Informativo do STF 363 de 01/10/2004
Publicado por Supremo Tribunal Federal
PLENÁRIO
CPMI. Quebra de Sigilo. Fundamentação
O Tribunal indeferiu mandado de segurança impetrado contra ato da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito - CPMI do BANESTADO, que investiga evasão de divisas e outros crimes, consubstanciado na determinação de quebra de sigilos bancário, fiscal, telefônico e telemático dos impetrantes. Alegava-se a nulidade do ato coator, por ausência de fundamentação, uma vez que a quebra fora determinada sem que estivesse embasada em um mínimo de provas. Entendeu-se que a alegação era improcedente, já que a quebra em questão apresentara lastro fático suficiente a demonstrar, a princípio, o envolvimento dos impetrantes com os fatos investigados pela CPMI. Ressaltou-se que a comissão parlamentar de inquérito, por atuar na fase meramente investigatória, prescinde, para determinação de quebra de sigilo de dados, de fundamentação exaustiva, equiparável à exigida dos órgãos judiciais, destinando-se a levantar dados acerca de determinados fatos, para que, se for o caso, sejam os mesmos encaminhados ao titular da ação penal.
MS 24749/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 29.9.2004. (MS-24749)
Fazenda Pública. Honorários Advocatícios. Execução Não Embargada
O Tribunal negou provimento a recurso extraordinário interposto, com fundamento na alínea b do inciso III do art. 102 da CF, contra acórdão do TRF da 4ª Região que entendera ser devido o pagamento, pelo INSS, de honorários advocatícios em execução contra ele movida e não embargada, tendo em conta precedente da Corte Especial daquele Tribunal, no qual se declarara a inconstitucionalidade do art. 1º-D da Lei 9.494/97, na redação que lhe foi dada pela Medida Provisória 2.180-35/2001 ("Art.1o-D. Não serão devidos honorários advocatícios pela Fazenda Pública nas execuções não embargadas.") por não se vislumbrar a presença dos requisitos de relevância e urgência previstos no art. 62 da CF. Inicialmente, ressaltou-se a devolutividade ilimitada da análise da constitucionalidade da norma quando interposto o recurso extraordinário pela alínea b do permissivo constitucional. Em seguida, declarou-se, por maioria, incidentemente, a constitucionalidade da Medida Provisória 2.180-35/2001, com interpretação conforme de modo a reduzir-lhe a aplicação à hipótese de execução, por quantia certa, contra a Fazenda Pública (CPC, art. 730), excluídos os casos de pagamentos de obrigações definidos em lei como de pequeno valor, objeto do § 3º do art. 100 da CF ("Art. 100. À exceção dos créditos de natureza alimentícia, os pagamentos devidos pela Fazenda Federal, Estadual ou Municipal, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim. ... §3º O disposto no caput deste artigo, relativamente à expedição de precatórios, não se aplica aos pagamentos de obrigações definidas em lei como de pequeno valor que a Fazenda Federal, Estadual, Distrital ou Municipal deva fazer em virtude de sentença judicial transitada em julgado."). Entendeu-se que a norma impugnada veio a socorrer situação relevante e emergencial de urgência legislativa, tendo em conta a explosão da litigiosidade contra certas áreas da Fazenda Pública. Ressaltou-se a peculiaridade da execução por quantia certa contra esta movida, na qual ela estaria obrigada, mesmo que quisesse adimplir a condenação de outra forma, a pagar pelo sistema de precatórios, salvo a partir do advento da EC 20/98, que excetuou dessa regra os precatórios de pequeno valor. Concluiu-se que, no caso concreto, o recurso deveria ser improvido por se estar diante de hipótese de execução dessa última modalidade. Vencidos, na questão prejudicial de constitucionalidade, os Ministros Carlos Velloso, relator, Carlos Britto e Marco Aurélio, que declaravam a inconstitucionalidade formal e integral da norma impugnada. (CPC: "Art. 730. Na execução por quantia certa contra a Fazenda Pública, citar-se-á a devedora para opor embargos em 10 (dez) dias; se esta não os opuser, no prazo legal, observar-se-ão as seguintes regras: I - o juiz requisitará o pagamento por intermédio do presidente do tribunal competente; II - far-se-á o pagamento na ordem de apresentação do precatório e à conta do respectivo crédito.").
RE 420816/PR, rel. orig. Min. Carlos Velloso, rel. p/ acórdão Min. Sepúlveda Pertence, 29.9.2004. (RE-420816)
Mandado de Injunção. Lei Complementar. Atos Cooperativos
O Tribunal não conheceu de mandado de injunção impetrado pela Unimed Paulistana - Cooperativa de Trabalho Médico em que se alegava omissão legislativa caracterizada pela não edição de lei complementar estabelecendo "adequado tratamento tributário dos atos cooperativos", nos termos do art. 146, III, c, da CF, e se requeria a concessão da ordem para afastar a "exigibilidade da retenção das contribuições alcançadas pela Lei nº 10.833/83 - COFINS, PIS e CSLL" (CF: "Art. 146. Cabe à lei complementar:... III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre:... c) adequado tratamento tributário ao ato cooperativo praticado pelas sociedades cooperativas."). Entendeu-se, com base na jurisprudência do STF, inadequado o manejo do writ injuncional, em face da inexistência de situação configuradora de lacuna técnica que inviabilizasse o exercício de direitos e liberdades constitucionais (CF, art. 5º, LXXI), tendo em vista haver, no cenário jurídico, diversas leis ordinárias disciplinando sobre tributação das cooperativas (Lei 10.684/2003, art. 17; Lei 10.833/2003, art. 10, VI; Lei 10.865/2004, arts. 39 e 48; MP 9.718/98, art. 3º, §9º e art. 15). Ressaltou-se que, apesar dessas normas não terem a envergadura complementar a que alude o art. 146, III, c, da CF, a discussão em torno da constitucionalidade das mesmas haveria de ser formulada em ação direta de inconstitucionalidade, sob pena de se conferir ao mandado de injunção contornos próprios de processo objetivo. MI 701/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 29.9.2004. (MI-701)
ADI. Assistente Jurídico. Defensoria Pública. Concurso Público
O Tribunal julgou procedente pedido de ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pelo Governador do Estado do Amapá contra o art. 29 do Ato das Disposições Transitórias da Constituição estadual ("Art. 29. Os assistentes jurídicos pertencentes ao quadro do extinto Território Federal do Amapá, sob a subordinação da Procuradoria-Geral e da Defensoria Pública do Estado, que optarem pelo quadro de servidores estaduais, serão denominados Procuradores ou Defensores Públicos do Estado, assegurado o direito de integrar os respectivos quadros de carreira.") e contra os artigos 85, 86 e 87 da Lei Complementar estadual 8/94 ("Art. 85 - Na forma do disposto no art. 29 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição do Estado do Amapá, os Assistentes Jurídicos, pertencentes ao Quadro do extinto Território Federal do Amapá, e que à data da promulgação da Constituição do Estado do Amapá estavam em efetivo exercício na Defensoria Pública do Estado, poderão, no prazo de 120 (cento e vinte) dias, a partir da Publicação desta Lei Complementar, fazer opção pelo Quadro de Defensores Públicos do Estado do Amapá, no cargo efetivo de Defensor-Público do Estado de Categoria Especial. Art. 86 - É assegurado aos ocupantes de cargos efetivos de Assistentes Jurídicos, lotados na Defensoria Pública do Estado, o ingresso, mediante opção, na carreira de Defensor-Público do Estado de 1ª Categoria, no prazo previsto no artigo anterior. Art. 87 - Enquanto não preenchidos os cargos de Carreira da Defensoria Pública do Estado, o Defensor-Público Geral, as Chefias de Defensorias, Núcleos Regionais e da Corregedoria serão exercidas pelos Assistentes Jurídicos, com direitos e vantagens previstos nos artigos 59 e 64 desta Lei."). O requerente alegava ofensa aos artigos 5º, caput; 37, caput, II e V, da CF. Declarou-se a inconstitucionalidade dos dispositivos impugnados por se considerar que os mesmos violavam o princípio do concurso público (CF, art. 37, II: "a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração;"), assegurando-se, no entanto, os direitos provenientes do art. 22 do ADCT da CF/88 ("Art. 22. É assegurado aos defensores públicos investidos na função até a data de instalação da Assembléia Nacional Constituinte o direito de opção pela carreira, com a observância das garantias e vedações previstas no art. 134, parágrafo único, da Constituição.").
ADI 1267/AP, Min. Eros Grau, 30.9.2004. (ADI- 1267)
Sentença Estrangeira Contestada. Trânsito em Julgado. Prevalência
O Tribunal concluiu julgamento de sentença estrangeira contestada proposta por italiano contra brasileira, em que se pretendia a homologação de decisão do Tribunal de Roma, Itália, que declarara as partes legalmente separadas por mútuo consentimento e homologara o acordo firmado para a separação consensual - v. Informativo 353. O Pleno, por maioria, deferiu o pedido, em parte, excetuando da homologação a divisão de bens imóveis existentes no Brasil (CPC: "Art. 89. Compete à autoridade judiciária brasileira, com exclusão de qualquer outra: I - conhecer de ações relativas a imóveis situados no Brasil;"). Ressaltou-se, com base em jurisprudência da Corte, que a sentença homologanda, proposta em data anterior à decisão que decretara o divórcio entre as partes no Brasil, por já ter transitado em julgado, deveria prevalecer sobre esta última, ainda pendente de recurso. Vencidos os Ministros Ellen Gracie, relatora, Cezar Peluso e Celso de Mello que indeferiam integralmente o pedido por considerarem que o acordo estabelecido perante a Corte italiana atentava contra os princípios inerentes à própria soberania nacional e a ordem pública, e por julgarem que se deveria dar precedência à decisão proferida pelo Poder Judiciário brasileiro, ainda que não transitada em julgado.
SEC 7209/República Italiana, rel. orig. Min. Ellen Gracie, rel. p/ acórdão Min. Marco Aurélio, 30.9.2004. (SEC-7209)
Reserva Remunerada e Novo Cargo - 2
O Tribunal concluiu julgamento de mandado de segurança impetrado por oficial da Marinha contra ato do Presidente da República e do Diretor de Pessoal da Marinha, consistente na negativa de autorização de posse do impetrante no cargo de professor na Universidade Federal do Estado do Ceará, para o qual fora habilitado por meio de concurso público, tornando insubsistente ato de posse autorizado anteriormente pelo Ministro da Administração Federal, que determinara a agregação do impetrante para fins de reserva remunerada - v. Informativo 352. Indeferiu-se, por maioria, a segurança e cassou-se a liminar concedida com base na jurisprudência do STF no sentido de que a investidura de militar em novo cargo, com sua conseqüente transferência para a reserva remunerada, está subordinada à autorização do Presidente da República, de acordo com o §3º do art. 98 da Lei 6.880/80, norma recebida pelo §9º do art. 42 da CF, na sua redação original, que expressamente remete, à lei ordinária, o estabelecimento das condições de transferência dos militares para a inatividade. Vencido o Min. Marco Aurélio que concedia a segurança por considerar que, diante das peculiaridades do caso, e em prol da segurança jurídica, não se poderia admitir que os procedimentos administrativos anteriores, que autorizaram a posse e passagem do impetrante para reserva remunerada, não tivessem gerado efeitos válidos.
MS 22369/RJ, rel. Min. Ellen Gracie, 30.9.2004. (MS-22369)
Emenda Parlamentar e Vício de Iniciativa - 2
O Tribunal retomou julgamento de recurso extraordinário interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais que negara a ex-prefeitos do Município de Belo Horizonte o direito de continuarem a receber o subsídio mensal vitalício previsto no art. 21 da Lei municipal 3.052/79, revogado pela Lei municipal 5.714/90 - v. Informativo 245. Na sessão de 4.10.2001, o Min. Ilmar Galvão, relator, não conheceu do recurso por entender correto o acórdão recorrido. Ressaltou a inexistência de direito adquirido à pensão em questão, já que inserida em lei que ofende o princípio da iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo (CF/69: "Art. 65. É da competência do Poder Executivo a iniciativa das leis orçamentárias e das que abram créditos, fixem vencimentos e vantagens dos servidores públicos, concedam subvenção ou auxílio ou, de qualquer modo, criem ou aumentem a despesa pública. § 1º Não será objeto de deliberação a emenda de que decorra aumento de despesa global ou de cada órgão, fundo, projeto ou programa, ou que vise a modificar-lhe o montante, a natureza ou o objetivo."). Salientou que esse vício não poderia ser sanado em virtude da não submissão da norma ao controle abstrato de inconstitucionalidade nem pela superveniência de regulamento da referida vantagem por meio de decreto e nem pelo fato de seu pagamento não ter sido interrompido com o advento da CF/88, cujo inciso I do art. 63, de observância compulsória pelos Estados e Municípios e, ao contrário do que sustentado pelos recorrentes, veda aumento de despesa prevista em projetos de iniciativa exclusiva do Presidente da República. Acompanharam o relator, na ocasião, os Ministros Ellen Gracie e Maurício Corrêa. Prosseguindo no julgamento, o Min. Carlos Velloso, em voto-vista, e o Min. Joaquim Barbosa também seguiram o voto do relator. Após, o Min. Marco Aurélio pediu vista dos autos.
RE 290776/MG, rel. Min. Ilmar Galvão, 30.9.2004. (RE-290776)
PRIMEIRA TURMA
Arquivamento Provisório de Inquérito Policial
A Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus em que se pretendia a nulidade de acórdão de turma recursal de juizado especial criminal que indeferira idêntica medida e mantivera decisão de juízo singular que determinara o desarquivamento de inquérito policial instaurado contra o paciente pela suposta prática de lesões corporais simples. No caso concreto, o Ministério Público requerera o arquivamento do inquérito, por falta de interesse processual, em face da não localização da vítima para realização de exame complementar de corpo de delito, o que fora acolhido pelo juízo. Posteriormente, em decorrência da manifestação da vítima informando a existência de erro no endereço constante do mandado de intimação, o mesmo órgão ministerial pedira o desarquivamento do feito, o que também fora deferido. Sustentava o impetrante que o desarquivamento se dera em afronta ao art. 10, XXXIII, da Lei Complementar 28/92, do Estado do Rio de Janeiro ("Cabe ao Procurador-Geral requisitar autos arquivados, promover seu desarquivamento e, se for o caso, oferecer denúncia ou designar outro órgão do Ministério Público para fazê-lo."), e, ainda, ao Enunciado 524 da Súmula do STF ("Arquivado o inquérito policial, por despacho do juiz, a requerimento do promotor de justiça, não pode a ação penal ser iniciada, sem novas provas."). Esclareceu-se, de início, que o art. 72 da Lei 9.099/95, ao exigir a presença da vítima para audiência preliminar, criou, implicitamente, na hipótese da mesma não ser localizada para tanto, nova modalidade de arquivamento das peças informativas diversa daquelas previstas no art. 18 do CPP, na Súmula 524 e na norma estadual invocada (Lei 9.099/95, art. 72: "Na audiência preliminar, presente o representante do Ministério Público, o autor do fato e a vítima e, se possível, o responsável civil, acompanhados por seus advogados, o Juiz esclarecerá sobre a possibilidade da composição dos danos e da aceitação da proposta de aplicação imediata de pena não privativa de liberdade."; CPP, art. 18: "Depois de ordenado o arquivamento do inquérito pela autoridade judiciária, por falta de base para a denúncia, a autoridade policial poderá proceder a novas pesquisas, se de outras provas tiver notícia."). Entendeu-se que, sendo hipótese de crime condicionado à representação do ofendido, o arquivamento do feito somente seria considerado definitivo se a vítima, ciente deste, se mantivesse inerte, o que não ocorrera na espécie. Vencido o Min. Marco Aurélio que deferia o writ por considerar que, em homenagem à segurança jurídica, a existência da premissa errônea não seria suficiente, por si só, para acatar o pedido de reconsideração do arquivamento.
HC 84638/RJ, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 28.9.2004. (HC-84638)
RE e Efeito Suspensivo: Militares Temporários e Estabilidade
A Turma referendou decisão do Min. Carlos Britto, relator, em ação cautelar, para conceder eficácia suspensiva a recurso extraordinário e garantir a permanência dos requerentes-recorrentes no serviço ativo da Força Aérea Brasileira - FAB. Na espécie, os recorrentes, militares temporários, licenciados ex officio da Corporação, pleiteiam o direito à estabilidade no serviço ativo da FAB, nos termos do art. 50, IV, da Lei 6.880/80 ("Art. 50. São direitos dos militares:... IV - nas condições ou nas limitações impostas na legislação e regulamentação específicas: a) a estabilidade, quando praça com 10 (dez) ou mais anos de tempo de efetivo serviço;"). O recurso extraordinário fora interposto contra acórdão do TRF da 2ª Região, que reformara sentença, proferida em ação cautelar inominada, na qual se reconhecera a mencionada estabilidade e se determinara a reintegração dos militares, tendo em conta a comprovada prestação de cerca de dez anos de serviço militar e a ausência de devida motivação da autoridade militar para interromper "a carreira das armas". Entendeu-se presente o periculum in mora, consubstanciado na edição de "ato administrativo revigorando o licenciamento e o desligamento" dos requerentes-recorrentes e o fumus boni iuris, em razão da satisfação, em princípio, do requisito a que se refere o dispositivo legal aludido para aquisição da estabilidade. Ressaltou-se, ainda, que o voto já proferido no recurso extraordinário é pelo seu provimento e que está em jogo a situação funcional dos requerentes-recorrentes, com reflexo direto na sua remuneração, de natureza alimentar.
AC 438 MC/RJ, rel. Min. Carlos Britto, 28.9.2004. (AC-438)
SEGUNDA TURMA
Revisão Geral de Remuneração e Enunciado 339 da Súmula
A Turma iniciou o julgamento de recurso extraordinário interposto pelo Estado do Rio de Janeiro, com base no art. 102, III, a e c, da CF, contra acórdão proferido pelo tribunal de justiça do mesmo Estado que deferiu mandado de segurança para garantir a defensores públicos, procuradores do Estado e delegados de polícia a percepção de reajustes concedidos, a título de abonos, a todos os servidores públicos daquele ente federativo, bem como para assegurar-lhes a observância do teto limite remuneratório fixado em Decreto Legislativo estadual. O recorrente sustenta, na espécie, a inconstitucionalidade do Decreto Legislativo Estadual 16/90, que fixou a remuneração dos membros da Assembléia Legislativa em 75% do que percebido por deputado federal, uma vez que o mesmo teria sido julgado válido, pelo acórdão recorrido, em face da Constituição. Alega também: a) a ofensa aos arts. 2º; 5º, LXIX; 27, §2º; 37, XI, XII, XIII; 60, §4º, III; 61, §1º, II, a; 96, II, b; 167, II; 169, parágrafo único e incisos, todos da CF; b) a violação ao art. 38 do ADCT; c) a impossibilidade do exame da questão, em sede de mandado de segurança, já que envolve ampla instrução probatória; d) a indevida relação estipendial transfederativa estabelecida pelo acórdão, fixando os vencimentos no âmbito estadual em decorrência de alterações no plano federal, sem o necessário concurso decisório dos poderes Executivo e Legislativo locais; e) a impossibilidade do Poder Judiciário local, consoante disposto no Enunciado 339 da Súmula do STF ("Não cabe ao Poder Judiciário, que não tem função legislativa, aumentar vencimentos de servidores públicos sob fundamento da isonomia"), aumentar vencimentos de servidores públicos a pretexto de isonomia, sob pena de ofensa ao princípio da separação dos poderes; f) que a concessão dos abonos não lesionou o princípio da isonomia, pois não se tratou de revisão geral, mas de correção de anomalias existentes na remuneração dos servidores. A Min. Ellen Gracie, relatora, não conheceu do recurso pela alínea c, por entender que o referido Decreto não fora contestado perante a Constituição Federal, mas apenas servira de fundamento ao acórdão recorrido para invalidar ato do poder Executivo local que fixou a remuneração dos secretários de Estado, este sim questionado em face do art. 49, VIII, da CF. No tocante ao fundamento previsto no art. 102, III, a, da CF, a relatora, considerando que somente os arts. 2º e 37, X, da CF foram prequestionados, conheceu do recurso e a ele negou provimento. Asseverou que, no caso, tendo o tribunal de justiça examinado os decretos estaduais e concluído tratar-se de revisão geral, haveria óbice, em recurso extraordinário, em se concluir de forma diversa e reinterpretar direito local. Assim, estabelecida a premissa de se estar diante de revisão geral, e não de hipótese de reajuste setorial, a relatora aplicou o precedente firmado no RMS 22307/DF (DJU de 13.6.97), no qual, com fundamento na auto-aplicabilidade do art. 37, X, da CF, em sua redação original, afastou-se o Enunciado 339 da Súmula do STF para garantir a todos os servidores públicos federais o reajuste concedido aos servidores militares pelas Leis 8.622/93 e 8.627/93. Após, pediu vista o Min. Joaquim Barbosa.
RE 393679/RJ, rel. Min. Ellen Gracie, 28.9.2004. (RE-393679)
Responsabilidade Civil do Estado e Desaparecido Político
A Turma iniciou julgamento de recurso extraordinário interposto contra acórdão do TRF da 5ª Região que afastara a ocorrência de prescrição para ação indenizatória e, por reconhecer a existência de responsabilidade objetiva, condenara a União a ressarcir, por dano moral, esposa de desaparecido político. A recorrente sustenta, na espécie, prescrição da pretensão indenizatória, ausência de provas de que o marido da recorrida desaparecera durante o regime de exceção e ofensa ao art. 37, §6º, da CF, por inexistência de nexo de causalidade entre a ação do Estado e o referido desaparecimento. Pretende a revisão do valor da indenização, em face da má situação financeira do país. O Min. Joaquim Barbosa, relator, não conheceu do recurso por considerar que as alegações de prescrição e de falta de provas dependem do exame de normas infraconstitucionais ou de alegações de fato resolvidas nas instâncias inferiores, inclusive para se viabilizar a fixação do termo a quo da prescrição, em razão da inexistência de confirmação de falecimento do desaparecido pela autora. Entendeu, ainda, ser frágil a alegação suscitada para embasar o pedido de redução do valor de indenização. Concluiu, em relação ao nexo de causalidade, ser suficiente, para a verificação da responsabilidade objetiva do Estado, o registro da sentença e o da apelação sobre os indícios das razões políticas do desaparecimento do marido da recorrida, cuja análise também dependeria do reexame de provas. Após, o Min. Gilmar Mendes pediu vista dos autos.
RE 313915/RN, rel. Min. Joaquim Barbosa, 28.9.2004. (RE-313915)
Mandado de Segurança e Ato de Órgão Colegiado
A Turma negou provimento a recurso ordinário em mandado de segurança interposto pela Associação de Notários e Registradores do Brasil - ANOREG/BR contra acórdão do STJ que declarara a sua incompetência para processar e julgar, originariamente, mandado de segurança impetrado contra ato de órgão colegiado presidido por Ministro de Estado, e extinguira o processo sem julgamento de mérito. Tratava-se, na espécie, de mandado de segurança impetrado contra ato do Ministro da Justiça, consubstanciado na Resolução 124/2001, do Conselho Nacional de Trânsito - CONTRAN, que dispensou a obrigatoriedade de se proceder ao registro do contrato de alienação fiduciária sobre veículo automotor em Cartório de Títulos e Documentos. Sustentava-se, preliminarmente, que em razão de o CONTRAN ser órgão do Ministério da Justiça, composto por Ministros de Estado, seus atos não poderiam ser discutidos em primeira instância, mas que, se reconhecida a competência da Justiça Federal, o processo para ela deveria ter sido remetido. Quanto ao mérito, alegava-se ofensa ao princípio da legalidade administrativa, em sentido estrito (CF, art. 37), já que a referida Resolução afastara a obrigatoriedade de registro prevista em lei (Decreto-lei 911/69), bem como violação ao art. 130 da Lei 6.015/73, que determina o registro de títulos e documentos em ambas as circunscrições, se os contratantes morarem em localidades diversas. Entendeu-se que, apesar de a impetração se dirigir contra ato do Ministro da Justiça, os termos impugnados se referiam à Resolução 124/2001, emanada de órgão colegiado (CONTRAN), inexistindo decisão que pudesse ser atribuída a específico exercício do cargo da autoridade apontada como coatora, o que afastaria a competência do STJ para a apreciação do writ. Esclareceu-se, ainda, que o pedido alternativo de remessa do feito para a justiça federal de 1ª instância não poderia ser atendido por implicar correção do pólo passivo da demanda, conforme jurisprudência do STF. Precedentes citados:
RMS 21560/DF (DJU de 18.12.92); RMS 22780/DF (DJU de 4.12.98). RMS 24552/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, 28.9.2004. (RMS-24552)
Art. 19 do ADCT e Interrupção do Exercício
A Turma, por maioria, negou provimento a recurso extraordinário interposto pelo Estado de Minas Gerais contra acórdão do tribunal de justiça do mesmo Estado que, reformando sentença, entendera ser a recorrida, professora convocada da rede estadual de ensino, beneficiária da estabilidade prevista no art. 19 do ADCT ("Os servidores públicos civis da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, da administração direta, autárquica e das fundações públicas, em exercício na data da promulgação da Constituição, há pelo menos cinco anos continuados, e que não tenham sido admitidos na forma regulada no art. 37, da Constituição, são considerados estáveis no serviço público"). O recorrente alegava que o instituto da convocação seria modalidade de contratação sob regime especial e por tempo determinado não amparado pelo art. 19 do ADCT e que não teria havido exercício contínuo da função no período a que alude o referido dispositivo constitucional. Entendeu-se, tendo em conta a singularidade do caso, que os breves intervalos verificados nas contratações firmadas com a recorrida, decorrentes da própria natureza da atividade prestada (magistério), não descaracterizariam o direito da servidora. Asseverou-se, ainda, que o art. 19 do ADCT visou beneficiar aqueles que vinham prestando serviço continuado e não mencionou a exigência de que o serviço fosse prestado por período ininterrupto. Vencida a Min. Ellen Gracie, relatora, que dava provimento ao recurso por considerar que se deveria dar interpretação restritiva ao requisito a que alude o art. 19 do ADCT, norma transitória e exceção à regra do art. 37, II, da CF, no sentido de que o mesmo exigiria, para obtenção da estabilidade, a prestação do serviço pelo prazo de cinco anos contínuos e ininterruptos.
RE 361020/MG, rel. orig. Min. Ellen Gracie, rel. p/ acórdão Min. Carlos Velloso, 28.9.2004. (RE-361020)