Informativo do STF 516 de 22/08/2008
Publicado por Supremo Tribunal Federal
PLENÁRIO
ADC e Vedação ao Nepotismo - 3
O Tribunal julgou procedente pedido formulado em ação declaratória de constitucionalidade proposta pela Associação dos Magistrados do Brasil - AMB para declarar a constitucionalidade da Resolução 7/2005, do Conselho Nacional de Justiça - CNJ - que veda o exercício de cargos, empregos e funções por parentes, cônjuges e companheiros de magistrados e de servidores investidos em cargos de direção e assessoramento, no âmbito do Poder Judiciário -, e emprestar interpretação conforme a Constituição a fim de deduzir a função de chefia do substantivo "direção", constante dos incisos II, III, IV e V do art. 2º da aludida norma - v. Informativo 416. Inicialmente, o Tribunal acolheu questão de ordem suscitada pelo Min. Marco Aurélio no sentido de fazer constar a rejeição da preliminar de inadequação da ação declaratória, por ele sustentada, no julgamento da cautelar - ao fundamento de que não se trataria de questionamento de um ato normativo abstrato do CNJ - e em relação à qual restara vencido. No mérito, entendeu-se que a Resolução 7/2005 está em sintonia com os princípios constantes do art. 37, em especial os da impessoalidade, da eficiência, da igualdade e da moralidade, que são dotados de eficácia imediata, não havendo que se falar em ofensa à liberdade de nomeação e exoneração dos cargos em comissão e funções de confiança, visto que as restrições por ela impostas são as mesmas previstas na CF, as quais, extraídas dos citados princípios, vedam a prática do nepotismo. Afirmou-se, também, não estar a resolução examinada a violar nem o princípio da separação dos Poderes, nem o princípio federativo, porquanto o CNJ não usurpou o campo de atuação do Poder Legislativo, limitando-se a exercer as competências que lhe foram constitucionalmente reservadas. Vencidos, no ponto relativo à interpretação conforme, os Ministros Menezes Direito e Marco Aurélio, reputá-la desnecessária.
ADC 12/DF, rel. Min. Carlos Britto, 20.8.2008. (ADC-12)
Ação Trabalhista: Contratação de Servidores Temporários e Competência - 2
Em conclusão, o Tribunal, por maioria, deu provimento a agravo regimental e julgou procedente reclamação ajuizada pelo Município de São Miguel do Guamá - PA, para deslocar para a Justiça Comum ações em trâmite na Justiça do Trabalho, em que se discute a validade de contratações celebradas sem prévia aprovação em concurso público - v. Informativo 471. Inicialmente, esclareceu-se tratar-se de ações classificadas em dois grupos: 1) as relativas a contratações temporárias realizadas antes da CF/88, nas quais se sustenta a validade das mesmas, e se pretende a aplicação da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT; 2) as concernentes a contratações temporárias feitas depois da CF/88, em que se alega a nulidade delas, por ofensa ao art. 37, II, da CF, e a conseqüente submissão dos casos a direitos típicos de uma relação trabalhista. Entendeu-se caracterizada a afronta à decisão proferida pelo Supremo na ADI 3395 MC/DF (DJU de 10.11.2006), na qual referendada cautelar que suspendeu liminarmente toda e qualquer interpretação dada ao inciso I do art. 114 da CF, na redação dada pela EC 45/2004, que inclua, na competência da Justiça do Trabalho, a apreciação de causas que sejam instauradas entre o Poder Público e seus servidores, a ele vinculados por típica relação de ordem estatutária ou de caráter jurídico-administrativo. Vencido o Min. Marco Aurélio que julgava improcedente o pleito, e se reportava ao voto por ele proferido no julgamento do RE 573202/AM, a seguir relatado, e, ainda, ao que decidido pelo Plenário no julgamento do CC 7134/RS (DJU de 15.8.2003).
Rcl 4489 AgR/PA, rel. orig. Min. Marco Aurélio, rel. p/ o acórdão Min. Cármen Lúcia, 21.8.2008. (Rcl-4489)
Parcelamento de Multas de Trânsito e Vício Formal
Por entender usurpada a competência privativa da União para legislar sobre trânsito (CF, art. 22, XI), o Tribunal, por maioria, julgou procedente pedido formulado em ação direta ajuizada pelo Governador do Estado do Espírito Santo para declarar a inconstitucionalidade da Lei estadual 7.738/2004, que cria a possibilidade de parcelamento, em até 5 vezes, de débitos decorrentes de multas por infrações ao Código de Trânsito Brasileiro - CTB. Vencidos os Ministros Marco Aurélio e Ricardo Lewandowski que salientaram a necessidade de se adotar ótica que fortalecesse a Federação e levaram em conta o argumento de que a verbas provenientes do parcelamento ingressaram nos próprios cofres estaduais para julgar improcedente o pleito. Precedentes citados: ADI 2064 MC/MS (DJU de 5.11.99); ADI 2101/MS (DJU de 5.10.2001); ADI 2582/RS (DJU de 6.6.2003); ADI 2644/PR (DJU de 29.8.2003); ADI 2814/SC (DJU de 5.12.2003); ADI 2432 MC/RN (DJU de 21.9.2001); ADI 3444/RS (DJU de 3.2.2006); ADI 2432/RN (DJU de 26.8.2005).
ADI 3196/ES, rel. Min. Gilmar Mendes, 21.8.2008. (ADI-3196)
REPERCUSSÃO GERAL
Repercussão Geral: Benefício de Prestação Continuada e Requisitos para Concessão
Na linha do que decidido no AI 715423 QO/RS (j. 11.6.2008), e, tendo em conta que o recurso extraordinário trata de tema - requisitos para a concessão de benefício de prestação continuada a necessitado, em face do disposto no art. 203, V, CF - cuja repercussão geral já foi reconhecida (RE 567985/MT, DJE de 11.4.2008), o Tribunal, por maioria, acolheu questão de ordem suscitada pelo Min. Cezar Peluso, em recurso extraordinário, do qual relator, para, com fundamento no art. 328, parágrafo único, do RISTF ("Quando se verificar subida ou distribuição de múltiplos recursos com fundamento em idêntica controvérsia, a Presidência do Tribunal ou o(a) Relator(a) selecionará um ou mais representativos da questão e determinará a devolução dos demais aos tribunais ou turmas de juizado especial de origem, para aplicação dos parágrafos do art. 543-B do Código de Processo Civil.") determinar a devolução dos autos, e de todos os recursos extraordinários que versem a mesma matéria, ao Tribunal de origem, para os fins do art. 543-B do CPC ("Art. 543-B. Quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica controvérsia, a análise da repercussão geral será processada nos termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, observado o disposto neste artigo. § 1o Caberá ao Tribunal de origem selecionar um ou mais recursos representativos da controvérsia e encaminhá-los ao Supremo Tribunal Federal, sobrestando os demais até o pronunciamento definitivo da Corte. § 2o Negada a existência de repercussão geral, os recursos sobrestados considerar-se-ão automaticamente não admitidos. § 3o Julgado o mérito do recurso extraordinário, os recursos sobrestados serão apreciados pelos Tribunais, Turmas de Uniformização ou Turmas Recursais, que poderão declará-los prejudicados ou retratar-se. § 4o Mantida a decisão e admitido o recurso, poderá o Supremo Tribunal Federal, nos termos do Regimento Interno, cassar ou reformar, liminarmente, o acórdão contrário à orientação firmada. § 5o O Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal disporá sobre as atribuições dos Ministros, das Turmas e de outros órgãos, na análise da repercussão geral."). Vencido o Min. Marco Aurélio que rejeitava a questão de ordem por não aplicar o art. 543-B a recursos interpostos antes da regulamentação do instituto da repercussão geral.
RE 540410 QO/RS, rel. Min. Cezar Peluso, 20.8.2008. (RE-540410)
Repercussão Geral: Vedação ao Nepotismo e Aplicação aos Três Poderes - 1
O Tribunal deu parcial provimento a recurso extraordinário interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte que reputara constitucional e legal a nomeação de parentes de vereador e Vice-Prefeito do Município de Água Nova, daquela unidade federativa, para o exercício dos cargos, respectivamente, de Secretário Municipal de Saúde e de motorista. Asseverou-se, inicialmente, que, embora a Resolução 7/2007 do CNJ seja restrita ao âmbito do Judiciário, a vedação do nepotismo se estende aos demais Poderes, pois decorre diretamente dos princípios contidos no art. 37, caput, da CF, tendo aquela norma apenas disciplinado, em maior detalhe, aspectos dessa restrição que são próprios a atuação dos órgãos jurisdicionais. Ressaltou-se que o fato de haver diversos atos normativos no plano federal que vedam o nepotismo não significaria que somente leis em sentido formal ou outros diplomas regulamentares fossem aptos para coibir essa prática, haja vista que os princípios constitucionais, que não configuram meras recomendações de caráter moral ou ético, consubstanciam regras jurídicas de caráter prescritivo, hierarquicamente superiores às demais e positivamente vinculantes, sendo sempre dotados de eficácia, cuja materialização, se necessário, pode ser cobrada por via judicial. Assim, tendo em conta a expressiva densidade axiológica e a elevada carga normativa que encerram os princípios contidos no caput do art. 37 da CF, concluiu-se que a proibição do nepotismo independe de norma secundária que obste formalmente essa conduta. Ressaltou-se, ademais, que admitir que apenas ao Legislativo ou ao Executivo fosse dado exaurir, mediante ato formal, todo o conteúdo dos princípios constitucionais em questão, implicaria mitigar os efeitos dos postulados da supremacia, unidade e harmonização da Carta Magna, subvertendo-se a hierarquia entre esta e a ordem jurídica em geral.
RE 579951/RN, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 20.8.2008. (RE-579951)
Repercussão Geral: Vedação ao Nepotismo e Aplicação aos Três Poderes - 2
Aduziu-se que art. 37, caput, da CF/88 estabelece que a Administração Pública é regida por princípios destinados a resguardar o interesse público na tutela dos bens da coletividade, sendo que, dentre eles, o da moralidade e o da impessoalidade exigem que o agente público paute sua conduta por padrões éticos que têm por fim último alcançar a consecução do bem comum, independentemente da esfera de poder ou do nível político-administrativo da Federação em que atue. Acrescentou-se que o legislador constituinte originário, e o derivado, especialmente a partir do advento da EC 1/98, fixou balizas de natureza cogente para coibir quaisquer práticas, por parte dos administradores públicos, que, de alguma forma, buscassem finalidade diversa do interesse público, como a nomeação de parentes para cargos em comissão ou de confiança, segundo uma interpretação equivocada dos incisos II e V do art. 37 da CF. Considerou-se que a referida nomeação de parentes ofende, além dos princípios da moralidade administrativa e da impessoalidade, o princípio da eficiência, haja vista a inapetência daqueles para o trabalho e seu completo despreparo para o exercício das funções que alegadamente exercem. Frisou-se, portanto, que as restrições impostas à atuação do administrador público pelo princípio da moralidade e demais postulados do art. 37 da CF são auto-aplicáveis, por trazerem em si carga de normatividade apta a produzir efeitos jurídicos, permitindo, em conseqüência, ao Judiciário exercer o controle dos atos que transgridam os valores fundantes do texto constitucional. Com base nessas razões, e fazendo distinção entre cargo estritamente administrativo e cargo político, declarou-se nulo o ato de nomeação do motorista, considerando hígida, entretanto, a nomeação do Secretário Municipal de Saúde.
RE 579951/RN, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 20.8.2008. (RE-579951)
Repercussão Geral: Vedação ao Nepotismo e Aplicação aos Três Poderes - 3
O Tribunal aprovou o Enunciado da Súmula Vinculante 13 nestes termos: "A nomeação de cônjuge, companheiro, ou parente, em linha reta, colateral ou por afinidade, até o 3º grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica, investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança, ou, ainda, de função gratificada na Administração Pública direta e indireta, em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal.". A edição do verbete ocorreu após o julgamento do recurso extraordinário acima relatado. Precedentes citados:
ADI 1521/RS (DJU de 17.3.2000); ADC 12 MC/DF (DJU de 1º.9.2006); MS 23780/MA (DJU de 3.3.2006); RE 579951/RN (j. em 20.8.2008 ).
Repercussão Geral: Contratação Temporária e Competência da Justiça Comum - 1
O Tribunal, por maioria, deu provimento a recurso extraordinário interposto contra acórdão do Tribunal Superior do Trabalho - TST que entendera ser competente a Justiça do Trabalho para julgar pretensão deduzida pela recorrida, admitida como professora, pelo Estado do Amazonas, sob o regime de contratação temporária prevista em lei local (Lei 1.674/84). Na espécie, a recorrida ajuizou reclamação trabalhista, na qual pleiteia o reconhecimento de vínculo trabalhista e as verbas dele decorrentes, ao fundamento de que teria sido contratada pelo regime especial da Lei 1.674/84, mas que, em decorrência das prorrogações sucessivas desse contrato, esse vínculo teria se transmudado automaticamente num vínculo celetista. Aplicou-se a orientação fixada pelo Supremo em vários precedentes no sentido de que compete à Justiça Comum estadual processar e julgar causas instauradas entre a Administração Pública e seus servidores submetidos ao regime especial disciplinado por lei local editada antes da CF/88 com fundamento no art. 106 da CF/67, na redação que lhe conferiu a EC 1/69. Asseverou-se que esse entendimento foi reafirmado em inúmeros precedentes, já sob a égide da vigente Carta Magna. Enfatizou-se, ademais, que várias decisões vêm sendo prolatadas no sentido de que o processamento de litígio entre servidores temporários e a Administração Pública perante a Justiça do Trabalho afronta a decisão do Pleno na ADI 3395 MC/DF (DJU de 10.11.2006), na qual referendada cautelar que suspendeu liminarmente toda e qualquer interpretação conferida ao inciso I do art. 114 da CF, na redação dada pela EC 45/2004, que inclua, na competência da Justiça do Trabalho, a apreciação de causas que sejam instauradas entre o Poder Público e seus servidores, a ele vinculados por típica relação de ordem estatutária ou de caráter jurídico-administrativo.
RE 573202/AM, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 21.8.2008. (RE-573202)
Repercussão Geral: Contratação Temporária e Competência da Justiça Comum - 2
Mencionou-se, também, o que afirmado no julgamento da Rcl 5381/AM (DJE 8.8.2008), no sentido de que, depois da decisão proferida na ADI 2135 MC/DF (DJE de 7.3.2008), que suspendera os efeitos da EC 19/98 para retornar ao regime jurídico único, não haveria como, no sistema jurídico-administrativo brasileiro constitucionalmente posto, comportar esse tipo de contratação pelo regime da CLT. Por fim, asseverou-se que a prorrogação indevida no contrato de trabalho de servidor temporário não transmuda esse vínculo original, de natureza tipicamente administrativa, num vínculo trabalhista. Aduziu-se que a prorrogação do contrato, nessas circunstâncias, seja ela expressa ou tácita, em que se opera a mudança do prazo de vigência deste, de temporário para indeterminado, pode até ensejar nulidade ou caracterizar ato de improbidade, com todas as conseqüências que isso acarreta, mas não alterar a natureza jurídica do vínculo. Vencido o Min. Marco Aurélio que afirmava que a competência seria definida pela causa de pedir e pelo pedido, e, tendo em conta que, no caso, a recorrida ajuizara uma reclamação trabalhista, evocando, a partir do princípio da realidade, a existência do vínculo empregatício, reputava ser da Justiça do Trabalho a competência para dirimir o conflito de interesses. Outros precedentes citados: RE 130540/DF (DJU de 18.8.95); RE 102358/MG (DJU de 28.9.84); RE 136179/DF (DJU de 2.8.96); RE 215819/RS (DJU de 28.5.99); RE 367638/AM (DJU de 28.3.2003); CJ 6829/SP (j. em 15.3.89); Rcl 4903 AgR/SE (DJE de 8.8.2008).
RE 573202/AM, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 21.8.2008. (RE-573202)
PRIMEIRA TURMA
HC: Impetração em favor de Pessoa Jurídica e Não Conhecimento - 1
A pessoa jurídica não pode figurar como paciente de habeas corpus, pois jamais estará em jogo a sua liberdade de ir e vir, objeto que essa medida visa proteger. Com base nesse entendimento, a Turma, preliminarmente, em votação majoritária, deliberou quanto à exclusão da pessoa jurídica do presente writ, quer considerada a qualificação como impetrante, quer como paciente. Tratava-se, na espécie, de habeas corpus em que os impetrantes-pacientes, pessoas físicas e empresa, pleiteavam, por falta de justa causa, o trancamento de ação penal instaurada, em desfavor da empresa e dos sócios que a compõem, por suposta infração do art. 54, § 2º, V, da Lei 9.605/98. Sustentavam, para tanto, a ocorrência de bis in idem, ao argumento de que os pacientes teriam sido responsabilizados duplamente pelos mesmos fatos, uma vez que já integralmente cumprido termo de ajustamento de conduta com o Ministério Público Estadual. Alegavam, ainda, a inexistência de prova da ação reputada delituosa e a falta de individualização das condutas atribuídas aos diretores.
HC 92921/BA, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 19.8.2008. (HC-92921)
HC: Impetração em favor de Pessoa Jurídica e Não Conhecimento - 2
Enfatizou-se possibilidade de apenação da pessoa jurídica relativamente a crimes contra o meio ambiente, quer sob o ângulo da interdição da atividade desenvolvida, quer sob o da multa ou da perda de bens, mas não quanto ao cerceio da liberdade de locomoção, a qual enseja o envolvimento de pessoa natural. Salientando a doutrina desta Corte quanto ao habeas corpus, entendeu-se que uma coisa seria o interesse jurídico da empresa em atacar, mediante recurso, decisão ou condenação imposta na ação penal, e outra, cogitar de sua liberdade de ir e vir. Vencido, no ponto, o Min. Ricardo Lewandowski, relator, que, tendo em conta a dupla imputação como sistema legalmente imposto (Lei 9.605/98, art. 3º, parágrafo único) - em que pessoas jurídicas e naturais farão, conjuntamente, parte do pólo passivo da ação penal, de modo que o habeas corpus, que discute a viabilidade do prosseguimento da ação, refletiria diretamente na liberdade destas últimas -, conhecia do writ também em relação à pessoa jurídica, dado o seu caráter eminentemente liberatório.
HC 92921/BA, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 19.8.2008. (HC-92921)
Trancamento de Ação Penal e Inépcia da Inicial - 3
Em seguida, rejeitou-se afirmação do Tribunal de origem de que o parquet estadual seria absolutamente incompetente para propor a ação penal ou para convalidar eventual medida despenalizadora, ante o caráter transfronteiriço do rio em que supostamente lançados resíduos poluentes. Asseverou-se que a preservação do meio ambiente está inserida no âmbito da competência comum, consoante fora afirmado pelo STJ. No mérito, indeferiu-se a ordem. Quanto à denúncia, aduziu-se que, embora sucinta, não impede o exercício da ampla defesa e está em conformidade com o disposto no art. 41 do CPP. Relativamente à alegada dupla persecução pelos mesmos fatos, registrou-se que, cuidando-se de delitos ambientais, o termo de ajustamento de conduta não pode consubstanciar salvo-conduto para que empresa potencialmente poluente deixe de ser fiscalizada e responsabilizada na hipótese de reiteração da atividade ilícita. Ademais, considerou-se não ser possível decretar o trancamento da ação penal, pela via do habeas corpus, porquanto não configurada situação excepcional autorizadora. Por fim, no que tange à falta de individualização das condutas dos dirigentes, aplicou-se jurisprudência do STF no sentido de que, em crimes societários, não há inépcia da inicial acusatória pela ausência de indicação individualizada da conduta de cada indiciado, sendo suficiente que os acusados sejam de algum modo responsáveis pela condução da sociedade sob a qual foram praticados os delitos.
HC 92921/BA, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 19.8.2008. (HC-92921)
Dosimetria: Tráfico de Drogas e Natureza do Entorpecente
A Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus em que requerida a exclusão de circunstância judicial reputada inidônea para elevar a pena-base acima do mínimo legal. No caso, o paciente fora condenado à pena de 5 anos e 4 meses de reclusão por tráfico ilícito de entorpecente (Lei 6.368/76, art. 12) e tivera sua pena redimensionada para 4 anos, em idêntico regime prisional, pelo STJ, que excluíra a circunstância de o réu utilizar-se de sua residência para comercializar drogas. Mantivera, contudo, o aumento decorrente da natureza da substância apreendida, cocaína, em razão de sua maior nocividade à saúde pública, dado o seu alto grau de dependência física e psíquica. A impetração sustentava que a natureza do entorpecente não poderia ser invocada para a majoração da pena, alegando ausência de elementos concretos aptos a legitimá-la. Inicialmente, salientou-se que, embora tipificadas por fontes heterônomas que complementam a norma penal em branco, as espécies de substâncias entorpecentes constituem elementares do tipo, e que cabe ao juiz conjugá-las a outros fatores, como a quantidade e a qualidade, ao individualizar a pena a ser aplicada. Nesse sentido, afirmou-se que a quantidade e a espécie de entorpecente traficado, quando combinadas, são circunstâncias judiciais que podem justificar a exasperação da pena-base para além do mínimo legal e que, na hipótese, a majoração não se amparara somente na circunstância de a cocaína deter maior potencial lesivo. Entendeu-se que, na espécie, houve a indicação de fatos concretos para que fosse efetuado o acréscimo da pena do paciente, enfatizando-se a apreensão de 14 g de cocaína, situação que, em tese, deveria ser diferenciada da apreensão da mesma quantidade de outras substâncias capazes de configurar o crime. Por fim, aduziu-se que não haveria que se falar em desproporcionalidade no aumento da pena-base em 1 ano de reclusão, sobretudo se levado em conta que a reprimenda cominada ao delito varia de 3 a 15 anos de reclusão. Vencido o Min. Ricardo Lewandowski que concedia a ordem para reduzir a pena-base ao patamar mínimo por considerar que a majoração da pena com fundamento na natureza da substância entorpecente ampliaria demais a discricionariedade do juiz, afetando os princípios da legalidade e da segurança jurídica.
HC 94655/MS, rel. Min. Cármen Lúcia, 19.8.2008. (HC-94655)
Comutação de Pena a Beneficiado com Livramento Condicional
A Turma deferiu habeas corpus contra acórdão do STJ que cassara benefício de comutação da pena ao fundamento de que, na ausência de disposição expressa no Decreto 5.295/2004 - que concede indulto condicional, comutação e dá outras providências -, estaria vedada a sua outorga àqueles que estivessem em livramento condicional. Enfatizou-se que, na espécie, não há impedimento decorrente do mencionado decreto, pois as condenações impostas ao paciente se referem a fatos ocorridos antes da edição da Lei 8.072/90. Ademais, tendo em conta as peculiaridades do caso, considerou-se que o paciente preencheu todos os requisitos exigidos para a comutação da pena previstos no art. 2º do referido decreto e que a omissão contida em tal diploma, quanto ao tratamento a ser conferido aos condenados à pena privativa de liberdade que obtiveram livramento condicional até determinada data, reforçaria a tese de silêncio eloqüente, devendo essa falta ser interpretada no sentido de, relativamente a esses reeducandos, não haver impedimento para a comutação pretendida. Assim, concluiu-se que a interpretação a ser dada ao citado Decreto 5.295/2004 é a de que a comutação de pena não é vedada àqueles que estão em livramento condicional. Ordem concedida para restabelecer a decisão proferida pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, que deferira a comutação da pena.
HC 94654/RS, rel. Min. Cármen Lúcia, 19.8.2008. (HC-94654)
SEGUNDA TURMA
Descaminho e Princípio da Insignificância
Por ausência de justa causa, a Turma deferiu habeas corpus para determinar o trancamento de ação penal instaurada contra acusado pela suposta prática do crime de descaminho (CP, art. 334), em decorrência do fato de haver iludido impostos devidos pela importação de mercadorias, os quais totalizariam o montante de R$ 5.118,60 (cinco mil cento e dezoito reais e sessenta centavos). No caso, o TRF da 4ª Região, por reputar a conduta do paciente materialmente típica, negara aplicação ao princípio da insignificância ao fundamento de que deveria ser mantido o parâmetro de R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais) para ajuizamento de execuções fiscais (Lei 10.522/2002) e não o novo limite de R$ 10.000,00 (dez mil reais) instituído pela Lei 11.033/2004. Inicialmente, salientou-se o caráter vinculado do requerimento do Procurador da Fazenda para fins de arquivamento de execuções fiscais e a inexistência, no acórdão impugnado, de qualquer menção a possível continuidade delitiva ou acúmulo de débitos que conduzisse à superação do valor mínimo previsto na Lei 10.522/2002, com a redação dada pela Lei 11.033/2004 ["Art. 20. Serão arquivados, sem baixa na distribuição, mediante requerimento do Procurador da Fazenda Nacional, os autos das execuções fiscais de débitos inscritos como Dívida Ativa da União pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional ou por ela cobrados, de valor consolidado igual ou inferior a R$ 10.000,00 (dez mil reais). § 1o Os autos de execução a que se refere este artigo serão reativados quando os valores dos débitos ultrapassarem os limites indicados."]. Entendeu-se não ser admissível que uma conduta fosse irrelevante no âmbito administrativo e não o fosse para o Direito Penal, que só deve atuar quando extremamente necessário para a tutela do bem jurídico protegido, quando falharem os outros meios de proteção e não forem suficientes as tutelas estabelecidas nos demais ramos do Direito.
HC 92438/PR, rel. Min. Joaquim Barbosa, 19.8.2008. (HC-92438)