tempo em que estivera foragido, o paciente cometera outro crime, vindo o juízo das execuções criminais a unificar as penas impostas e a estabelecer essa data como marco inicial para obtenção da progressão de regime. Esse posicionamento fora mantido pelo STJ que, ao prover recurso especial do Ministério Público, reformara acórdão da Corte local, em que adotado o dia da recaptura do paciente como data-base. Daí a impetração do presente writ pela defesa. Inicialmente, enfatizou-se que a prática de falta grave acarreta as sanções de regressão de regime e de reinício do lapso temporal para o cálculo de benefício. Aduziu-se, em seguida, que o STF possui jurisprudência consolidada no sentido de que a data-base para a recontagem de prazo para a concessão de progressão de regime é a do cometimento da última infração disciplinar grave ou, em caso de fuga, da recaptura. Nesse sentido, asseverou-se que o advento de uma condenação superveniente à reunificação de penas não altera o entendimento de se considerar a recaptura como marco inicial para o gozo de benefícios, desde que a nova condenação não implique regime de cumprimento de pena mais gravoso. Determinou-se, por fim, que, mantida a data da recaptura do paciente como data-base, seja observada a detração do período de pena cumprido anteriormente, nos termos do que dispõe o art. 111 da Lei de Execução Penal - LEP.

HC 95367/RS, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 16.12.2008. (HC-95367)

Impedimento de Magistrado e Nulidade Absoluta

Por vislumbrar ofensa ao art. 252, III, do CPP (“Art. 252. O juiz não poderá exercer jurisdição no processo em que: ... III - tiver funcionado como juiz de outra instância, pronunciando-se, de fato ou de direito, sobre a questão;”), a Turma deferiu, parcialmente, habeas corpus impetrado em favor de nacional alemão contra acórdão do STJ que denegara idêntica medida ao fundamento de que o paciente não conseguira infirmar os motivos em que embasados o decreto de expulsão contra ele formulado. A defesa pleiteava a revogação do aludido decreto — expedido ante a condenação do paciente por tráfico internacional de entorpecentes —, bem como do ato de cancelamento de seu visto. Reiterava, para tal fim, as alegações de ofensa ao princípio do devido processo legal e de incompetência do Ministro da Justiça para decidir sobre a expulsão de estrangeiros por delegação do Presidente da República. Declarou-se insubsistente o julgamento realizado no STJ, tendo em conta o fato de o Ministro-relator naquela Corte haver desempenhado, no TRF da 2ª Região, a função de juiz-relator de apelação interposta pelo ora paciente no processo em que condenado e que resultara na sua expulsão. Determinou-se, por conseguinte, o retorno dos presentes autos ao tribunal a quo para que seja realizado novo julgamento, sem a participação do aludido Ministro.

HC 96774/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, 16.12.2008. (HC-96774)

SEGUNDA TURMA

Fidelidade Partidária e Perda de Mandato

A Turma desproveu agravo de instrumento interposto por parlamentar contra decisão da Presidência do Tribunal Superior Eleitoral - TSE que não admitira o processamento de recurso extraordinário o qual impugnava acórdão que consubstanciara a perda de mandato do ora agravante em virtude de desfiliação partidária sem justa causa. Sustentava-se, no caso, que o TSE desrespeitara diversos preceitos inscritos na Constituição, tais como aqueles que contemplam a democracia representativa, a divisão funcional do poder, o princípio da legalidade, a inafastabilidade do controle jurisdicional, a vedação da retroatividade e intangibilidade de situações definitivamente consolidadas, a preservação da segurança jurídica, a proibição de instituição de tribunais de exceção, a reserva constitucional de lei complementar, a taxatividade do rol definidor das hipóteses de perda de mandato, a usurpação da competência legislativa do Congresso Nacional, a garantia do devido processo legal e o direito à plenitude de defesa. Preliminarmente, reconheceu-se a competência das Turmas do STF para processar e julgar recursos extraordinários e respectivos incidentes de agravos de instrumento quando interpostos, como na espécie, contra o TSE, conforme disposto no art. 9º, III, do Regimento Interno do STF - RISTF. Em seguida, registrou-se, também, que a apreciação de agravo de instrumento independe de pauta, por efeito de expressa norma regimental (art. 83, § 1º, III) e que incabível sustentação oral em tal pleito. Salientou-se, outrossim, que, no fundo, o que se buscava era refutar as decisões do TSE sob a alegação da inconstitucionalidade da resolução daquela Corte a respeito da matéria. Ocorre, todavia, que o Plenário do STF confirmou a constitucionalidade das Resoluções 22.610/2007 e 22.733/2008, ambas do TSE, entendendo-as compatíveis com a Constituição (ADI 3999/DF e ADI 4086/DF, j. em 12.11.2008). Enfatizou-se, ainda, que essas resoluções foram editadas pelo TSE a partir de recomendações feitas pelo próprio STF (MS 26602/DF, DJE de 17.10.2008; MS 26603/DF, DJE de 19.12.2008; e MS 26604/DF, DJE de 3.10.2008). Por derradeiro, deliberou-se a imediata execução dos acórdãos emanados do TSE, independentemente de publicação do acórdão consubstanciador do julgamento do presente agravo de instrumento.

AI 733387/DF, rel. Min. Celso de Mello, 16.12.2008. (AI-733387)

Crime de Responsabilidade: Permanência no Cargo e Condição de Procedibilidade - 1

A Turma iniciou julgamento de habeas corpus em favor de desembargador do Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba denunciado pela suposta prática dos delitos de quebra da ordem cronológica de apresentação de precatórios (CF, art. 100, § 6º), de atuação em processo no qual seria suspeito por alegada amizade íntima (Lei 1.079/50, art. 39, 2), e de crime de prevaricação (CP, art. 319), todos ocorridos enquanto exercia as funções de presidente daquela Corte. Requer a impetração em síntese: a) que seja decretada a extinção da punibilidade quanto ao crime de responsabilidade, na medida em que a permanência no cargo de presidente de tribunal deve ser interpretada como condição de procedibilidade para o recebimento da denúncia; b) que seja reconhecida a ilegitimidade ativa do Ministério Público Federal da peça acusatória, nos termos do art. 41-A da Lei 1.079/50, uma vez que, diante da natureza distinta das infrações tipicamente penais e os denominados crimes de responsabilidade, esses não poderiam ter sido cumulados na persecução penal; c) no que se refere ao crime de prevaricação (CP, art. 319), que seja o delito classificado como infração de menor potencial ofensivo, para, deste modo, sujeitar-se à possibilidade de oferecimento de transação penal pelo parquet.

HC 87817/PB, rel. Min. Gilmar Mendes, 16.12.2008. (HC-87817)

Crime de Responsabilidade: Permanência no Cargo e Condição de Procedibilidade - 2

O Min. Gilmar Mendes, relator, deferiu parcialmente a ordem e trancou a ação penal no que tange à acusação de crime de responsabilidade. Entendeu que, de fato, nos exatos termos do § 6º do art. 100 da CF, o crime de responsabilidade somente poderia ser praticado por presidente de tribunal, não se admitindo que a pessoa do desembargador, que antes desempenhara as funções correspondentes, sofresse, portanto, as sanções impostas no art. 2º da Lei dos Crimes de Responsabilidade, por expressa determinação legal, contida em seu próprio art. 42 (“A denúncia só poderá ser recebida se o denunciado não tiver, por qualquer motivo, deixado definitivamente o cargo”), nisso se considerando haver deixado definitivamente o cargo de presidente antes do recebimento da denúncia, como no caso concreto. Assim, ao indicar o descabimento do processo e julgamento por crime de responsabilidade, quer por ausente condição de procedibilidade, quer por haver o próprio STJ rejeitado a denúncia quanto ao delito previsto no art. 39, 2, da Lei 1.079/50, assentou o prejuízo do exame da questionada ilegitimidade ativa do MPF para a simultânea propositura da ação penal por crime de responsabilidade e por crime comum.

HC 87817/PB, rel. Min. Gilmar Mendes, 16.12.2008. (HC-87817)

Crime de Responsabilidade: Permanência no Cargo e Condição de Procedibilidade - 3

No tocante ao delito de prevaricação, aduziu que, em princípio, seria possível a incidência do instituto da transação penal, porquanto a pena máxima cominada em abstrato, aplicável ao tipo, é de 1 ano. Todavia, tendo em conta as informações prestadas por Ministra do STJ, concluiu que a transação penal não fora proposta pelo parquet, e, tampouco, requerida pela defesa. Nesse diapasão, ressaltou que a transação penal, tal qual consubstanciada no art. 72 da Lei 9.099/95, constitui providência cabível exclusivamente na fase pré-processual, colocada à disposição tanto da parte acusatória — que pode propô-la — quanto pela defesa — a quem cabe reclamá-la. Ocorre que, na presente situação, o órgão acusador silenciara em ofertar a transação e o denunciado nada requerera no tempo certo, resultando preclusa a possibilidade de sua aplicação, devendo a ação, nesse ponto, ter seu devido prosseguimento. O Min. Joaquim Barbosa, no que concerne ao crime de responsabilidade, iniciou divergência por reputar que a questão de procedibilidade continua atendida, eis que o desembargador permanece no exercício de cargo de desembargador. Enfatizou que, na verdade, o que se está criando, de maneira oblíqua, é uma generosa modalidade de extinção da punibilidade, bastando que o indivíduo pratique determinado crime na presidência de tribunal e em seguida deixe a presidência para não responder por esse crime. Após, o Min. Cezar Peluso pediu vista.

HC 87817/PB, rel. Min. Gilmar Mendes, 16.12.2008. (HC-87817)

IPTU: Isenção Progressiva da Alíquota e Valor Venal do Imóvel

Em continuação de julgamento, a Turma, acolhendo proposta do Min. Gilmar Mendes, decidiu afetar ao Plenário julgamento de recurso extraordinário no qual se discute a constitucionalidade de lei municipal que instituiu isenção progressiva de alíquota de IPTU de acordo com o valor venal dos imóveis antes da edição da EC 29/2000. Em voto proferido na sessão de 1º.2.2005, a Min. Ellen Gracie, relatora, negou provimento ao recurso por dois fundamentos: a) impossibilidade de extensão de isenção à recorrente, sob pena de transformar-se o Poder Judiciário em legislador positivo e b) a declaração de inconstitucionalidade de norma municipal não beneficiaria a recorrente, mas apenas obstaria a concessão de isenção aos demais contribuintes.

RE 355046/SP, rel. Min. Ellen Gracie, 16.12.2008. (RE-355046)