Informativo do STF 384 de 22/04/2005
Publicado por Supremo Tribunal Federal
PLENÁRIO
Estado de Calamidade Pública e Sistema Único de Saúde - 1
O Tribunal concedeu mandado de segurança impetrado contra o Decreto Presidencial 5.392/2005, que declara estado de calamidade pública do setor hospitalar do Sistema Único de Saúde - SUS no Município do Rio de Janeiro, e, dentre outras determinações, autoriza, nos termos do inciso XIII do art. 15 da Lei 8.080/90, a requisição, pelo Ministro da Saúde, dos bens, serviços e servidores afetos a hospitais daquele Município ou sob sua gestão (Lei 8.080/90: "Art. 15. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios exercerão, em seu âmbito administrativo, as seguintes atribuições:... XIII - para atendimento de necessidades coletivas, urgentes e transitórias, decorrentes de situações de perigo iminente, de calamidade pública ou de irrupção de epidemias, a autoridade competente da esfera administrativa correspondente poderá requisitar bens e serviços, tanto de pessoas naturais como de jurídicas, sendo-lhes assegurada justa indenização;"). O Min. Joaquim Barbosa, relator, entendeu ser nulo o ato presidencial impugnado ante a insuficiência de motivação expressa, porquanto ausente qualquer alusão aos motivos de fato ou de direito determinantes de sua prática. Ressaltou, ainda, a possibilidade de a requisição incidir sobre bens públicos, sem a necessidade da decretação do estado de defesa, por ser ela instituto que visa fornecer alternativas à administração para solução de problemas em casos de eminente perigo público.
MS 25295/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 20.4.2005. (MS-25295)
Estado de Calamidade Pública e Sistema Único de Saúde - 2
O Min. Carlos Britto divergiu em parte do relator. Considerou tratar-se, na espécie, não de requisição, mas de intervenção federal no município, não admitida pela Constituição Federal, com apossamento de bens, serviços, servidores e recursos públicos municipais, pela União, fora dos parâmetros do estado de defesa e do estado de sítio (CF, arts. 136 e 137 e ss., respectivamente). Concluiu, dessa forma, ter sido o município em questão desafetado de serviço que lhe é próprio, por destinação constitucional, já que a saúde pública é área de atuação de toda pessoa federada, correspondendo a um condomínio funcional, nos termos do art. 196, da CF. Afastou, ainda, a viabilidade de requisição de bens públicos na forma preconizada pelo inciso XIII do art. 15 da Lei 8.080/90, haja vista tal dispositivo estar relacionado ao art. 5º, XXV, da CF, que prevê que a requisição de uso temporário apenas incide sobre bens particulares. Reconhecendo a nulidade do ato por falta de motivação e o caráter interventivo do mesmo, concedeu a ordem o Min. Cezar Peluso. Acrescentou que a requisição como tal pressupõe que o bem requisitado tenha destinação natural diversa daquela prevista na Constituição, qual seja, atender a iminente perigo público, o que não teria sido observado no caso, e, ainda, o fato de a própria lei invocada como suporte da requisição impedir que se extravasasse o âmbito administrativo de cada unidade federada.
MS 25295/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 20.4.2005. (MS-25295)
Estado de Calamidade Pública e Sistema Único de Saúde - 3
Na linha dos dois últimos votos, decidiram os Ministros Gilmar Mendes e Ellen Gracie. Perfilharam, ainda, a conclusão quanto ao caráter interventivo do ato impugnado os Ministros Carlos Velloso e Celso de Mello. O Min. Marco Aurélio adotou o entendimento da nulidade do decreto por ausência de fundamentação. O Min. Sepúlveda Pertence acompanhou os votos dos Ministros Carlos Britto e Cezar Peluso no que respeita à tese da intervenção, deixando, no entanto, de considerar o vício apontado pelo relator quanto à falta de motivação do ato porque estranho à causa de pedir. O Min. Nelson Jobim, Presidente, por fim, seguindo a maioria formada reconhecendo a nulidade do ato por falta de fundamentação, apontou restrição quanto à amplitude do seu voto no sentido de - tendo em conta ser da competência comum da União, Estados, DF e Municípios a função de cuidar da saúde e da assistência pública (CF, art. 23, II), e diante de determinadas circunstâncias, como a da negativa absoluta da prestação do serviço pela unidade federada - não se caminhar para a intervenção, mas para o cumprimento daquela obrigação constitucional, a fim de se evitar que o conflito federativo implique prejuízo aos cidadãos. Ordem deferida para restabelecer a administração e a gestão, por parte do Município do Rio de Janeiro, dos hospitais municipais Souza Aguiar e Miguel Couto; a administração dos servidores municipais lotados nestes dois hospitais municipais; a manutenção dos serviços públicos de saúde nestes dois hospitais municipais; bem como vedar à União a pretensão de utilizar os servidores municipais, os bens e serviços contratados pelo município impetrante nos outros quatro hospitais, nos termos dos votos respectivos de cada um de seus ministros.
MS 25295/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 20.4.2005. (MS-25295)
PRIMEIRA TURMA
Prisão Preventiva e Excesso de Prazo
Por excesso de prazo, a Turma deferiu, de ofício, habeas corpus para conceder liberdade provisória a um de dois pacientes, denunciados com terceiros - com base em investigações realizadas envolvendo organização supostamente criminosa, denominada "Rede Chebabe" - pela prática dos crimes de formação de quadrilha ou bando (CP, art. 288), falsidade ideológica (CP, art. 299) e corrupção ativa (CP, art. 333, parágrafo único), cuja prisão preventiva, mantida pelo TRF da 2ª Região, fora decretada com fundamento na garantia da ordem pública. Alegava-se, na espécie, ausência de motivação legal do decreto de prisão cautelar e excesso de prazo. Inicialmente julgou-se prejudicado o pedido em relação a um dos pacientes, já que a Turma estendera-lhe os efeitos da decisão proferida no HC 85020/RJ (DJU de 18.2.2005). No que toca ao outro paciente, indiciado como chefe do mencionado grupo, asseverou-se que a questão relativa ao excesso de prazo da prisão poderia ser analisada de ofício, apesar de não ter sido objeto da petição do writ perante o TRF da 2ª Região. Assim, entendeu-se que a superação do prazo, cujo excesso prejudica o seu fundamento cautelar, ultrapassa os temperamentos admissíveis à luz do juízo de razoabilidade, já que, passados mais de quatro meses desde o julgamento daquele HC nesta Corte, o feito ainda se encontra na fase de diligências complementares, com a ressalva de que sem prazo certo de término. Salientou-se que, embora tais diligências tenham sido solicitadas pela defesa, a esta não poderia ser atribuída o atraso no encerramento da instrução.
HC 85068/RJ, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 19.4.2005. (HC-85068)
Ministério Público: Termo Inicial do Prazo Recursal
A Turma, tendo em conta que a eficácia do lançamento do "ciente" pelo representante do parquet como termo inicial do prazo recursal pressupõe a ausência de outra intimação pessoal, anterior, que, per si, baste para consumar o ato, deferiu habeas corpus para, reconhecendo a intempestividade de embargos de declaração opostos pelo Ministério Público Federal, anular o julgamento destes e, em conseqüência, restabelecer o acórdão embargado, que não conhecera de recurso especial. Considerou-se que, na espécie, deveria prevalecer, para efeito de contagem de início de prazo recursal, a data constante de certidão, não contestada, e lavrada pela Coordenadoria da 6ª Turma do STJ, na qual certificado que o membro do MPF fora devidamente intimado, na pessoa de seu representante legal. Ademais, afirmou-se que essa intimação deveria preponderar, inclusive, em relação a que é realizada mediante entrega do processo em setor administrativo do Ministério Público, formalizada a carga pelo servidor. Precedente citado:
HC 83255/SP (DJU de 12.3.2004). HC 83915/SP, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 19.4.2005. (HC-83915)
Defensoria Pública e Intimação Pessoal
A ausência de intimação pessoal do defensor público da pauta de julgamento acarreta a nulidade absoluta do julgado, não havendo que se falar em preclusão ou em necessidade de demonstração de prejuízo. Com base nesse entendimento, a Turma, mantendo a prisão decretada na sentença de pronúncia, deu provimento a recurso ordinário em habeas corpus interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que negara provimento a recurso em sentido estrito do paciente, representado pela Procuradoria de Assistência Judiciária daquele Estado, a qual não fora intimada para a sessão de julgamento do referido recurso. Precedentes citados:
RHC 83770/SP (DJU de 12.32004); HC 77359/DF (DJU de 23.10.98); HC 70612/SP (DJU de 15.4.94); HC 75732/SP (DJU de 31.10.97); HC 77141/RS (DJU de 21.8.98). RHC 85443/SP, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 19.4.2005. (RHC-85443)
SEGUNDA TURMA
HC e Inabilitação para Cargo Público
Não é cabível habeas corpus para questionar a aplicação de penas acessórias que não afetam de modo algum a liberdade de locomoção. Com base nesse entendimento, a Turma não conheceu de habeas corpus impetrado contra acórdão do STJ em que se pretendia a desconstituição de acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Piauí na parte em que determinara o afastamento do paciente do cargo de prefeito municipal em decorrência de sua condenação, a dois anos e quatro meses de reclusão e inabilitação para o exercício de cargo ou função pública, pela prática de crime tipificado no art. 1º, I, VI, VII e XI, do Decreto-lei 201/67. Precedentes citados:
HC 76605/SP (DJU de 18.9.98); HC 79791/GO (DJU de 4.8.2000); HC 84420/PI (DJU de 27.8.2004); HC 84326 AgR/PE (1º.10.2004). HC 84816/PI, rel. Min. Carlos Velloso, 19.4.2005. (HC-84816)
Prerrogativa de Foro e Suspensão de HC
Após o voto da Min. Ellen Gracie, relatora, a Turma, acatando preliminar suscitada pelo Min. Carlos Velloso, suspendeu, para aguardar o julgamento, pelo Pleno, das ADI 2797/DF e 2860/DF - nas quais se discute a constitucionalidade dos §§ 1º e 2º do art. 84 do CPP, inseridos pelo art. 1º da Lei 10.628/2002 -, o andamento de habeas corpus. Pretende-se, no writ, o reconhecimento, ante a nova redação do citado art. 84, da competência do STJ para julgar apelações - interpostas por magistrado aposentado e pelo Ministério Público contra sentença que condenara o primeiro apelante e absolvera o paciente, ex-senador - bem como a anulação do acórdão dessa Corte especial que determinara a remessa dos autos do processo criminal ao TRF da 3ª Região (CPP: "Art. 84. A competência pela prerrogativa de função é do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça, dos Tribunais Regionais Federais e Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, relativamente às pessoas que devam responder perante eles por crimes comuns e de responsabilidade. § 1o A competência especial por prerrogativa de função, relativa a atos administrativos do agente, prevalece ainda que o inquérito ou a ação judicial sejam iniciados após a cessação do exercício da função pública. § 2o A ação de improbidade, de que trata a Lei no 8.429, de 2 de junho de 1992, será proposta perante o tribunal competente para processar e julgar criminalmente o funcionário ou autoridade na hipótese de prerrogativa de foro em razão do exercício de função pública, observado o disposto no § 1o."). A Min. Ellen Gracie, relatora, com base em precedentes do STF, deferiu a ordem. Salientando a validade da sentença condenatória proferida antes da Lei 10.628/2002, à vista do princípio tempus regit actum, entendeu que, em razão da superveniente alteração legislativa, conferindo ao STJ a competência originária para julgar o primeiro apelante, seria desse órgão a atribuição para o julgamento dos referidos recursos. Mantida a liminar deferida anteriormente pelo Min. Presidente, que suspendera os efeitos do acórdão impugnado, até o julgamento definitivo do writ.
HC 85433/SP, rel. Min. Ellen Gracie, 19.4.2005. (HC-85433)
Concurso Público e Princípio da Isonomia
A Turma iniciou julgamento de recurso extraordinário interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte que, com fundamento no princípio da isonomia, afastara norma do edital de concurso público para provimento de cargo de escrivão da polícia civil e concedera mandado de segurança, a fim de conferir à impetrante, ora recorrida, o direito de realizar nova prova física. A Min. Ellen Gracie, relatora, deu provimento ao recurso. Entendeu que o tribunal de origem, ao acolher a pretensão da impetrante, que falhara durante a realização da prova física em decorrência de uma distensão muscular, longe de dar efetividade ao aludido princípio, acabou por ofender o da impessoalidade, uma vez que criou benefício não estendido aos demais candidatos. Ressaltou que é certo que o princípio da isonomia pressupõe a criação de distinções entre pessoas que estejam em situações diversas, contudo, essa discriminação precisa basear-se em pressupostos genéricos e impessoais, o que não fora observado na espécie, tendo o tribunal a quo, com o afastamento da disposição editalícia, premiado a impetrante em detrimento dos candidatos que também não foram aprovados no referido exame. Após, pediu vista dos autos o Min. Gilmar Mendes.
RE 351142/RN, rel. Min. Ellen Gracie, 19.4.2005. (RE-351142)