Informativo do STF 42 de 30/08/1996
Publicado por Supremo Tribunal Federal
Plenário
Extradição: Caso Qian Hong
Entendendo que a estrutura excessivamente aberta e flexível do tipo constante da legislação penal chinesa não permitiria o enquadramento seguro, no próprio Estado requerente, da conduta imputada ao extraditando, o Tribunal, em face da impossibilidade de verificar o cumprimento do requisito da dupla incriminação (Lei 6815/80, art. 77, II: "Não se concederá a extradição quando: II - o fato que motivar o pedido não for considerado crime no Brasil ou no Estado requerente;"), indeferiu a extradição de Quian Hong, requerida pela República Popular da China, onde o extraditando está sendo processado por fatos que, no Brasil, seriam capitulados como estelionato (CP, art. 171). Ext 633-República Popular da China, rel. Min. Celso de Mello, 28.08.96.
Regime Jurídico Único e Banco Central
Declarada a inconstitucionalidade do art. 251 da Lei 8112/90, que excluía do regime jurídico único, aplicável aos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais, os servidores do Banco Central do Brasil ("Enquanto não for editada a lei complementar de que trata o artigo 192 da Constituição Federal, os servidores do Banco Central do Brasil continuarão regidos pela legislação em vigor à data da publicação desta Lei."). Rejeitando a tese de que o regime jurídico estaria incluído entre as matérias mencionadas no art. 192, IV, da CF - que remete à lei complementar do sistema financeiro a disciplina sobre "a organização, o funcionamento e as atribuições do banco central e demais instituições financeiras públicas e privadas;"-, o Tribunal entendeu que os servidores do Banco Central (autarquia federal) também se sujeitam ao regime instituído pela Lei 8112/90. Reconheceu-se, na espécie, ofensa ao art. 39, caput, da CF ("A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão, no âmbito de sua competência, regime jurídico único e planos de carreira para os servidores da administração pública direta, das autarquias e das fundações públicas.").
ADIn 449-DF, rel. Min. Carlos Velloso, 29.08.96.
Vinculação de Remuneração
Deferida a suspensão de eficácia de dispositivo da Constituição do Estado de São Paulo que vincula a remuneração percebida por procuradores autárquicos à percebida pelos procuradores do Estado. Vencido o Min. Celso de Mello, relator, que, reconhecendo embora a plausibilidade da argüição de inconstitucionalidade - deduzida pelo Governador do Estado, autor da ação, com fundamento no art. 37, XIII, da CF -, não via, na espécie, periculum in mora para o deferimento da cautelar. Precedentes citados:
ADIn 120-AM (DJ de 26.04.96) e ADIn 112-BA (DJ de 09.02.96). ADIn 1.434-SP, rel. Min. Celso de Mello, 29.08.96.
Primeira Turma
Erro Material: Inocorrência
A aplicação ao crime de atentado violento ao pudor cometido contra menor de 14 anos da pena do parágrafo único do art. 214 do CP (acrescentado pela Lei 8069/90 e revogado expressamente pela Lei 9291/96), em vez da prevista na Lei 8072/90 (Crimes Hediondos), não constitui erro material a autorizar a retificação ex officio da sentença pelo juiz. Com esse fundamento, a Turma deferiu habeas corpus impetrado contra acórdão do Tribunal de Justiça do Pará que, identificando na espécie simples erro material, afirmara a validade da decisão que corrigira de ofício a sentença condenatória para duplicar a pena imposta ao réu. Com o deferimento do writ e o restabelecimento da primeira sentença - que condenara o paciente à pena de três anos em regime aberto -, determinou-se a reabertura do prazo para a interposição de recursos pelas partes.
HC 73.211-PA, rel. Min. Octavio Gallotti, 27.08.96.
Progressão e Crime Hediondo
Se, a despeito do que estabelece o § 1º do art. 2º da Lei 8072/90 ("A pena por crime previsto neste artigo será cumprida integralmente em regime fechado."), a sentença reconhece ao condenado por crime definido como hediondo o direito de "cumprir a pena imposta, desde o início, em regime semi-aberto", é porque não apenas afasta, de modo expresso, a adoção do regime fechado, como admite implicitamente a progressão vedada pelo mencionado dispositivo. Com base nesse entendimento, e verificando que essa sentença transitara em julgado para a acusação, a Turma deferiu habeas corpus impetrado contra acórdão do Tribunal de Justiça do Paraná que, em julgamento de recurso interposto pela defesa, interpretara a referida cláusula no sentido de haver ela determinado que a pena fosse cumprida integralmente no regime semi-aberto. Precedentes citados:
HC 68847-RJ (RTJ 138/218) e HC 72897-CE (DJ de 20.10.95). HC 73.980-PR, rel. Min. Moreira Alves, 27.08.96.
Falta de Justa Causa
Deferido habeas corpus impetrado em favor de prefeito municipal processado perante o Tribunal de Justiça do Paraná, para determinar o trancamento da ação penal na parte em que imputava ao paciente a prática do crime previsto no art. 1º, XIV, do DL 201/67 (negar execução à lei estadual). A Turma entendeu que o prefeito, ao contratar prestação de serviço com empresa pertencente a funcionário municipal, não descumprira a regra do art. 29 da Constituição estadual ("Nenhum servidor poderá ser diretor ou integrar conselho de empresa fornecedora, ou que realize qualquer modalidade de contrato com o Estado, sob pena de demissão do serviço público."), e, portanto, não infringira o mencionado dispositivo do DL 201/67, faltando, em conseqüência, justa causa para a ação penal.
HC 73.997-PR, rel. Min. Moreira Alves, 27.08.96.
Poupança e Ato Jurídico Perfeito
O depositante em caderneta de poupança tem direito à manutenção das condições contratuais vigentes na data do depósito inicial ou da renovação, pelo prazo previsto para o pagamento dos juros e da correção monetária devidos pela instituição financeira. Reconhecendo na hipótese a existência de ato jurídico perfeito, a Turma afastou a alegação de ofensa ao art. 5º, XXXVI, da CF, deduzida pela Caixa Econômica Federal em recurso extraordinário interposto contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região que julgara procedente ação ajuizada por investidor, visando ao recebimento dos rendimentos que deixaram de ser pagos em virtude da aplicação imediata, aos contratos em curso, da Medida Provisória nº 32, de 15.01.89 - posteriormente convertida na Lei 7730/89 (Plano Verão) -, que modificara o índice de correção monetária aplicável às cadernetas de poupança.
RE 200.514-RS, rel. Min. Moreira Alves, 27.08.96.
Cabimento de Recurso no TST
No Tribunal Superior do Trabalho, decisão interlocutória proferida por relator é impugnável mediante agravo regimental. Afirmando a correção desse entendimento - que decorre da nova redação da Súmula 214 do TST ("As decisões interlocutórias, na Justiça do Trabalho, só são recorríveis de imediato quando terminativas do feito, podendo ser impugnadas na oportunidade da interposição de recurso contra decisão definitiva, salvo quando proferidas em acórdão sujeito a recurso para o mesmo Tribunal.") -, a Turma negou provimento a recurso ordinário interposto pelo Estado do Rio Grande do Sul contra acórdão do TST que julgara incabível mandado de segurança impetrado contra despacho de relator que relevara deserção de recurso da outra parte, ao fundamento de que esse despacho deveria ter sido objeto de agravo regimental. Aplicação da Súmula 267 do STF ("Não cabe mandado de segurança contra ato judicial passível de recurso ou correição.").
RMS 22489-DF, rel. Min. Octavio Gallotti, 27.08.96.
Direito Adquirido contra a CF
Conhecido e provido recurso extraordinário interposto pelo Estado de Goiás contra acórdão do Tribunal de Justiça local que reconhecera aos recorridos direito adquirido a que as pensões especiais a eles concedidas antes da CF/88 continuassem vinculadas ao salário mínimo. Decisão fundada no art. 7º, IV, parte final, da CF - que proíbe a utilização do salário mínimo como indexador para qualquer fim - e no entendimento de que inexiste direito adquirido contra a Constituição. Precedente citado:
RE 140499-GO (DJ de 09.09.94). RE 143.812-GO, rel. Min. Ilmar Galvão, 27.08.96.
Taxa de Localização e Funcionamento
Confirmado acórdão do Tribunal de Justiça do Ceará que afastou a cobrança de taxa de localização e funcionamento pelo Município de Fortaleza, ao fundamento de ser ela inconstitucional "quando cobrada em repetição anual, desvinculada da existência de qualquer serviço que caracterize uma atuação sinalagmática para o tributo". Vencido o Min. Ilmar Galvão. Precedentes citados: (RE 80.441-ES (RTJ 88/882); RE 88.371-MG (RTJ 92/1295); RE 115.983-SP (RTJ 125/1346); RE 115.213-SP (RTJ 137/882).
RE 140.278 -CE, rel. Min. Sydney Sanches, 27.08.96.
Segunda Turma
Excesso de Prazo
Deferido habeas corpus impetrado contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro que, ao anular sentença condenatória em julgamento de apelação, deixou de determinar a soltura do réu, desconsiderando o fato de que sua prisão, decorrente de flagrante, já se estendia por período equivalente a quase um terço da pena imposta em primeira instância.
HC 74.130-RJ, rel. Min. Maurício Corrêa, 27.08.96.
Competência Recursal
A tentativa de latrocínio configura-se pela prática de homicídio tentado e subtração tentada, sendo irrelevante que da violência tenha resultado somente lesão corporal leve. No Estado de São Paulo, a competência para julgar a tentativa de latrocínio em grau de recurso é do Tribunal de Alçada Criminal, nos termos do art. 79, II, a, da Constituição local ("Ressalvada a competência residual do Tribunal de Justiça, compete, em grau de recursos, aos Tribunais de Alçada, além de outros feitos definidos em lei, processar e julgar:... II - em matéria criminal: a) os crimes contra o patrimônio, seja qual for a natureza da pena cominada, excetuados os com evento morte."). Entendimento de que os crimes excetuados da competência do Tribunal de Alçada são aqueles em que o evento morte efetivamente se verifique, o que exclui a tentativa de latrocínio.
HC 74.155-SP, rel. Min. Maurício Corrêa, 27.08.96.
Fiança
A falta de efeito suspensivo dos recursos extraordinário e especial e a conseqüente possibilidade de execução provisória da condenação não impedem a concessão de fiança ao réu, nos termos do art. 334, CPP, ("A fiança poderá ser prestada em qualquer termo do processo, enquanto não transitar em julgado a sentença condenatória"). Com base nesse dispositivo, a Turma deu provimento a recurso em habeas corpus interposto em favor de réu julgado originariamente e condenado pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul por infração ao art. 20 da Lei de Imprensa ("caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime"), para que o presidente daquela corte arbitre a fiança a ser satisfeita pelo paciente, sendo-lhe assegurada a liberdade até o trânsito em julgado da decisão condenatória. Precedentes citados:
HC 72.169-RJ, (DJU de 09.06.96); HC 73.151-RJ (DJU de19.04.96) RHC 74.035-RS, rel. Min. Francisco Rezek, 27.08.96.
Contribuição Federativa
A contribuição federativa prevista no art. 8º, IV, da CF ("IV - a assembléia geral fixará a contribuição que, em se tratando de categoria profissional, será descontada em folha, para custeio do sistema confederativo da representação sindical respectiva, independentemente da contribuição prevista em lei;") distingue-se da contribuição sindical por não possuir natureza tributária (art. 149, CF: "Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas...") e, portanto, não tem caráter compulsório para os trabalhadores não filiados ao sindicato. Com base nesse entendimento, a Turma não conheceu de recursos extraordinários interpostos por diversos sindicatos que pretendiam cobrar a referida contribuição federativa de todos os membros das respectivas categorias.
RREE 198.092-SP, 170439-MG, 193972-SP, rel. Min. Carlos Velloso, 27.08.96.
Exame Psicotécnico
Não ofende o art. 37, I da CF (" I - os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei;) decisão que considera não exigível o exame psicotécnico em concurso público para o ingresso na carreira policial civil do Distrito Federal, tendo em vista a falta de previsão legal para tal procedimento. Com base nesse entendimento, a Turma não conheceu de recurso extraordinário interposto pelo Distrito Federal. Precedente:
RE 112.676-MG (RTJ 124/770). RE 176168-DF, rel. Min. Francisco Rezek, 27.08.96.